Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
fruto <strong>de</strong> uma estratégia militar e política antecipada <strong>de</strong> Melo Antunes e do Grupo dos 9, em articulação<br />
com o PS e PPD, mas até que ponto as pressões diplomáticas dos aliados sobre a URSS, nomeadamente<br />
após os Acordos <strong>de</strong> Helsínquia, pesaram na reacção do PCP? James Callaghan consi<strong>de</strong>ra que houve<br />
melhoria na situação portuguesa após a realização da Conferência <strong>de</strong> Helsínquia, sendo que os<br />
soviéticos <strong>de</strong>ram claramente maior priorida<strong>de</strong> ao acordo da CSCE do que à ajuda aos comunistas<br />
portugueses. 365 Soares é da opinião <strong>de</strong> que “os apoios internacionais ajudaram a neutralizar a URSS,<br />
quando se convenceram que o PCP não conseguiria nunca chegar ao po<strong>de</strong>r por via pacífica.” 366<br />
Segundo Bernardino Gomes e Tiago Moreira <strong>de</strong> Sá, 367 <strong>de</strong>vido à indisponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> consulta <strong>de</strong> fontes<br />
soviéticas, não é ainda possível <strong>de</strong>terminar o impacto total da pressão oci<strong>de</strong>ntal na URSS, mas “os<br />
registos existentes apontam para, no mínimo, uma mo<strong>de</strong>ração da posição do Kremlin face à revolução<br />
portuguesa, na sequência das pressões europeias.” 368<br />
Se foi <strong>de</strong>cisiva a acção diplomática dos aliados sobre a URSS e o seu apoio ao PS para o<br />
<strong>de</strong>sfecho do 25 <strong>de</strong> Novembro em Portugal é impru<strong>de</strong>nte afirmar, mas conclui-se, com toda a certeza,<br />
que foi extremamente importante. Para Telo, os factores externos foram o amplificador da evolução<br />
interna (…).” 369 Além da repercussão na reacção soviética, o apoio europeu e norte-americano conferiu<br />
uma dimensão política ao PS e ao restante sector mo<strong>de</strong>rado, que terá pesado na pon<strong>de</strong>ração dos<br />
comunistas portugueses face ao 25 <strong>de</strong> Novembro. “Os apoios externos ajudaram muito: mostraram ao<br />
PCP, ao contrário do que inicialmente se pensaria, que um passo a mais em direcção ao abismo os<br />
arrastaria sem remissão para um <strong>de</strong>sastre fatal. Por isso recuaram a tempo – mas „in extremis‟ - , honra<br />
lhes seja …” 370 Este reconhecimento <strong>de</strong> Soares remete para a relevância da diplomacia oci<strong>de</strong>ntal na<br />
condução dos <strong>de</strong>sígnios <strong>de</strong>mocráticos da Revolução. E graças à sua acção, <strong>de</strong> Tito Morais e Ramos da<br />
Costa, um partido que nasceu sem uma implantação que rivalizasse com o PCP, conseguiu revelar-se<br />
<strong>de</strong>terminante para o <strong>de</strong>sfecho político da Revolução, graças aos apoios externos e a uma acção<br />
diplomática europeia. E na base disto, está uma acção política e a figura <strong>de</strong> Soares na Europa,<br />
coadjuvado por Tito <strong>de</strong> Morais e Ramos da Costa. Em Portugal, a contenda política acabava assim a<br />
favor da <strong>de</strong>mocracia, da concretização da i<strong>de</strong>ia europeísta <strong>de</strong> Soares para Portugal e dos lí<strong>de</strong>res<br />
europeus e norte-americanos, que manteriam assim o status quo oci<strong>de</strong>ntal.<br />
365 James Callaghan, cit., p. 364.<br />
366 In Maria João Avillez, Soares, Ditadura […] cit. p. 478.<br />
367 Carlucci vs. Kissinger […] cit., pp. 272, 273.<br />
368 Segundo uma investigação <strong>de</strong> Tilo Wagner nos arquivos da RDA, “Brejnev não estava disposto a abdicar da Conferência para<br />
a Segurança e Cooperação Europeia em troca <strong>de</strong> uma revolução comunista em Lisboa.” Segundo a sua pesquisa, antes da<br />
Conferência <strong>de</strong> Helsínquia, Brejnev <strong>de</strong>ixou claro “que Moscovo não pretendia <strong>de</strong>sistir da consumação da sua estratégia <strong>de</strong><br />
détente por uma mão-cheia <strong>de</strong> comunistas portugueses ansiosos”, exigindo “a retirada do SED para evitar tensões com a<br />
Europa Oci<strong>de</strong>ntal e os EUA.”, Tilo Wagner, “Portugal e a RDA durante a Revolução dos Cravos”, Relações Internacionais, nº 11,<br />
Setembro 2006, p. 86. Citado por Bernardino Gomes, cit., pp. 273. (O SED - Partido Socialista Unido – era o Partido Comunista<br />
da RDA).<br />
369 António José Telo, História Contemporânea – do 25 <strong>de</strong> Abril à Actualida<strong>de</strong>, Vol. II, […] cit., p. 204.<br />
370 In Maria João Avillez, Soares, Ditadura […] cit., p. 478.<br />
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