Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
Moscovo, Kissinger concordou que ainda havia esperança e assegurou ao homólogo britânico que o iria<br />
seguir, sempre um passo atrás.‟” 321<br />
Foi essencialmente a partir do 11 <strong>de</strong> Março, com as consequências da tentativa do golpe<br />
encetado, 322 que os EUA creram profundamente num <strong>de</strong>stino comunista para Portugal. Não acreditando<br />
na capacida<strong>de</strong> suficiente do PS e dos outros partidos da ala mo<strong>de</strong>rada, como o PPD e o CDS, para<br />
contrabalançar o PCP na transição <strong>de</strong>mocrática do país, Kissinger começa a conjecturar, como medida<br />
<strong>de</strong> pressão a Lisboa, isolar Portugal na NATO, o que indicia numa carta dirigida a Costa Gomes. 323 Na<br />
tentativa <strong>de</strong> puxar Washington para a mesma atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> confiança da Europa Oci<strong>de</strong>ntal, Willy Brandt<br />
encontra-se com o Secretário <strong>de</strong> Estado e o Presi<strong>de</strong>nte norte-americano, em Março <strong>de</strong> 1975. “Falei-lhe<br />
da minha ansieda<strong>de</strong> e pedi-lhe abertamente ajuda. 324 Incutindo esperança ao governo <strong>de</strong> Washington,<br />
Brandt aproveitou para realçar a acção do PS em Portugal e a confiança em Soares, 325 entregando<br />
também a Ford uma carta <strong>de</strong> pedido <strong>de</strong> apoio do socialista português. 326<br />
Contudo, a resposta <strong>de</strong> Washington foi <strong>de</strong> cepticismo, querendo reequacionar a presença <strong>de</strong><br />
Portugal na Aliança Atlântica, com Ford a consi<strong>de</strong>rar que “toda a realida<strong>de</strong> portuguesa „ia complicar a<br />
situação dos aliados na NATO‟.” 327 A diplomacia <strong>de</strong> Kissinger, a<strong>de</strong>pto do isolamento <strong>de</strong> Portugal,<br />
acarretou também divergências com Frank Carlucci, o embaixador norte-americano em Lisboa, que,<br />
mantendo uma relação próxima com Mário Soares, acalentou esperanças numa transição <strong>de</strong>mocrática<br />
pela via do PS. Para Carlucci, “ostracizar ou colocar Portugal <strong>de</strong> quarentena na NATO” seria<br />
“entendido como um ataque ao novo governo”, pelo que aconselhava os EUA a apoiar todas a acções<br />
ten<strong>de</strong>ntes à realização <strong>de</strong> “eleições livres e justas. (…) Soares compreen<strong>de</strong> isto e é essa a razão pela<br />
qual ele está a mobilizar os seus amigos alemães na questão das eleições.” 328<br />
Na política americana extremam-se posições, com a corrente europeia <strong>de</strong> apoio a Soares, <strong>de</strong><br />
Carlucci, e a <strong>de</strong> isolamento <strong>de</strong> Portugal, <strong>de</strong> Kissinger, que consi<strong>de</strong>rava Lisboa perdida para o Oci<strong>de</strong>nte,<br />
com a agravante <strong>de</strong> o comunismo ter uma via aberta para a Europa do Sul, sendo que a atitu<strong>de</strong> mais<br />
cautelosa e lógica seria o afastamento <strong>de</strong> Portugal da NATO. Esta posição resi<strong>de</strong> na preocupação sobre<br />
a viabilida<strong>de</strong> futura da política externa e <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa que os EUA tinham <strong>de</strong>lineado como estratégica após<br />
a II Guerra Mundial, na qual a Europa assumia a função da sua zona tampão <strong>de</strong> segurança. Ora,<br />
Portugal tinha uma importância extrema para a estratégia militar norte-americana. O único entrave para<br />
os EUA concretizarem a sua intenção <strong>de</strong> excluir Portugal da NATO residia na falta <strong>de</strong> consonância com<br />
321<br />
Hans Janitschek, cit., p. 79.<br />
322<br />
“Portugal <strong>de</strong>slocou-se bruscamente em direcção a uma ditadura militar <strong>de</strong> esquerda”, dizia-se no relatório, que levantava<br />
dúvidas relativamente ao futuro, nomeadamente à “relação <strong>de</strong> Portugal com a NATO, à atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> Espanha e à presença<br />
americana nos Açores” Ver Memorandum from Sonnenfeldt to the Secretary. Portugal: «Courses of Action», s.d. FOIA. Citado<br />
por Bernardino Gomes, cit., pp. 170-176.<br />
323<br />
“‟Os Estados Unidos estavam em contacto com os seus aliados da NATO para uma análise conjunta da situação portuguesa‟,<br />
o que em linguagem diplomática significava que a posição do país no seio da Aliança Atlântica podia ser revista.” In Portugal in<br />
Transition, a Report by Senator Mike Mansfield, US Senate, 94 th Congress Session, September 1975, Washington, DC,<br />
Government Printing Office, 1975, p. 780, citado por Bernardino Gomes, cit., p. 181.<br />
324<br />
Willy Brandt, cit., p. 316.<br />
325<br />
“Soares, com quem nós socialistas estamos associados, continua no executivo, como ministro sem pasta, pelo que po<strong>de</strong><br />
estar em campanha eleitoral. (…) Não <strong>de</strong>vemos <strong>de</strong>sistir.” In “Memorandum of Conversation, March, 27, 1975, NSA, Box 10.”<br />
Citado por Bernardino Gomes, cit., p. 183.<br />
326<br />
Ver “Memoramdum from Henry A. Kissinger for the Presi<strong>de</strong>nt Ford”, March 27, 1975, GFL, PCF, Box 10. Citado por<br />
Bernardino Gomes, cit., pp. 183, 184.<br />
327<br />
In “Memoramdum of Conversation”, March, 27, 1975, GFL, NSA, Box 10. Citado por Bernardino Gomes, cit., p. 183.<br />
328<br />
In “Lisbon, 1844, April 1, 1975”, GFL, PCF, Box, 11. Citado por Bernardino Gomes, cit., pp. 187, 188.<br />
77