Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
A sua táctica <strong>de</strong> oposição ao PCP e a Vasco Gonçalves teria <strong>de</strong> extravasar as fronteiras<br />
portuguesas, a fim <strong>de</strong> mobilizar a política europeia como forma <strong>de</strong> pressão interna. A resposta não se<br />
fez <strong>de</strong>morar, com os principais dirigentes da IS a multiplicarem esforços na ajuda ao PS e restantes<br />
forças <strong>de</strong>mocráticas mo<strong>de</strong>radas e na pressão sobre o Presi<strong>de</strong>nte da República. Depois dos socialistas<br />
terem abandonado o IV Governo Provisório, o Bureau da IS emitiu um comunicado <strong>de</strong> apoio aos<br />
socialistas portugueses: “Só com o socialismo <strong>de</strong>mocrático, Portugal po<strong>de</strong>rá evitar três ameaças: um<br />
golpe <strong>de</strong> direita, a ditadura comunista e a ditadura militar.” 289 Os amigos da Europa serão fundamentais<br />
para a estratégia <strong>de</strong> combate <strong>de</strong> Soares à radicalização das forças <strong>de</strong> esquerda em Portugal. O lí<strong>de</strong>r do<br />
PS projecta Portugal para a Europa e puxa a Europa para Portugal, para que, cá <strong>de</strong>ntro, o apoio europeu<br />
imprima força e credibilida<strong>de</strong> aos socialistas e para que na Europa se conheça a <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za da situação<br />
<strong>de</strong> Lisboa e as possíveis repercussões para o bloco oci<strong>de</strong>ntal.<br />
Embora se tenha intensificado a partir <strong>de</strong> 1975, a relação pós-revolução <strong>de</strong> Soares com os<br />
amigos da Europa já vinha acontecendo logo após o 25 <strong>de</strong> Abril. Convidado para integrar o Governo<br />
Provisório por Spínola e a propósito da composição do executivo, Soares, <strong>de</strong>fensor <strong>de</strong> que, a bem do<br />
pluralismo <strong>de</strong>mocrático, também o PCP <strong>de</strong>via integrar o Governo, não <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> se aconselhar sobre o<br />
assunto com <strong>de</strong>stacados lí<strong>de</strong>res europeus. 290 A sua opinião sobre os acontecimentos em Portugal era<br />
importante, não apenas porque se tratava <strong>de</strong> um momento político <strong>de</strong>licado que traria sempre alguma<br />
insegurança ao político português (afinal, estava em causa o futuro <strong>de</strong> Portugal), mas também porque<br />
manter confidências com os lí<strong>de</strong>res europeus seria para eles indutor <strong>de</strong> confiança no PS e no seu lí<strong>de</strong>r,<br />
vistos como a via mais capaz <strong>de</strong> constituição <strong>de</strong> um governo <strong>de</strong>mocrático em Portugal. 291<br />
É com esse intuito, antevendo a necessida<strong>de</strong> futura <strong>de</strong> apoio ao partido, que Soares convida os<br />
amigos da Europa a assistir ao I Congresso do PS na legalida<strong>de</strong>, realizado a 13 e 14 <strong>de</strong> Dezembro <strong>de</strong><br />
1974. A assembleia, na qual Mário Soares é reeleito secretário-geral do partido, conta com “a presença<br />
<strong>de</strong> representantes qualificados <strong>de</strong> partidos socialistas europeus e sociais-<strong>de</strong>mocratas estrangeiros <strong>de</strong> tão<br />
gran<strong>de</strong> número e ainda o presi<strong>de</strong>nte da IS, Bruno Pitermann, e do presi<strong>de</strong>nte Spinelli, um dos co-<br />
presi<strong>de</strong>ntes da Comissão Europeia.” 292 Tais comparências foram <strong>de</strong>terminantes para a afirmação<br />
interna e externa do PS, concretamente para a propaganda <strong>de</strong> Soares à Europa sobre o alegado perigo<br />
comunista. O <strong>de</strong>curso do congresso serviu perfeitamente esse intento, pois, apesar da sua confortável<br />
reeleição como secretário-geral do partido, foi uma reunião conturbada, minada <strong>de</strong> influências políticas<br />
do PCP, que tentava o controlo i<strong>de</strong>ológico do partido. 293<br />
289 “Bureau meets in Ireland”, Socialist affairs, Londres, 1975, vol. 25, nº 4, p. 79. Citado por Sergei Yastrzhembskiy, cit., p. 72.<br />
290 “Imediatamente após o golpe <strong>de</strong> estado, levantei a questão com diferentes homens <strong>de</strong> estado europeus. Willy Brandt, então<br />
chanceler da Alemanha Fe<strong>de</strong>ral, o primeiro-ministro britânico, Harold Wilson, e outros representantes <strong>de</strong> governos europeus<br />
mostraram-se convencidos da justeza do nosso ponto <strong>de</strong> vista, a saber, que para consolidar o processo da <strong>de</strong>mocratização<br />
havia vantagens em po<strong>de</strong>r contar com uma participação dos comunistas no Governo Provisório.” Entrevista <strong>de</strong> Mário Soares,<br />
concedida a Piero <strong>de</strong> Garzarolli, para o suplemento Europa, publicado no Le Mon<strong>de</strong>, 3.12.1974, em França e, simultaneamente,<br />
na Alemanha Fe<strong>de</strong>ral, na Grã-Bretanha e na Itália, in Mário Soares, Democratização […] cit., p. 204.<br />
291 Juliet Antunes Sablosky, O PS e a transição para a <strong>de</strong>mocracia, Lisboa, Editorial Notícias, 2000, pp. 42-45.<br />
292 “Relatório <strong>de</strong> Mário Soares no Congresso do PS”, in B. Diaz Nosty, cit., p. 151.<br />
293 O primeiro congresso do PS na legalida<strong>de</strong> vê-se ameaçado pelo distúrbio <strong>de</strong> uma ala i<strong>de</strong>ológica mais à esquerda, li<strong>de</strong>rada<br />
por Manuel Serra, fundador do Movimento Socialista Popular, integrado no PS como grupo autónomo, que apresenta uma lista<br />
concorrente à direcção do partido. Nesta ala, pairava a sombra da mão do PCP, com intentos <strong>de</strong> controlo i<strong>de</strong>ológico do partido.<br />
Ver Maria João Avillez, Soares, Ditadura […] cit., p. 367.<br />
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