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Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />

partido, a incumbência <strong>de</strong> fazer o reconhecimento da Revolução na Europa dá a Soares uma<br />

oportunida<strong>de</strong> única <strong>de</strong> projectar em Portugal a notorieda<strong>de</strong> que ele e o seu partido haviam adquirido nos<br />

meios políticos europeus. “O resultado <strong>de</strong> muitos anos <strong>de</strong> luta fora, finalmente, coroado por um sucesso<br />

público.” 275<br />

A par disto, era necessário iniciar uma acção partidária interna e colocar o discurso ao serviço<br />

da credibilização do PS e do seu lí<strong>de</strong>r. A conferência <strong>de</strong> imprensa do partido, dada após o seu périplo<br />

europeu <strong>de</strong> reconhecimento da Revolução portuguesa, é disso um reflexo. As linhas políticas que<br />

<strong>de</strong>fen<strong>de</strong> para a implementação do sistema <strong>de</strong>mocrático português, o papel que o PS preten<strong>de</strong> assumir na<br />

clarificação do processo <strong>de</strong>mocrático, as consi<strong>de</strong>rações sobre a constituição do Governo Provisório e o<br />

que <strong>de</strong>vem ser os seus objectivos indiciam o início <strong>de</strong> uma acção <strong>de</strong> campanha do partido no país com a<br />

<strong>de</strong>limitação do seu espaço político no período pós-revolução. Importante é o esclarecimento feito acerca<br />

da acção <strong>de</strong> reconhecimento da Revolução no estrangeiro, em que Soares “sublinhou que o fizera única<br />

e exclusivamente na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> representante do Partido Socialista (e não como porta-voz oficial ou<br />

oficioso), a convite <strong>de</strong> partidos e governos socialistas no po<strong>de</strong>r, nomeadamente o inglês, que lhe<br />

afirmaram que não reconheceriam a Junta <strong>de</strong> Salvação Nacional sem prévia consulta ao Partido<br />

Socialista português sobre as garantias oferecidas quanto à consolidação da <strong>de</strong>mocracia e ao processo<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>scolonização.” 276 Esta revelação tem duas leituras. A primeira é que, <strong>de</strong> facto, a credibilida<strong>de</strong> que<br />

Soares e o PS construíram na Europa durante o exílio são um factor chave <strong>de</strong> credibilização para a<br />

Revolução, como já anteriormente constatámos. A segunda <strong>de</strong>nota claramente o intuito <strong>de</strong> seguimento<br />

<strong>de</strong> uma estratégia, em que Soares não abdica <strong>de</strong> continuar a fazer a projecção do PS em Portugal através<br />

da evidência da sua importância europeia e vice-versa.<br />

O cargo <strong>de</strong> Ministro dos Negócios Estrangeiros vem possibilitar-lhe continuar essa estratégia:<br />

por um lado, aplicando a sua concepção <strong>de</strong> política externa a Portugal e, por outro, sendo o rosto <strong>de</strong><br />

uma pasta com bastante visibilida<strong>de</strong> no Governo, projectando as suas i<strong>de</strong>ias e o seu partido, ocupando<br />

espaço político em Portugal e na Europa, colmatando a construção da sua credibilida<strong>de</strong> para potencial<br />

lí<strong>de</strong>r para a implementação do socialismo <strong>de</strong>mocrático em Portugal.<br />

Além disto, a aceitação <strong>de</strong> Soares para assumir a li<strong>de</strong>rança do Ministério dos Negócios<br />

Estrangeiros do I Governo Provisório não é livre <strong>de</strong> interesses partidários, inerentes à sua estratégia<br />

para o futuro <strong>de</strong> Portugal. O facto <strong>de</strong> ser uma pasta subalterna relativamente, por exemplo, aos ministros<br />

sem pasta, era um pormenor quando comparado com a oportunida<strong>de</strong> que a visibilida<strong>de</strong> dos Negócios<br />

Estrangeiros acarretava para colocar as suas i<strong>de</strong>ias em prática. 277 “Quanto a mim, a i<strong>de</strong>ia inicial era ser<br />

Ministro sem Pasta (…); mas eu disse logo, ao Spínola, que preferia ser Ministro dos Negócios<br />

275<br />

In Maria João Avillez, Soares, Ditadura […] cit., pp. 319, 320.<br />

276<br />

Síntese da Conferência <strong>de</strong> Imprensa, realizada por Mário Soares, publicada em Maio <strong>de</strong> 1974, no nº 5 do Portugal Socialista,<br />

in Mário Soares, Democratização […] cit., pp. 23-31.<br />

277<br />

“No fundo, tratava-se <strong>de</strong> uma questão formal e os Negócios Estrangeiros convinham-me muito mais por outras razões:<br />

<strong>de</strong>senvolveria a minha re<strong>de</strong> <strong>de</strong> contactos internacionais, interviria nas questões <strong>de</strong> <strong>de</strong>scolonização; e por outro lado, seria muito<br />

mais fácil adquirir notorieda<strong>de</strong> aos olhos do Povo Português através <strong>de</strong> maior visibilida<strong>de</strong> da pasta conferida pela televisão.” In<br />

Maria João Avillez, Soares, Ditadura […] cit., p. 330.<br />

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