Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
diplomáticas no âmbito do MC intensificaram-se, com a previsão da vinda a Portugal <strong>de</strong> um membro da<br />
Comissão das Comunida<strong>de</strong>s. 242 Portugal já tinha recebido também a visita do Secretário <strong>de</strong> Estado<br />
alemão, do Primeiro-ministro e do Ministro dos Negócios Estrangeiros da Holanda e do subsecretário<br />
<strong>de</strong> Estado dos Negócios Estrangeiros italiano. A mensagem <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> relações comerciais<br />
com o MC é também frequentemente transmitida em entrevistas e <strong>de</strong>bates. 243<br />
Todavia, embora estabelecendo como prioritária uma “cooperação económica cada vez mais<br />
estreita com a Europa, com o Mercado Comum,” 244 Soares não <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> uma integração imediata nesta<br />
organização, numa atitu<strong>de</strong> proteccionista dos interesses económicos portugueses: “A nossa economia<br />
não está, certamente, ainda em condições <strong>de</strong> encarar uma integração (…).” 245 Ao advertir que Portugal<br />
não estaria em condições <strong>de</strong> competir num mercado livre <strong>de</strong> intercâmbio <strong>de</strong> produtos, 246 revela a sua<br />
vertente política pragmática, o que nos ajuda a compreen<strong>de</strong>r a relação entre i<strong>de</strong>ia e prática no<br />
pensamento <strong>de</strong> Soares. Indubitavelmente, a integração <strong>de</strong> Portugal na Comunida<strong>de</strong> Europeia é a sua<br />
concepção <strong>de</strong> futuro, mas não a qualquer preço. Há que salvaguardar as suas consequências práticas<br />
imediatas. Europa sim, como visão, mas não já como integração, pois traria mais <strong>de</strong>svantagens do que<br />
vantagens para a economia portuguesa. De resto, esta atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> não ter a Europa a qualquer preço já se<br />
tinha evi<strong>de</strong>nciado durante a sua estada no exílio, ao contestar que os países da Comunida<strong>de</strong><br />
concebessem a entrada <strong>de</strong> Portugal ditatorial no MC. Neste aspecto, Soares sobrepunha o i<strong>de</strong>al <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>mocracia à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> integração europeia, pois tal <strong>de</strong>sarmaria a oposição a Salazar. Agora, Soares faz<br />
sobrepor a <strong>de</strong>svantagem pragmática ao i<strong>de</strong>al.<br />
Mas, ao não <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r uma integração imediata no MC, Soares é cauteloso em todos os<br />
esclarecimentos para não ser conectado com qualquer i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> recusa da Europa, o que faz<br />
particularmente à comunicação social europeia, quando confrontado com as questões <strong>de</strong> um jornalista<br />
belga:<br />
MS: “(…) Penso que não <strong>de</strong>vemos solicitar logo no início das conversações um estatuto <strong>de</strong> associado e,<br />
muito menos ainda, um acordo <strong>de</strong> integração, porque o estado actual da nossa economia não o permite.<br />
Mas esse é o nosso objectivo. Por agora, todavia, vamos <strong>de</strong>senvolver as nossas relações comerciais, no<br />
quadro do tratado preferencial que assinámos e que vai ser corrigido, <strong>de</strong>senvolvido e aprofundado. Só<br />
então, po<strong>de</strong>remos encarar, para o futuro, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> solicitarmos o estatuto <strong>de</strong> associado. Mas<br />
queremos, evi<strong>de</strong>ntemente, estreitar <strong>de</strong>s<strong>de</strong> já, ao máximo, os laços económicos, culturais e políticos com a<br />
Europa.<br />
técnicos, <strong>de</strong> que a melhor opção para Portugal, para já, é a <strong>de</strong> aprofundar e <strong>de</strong>senvolver o tratado comercial preferencial que<br />
firmámos com o Mercado Comum. A CEE está precisamente disposta a <strong>de</strong>senvolver esse tratado e encara a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
uma ajuda a Portugal.” Mário Soares, Conferência <strong>de</strong> Imprensa no Palácio das Necessida<strong>de</strong>s, 13.09.1974, in Mário Soares,<br />
Democratização [...] cit., pp. 97,98.<br />
242 I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m, pp. 98.<br />
243 Mesa redonda transmitida pela televisão alemã oci<strong>de</strong>ntal, 9.10.1974, transcrição, in Mário Soares, Democratização […] cit.,<br />
p.157.<br />
244 Entrevista a Mário Soares, realizada por Marcel Nie<strong>de</strong>rgang, para o semanário jornal Le Mon<strong>de</strong>, publicada em 24.12.1974, in<br />
Mário Soares, Democratização […] cit., p. 246.<br />
245 I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m. Nesta entrevista reitera o interesse <strong>de</strong> Portugal “em intensificar e alargar as nossas relações comerciais (…) e<br />
em <strong>de</strong>senvolver o tratado preferencial que temos com a Europa do Mercado Comum.”<br />
246 “(…) se houvesse uma liberda<strong>de</strong> total <strong>de</strong> transferência <strong>de</strong> homens, mercadorias e capitais entre Portugal e a CEE, a nossa<br />
economia ficaria arruinada a curto prazo, seria totalmente colonizada pelas gran<strong>de</strong>s firmas multinacionais e o nosso país,<br />
possivelmente, <strong>de</strong>spovoar-se-ia.” Mário Soares em entrevista realizada por Mário Alexandre, para o diário português A Capital,<br />
publicada em 13.12.1974, in Mário Soares, Democratização […] cit., p. 223.<br />
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