Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
<strong>de</strong>scolonização, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>ndo a urgência <strong>de</strong>la contra a confrontação com as críticas <strong>de</strong> precipitação no<br />
processo. Ainda na Alemanha, num <strong>de</strong>bate televisivo, 230 aborda o mesmo assunto, justificando as<br />
opções <strong>de</strong> in<strong>de</strong>pendência em Moçambique, prevendo as <strong>de</strong> Angola e refutando ainda qualquer cedência<br />
ao interesse geoestratégico da Aliança Oci<strong>de</strong>ntal nas ilhas <strong>de</strong> Cabo Ver<strong>de</strong>, em <strong>de</strong>trimento da sua<br />
in<strong>de</strong>pendência. 231 No discurso na Assembleia-geral da ONU reafirma a “<strong>de</strong>scolonização dos territórios<br />
sob administração portuguesa, num processo rápido e seguro” 232 , como um dos três objectivos<br />
principais que o Movimento 25 <strong>de</strong> Abril se propõe alcançar. E volta a vincar e explicar esta posição em<br />
vários órgãos <strong>de</strong> comunicação social. 233<br />
Conclui-se assim que, não obstante a sua efectiva i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> <strong>de</strong>scolonização estar vinculada à<br />
legitimação da <strong>de</strong>mocracia portuguesa, é notório também um esforço <strong>de</strong> comunicação nesse sentido, o<br />
que ajuda à construção da credibilida<strong>de</strong> do Governo Provisório e do incremento da sua, enquanto lí<strong>de</strong>r<br />
partidário. A política <strong>de</strong> <strong>de</strong>scolonização era uma base <strong>de</strong> legitimação <strong>de</strong> actuação, o sinal político<br />
premente <strong>de</strong> mudança, e disso estava <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte um apoio e aceitação do regime português pela<br />
diplomacia oci<strong>de</strong>ntal, nomeadamente a Europa. A par disto, estava também a ser posta à prova a sua<br />
própria capacida<strong>de</strong> política socialista, cuja avaliação era importante para um futuro apoio em eleições<br />
<strong>de</strong>mocráticas.<br />
5.1.2 – Uma política <strong>de</strong> abertura – Europa na mira<br />
Mercado Comum sim, mas não já!<br />
“Mário Soares, o seu Lí<strong>de</strong>r (do PS), era sem dúvida a figura política portuguesa mais<br />
conhecida e, embora exilado, ele era quem mais se aproximava <strong>de</strong> um lí<strong>de</strong>r nacional,” 234 consi<strong>de</strong>ra<br />
James Callaghan. A confiança dos lí<strong>de</strong>res europeus sobre Soares iria incrementar-se com a sua actuação<br />
após a Revolução, em que vai proferindo o discurso sobre necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Europa, <strong>de</strong> abertura externa e<br />
quebra com a política “orgulhosamente só.” Des<strong>de</strong> a já abordada conferência <strong>de</strong> imprensa no Palácio<br />
das Necessida<strong>de</strong>s, nas várias entrevistas que conce<strong>de</strong> e discursos que protagoniza, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
Europa é inserida numa i<strong>de</strong>ia global <strong>de</strong> abertura à diplomacia internacional, quebrando com o passado<br />
isolacionista. “Quero <strong>de</strong>ixar bem claro que o Portugal livre e <strong>de</strong>mocrático que estamos a construir, com<br />
gran<strong>de</strong>s dificulda<strong>de</strong>s, mas estimulados pela confiança generalizada do nosso povo, começa agora a<br />
sentir-se orgulhosamente acompanhado”, diz, numa alusão contraditória ao slogan isolacionista <strong>de</strong><br />
230<br />
Declarações <strong>de</strong> Mário Soares em <strong>de</strong>bate, mesa redonda transmitida pela televisão alemã oci<strong>de</strong>ntal, 9.10.1974, transcrição, in<br />
I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m, pp. 145-159.<br />
231<br />
“Po<strong>de</strong>mos dizer que as ilhas <strong>de</strong> Cabo Ver<strong>de</strong> têm o mesmo valor estratégico para o Atlântico Sul que as ilhas dos Açores – e a<br />
comparação é legítima – para o Atlântico Norte. (…) De qualquer maneira, <strong>de</strong>finimos uma política <strong>de</strong> <strong>de</strong>scolonização livremente<br />
e não tem <strong>de</strong> ter em conta imposições <strong>de</strong> estratégia <strong>de</strong> tipo mundial.” I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m, pp. 153,154.<br />
232<br />
Mário Soares, “discurso pronunciado na 29ª sessão da Assembleia-geral da ONU”, 23.09.1974, in Mário Soares,<br />
Democratização […] cit., p.128.<br />
233<br />
Ver entrevistas dadas por Mário Soares ao semanário tunisino Dialogue, 11.11.1974, ao diário português A Capital,<br />
13.12.1974, ao semanário português O Século Ilustrado, publicada em 21.12.1974, ao jornal francês Le Mon<strong>de</strong>, publicada em<br />
24.12.1974, in Mário Soares, Democratização […] cit., pp. 189-201; 213-227; 229-239; 241-248.<br />
234<br />
James Callaghan, Time and Change, London, Collins, 1987, p. 360.<br />
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