Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
foi a Revolução 25 <strong>de</strong> Abril permite a Soares dar expressão prática às i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong>fendidas na oposição. A<br />
pasta dos Negócios Estrangeiros oferece-lhe <strong>de</strong> ban<strong>de</strong>ja a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dar seguimento à sua<br />
estratégia política e à sua i<strong>de</strong>ia para o futuro <strong>de</strong> Portugal.<br />
Além <strong>de</strong>, como Ministro dos Negócios Estrangeiros, ter conduzido o processo <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>scolonização, i<strong>de</strong>ia que foi uma das suas ban<strong>de</strong>iras <strong>de</strong> oposição a Salazar, Soares põe também em<br />
prática as directrizes <strong>de</strong> política externa que já <strong>de</strong>fendia. Numa conferência <strong>de</strong> imprensa, no Palácio das<br />
Necessida<strong>de</strong>s, em Setembro <strong>de</strong> 1974, apresenta as linhas condutoras do novo posicionamento externo<br />
<strong>de</strong> Portugal, que incluem “a estrita fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> à Aliança Inglesa”, a “fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> absoluta à Aliança<br />
Atlântica” 224 e uma aproximação ao MC.<br />
Durante o Estado Novo, tinham sido Mário Soares e os companheiros socialistas que vinham<br />
mantendo as únicas relações portuguesas <strong>de</strong> amiza<strong>de</strong> com a Europa, assegurando uma relação com um<br />
outro Portugal alternativo ao <strong>de</strong> Salazar, que emergia agora, com Soares na pasta dos Negócios<br />
Estrangeiros. Perante um Governo Provisório sem uma <strong>de</strong>finição política clara, Soares encontrava<br />
margem suficiente para ir pondo em prática as suas i<strong>de</strong>ias relativamente à política externa portuguesa,<br />
mantendo a linha <strong>de</strong> pensamento que vinha preconizando e praticando no exílio, mas com alguma<br />
cautela, aten<strong>de</strong>ndo à <strong>de</strong>lica<strong>de</strong>za política do momento. É certo que os programas dos governos<br />
provisórios incluíam “uma intensificação das relações comerciais e políticas com os países da<br />
Comunida<strong>de</strong> Económica Europeia,” 225 mas, sendo referências vagas, será Soares que dará consistência e<br />
<strong>de</strong>senvolvimento a estas esparsas intenções, ultrapassando o propósito prático <strong>de</strong> aprofundamento <strong>de</strong><br />
acordo com o MC. Na conferência <strong>de</strong> imprensa, anuncia que ratificará a Convenção Europeia dos<br />
Direitos do Homem, “po<strong>de</strong>ndo vir a participar nas organizações europeias do tipo político, como é do<br />
interesse <strong>de</strong> Portugal.” Contudo, esta reflexão fica por aqui. Não <strong>de</strong>senvolve mais o interesse <strong>de</strong><br />
estreitar laços políticos com os países da CEE, pois não era o momento oportuno. Soares sabe que, em<br />
tempos <strong>de</strong> transição política do país, não é a altura conveniente para <strong>de</strong>senvolver plenamente a sua i<strong>de</strong>ia<br />
<strong>de</strong> uma integração política <strong>de</strong> Portugal no projecto europeu. Sabe que o caminho tem <strong>de</strong> se ir<br />
preparando progressivamente. Perante a situação débil da economia portuguesa, esta era apenas a altura<br />
própria para <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r uma relação privilegiada com o MC. Para já, era inoportuno dominar os discursos<br />
com a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> uma associação <strong>de</strong> Portugal à CEE.<br />
No Palácio das Necessida<strong>de</strong>s, fica patente que a linha programática do Governo Provisório para<br />
a política externa portuguesa coincidia, afinal, com a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Soares – a <strong>de</strong> retirar Portugal da situação<br />
isolacionista <strong>de</strong> Salazar e abrir a diplomacia lusa a todos os países, sendo que, além do privilégio das<br />
relações com a Europa, está também o reatar e mantimento <strong>de</strong> relações com a América Latina,<br />
nomeadamente com o Brasil, África, com os países árabes e asiáticos. Crê-se que a correspondência da<br />
224 Mário Soares, “Conferência <strong>de</strong> Imprensa no Palácio das Necessida<strong>de</strong>s”, em 13 <strong>de</strong> Setembro <strong>de</strong> 1974, in Mário Soares,<br />
Democratização e Descolonização, <strong>de</strong>z meses <strong>de</strong> Governo Provisório, Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1975, p. 97.<br />
225 Linhas Programáticas do Governo Provisório, http://www.portugal.gov.pt/pt/Documentos/Governos_Documentos/GP01.pdf ,<br />
acedido em 20.12.2009. No programa do III Governo Provisório, estabelece-se como objectivo o “Estreitamento e intensificação<br />
das relações com as Comunida<strong>de</strong>s Europeias, através da negociação <strong>de</strong> arranjos que introduzam melhorias, no actual acordo<br />
<strong>de</strong> comércio e da sua extensão, pelo funcionamento da cláusula evolutiva, a outros domínios, nomeadamente, a mão-<strong>de</strong>-obra<br />
emigrada, a cooperação tecnológica, industrial e financeira.”<br />
http://www.portugal.gov.pt/pt/Documentos/Governos_Documentos/Gov_P03_Prog.pdf, acedido em 20.12.2009.<br />
56