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Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />

Perante estes sinais <strong>de</strong> pon<strong>de</strong>ração a uma abertura do MC a Portugal, Soares não cruza os<br />

braços. Não só vai <strong>de</strong>nunciando o assunto em instâncias europeias e aliando os partidos socialistas para<br />

a tomada <strong>de</strong> uma posição contra, que pressionasse os governos europeus, como também terá participado<br />

conjuntamente com os seus camaradas socialistas portugueses na emissão <strong>de</strong> um aviso, dirigido à<br />

Europa, 213 no qual se sustenta ser inconcebível a entrada <strong>de</strong> Lisboa no MC. Num documento <strong>de</strong> 17<br />

páginas, assinado por Ramos da Costa, é analisada a economia portuguesa, recorrendo-se a valores da<br />

OCDE. Nesta mensagem à Europa, apresenta-se a posição <strong>de</strong> Rui Patrício, o então Ministro dos<br />

Negócios Estrangeiros, que propunha, para a viabilida<strong>de</strong> da entrada <strong>de</strong> Portugal no MC, a divisão <strong>de</strong><br />

Portugal em duas partes, as colónias e a metrópole, sendo que esta estaria preparada para negociar com<br />

a Comunida<strong>de</strong> Europeia. Profundos conhecedores do projecto <strong>de</strong> construção europeia, os socialistas<br />

portugueses contrariam a posição <strong>de</strong> Rui Patrício, com base na incompatibilida<strong>de</strong> da natureza política<br />

do regime português e dos preceitos do Tratado <strong>de</strong> Roma, que fundou a CEE. “O acordo <strong>de</strong> associação,<br />

só por si, é inconciliável com os princípios da doutrina comunitária, <strong>de</strong> essência <strong>de</strong>mocrática,<br />

incompatível, mais precisamente, com os artigos 237 e 238 do Tratado <strong>de</strong> Roma. Sobre esta matéria,<br />

convém ter em conta a informação BIRKEMBACK, da qual a doutrina é hoje geralmente aceite. O fim<br />

último do Tratado <strong>de</strong> Roma, segundo BIRKEMBACK, é a união política da Europa.” 214<br />

Socorrendo-se dos princípios do tratado que instituiu a CEE, os socialistas portugueses buscam<br />

argumentos para a inadmissibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma associação portuguesa ao MC. No entanto, a oposição a<br />

esta negociação, que já estava a ser discutida, não é apenas feita com base em razões morais e políticas,<br />

mas também em termos pragmáticos, com a <strong>de</strong>fesa <strong>de</strong> que tal acordo não seria benéfico, nos termos em<br />

que está a ser negociado, para a economia portuguesa. O início da discussão <strong>de</strong> uma modalida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

associação <strong>de</strong> Portugal ao MC <strong>de</strong>veu-se, sobretudo, ao enfraquecimento da EFTA, com as perspectivas<br />

<strong>de</strong> a<strong>de</strong>são da Inglaterra à CEE. Sendo que o acordo <strong>de</strong> a<strong>de</strong>são ao MC pressupunha a abolição das taxas<br />

aduaneiras, os socialistas portugueses viam na consequência disso a <strong>de</strong>terioração da economia agrícola<br />

do país, que, já menos <strong>de</strong>senvolvida do que a europeia, não teria condições <strong>de</strong> competitivida<strong>de</strong>, face à<br />

entrada <strong>de</strong> produtos externos, mesmo com a existência <strong>de</strong> uma cláusula <strong>de</strong> protecção aos sectores mais<br />

sensíveis. 215 Ao <strong>de</strong>smontar o argumento económico do Governo, os socialistas concluem e acusam<br />

Marcelo Caetano <strong>de</strong> não estar preocupado com a economia portuguesa, mas sim <strong>de</strong>, numa fase em que<br />

se agudizavam as contestações internacionais à conduta colonialista <strong>de</strong> Lisboa, querer apenas uma<br />

legitimação política internacional. 216<br />

213 “Avis Des Socialistes Portugais (ASP) sur les Negociations en Cours entre le Gouvernement Portugais e la Communaute<br />

Europeene (CEE)”, Centro <strong>de</strong> Documentação 25 <strong>de</strong> Abril, <strong>Universida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Coimbra</strong>, 330 (469) « 1971 » ACC.<br />

214 Ibi<strong>de</strong>m.<br />

215 “Contudo, Portugal abrirá as suas portas aos produtos industriais concorrentes, mais fortes do que nós no mercado da<br />

concorrência internacional, enquanto nós não po<strong>de</strong>remos <strong>de</strong>sfrutar, pela falta <strong>de</strong> capacida<strong>de</strong> industrial, <strong>de</strong> um mercado que os<br />

países da CEE nos abrem.” Ibi<strong>de</strong>m.<br />

216 “Os membros do governo português e seus apoiantes passam alegremente por cima dos interesses económicos do país,<br />

enquanto po<strong>de</strong>m tirar facilmente vantagem política das negociações em curso e do acordo em perspectiva. Essas negociações e<br />

esse acordo funcionam, para eles, como um certificado <strong>de</strong> boas práticas. Proporcionam-lhes uma forma <strong>de</strong> provar que todos<br />

reconhecem um regime, acusado legitimamente <strong>de</strong> totalitarismo e <strong>de</strong> colonialismo, com o privilégio <strong>de</strong> encetar negociações com<br />

os países <strong>de</strong>mocráticos. Quem é parecido, junta-se. O governo português tem agora uma nova possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> fazer crer o<br />

povo <strong>de</strong> que é um governo tão honesto e digno como os outros.” Ibi<strong>de</strong>m.<br />

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