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Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />

supra-nacionais e cuja unida<strong>de</strong> <strong>de</strong>riva do facto <strong>de</strong> todos os países que a compõem terem instituições<br />

<strong>de</strong>mocráticas.” 197<br />

Se estes valores têm sido fundamentais no seu discurso e no que <strong>de</strong>fen<strong>de</strong> para Portugal e<br />

Europa, nesta fase final do regime, eles tornam-se ainda mais imprescindíveis para <strong>de</strong>smontar a acção<br />

<strong>de</strong> Marcelo Caetano, numa oposição especificamente dirigida ao sucessor <strong>de</strong> Salazar. A tentativa <strong>de</strong><br />

Soares é a <strong>de</strong> impedir que as ilusões da Primavera Marcelista e o vislumbre <strong>de</strong> interesse do governo<br />

caetanista por uma aproximação à Europa caiam nas graças dos dirigentes europeus. Os valores<br />

<strong>de</strong>mocráticos e socialistas sobressaem novamente como argumento para os lí<strong>de</strong>res da Europa, contra a<br />

acção <strong>de</strong> abertura <strong>de</strong> Marcelo Caetano. Estava em causa toda a estratégia <strong>de</strong> oposição <strong>de</strong> Soares ao<br />

regime, que implicava a possível perda da Europa como arma <strong>de</strong> pressão para o fim da ditadura em<br />

Portugal. De tal modo que, transparece no seu discurso uma certa revolta contra a Europa.<br />

4.4 – E a revolta contra a Europa?<br />

Ao longo da sua campanha pela e na Europa, Soares tem duas atitu<strong>de</strong>s paralelas: se por um lado<br />

elogia o projecto <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> europeia, os padrões <strong>de</strong> vida europeus e se i<strong>de</strong>ntifica com a corrente da<br />

social-<strong>de</strong>mocracia, por outro, não se coíbe <strong>de</strong> acusar os lí<strong>de</strong>res oci<strong>de</strong>ntais <strong>de</strong> uma cumplicida<strong>de</strong> para<br />

com Salazar, co-responsabilizando-os pela longevida<strong>de</strong> do regime. Não o faz apenas no seu Portugal<br />

Amordaçado – on<strong>de</strong> explica “a sobrevivência do salazarismo” com a “traição das <strong>de</strong>mocracias<br />

oci<strong>de</strong>ntais” 198 – mas também nos órgãos <strong>de</strong> comunicação social europeus e nas próprias instâncias<br />

europeias on<strong>de</strong> discursa, realçando o facto <strong>de</strong>, apesar <strong>de</strong> os dois países terem regimes ditatoriais, o<br />

mundo esquecer “muito mais frequentemente o caso português do que o espanhol.” 199<br />

Apesar <strong>de</strong> <strong>de</strong>rrotado o fascismo <strong>de</strong> Hitler e Mussolini na II Guerra Mundial, as vicissitu<strong>de</strong>s da<br />

história e a particular localização geográfica portuguesa contribuíram para a indiferença oci<strong>de</strong>ntal à<br />

ditadura, pois o país ibérico era encarado como estratégico para o bloco oci<strong>de</strong>ntal no equilíbrio com o<br />

leste, com a crescente tensão da Guerra Fria a sobrevalorizar o papel <strong>de</strong> Portugal.<br />

A chegada <strong>de</strong> auxílio norte-americano à Ilha <strong>de</strong> S. Miguel, perante o ataque do porto <strong>de</strong> Ponta<br />

Delgada por um submarino alemão, na I Guerra Mundial, revelou aos Estados Unidos a importância das<br />

ilhas portuguesas para a <strong>de</strong>fesa daquela zona do Atlântico, tampão para o continente americano,<br />

iniciando-se assim um triângulo <strong>de</strong> relações, Inglaterra/EUA/Portugal, crucial para a política <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa<br />

oci<strong>de</strong>ntal que se reforçará com a criação da NATO. A II Guerra Mundial vem sobrevalorizar a<br />

importância geoestratégica dos Açores para os aliados. Apesar da neutralida<strong>de</strong> adoptada por Portugal,<br />

após <strong>de</strong>moradas negociações, Salazar acaba por ce<strong>de</strong>r as facilida<strong>de</strong>s dos Açores, nos acordos <strong>de</strong> 1943,<br />

197<br />

“Portugal 73 – Entrevista concedida por Mário Soares a Avelino Rodrigues”, Outubro <strong>de</strong> 1973, Arquivo Fundação Mário<br />

Soares, pasta 00517 001, imagens 185-198.<br />

198<br />

Mário Soares, Portugal […] cit., p. 85.<br />

199<br />

Mário Soares, discurso proferido na reunião do Comité Central do Movimento Fe<strong>de</strong>ralista Europeu, anexo numa Carta <strong>de</strong><br />

Massimo Malcovati, em nome da “Le Fe<strong>de</strong>ralista, revue <strong>de</strong> politique”, enviada a Mário Soares, Arquivo Fundação Mário Soares,<br />

pasta 02518 002, imagens 4-14.<br />

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