Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
dos partidos socialistas (…)”. 128 As suas aprendizagens europeias reflectem-se na consciência da<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> estabelecer um programa partidário “com rigor científico”, <strong>de</strong> fazer “recrutamento <strong>de</strong><br />
novos quadros” e <strong>de</strong> todos trabalharem “sujeitos a uma disciplina <strong>de</strong> partido.” 129<br />
É tempo <strong>de</strong> os socialistas assumirem responsabilida<strong>de</strong>s partidárias, “se querem, <strong>de</strong> facto,<br />
<strong>de</strong>sempenhar, na vida nacional, o papel relevante a que se julgam com direito.” 130 Uma justificação que<br />
<strong>de</strong>semboca na intenção <strong>de</strong> elaborar um “Programa Socialista”, encarado, no seu ponto <strong>de</strong> vista, “como<br />
um primeiro passo (ou contribuição) para a aprovação <strong>de</strong> um Programa Comum da Oposição<br />
Democrática, capaz <strong>de</strong> lhe conferir credibilida<strong>de</strong> nacional, e internacional, e <strong>de</strong> constituir uma<br />
verda<strong>de</strong>ira solução <strong>de</strong> alternativa para o fascismo caetanista.” 131 Esta <strong>de</strong>claração lança o olhar sobre<br />
Portugal e a Europa, revelando a consciência <strong>de</strong> que a sua estratégia interna <strong>de</strong> oposição teria <strong>de</strong> ter em<br />
linha <strong>de</strong> conta as repercussões europeias, o que implicaria uma <strong>de</strong>marcação do PCP.<br />
O Rapport Confi<strong>de</strong>ntial 132 - uma mensagem do Comité Directivo da ASP, datada <strong>de</strong> Janeiro <strong>de</strong><br />
1973, o que, a crer pela data mencionada no documento, foi enviada ainda antes da realização do III<br />
Congresso da Oposição Democrática em Aveiro - segue essa intenção, <strong>de</strong> construir uma reputação<br />
europeia centrada na preocupação <strong>de</strong> separar o PS das águas comunistas. 133 Fazer a <strong>de</strong>marcação do PCP<br />
seria uma acção fundamental ante a realização do III Congresso da Oposição Democrática <strong>de</strong> Aveiro,<br />
que, ao reunir todas as forças da oposição portuguesa, po<strong>de</strong>ria induzir uma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> aproximação aos<br />
comunistas. Ao longo <strong>de</strong> todo o documento enviado aos camaradas europeus, 134 é explicada a diferença<br />
entre as duas forças políticas, <strong>de</strong>talhando a proveniência dos socialistas portugueses que fundaram a<br />
ASP e contrariando a versão <strong>de</strong> Salazar, em como o PCP era a única força política da oposição. A ASP<br />
pretendia acabar com a cumplicida<strong>de</strong> oci<strong>de</strong>ntal ao Estado Novo, pois os seus congéneres europeus eram<br />
pontos <strong>de</strong> ampliação importantes da oposição socialista portuguesa, <strong>de</strong> modo a aumentar a pressão<br />
internacional sobre Marcelo Caetano.<br />
Soares actuava assim em duas frentes: na construção <strong>de</strong> uma reputação europeia e na<br />
clarificação i<strong>de</strong>ológica do partido, uma servindo a outra. É nesse sentido que faz aprovar, no Congresso<br />
<strong>de</strong> Maio <strong>de</strong> 1973, na Alemanha, a <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir Um Programa Socialista, com credibilida<strong>de</strong><br />
nacional e internacional, para se afirmar na aprovação <strong>de</strong> um Programa Comum da Oposição<br />
Democrática, i<strong>de</strong>ia que tinha saído do congresso <strong>de</strong> Aveiro. Se por um lado urgia dissipar confusões do<br />
PS com o PCP, por outro, era necessário mostrar à Europa que o Congresso <strong>de</strong> Aveiro podia ser o<br />
momento preparatório para o fim da ditadura. O Rapport Confi<strong>de</strong>ntiel serve esta estratégia dual,<br />
europeia e portuguesa.<br />
128<br />
Destruir o Sistema, Construir uma Nova Vida, Relatório do Secretário-geral do PS, lido, discutido e aprovado em Maio <strong>de</strong><br />
1973, Centro 25 <strong>de</strong> Abril, <strong>Universida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Coimbra</strong>, 329 (469), pp. 31,32.<br />
129<br />
Ibi<strong>de</strong>m.<br />
130<br />
Ibi<strong>de</strong>m, p. 33.<br />
131<br />
Ibi<strong>de</strong>m, p. 35.<br />
132<br />
Mário Soares (na qualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Secretário-geral), Ramos da Costa e Tito <strong>de</strong> Morais, “Rapport Confi<strong>de</strong>ntiel”, Comité Directivo<br />
da ASP, sobre o quadro político português em 1972, 9.01.1973, Arquivo Fundação Mário Soares, pasta 00517 001, imagens 23-<br />
31.<br />
133<br />
I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m.<br />
134<br />
Não é explícito que esta carta tenha sido enviada a camaradas europeus, contudo é <strong>de</strong>duzível pelo início do documento -<br />
“Cares Camara<strong>de</strong>s” -, pelo facto <strong>de</strong> ser redigida em francês e pelo próprio conteúdo.<br />
31