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Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />

EFTA). E se a Inglaterra, como parece, vier a associar-se ao Mercado Comum, mais uma razão para o<br />

nosso País se preparar rapidamente para viver a sua “hora europeia”. 84<br />

A década <strong>de</strong> 60 traz ao seu discurso o início do vislumbramento <strong>de</strong> um rumo mais concreto para<br />

Portugal, não sendo apresentadas apenas i<strong>de</strong>ias soltas e abstractas <strong>de</strong> oposição ao regime, mas em que já<br />

se <strong>de</strong>sbrava um caminho concreto. Com base na necessida<strong>de</strong> económica, Soares vai construindo um<br />

raciocínio causal que leva à lógica da integração <strong>de</strong> Portugal no Mercado Comum (MC). O padrão <strong>de</strong><br />

valores <strong>de</strong> referência europeu está presente, como uma bitola para Portugal.<br />

“Com efeito, sem uma reforma profunda das estruturas, das mentalida<strong>de</strong>s e dos hábitos, e sem uma larga<br />

preparação do país ao ritmo europeu, o que implica, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, a supressão do sistema corporativo, com o<br />

seu dirigismo económico e os múltiplos condicionalismos, a existência <strong>de</strong> sindicatos livres e o<br />

reconhecimento da livre iniciativa sem proteccionismos a certos monopólios (conseguidos à sombra do<br />

po<strong>de</strong>r político) como, sem isso, Portugal po<strong>de</strong>rá integrar-se, ou por qualquer forma associar-se aos países<br />

<strong>de</strong>mocráticos e <strong>de</strong> economia liberal que constituem o mercado comum?” 85<br />

A transformação do pós-guerra tornou a Europa numa referência não só em termos económicos,<br />

mas também i<strong>de</strong>ológicos. É uma “nova Europa”, à qual está subjacente a edificação <strong>de</strong> novos valores<br />

políticos, do socialismo <strong>de</strong>mocrático, e que “nada tem a ver com a Europa dos anos 30, <strong>de</strong> Hitler e <strong>de</strong><br />

Mussolini.” 86 Num abaixo-assinado dirigido ao Presi<strong>de</strong>nte da República, Soares combate o i<strong>de</strong>ário<br />

político salazarista e <strong>de</strong>marca-se do PCP, assumindo a existência <strong>de</strong> forças políticas na oposição,<br />

“perfeitamente i<strong>de</strong>ntificadas com as correntes da <strong>de</strong>mocracia europeia” 87 , tornando implícita a<br />

concepção futura <strong>de</strong> Portugal enquadrado nos valores da Europa. Assim vai germinando uma profunda<br />

contraposição i<strong>de</strong>ológica a Salazar, cuja “política ultra não só não tem futuro na Europa <strong>de</strong> hoje, como<br />

será verda<strong>de</strong>iramente <strong>de</strong>sastrosa para o <strong>de</strong>senvolvimento económico do País, conduzindo-o ao<br />

impasse.” 88<br />

Este enquadramento europeu <strong>de</strong> Portugal implicaria também o restabelecimento <strong>de</strong> relações<br />

diplomáticas oci<strong>de</strong>ntais. Partidário da auto-<strong>de</strong>terminação das colónias, <strong>de</strong>nuncia que tem sido a política<br />

colonialista portuguesa em boa parte responsável pelo isolamento do país. “Quem não sente quão<br />

nocivo é esse isolamento e que ele não po<strong>de</strong> durar in<strong>de</strong>finidamente?” 89 O isolacionismo do Estado<br />

Novo é uma questão <strong>de</strong> fundo na oposição <strong>de</strong> Soares. “Urge acabar com o isolamento ensimesmado em<br />

que nos confinamos e que tanto nos diminui aos olhos do estrangeiro,” o que só se contraria com o<br />

restabelecimento <strong>de</strong> “instituições verda<strong>de</strong>iramente <strong>de</strong>mocráticas (…).” 90 Na base da crítica à política<br />

externa <strong>de</strong> Salazar, que <strong>de</strong>ixa Portugal “<strong>de</strong> costas voltadas para a Europa” 91 , resi<strong>de</strong> a crença <strong>de</strong><br />

inevitabilida<strong>de</strong> do futuro do país passar pela política europeia, pois “não há outro caminho mais viável,<br />

84<br />

“Nos 40 Anos do Estado Novo – Um Projecto”, abaixo-assinado, dirigido ao Presi<strong>de</strong>nte da República, em 1966, redigido por<br />

Mário Soares, Arquivo Fundação Mário Soares, pasta 00002 00, imagens 71-97.<br />

85<br />

I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m.<br />

86<br />

I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m.<br />

87<br />

“Uma Entrevista que não foi publicada”, entrevista <strong>de</strong> Raul Rego a Mário Soares, 1968, Arquivo Fundação Mário Soares, pasta<br />

00003100, imagens 66-80.<br />

88 Ibi<strong>de</strong>m.<br />

89 Mário Soares, “Política Externa”, resposta ao inquérito promovido pela Capital, 14.10.1969, Arquivo Fundação Mário Soares,<br />

pasta 000032 00, imagens 51,52.<br />

90 I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m.<br />

91 “Nos 40 Anos <strong>de</strong> Estado Novo – Um Projecto”, abaixo-assinado, dirigido ao Presi<strong>de</strong>nte da República, em 1966, redigido por<br />

Mário Soares, Arquivo Fundação Mário Soares, pasta 00002 00, imagens 71-97.<br />

23

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