16.04.2013 Views

Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />

„socialismo totalitário‟, que, aliás, consi<strong>de</strong>ram não apresentar perigo para Portugal, na conjuntura<br />

presente.” 63 Com a intenção <strong>de</strong> pôr Marcelo Caetano à prova, o documento consolida a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />

organização <strong>de</strong> uma força opositora socialista, capaz <strong>de</strong> ombrear com a comunista. Cresce no futuro<br />

lí<strong>de</strong>r do PS a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> construir uma oposição capaz <strong>de</strong> angariar simpatias europeias. Ao<br />

“Manifesto à Nação”, segue-se o “Manifesto ao País”, revelando a perda <strong>de</strong> esperança num reformismo<br />

marcelista, com os portugueses a assistir a um “„salazarismo sem Salazar‟.” 64<br />

As eleições para a Assembleia Nacional, em 1969, são mais uma oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> afirmação da<br />

existência <strong>de</strong> uma oposição socialista. Apesar da intenção do II Congresso da Oposição Democrática,<br />

em Aveiro 65 , <strong>de</strong> constituir uma lista eleitoral única, as divergências imperaram, com as contestações<br />

comunistas à ASP e a Soares e este a querer <strong>de</strong>marcar-se do PCP. 66<br />

A ASP forma assim listas próprias, com a constituição da CEUD (Comissão Eleitoral <strong>de</strong><br />

Unida<strong>de</strong> Democrática), que concorre às eleições com a CDE (Comissão Democrática Eleitoral, <strong>de</strong><br />

influência comunista) e a CEM (Comissão Eleitoral Monárquica). A recusa dos socialistas em embarcar<br />

numa lista unitária, marca “a clara autonomia estratégica relativamente ao PCP”, concertando-se com<br />

uma intenção <strong>de</strong> chamar a atenção da Europa. “Conseguimos mobilizar a opinião <strong>de</strong> esquerda e centro-<br />

esquerda e po<strong>de</strong>mos contar com o apoio, pela primeira vez, explícito, da social-<strong>de</strong>mocracia europeia.” 67<br />

Soares dá, assim, seguimento à estratégia <strong>de</strong> propaganda europeia da força socialista da<br />

oposição portuguesa, o que será um trunfo para o futuro da ASP. No mês anterior às eleições <strong>de</strong><br />

Outubro, a IS <strong>de</strong>cidia, em Londres, formar uma comissão <strong>de</strong> observação da campanha eleitoral e das<br />

eleições em Portugal, pelo facto <strong>de</strong> “os socialistas, sob a li<strong>de</strong>rança <strong>de</strong> Mário Soares terem <strong>de</strong>cidido<br />

concorrer às eleições (…).” 68 A campanha europeia da oposição socialista já começava a dar frutos, ao<br />

ponto <strong>de</strong> o próprio Hans Janitschek, Secretário-<strong>Geral</strong> da IS (1969-1976) se <strong>de</strong>slocar ao país, integrado<br />

na comissão <strong>de</strong> observação das eleições, fazendo a sua terceira visita a Portugal. Contudo, a comitiva da<br />

IS é expulsa três dias <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter chegado a Lisboa, facto que contribuiu para a credibilização<br />

europeia da campanha dos socialistas portugueses contra o regime.<br />

Não obstante o <strong>de</strong>sastre eleitoral da CEUD 69 , a experiência permite uma clara constatação da<br />

i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Soares – a necessária campanha do socialismo português na Europa e a <strong>de</strong>marcação do PCP. A<br />

vinda do Secretário-<strong>Geral</strong> da IS havia <strong>de</strong>spontado o interesse pela ASP, quebrando o isolamento da<br />

oposição não comunista em Portugal e tornando-a conhecida na Europa. O trabalho <strong>de</strong> bastidores <strong>de</strong><br />

Soares e dos companheiros no exílio começava a dar frutos, pois, até então, eles eram praticamente<br />

<strong>de</strong>sconhecidos pela social-<strong>de</strong>mocracia europeia:<br />

63<br />

“À Nação” (Dezembro <strong>de</strong> 1968), in Mário Soares, Escritos Políticos, Editorial Inquérito, Quarta Edição, Lisboa, 1969, pp. 209-<br />

228.<br />

64<br />

“Ao País” (Maio <strong>de</strong> 1969), in I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m, pp. 229-242.<br />

65<br />

Manuel Braga da Cruz, Monárquicos e Republicanos no Estado Novo, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1986, pp.163-173.<br />

66<br />

“Os socialistas não estão dispostos a <strong>de</strong>ixarem-se comandar por um sector que se preten<strong>de</strong> hegemónico e que se serve <strong>de</strong><br />

elementos que não <strong>de</strong>claram a sua filiação partidária, para obter maiores fictícias e assim impor o seu predomínio." Carta <strong>de</strong><br />

Mário Soares a Armando Bacelar, publicada na revista Vida Mundial. Citado por Manuel Braga da Cruz Monárquicos e […] cit.,<br />

p.166.<br />

67<br />

In Maria João Avillez, Soares, Ditadura […] cit., p. 224.<br />

68<br />

Hans Janitschek, Mário Soares, Portrait of a Hero, George Wei<strong>de</strong>nfeld & Nicolson Limited, London, 1985, p. 9.<br />

69<br />

A CEUD consegue 5,8% dos votos, enquanto a Comissão Democrática Eleitoral 18,5%, a Comissão Eleitoral Monárquica<br />

0,8% e, obviamente, a União Nacional a maioria, com 75% dos votos. Ver Fernando Rosas; J. M. Brandão <strong>de</strong> Brito (coord),<br />

Dicionário <strong>de</strong> História <strong>de</strong> Portugal, Volume I, Venda Nova, Bertrand Editora, 1996, pp. 288-291.<br />

19

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!