Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
Republicana (RR), um grupo sem <strong>de</strong>finição política, com uma atitu<strong>de</strong> crítica às propostas do PCP e a<br />
visão <strong>de</strong> uma “necessida<strong>de</strong> imperiosa <strong>de</strong> re<strong>de</strong>finir uma esquerda, liberta <strong>de</strong> hipotecas paralisantes.” 41<br />
Com a intenção <strong>de</strong> criar uma frente comum <strong>de</strong> resistência ao regime, tal como apelam aos<br />
portugueses num comunicado lançado em 1957 42 , é evi<strong>de</strong>nte a emanação, neste grupo <strong>de</strong> caminheiros,<br />
dos valores republicanos. Num comunicado que assinala as comemorações do 5 <strong>de</strong> Outubro <strong>de</strong> 1910, a<br />
RR enaltece a “República Democrática”, consi<strong>de</strong>rando o 5 <strong>de</strong> Outubro como “a afirmação <strong>de</strong> resistência<br />
antifascista.” 43 Embora o socialismo <strong>de</strong>mocrático na Europa Oci<strong>de</strong>ntal já estivesse em ascensão, ainda<br />
não era manifesta em Soares uma opção doutrinária por essa corrente política, ultrapassando ainda “um<br />
fenómeno comum a todos os dissi<strong>de</strong>ntes,” com a i<strong>de</strong>ia “não <strong>de</strong> constituir um Partido Socialista mas <strong>de</strong><br />
contribuir para um comunismo <strong>de</strong> rosto humano.” 44<br />
A RR entra para o Directório Democrato-Social (DDS), graças à insistência <strong>de</strong> Soares perante os<br />
companheiros, que viam o grupo como “uma coisa <strong>de</strong> „velhos‟.” A sua estratégia era alargar a<br />
intervenção do DDS e da RR nas faixas <strong>de</strong> oposição não comunista, para competir com o PCP. Com a<br />
entrada para o DDS, “o „grupo‟ passou a ter influência” em “toda a ampla faixa da Oposição não<br />
comunista”, reforçando a oposição “em absoluto autónoma do unitarismo <strong>de</strong> inspiração comunista. Foi<br />
importante para o futuro.” 45 De tal modo que, será <strong>de</strong>sta base alargada da RR que nascerá a ASP –<br />
Acção Socialista Portuguesa - já uma repercussão evi<strong>de</strong>nte da social-<strong>de</strong>mocracia.<br />
Ao tornar-se num grupo fundamental <strong>de</strong> apoio à candidatura <strong>de</strong> Humberto Delgado, o DDS<br />
abraça a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> encetar relações com o exterior e o grupo <strong>de</strong> Soares constata a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>marcação da ala comunista para ganhar apoio internacional e credibilida<strong>de</strong> na oposição ao Estado<br />
Novo no estrangeiro. No clima <strong>de</strong> curiosida<strong>de</strong> externa em torno da candidatura <strong>de</strong> Delgado, o DDS<br />
convida Aneurin Bevan, do Partido Trabalhista Inglês, e o francês Mendès France, lí<strong>de</strong>res do socialismo<br />
europeu, para realizar uma conferência em Portugal. Tendo Bevan aceitado o convite e sido preparado<br />
todo o programa para a sua vinda, à última hora, quando o lí<strong>de</strong>r trabalhista inglês já tinha os bilhetes <strong>de</strong><br />
avião, Salazar não o <strong>de</strong>ixa entrar no país. 46<br />
É com a progressiva sedução pelo socialismo <strong>de</strong>mocrático e com o contacto com o estilo <strong>de</strong> vida<br />
europeia, que Mário Soares se vai <strong>de</strong>smembrando do comunismo. A isto não é alheio um certo fascínio<br />
pessoal pelo estilo <strong>de</strong> vida europeu, com o qual tomava contacto durante os anos 50, com viagens a<br />
Espanha, França, Itália e Bélgica. 47<br />
A RR e o DDS conciliaram velhas e novas aspirações socialistas, com esperança renovada pela<br />
candidatura <strong>de</strong> Delgado, que podiam importar o ímpeto <strong>de</strong> reformismo socialista europeu e implantá-lo<br />
41 Mário Soares, Portugal […] cit., p. 195.<br />
42 “Aos Portugueses Patriotas”, comunicado assinado por um Grupo <strong>de</strong> Patriotas, 1957, Arquivo Fundação Mário Soares, pasta<br />
0005 001, imagens 72-77.<br />
43 “Cinco <strong>de</strong> Outubro <strong>de</strong> 1910. Cinco <strong>de</strong> Outubro <strong>de</strong> 1956”, comunicado da Resistência Republicana, 1956, Arquivo Fundação<br />
Mário Soares, pasta 2243 009, imagem 27.<br />
44 “Conservadores e Neoliberais não têm Soluções para o Futuro”, entrevista <strong>de</strong> Mário Mesquita a Mário Soares, Diário <strong>de</strong><br />
Notícias, 19.04.1993, in Mário Soares, Intervenções 8, Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1994, p. 513-538.<br />
45 In Maria João Avillez, Soares, Ditadura […] cit., p. 117.<br />
46 Mário Soares, Portugal […] cit., p. 258.<br />
47 “Sentia-me frustrado e algo invejoso dos países da Europa Oci<strong>de</strong>ntal. Lia os jornais franceses e seguia a actualida<strong>de</strong><br />
internacional através <strong>de</strong>les, como se vivesse por procuração.” In Maria João Avillez, Soares, Ditadura […] cit., p. 133.<br />
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