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Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />

essencial o início do <strong>de</strong>smembrar <strong>de</strong>sse sistema, em que se pressupunha o apaziguamento das relações<br />

Este/Oeste, dando aos lí<strong>de</strong>res europeus e norte-americanos um po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> reivindicação importante<br />

perante a URSS, na negociação dos Acordos <strong>de</strong> Helsínquia.<br />

Se na europeização que Soares iniciou nas mentalida<strong>de</strong>s portuguesas po<strong>de</strong> ficar subjacente uma<br />

perda do fascínio histórico pelo mar, isso não é verda<strong>de</strong>. Antes pelo contrário. A opção europeia <strong>de</strong><br />

Soares significou, antes, uma rendição e aprofundamento da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> marítima do país e da sua<br />

história. O posicionamento político <strong>de</strong> Soares pela a<strong>de</strong>são <strong>de</strong> Portugal à CEE leva-nos a inferir que o<br />

fascínio histórico pelo mar - que <strong>de</strong>spertou a curiosida<strong>de</strong> pelo <strong>de</strong>sconhecido e a ânsia dos marinheiros<br />

que fizeram os Descobrimentos Portugueses - continua presente no pensamento português, ao<br />

enten<strong>de</strong>rmos a a<strong>de</strong>são à Europa como uma forma <strong>de</strong> Lisboa potenciar a sua condição marítima. Mais.<br />

De dotar a própria política comunitária <strong>de</strong>sse fascínio luso pelo mar, para que a UE possa exercer um<br />

papel que extravase as suas fronteiras. Congregando as suas potencialida<strong>de</strong>s civilizacionais, políticas e<br />

geográficas, Portugal e a Europa po<strong>de</strong>m fundir os seus <strong>de</strong>sígnios para marcar uma forma <strong>de</strong> estar<br />

singular, que contribua para o equilíbrio, a justiça e paz mundiais. Em última instância, po<strong>de</strong>mos ler, no<br />

pensamento <strong>de</strong> Soares, uma simbiose entre as duas i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s, europeia e portuguesa, que terão um<br />

papel moral superior a <strong>de</strong>sempenhar no mundo.<br />

Assim, <strong>de</strong>preen<strong>de</strong>mos do discurso político <strong>de</strong> Soares não só o resultado <strong>de</strong> uma influência<br />

profunda da história e do pensamento filosófico e literário português e europeu, como também a<br />

expressão <strong>de</strong> um certo i<strong>de</strong>alismo e misticismo lusos. O pensamento <strong>de</strong> Soares herda das letras um certo<br />

romantismo ao conceber chegar-se a um i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> justiça e moralida<strong>de</strong> entre os povos através da<br />

perfusão dos valores europeus e portugueses. Por outro lado, ao acreditar na Europa como agente <strong>de</strong><br />

salvação nacional, indutora <strong>de</strong> mudança ao país, Soares transporta no seu pensamento uma certa crença<br />

mítica portuguesa, <strong>de</strong> que a melhoria far-se-á por um agente vindouro <strong>de</strong> fora. Contudo, a concretização<br />

<strong>de</strong>ste espírito mítico, encerra em si um “anti-mito”, pois ele não crê em qualquer força superior<br />

inexplicável, em qualquer acção sebastiânica, mas sim na atitu<strong>de</strong> racional do homem, enquanto político<br />

e cidadão, para levar Portugal e a Europa ao exercício exemplar <strong>de</strong> valores civilizacionais, <strong>de</strong> uma<br />

política humanista e universalista – portanto, ao estatuto <strong>de</strong> heróis míticos. A Europa enquanto mito, no<br />

pensamento soarista, é-o apenas enquanto elevação <strong>de</strong> valores, assumindo o papel <strong>de</strong> quadro i<strong>de</strong>al, <strong>de</strong><br />

imagem guia, fim impulsionador da acção e razão humanas. Mas esse fim, esse i<strong>de</strong>al, não é conseguido<br />

através <strong>de</strong> qualquer força mística. Apenas através do homem, do político e do cidadão. Essa tem sido a<br />

essência da luta <strong>de</strong> Soares.<br />

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