Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
A Europa representou um meio para a estratégia política <strong>de</strong> Soares, sob várias formas. Em<br />
primeiro lugar, ela foi uma formadora. Foram as leituras do Nouvelle Observateur que o <strong>de</strong>spertaram,<br />
após a quebra com o PCP, para a existência <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ologia política na Europa Oci<strong>de</strong>ntal, que lhe<br />
oferecia uma alternativa <strong>de</strong> pensamento às duas vias dominantes que até então conhecia. Foi durante o<br />
exílio que consolidou a sua opção pela social-<strong>de</strong>mocracia, continuando aí, através da presença em<br />
eventos políticos, <strong>de</strong> contactos com lí<strong>de</strong>res europeus e do acesso mais fácil à leitura, a sua formação<br />
político-i<strong>de</strong>ológica. Foi também no exílio que apren<strong>de</strong>u a ser um “político à europeia”, ao frequentar os<br />
congressos da IS e dos seus partidos, ao observar como funcionava a máquina partidária numa<br />
<strong>de</strong>mocracia - que lhe <strong>de</strong>u a perceber a importância dos meios <strong>de</strong> comunicação social para a prossecução<br />
<strong>de</strong> objectivos políticos -, e ao assistir a encontros do MFE e do Movimento Europeu, que lhe abriram<br />
perspectivas críticas sobre o futuro da CEE. De uma forma geral, toda a sua vivência europeia permitiu-<br />
lhe uma formação i<strong>de</strong>ológica e político-partidária, sem a qual a sua acção e pensamento não teriam sido<br />
os mesmos e influenciado da mesma forma o futuro <strong>de</strong> Portugal.<br />
Além <strong>de</strong> formadora, no seu relacionamento com a Europa, ela assume ainda a vertente <strong>de</strong> meio<br />
político coadjuvante para a queda do Estado Novo e a <strong>de</strong>mocratização <strong>de</strong> Portugal. O público e,<br />
principalmente, os lí<strong>de</strong>res políticos europeus eram os <strong>de</strong>stinatários, por excelência, da crítica <strong>de</strong> Soares<br />
ao regime ditatorial e da veiculação da i<strong>de</strong>ia para o futuro do seu país. Projectando o seu pensamento<br />
(politicamente coinci<strong>de</strong>nte e favorável ao sistema Oci<strong>de</strong>ntal), Soares credibilizava-se, ganhando assim a<br />
confiança e ajuda política europeia que o acompanhará no futuro, como se verificou durante o PREC.<br />
Ou seja, além <strong>de</strong> um meio <strong>de</strong> formação pessoal, a Europa foi ainda um meio <strong>de</strong> ampliar a força da<br />
oposição política <strong>de</strong> Soares à ditadura portuguesa e <strong>de</strong> ajudar o PS, e toda a ala mo<strong>de</strong>rada em Portugal,<br />
contra a acção da extrema-esquerda após a Revolução. Concluímos, então, que sendo formadora e<br />
veículo <strong>de</strong> ampliação e credibilização da oposição <strong>de</strong> Soares, a Europa foi um meio para Soares atingir<br />
o seu objectivo – <strong>de</strong>mocratizar Portugal e integrá-lo na CEE.<br />
Logo, a Europa foi o meio <strong>de</strong> chegar à Europa e assim se justifica que <strong>de</strong>fendamos que ela foi,<br />
simultaneamente, um meio e um fim para Soares. É na vertente <strong>de</strong> ter sido uma meta, que posicionamos<br />
o relacionamento <strong>de</strong> Soares com a Europa a um nível i<strong>de</strong>ológico – que passa pela aceitação e<br />
incorporação do mo<strong>de</strong>lo sociopolítico europeu para o futuro <strong>de</strong> Portugal e do mundo até, sendo que<br />
todo o seu pensamento sobre Pátria e sobre o próprio futuro da UE passam a estar fundados em valores<br />
civilizacionais do velho continente e na génese da i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Europa unida.<br />
Neste sentido, po<strong>de</strong>mos dizer que, i<strong>de</strong>ologicamente, Mário Soares não cria nada, não inventa<br />
qualquer novo mo<strong>de</strong>lo político e qualquer solução nova para os problemas da Europa e do mundo. Ele<br />
inova sim, em Portugal, com a atitu<strong>de</strong> e o discurso político, assumindo-se como o paladino da Europa<br />
para o futuro do país. Inaugura um discurso e um posicionamento português relativamente à CEE que<br />
será aceite e incorporado pelas estruturas sociais, económicas e políticas do país e que não mudou até<br />
hoje. É o seu discurso - que já na década <strong>de</strong> 60 estava na vanguarda das i<strong>de</strong>ias veiculadas em Portugal,<br />
ao preconizar uma Europa forte e unida para se assumir como alternativa à manutenção da paz pelo<br />
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