16.04.2013 Views

Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />

construir. Como europeus conscientes e responsáveis não po<strong>de</strong>remos falhar esse <strong>de</strong>safio prioritário que<br />

a história nos lança.” 647<br />

É na assumpção <strong>de</strong>ste quadro valorativo que Soares abre uma clivagem i<strong>de</strong>ológica entre a<br />

Europa e América, tecendo um discurso bastante crítico relativamente à política norte-americana. As<br />

suas permanentes <strong>de</strong>preciações da actuação internacional <strong>de</strong> Washington, na era Bush, do seu domínio<br />

unilateral, são realizadas à luz <strong>de</strong> um conceito <strong>de</strong> valores, nos quais a balança ética e humanista é<br />

<strong>de</strong>sfavorável aos EUA. Ao apresentar uma UE como potencial contra ponto a Washington, com uma<br />

bagagem ética essencial à paz, Soares oferece-nos a imagem <strong>de</strong> uma Europa superior, exemplar e<br />

libertadora do resto do mundo. A dicotomia nós versus eles alimenta a atribuição <strong>de</strong> um <strong>de</strong>stino quase<br />

messiânico à Europa, um exemplo para o resto do mundo, inserindo assim a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Europa entre o<br />

limiar realista e mítico.<br />

É uma Europa messiânica para o mundo e, concretamente, para Portugal. Começou a sê-lo<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> que Soares se inicia nos trilhos i<strong>de</strong>ológicos da social-<strong>de</strong>mocracia europeia, sendo que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> aí, a<br />

Europa configura a esperança para o Portugal oprimido por Salazar. A esperança económica, a política<br />

e a referência cultural. A Europa assume-se não somente como um quadro valorativo superior,<br />

referência <strong>de</strong> futuro para Portugal, como também, a que tem o po<strong>de</strong>r <strong>de</strong> intervir politicamente e ajudar o<br />

povo português na libertação do salazarismo. Essa Europa, tanto se esboça no pensamento <strong>de</strong> Soares<br />

como a salvadora <strong>de</strong> Portugal, como um Messias libertador, como para o próprio Soares ela é a sua<br />

esperança política, a sua bengala <strong>de</strong> acção, como se constata na primeira e segunda parte <strong>de</strong>ste trabalho.<br />

E mesmo após o fim da ditadura e a consolidação da <strong>de</strong>mocracia em Portugal, a Europa<br />

continua a ser o veículo e o horizonte da afirmação portuguesa. É estando na e com a UE que se<br />

alimenta a profecia do “Quinto Império” <strong>de</strong> Pessoa. Contra as retóricas anti-europeias, agoirando uma<br />

consequente perda da soberania portuguesa, Soares faz a clara distinção entre soberania, i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e<br />

in<strong>de</strong>pendência. A i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do povo português não se esbate, pois continua ligada à sua história, língua<br />

e cultura, assim como a sua in<strong>de</strong>pendência: “somos um Estado nação, sem divisões regionais, falando<br />

todos a mesma língua. Não per<strong>de</strong>mos a nossa in<strong>de</strong>pendência por estarmos integrados num todo mais<br />

vasto que se chama União Europeia”, com a qual “ganhamos mais prestígio e influência no<br />

mundo.” 648 Para Portugal, a Europa continua associada à i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> condutora para o prestígio, para a<br />

prática <strong>de</strong> valores positivos, para o sobredimensionamento do país. A Europa salvadora e heroína, tal<br />

como é para o resto do mundo.<br />

647 Mário Soares, “Os Diálogos Renascentes”, discurso proferido na cerimónia <strong>de</strong> atribuição da Medalha <strong>de</strong> reconhecimento<br />

Académico, pelos Studi di Firenze, em Florença, 8.04.1991, in Mário Soares, Intervenções 6 […] cit., p.168.<br />

648 I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m, p. 150.<br />

143

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!