Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
Descortinamos isso através da sua i<strong>de</strong>ologia, mas também pela sua alusão directa ao “papel dos pais<br />
fundadores, Churchill, De Gaspari, Jean Monnet, A<strong>de</strong>nauer” e <strong>de</strong> “Jacques Delors”, que “está ao nível<br />
<strong>de</strong>les.” 643 É nestas referências que encontra o apoio para as suas propostas para o futuro da UE,<br />
credibilizando a sua i<strong>de</strong>ia com uma cumplicida<strong>de</strong> histórica, uma partilha <strong>de</strong> valores com nomes<br />
sonantes da política europeia. “Sou favorável à política e à acção <strong>de</strong> Jacques Delors, como tenho dito<br />
várias vezes. Como meta a atingir num futuro ainda distante, sou a favor dos Estados Unidos da<br />
Europa.” 644<br />
Não só <strong>de</strong>notando a sua influência, este discurso revela também o propósito <strong>de</strong> mostrar<br />
referências políticas, nesse intento pedagógico sobre a Europa. Neste sentido, o seu discurso encerra<br />
não só uma intencionalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> persuasão sobre a sua i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Europa do futuro, mas, essencialmente,<br />
com a constante referência a nomes da história comunitária, uma certa lição <strong>de</strong> história, formadora da<br />
opinião pública. Tais referências são ainda uma espécie <strong>de</strong> refúgio, quando este ímpeto pedagogo e<br />
sonhador é invadido por uma visão crítica da realida<strong>de</strong> política sua contemporânea. “Sente-se que no<br />
nosso tempo, tão cinzento e opaco, que assistiu ao implacável <strong>de</strong>sabar <strong>de</strong> tantas ilusões, que faz falta, na<br />
Europa, um „suplemento <strong>de</strong> alma‟, como se lhe tem chamado, um novo e gran<strong>de</strong> ímpeto renovador,<br />
servido por políticos <strong>de</strong> outro fôlego e <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> i<strong>de</strong>alismo moral, com o sentido dos valores, do <strong>de</strong>ver e<br />
das virtu<strong>de</strong>s cívicas, capazes <strong>de</strong> abraçar causas nobres (…)” 645 Mas esta atitu<strong>de</strong> é também uma<br />
evidência <strong>de</strong> um certo saudosismo <strong>de</strong> um espírito político europeu, também <strong>de</strong> uma convivência e<br />
aprendizagem com figuras como Willy Brandt, Olof Palme, François Miterrand e Helmut Kohl, suas<br />
eternas referências políticas.<br />
2.5 - Uma Europa quase messiânica e uma elite <strong>de</strong> valores<br />
Como vimos, neste último capítulo, Soares tem um projecto ambicioso para o futuro da Europa,<br />
reservando à União não apenas um papel interno, como também externo, <strong>de</strong> um pólo pulverizador <strong>de</strong><br />
uma cultura humanista e um centro político crucial para o equilíbrio do mundo. Ao conferir este papel à<br />
Europa, Soares atribui-lhe uma conotação <strong>de</strong> salvadora. “Todos os Povos e Estados da Terra sentem e<br />
compreen<strong>de</strong>m hoje, mais do que nunca, que a União Europeia, como potência internacional, faz falta ao<br />
Mundo. Para a afirmação e reestruturação das Nações Unidas, como é vital que aconteça, para a <strong>de</strong>fesa<br />
da paz e dos mais pobres e <strong>de</strong>sfavorecidos da Terra.” 646 É incorporando e praticando os valores<br />
civilizacionais europeus, que a UE faz jus à sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. “Um humanismo eis o que <strong>de</strong>veremos<br />
643 Mário Soares, “Democracia e Cidadania”, intervenção feita <strong>de</strong> improviso em 28.05.1992, no colóquio organizado pela Civistas,<br />
sobre o „Futuro dos Cidadãos”, in Mário Soares, Intervenções 8 […] cit., p. 301.<br />
644 Entrevista concedida por Mário Soares a Maria João Avillez, em 26.07.1989, in Mário Soares, Intervenções 4 […] cit., p. 526.<br />
A i<strong>de</strong>ia repete-se noutra <strong>de</strong>claração: “Sou partidário <strong>de</strong> uma Europa política, dos Estados Unidos da Europa, <strong>de</strong> uma Europa dos<br />
cidadãos, das tecnologias, do audiovisual. Penso que é necessário <strong>de</strong>senvolver a Comunida<strong>de</strong>, a nossa Comunida<strong>de</strong>, no<br />
espírito <strong>de</strong>sejado por Sr. Delors e pelos homens que são a favor <strong>de</strong> uma progressão da Europa na fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> das i<strong>de</strong>ias dos seus<br />
fundadores.” “Não acredito no <strong>de</strong>clínio da Europa”, entrevista concedida por Mário Soares ao Sud-Ouest, em 26.05.1989, in<br />
Mário Soares, Intervenções 4 […] cit., p. 428.<br />
645 Mário Soares, pref. Intervenções 9 […] cit., p. 17.<br />
646 Mário Soares, Porto Alegre e Nova Iorque […] cit., pp. 74,75.<br />
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