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Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />

apadrinhamento à ditadura portuguesa, cuja permanência era mais favorável ao Oci<strong>de</strong>nte do que a<br />

possível eclosão <strong>de</strong> instabilida<strong>de</strong> política, que podia revelar-se oportuna ao leste comunista. Além disso,<br />

os Açores já tinham revelado aos EUA a sua importância geoestratégica, sendo necessário manter<br />

Portugal como um aliado do Oci<strong>de</strong>nte.<br />

Contudo, apesar dos dissabores com o PCP, as manifestações políticas <strong>de</strong> Soares iam-se<br />

mantendo fiéis à linha partidária comunista. Quando discursou, em 1951, no Centro Republicano<br />

António José <strong>de</strong> Almeida, em Lisboa, Soares “criticava o Pacto do Atlântico, como um instrumento<br />

bélico, e sugeria, sem hesitações, que o campo da paz e da <strong>de</strong>mocracia se situava no bloco leste.”<br />

Reconhece, mais tar<strong>de</strong>, “que era um discurso maniqueísta, segundo o esquema da época, sem<br />

ambiguida<strong>de</strong>s nem nuances.” 26 Era o reflexo do <strong>de</strong>sfecho da II Guerra Mundial, <strong>de</strong> uma intelectualida<strong>de</strong><br />

académica dominada pelo marxismo, em que o mo<strong>de</strong>lo político soviético se apresentava como a<br />

alternativa mais credível face ao salazarismo e ao emergente imperialismo capitalista norte-americano.<br />

Este clima internacional, em conjunto com a posição dominante do PCP na oposição<br />

portuguesa, propiciou a manutenção <strong>de</strong> Soares durante vários anos, do lado comunista. A social-<br />

<strong>de</strong>mocracia que se <strong>de</strong>senhava na Europa Oci<strong>de</strong>ntal, e cuja “importação” i<strong>de</strong>ológica para Portugal se<br />

po<strong>de</strong> atribuir a Mário Soares, Ramos da Costa e Tito <strong>de</strong> Morais, era, na altura, por ele ignorada. De<br />

modo que, era da alternativa marxista e da organização partidária do PCP que advinha a sua luta contra<br />

a ditadura. 27<br />

É importante frisar que nunca, nesta fase <strong>de</strong> ligação ao PCP, Mário Soares teorizou uma i<strong>de</strong>ia<br />

para Portugal, o que é indiciador <strong>de</strong> que o comunismo não se havia incorporado como i<strong>de</strong>ologia<br />

estruturante do seu pensamento, como vem a ser, mais tar<strong>de</strong>, o socialismo <strong>de</strong>mocrático. A permanência<br />

no PCP não era apenas “a assunção <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ologia”, mas era, essencialmente, a admiração pelo<br />

“valor moral do sacrifício <strong>de</strong> posições <strong>de</strong> privilégio, <strong>de</strong> um certo conforto e facilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> vida”, tendo-<br />

lhe incutido a conduta da “solidarieda<strong>de</strong>”, da “disciplina e empenhamento em favor <strong>de</strong> uma maior<br />

justiça social.” 28 Soares nunca terá chegado a assumir o comunismo como a i<strong>de</strong>ologia base <strong>de</strong> uma<br />

solução para o futuro <strong>de</strong> Portugal, como indiciam as manifestações oposicionistas da sua militância<br />

comunista, que foram mais na or<strong>de</strong>m prática do que teórica. A atracção pelo PCP era ditada pela sua<br />

vertente organizacional e motivadora - “havia qualquer coisa <strong>de</strong> novo na metodologia comunista que<br />

me tocava profundamente e que não encontrara em nenhum outro lado: o apelo à acção!” 29<br />

Em Portugal, o combate visível à ditadura era garantido pelo PCP, que li<strong>de</strong>rava a oposição a<br />

Salazar, sendo a única estrutura verda<strong>de</strong>iramente organizada como partido, com uma estratégia política,<br />

que se disseminava pelos vários sectores da socieda<strong>de</strong> portuguesa. Embora dúvidas constantes lhe<br />

atravancassem uma verda<strong>de</strong>ira entrega i<strong>de</strong>ológica ao comunismo, a necessida<strong>de</strong> pragmática <strong>de</strong> oposição<br />

26 Mário Soares, Portugal Amordaçado […] cit., p. 183.<br />

27 “O PC foi para mim a assunção <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ologia, <strong>de</strong> um sistema coerente <strong>de</strong> explicações do mundo e das relações sociais,<br />

entre os meus 17 e 25 anos.” In Maria João Avillez, Soares, Ditadura […] cit., p. 99.<br />

28 I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m.<br />

29 Mário Soares, Portugal Amordaçado […] cit., p. 29. A falta <strong>de</strong> alternativa oposicionista impelia os jovens para o PCP: “Na<br />

<strong>Universida<strong>de</strong></strong>, nessa altura, a única presença oposicionista organizada era a das juventu<strong>de</strong>s comunistas. Aí encontrava-se a<br />

oferta <strong>de</strong> um caminho. Discutível, nas suas múltiplas implicações, mas um caminho!” I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m.<br />

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