Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
frente.” 613 Por acréscimo, lamenta o chumbo ao Tratado, pelo recuo que isso significa para os seus<br />
i<strong>de</strong>ais, consi<strong>de</strong>rando voltar-se “ao Tratado <strong>de</strong> Nice, que todos reconhecem ser um mau tratado.” 614 A<br />
Europa acaba por voltar ao impasse, com a rectificação do primeiro Tratado Constitucional, fruto dos<br />
vetos holandês e francês, para aprovar o Tratado <strong>de</strong> Lisboa.<br />
Só a união política garante a plena <strong>de</strong>mocracia do projecto europeu e a sua evolução <strong>de</strong> acordo<br />
com os objectivos dos fundadores. A solidarieda<strong>de</strong> e a igualda<strong>de</strong>, só estarão asseguradas com uma<br />
unida<strong>de</strong> política. É por isso que uma reforma institucional é necessária para conferir a tal dimensão<br />
política à Comunida<strong>de</strong>, sendo do particular interesse dos países pequenos. “(…) A União Política é<br />
sobretudo importante para os pequenos países, muito mais do que para os gran<strong>de</strong>s, que se contentariam<br />
bem com a União Económica e Monetária (…).” 615 Uma Europa Política libertaria os países pequenos<br />
dos interesses nacionalistas dos gran<strong>de</strong>s, oferecendo maiores garantias <strong>de</strong> participação <strong>de</strong>mocrática,<br />
indo ao encontro do interesse dos cidadãos, que terão assim a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma participação nos<br />
processos <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão europeia e uma maior fruição dos mesmos.<br />
Esta é a essência da génese <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> europeia, em que o carácter humanista e <strong>de</strong>mocrático<br />
europeu emana dos cidadãos e os serve. A essência do pensamento soarista sobre o futuro da UE.<br />
“Europeísta convicto, sempre <strong>de</strong>fendi que temos <strong>de</strong> caminhar resolutamente no sentido da União<br />
Europeia, dotando a Comunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> instituições políticas eficazes, revigoradas pelo controlo<br />
<strong>de</strong>mocrático e pela participação dos cidadãos.” 616 Na base da sua assumpção como europeísta, está uma<br />
profunda inspiração histórica, que vai ao encontro da génese política da Comunida<strong>de</strong> Europeia: “É<br />
imperioso construir uma espécie <strong>de</strong> Estados Unidos da Europa. Só <strong>de</strong>ssa forma, centenas <strong>de</strong> milhões <strong>de</strong><br />
trabalhadores po<strong>de</strong>rão recuperar as alegrias e esperanças simples que dão sentido à vida.” 617<br />
As prenunciações <strong>de</strong> necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> unida<strong>de</strong> política, logo lançadas por Churchill no pós-<br />
guerra, repercutem-se na Declaração <strong>de</strong> Schuman, a prever já que a CECA lance “os alicerces <strong>de</strong> uma<br />
Fe<strong>de</strong>ração Europeia, indispensável à preservação da paz.” 618 E como constatamos, o espírito fundador<br />
da CEE permanece assim em Soares. A evolução fe<strong>de</strong>rativa será natural, fruto da aspiração dos<br />
cidadãos e da sua própria consciência <strong>de</strong> que uma Europa humanista e solidária só po<strong>de</strong> ser conseguida<br />
através da unida<strong>de</strong> política. “Quer dizer, uma Europa com uma finalida<strong>de</strong> fe<strong>de</strong>ralista (não há que fugir à<br />
palavra nem ter medo <strong>de</strong>la), quer dizer uma Europa com instituições europeias, quer dizer uma Europa<br />
política, com a participação e o controlo dos cidadãos através <strong>de</strong> organismos e meios <strong>de</strong> intervenção<br />
efectivos.” 619 E <strong>de</strong> facto, a partir <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>terminada fase da sua carreira, Soares não foge à palavra.<br />
613 In Mário Soares, Sérgio Sousa Pinto, cit., p.165.<br />
614 Mário Soares, “O Imbróglio Europeu”, La Vanguardia, 12.06.2005, http://www.fundacao-mariosoares.pt/mario_soares/textos_ms/002/39.pdf<br />
, acedido em 17.09.2010.<br />
615 Mário Soares, “Portugal, Horizonte Ano 2000”, discurso proferido em Lisboa, em 5.12.1990, no ciclo <strong>de</strong> conferências<br />
organizadas pelo semanário O Jornal, in Mário Soares, Intervenções 5 […] cit., pp. 51,52.<br />
616 Mário Soares, “Amor da Pátria e do Povo”, discurso proferido em 10.06.1993, em Sintra, na sessão solene comemorativa do<br />
Dia <strong>de</strong> Portugal, <strong>de</strong> Camões e das Comunida<strong>de</strong>s, in Mário Soares, Intervenções 8 […] cit., p. 55.<br />
617 Discurso <strong>de</strong> Winston Churcill, pronunciado em Zurique, a 19.09.1946, in 50 Anos <strong>de</strong> Europa […] cit., p. 15.<br />
618 “Declaração Schuman”, feita em Paris por Robert Schuman, em 9.05.1950, in 50 Anos <strong>de</strong> Europa […] cit., p. 24.<br />
619 Entrevista concedida por Mário Soares, ao jornal Público, em 28.03.1993, in Mário Soares, Intervenções 7 […] cit., p. 306;<br />
“Sou favorável à unida<strong>de</strong> política europeia. A um Parlamento Europeu com mais po<strong>de</strong>res e, porventura, até a um governo<br />
europeu, que relance o processo <strong>de</strong> construção <strong>de</strong> uma fe<strong>de</strong>ração europeia.” Entrevista concedida por Mário Soares, ao Público,<br />
em 9.03.1990, in Mário Soares, Intervenções 5 […] cit., p. 353.<br />
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