Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
espaço aberto, <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocracia, liberda<strong>de</strong> e solidarieda<strong>de</strong>, como uma Comunida<strong>de</strong> não eurocêntrica, pois<br />
“não po<strong>de</strong> haver uma União estável cortada da outra Europa.” 539<br />
O fim do império soviético leva a uma reflexão sobre a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> construção europeia e a que<br />
“consi<strong>de</strong>remos que os limites iniciais do projecto foram ultrapassados.” 540 Foram ultrapassados pela<br />
necessida<strong>de</strong> do momento histórico e pelo chamamento da Comunida<strong>de</strong> exercer o seu propósito <strong>de</strong><br />
contribuir para a estabilida<strong>de</strong> europeia. “Seria um grave erro não correspon<strong>de</strong>r positivamente” às<br />
aspirações dos países da Europa Central e Oriental, “<strong>de</strong> plena integração na Europa <strong>de</strong> que sempre,<br />
aliás, fizeram parte, tanto no plano geográfico, como nos domínios histórico, político e cultural.” 541 Mas<br />
não só <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> histórica se trata. O fechamento da Comunida<strong>de</strong> à “outra Europa” seria uma<br />
contradição à própria essência comunitária, porque se trata <strong>de</strong> uma oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> contribuir para um<br />
novo equilíbrio geopolítico do mundo e <strong>de</strong> iniciar uma época <strong>de</strong> apaziguamento, sendo para isso<br />
indispensável alargar a sua influência. “Só assim a Europa po<strong>de</strong>rá exercer o papel que lhe cabe no<br />
presente contexto mundial <strong>de</strong> reajustamentos político-militares (…).” 542<br />
A abertura das suas fronteiras a Leste vai ao encontro da mesma razão – manutenção da paz -<br />
que levou à criação da CECA e da sua evolução para CEE. Com a fi<strong>de</strong>lida<strong>de</strong> aos seus valores<br />
primordiais, a Europa como exemplo e promotora <strong>de</strong> união é assim chamada a respon<strong>de</strong>r às<br />
contingências históricas. “O alargamento, a Norte e a Leste, é <strong>de</strong>sejável e <strong>de</strong> certa forma inevitável,<br />
consi<strong>de</strong>rando a própria natureza e vocação da União Europeia.” 543 Trata-se aqui <strong>de</strong> acompanhar a<br />
evolução histórica. A Europa que foi arquitectada no fim da II Guerra Mundial, impulsionada pelo<br />
interesse oci<strong>de</strong>ntal em congregar uma força política estanque ao comunismo, que garantisse o<br />
contrabalanço político e económico das forças da Guerra Fria já não tem sentido. Com o<br />
<strong>de</strong>smoronamento <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong> equilíbrio político mundial bipolar, a Europa tem <strong>de</strong> se enquadrar no<br />
novo contexto, sendo a protagonista do esboço <strong>de</strong> um novo mapa político mundial, assumindo aí a sua<br />
importância.<br />
Contudo, embora Soares seja um fervoroso <strong>de</strong>fensor da extensão das fronteiras da Comunida<strong>de</strong><br />
a Leste, adverte que a Europa não po<strong>de</strong> agora ficar refém <strong>de</strong>ssa iniciativa para a continuida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
relacionamento com outros países. “Seria irónico e inaceitável, na verda<strong>de</strong>, que o apoio à <strong>de</strong>mocracia<br />
do Leste viesse a fazer-se em <strong>de</strong>trimento do próprio i<strong>de</strong>al europeu e à custa dos países do Sul da Europa<br />
539 Mário Soares, “Um Olhar pelo Mundo”, conferência proferida <strong>de</strong> improviso no Colóquio do Instituto <strong>de</strong> <strong>Estudo</strong>s Estratégicos e<br />
Internacionais, a 25.05.1992, no Grémio Literário em Lisboa, in Mário Soares, Intervenções 8 […] cit., pp. 271, 272.<br />
540 Mário Soares, “A Europa dos Anos 90”, conferência realizada em 9.02.1990, no colóquio comemorativo dos 3 anos do<br />
Semanário Económico, in Mário Soares, Intervenções 5 […] cit., p. 210.<br />
541 Mário Soares, “Uma visão ambiciosa da Europa”, texto escrito em Julho <strong>de</strong> 1994, para uma antologia norueguesa sobre a<br />
União Europeia, in Mário Soares, Intervenções 9 […] cit., p. 212. São várias as manifestações <strong>de</strong> Soares sobre esta i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong><br />
cumprimento da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> europeia, como também é exemplo esta citação: “O acordo <strong>de</strong> associação entre a União Europeia e<br />
o chamado Grupo <strong>de</strong> Visegra<strong>de</strong>, que a república Eslovaca integra, é a prova palpável do reconhecimento <strong>de</strong> que os novos<br />
estados <strong>de</strong>mocráticos da Europa Central e Oriental fazem legitimamente parte da herança cultural e política europeia que é a<br />
matriz comum <strong>de</strong> todos nós.” Mário Soares, “O Perigo dos nacionalismos agressivos”, discurso proferido em 7.7.1994, no<br />
Palácio da Ajuda, no banquete oferecido em honra do presi<strong>de</strong>nte da República Eslovaca, in Mário Soares, Intervenções 9 […]<br />
cit., p. 216.<br />
542 Mário Soares, “Reforçar o Património Comum”, discurso proferido na <strong>Universida<strong>de</strong></strong> do Rio <strong>de</strong> Janeiro, em 19.03.1990, na<br />
cerimónia <strong>de</strong> doutoramento honoris causa, in Mário Soares, Intervenções 5 […] cit., p. 84.<br />
543 “Visões da Europa”, entrevista concedida por Mário Soares ao director do Observatório Europeu <strong>de</strong> Geopolítica <strong>de</strong> Leon, Prof.<br />
Michel Foncher, em Setembro <strong>de</strong> 1995, in Mário Soares, Intervenções 10 […] cit., p. 337.<br />
122