Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
discursos após a retirada da vida política activa, colocando o fe<strong>de</strong>ralismo europeu como essência da<br />
evolução institucional da União. A nova forma <strong>de</strong> soberania consiste na sua partilha, no que parece ser<br />
um contra-senso, mas que é afinal o novo paradigma <strong>de</strong> soberania do Estado Nação.<br />
A i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> Portugal po<strong>de</strong>r ter uma influência eficaz no mundo quando integrado numa união<br />
política fe<strong>de</strong>ral, resulta, no arquétipo i<strong>de</strong>ológico soarista, <strong>de</strong> uma análise às alterações que a nova<br />
conjuntura mundial provoca nas formas <strong>de</strong> actuação internacional, o que leva a uma mudança na forma<br />
<strong>de</strong> exercício da soberania nacional e no próprio conceito. “Como se <strong>de</strong>ve enten<strong>de</strong>r hoje a soberania<br />
nacional? Relaciona-se com a moeda? Já vimos que não. (…) O po<strong>de</strong>r militar? A capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
po<strong>de</strong>rmos, só com os nossos meios, <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>r o nosso território <strong>de</strong> eventuais ataques externos? Não é o<br />
caso.” 511 Toca-se assim no ponto que <strong>de</strong>sperta a necessida<strong>de</strong> externa <strong>de</strong> um Portugal inserido numa<br />
Europa fe<strong>de</strong>ral. No mundo actual, a actuação conjunta dos estados reforça a posição <strong>de</strong> cada um. “Hoje<br />
a <strong>de</strong>fesa militar tem muito a ver com o sistema <strong>de</strong> alianças em que nos inserimos, com o facto <strong>de</strong><br />
estarmos na União Europeia. A <strong>de</strong>fesa, hoje, é colectiva (…). É por aí que se assegura a soberania.” 512<br />
Quanto mais integrado Portugal estiver na UE, mais soberania mundial exercerá. Esta noção <strong>de</strong> Soares<br />
recai, mais uma vez, na i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> uma Europa impulsionadora, motor <strong>de</strong> engrenagem, com um <strong>de</strong>stino<br />
político mundial. “Isolados, hoje, não teríamos condições, sequer, para nos <strong>de</strong>fen<strong>de</strong>rmos da<br />
Espanha.” 513<br />
Embora ainda longe da união fe<strong>de</strong>ral, a a<strong>de</strong>são à CEE já implicou para Portugal o início <strong>de</strong>ssa<br />
nova forma <strong>de</strong> exercício <strong>de</strong> soberania e a consumação do antagonismo i<strong>de</strong>ológico ao país<br />
“orgulhosamente só.” A partilha <strong>de</strong> soberania nacional não tem suscitado oposições políticas que<br />
coloquem em causa o sistema internacional actual em que Portugal se insere, o que <strong>de</strong>nota a<br />
consolidação plena da renovação da mentalida<strong>de</strong> portuguesa sobre o fim do império colonial, varrendo<br />
os espíritos cépticos que ainda punham em causa esta opção no final do Estado Novo.<br />
E assim, inserido nos sistemas geopolíticos internacionais contemporâneos, Portugal encontra<br />
um meio <strong>de</strong> exercer uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> renovada. São novas formas <strong>de</strong> exercício da tradição universalista<br />
portuguesa, em que a via marítima das Descobertas <strong>de</strong>u lugar à relação política transnacional. Se a<br />
integração europeia veio ditar o fim do império colonial por um lado, por outro, ela não preten<strong>de</strong> ser um<br />
marco <strong>de</strong> quebra com o passado além-mar, mas sim recuperar o seu sentido humanista e universalista<br />
emanado dos Descobrimentos.<br />
O fim do império colonial dita apenas, na óptica <strong>de</strong> Soares, a aniquilação do sentido parasitário<br />
da relação com os territórios ultramarinos. Deve, porém, conservar-se a marca positiva da presença lusa<br />
em África e Brasil, a génese do espírito quinhentista, a tradição universalista portuguesa como fomento<br />
da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> do país após o fim do ciclo do império. “Hoje a nossa presença na Europa e no Mundo<br />
<strong>de</strong>ve afirmar-se na consciência do que somos e daquilo que criámos, com o legítimo orgulho pela<br />
511 Mário Soares, Sérgio Sousa Pinto, Diálogo <strong>de</strong> Gerações, Lisboa, Círculo <strong>de</strong> Leitores, 2004, p. 149.<br />
512 I<strong>de</strong>m., ibi<strong>de</strong>m.<br />
513 I<strong>de</strong>m., ibi<strong>de</strong>m.<br />
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