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Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra

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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />

contexto contemporâneo, através da participação e contribuição para a construção europeia. Ao integrar<br />

a CEE em 1985, apanhando um comboio que já levava <strong>de</strong>z países, colocava-se a questão da dimensão e<br />

periferia do território português como alarme para a possível marginalização europeia <strong>de</strong> Lisboa, ainda<br />

para mais, aten<strong>de</strong>ndo à discrepância <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento relativamente a outras capitais comunitárias.<br />

Torna-se, assim, necessário promover uma “integração europeia sem perda <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong><br />

própria (…),” 487 em que a geografia e historicida<strong>de</strong> portuguesas passam também por ser armas <strong>de</strong><br />

afirmação i<strong>de</strong>ntitária na Europa. “A singularida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Portugal na União Europeia resi<strong>de</strong> nessa memória<br />

histórica”, pelo que <strong>de</strong>ve pôr-se “em realce aquilo que nos individualiza na União Europeia.” Essa será<br />

a base política competitiva <strong>de</strong> Portugal, traduzindo uma “estratégia clara e diferenciada em relação aos<br />

outros países europeus (…),” 488 através <strong>de</strong> uma valorização do seu manancial histórico e geoestratégico,<br />

com uma localização “na embocadura do Mediterrâneo, <strong>de</strong>bruçado sobre o Atlântico, o mais próximo<br />

vizinho europeu dos EUA.” 489 Aproveitar as oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>sta posição geográfica significa “saber<br />

tirar vantagens <strong>de</strong>ssa vizinhança com os EUA, (…) bem como com o Brasil e com África.” 490<br />

Deste modo, a periferia <strong>de</strong> Portugal torna-se na sua própria vantagem e trunfo político na<br />

Europa. Por isso, urge a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> uma estratégia para Portugal na Comunida<strong>de</strong>, com “uma política<br />

externa activa, dotada <strong>de</strong> meios e consequente com o que fomos e representamos.” 491 O mar é agora<br />

enaltecido, não na concepção colonialista <strong>de</strong> Salazar - como o único horizonte da política externa<br />

portuguesa - mas numa perspectiva <strong>de</strong> abertura, como uma ponte da Europa para outros continentes,<br />

fomentando o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> relações económicas, políticas e culturais passíveis <strong>de</strong> mais-valias<br />

bilaterais. Isto confere a Portugal uma importância única na construção europeia. Não só “somos o país<br />

da Europa mais próximo dos EUA”, como “mantemos diálogo muito estreito com os países da América<br />

Latina e África.” 492 E prevenindo que esta concepção universalista <strong>de</strong> Portugal possa ser vista como<br />

exacerbado i<strong>de</strong>alismo, Soares procura inseri-la numa importância política em momentos capitais da<br />

história mundial, como prova o valor do “triângulo geoestratégico Continente, Açores-Ma<strong>de</strong>ira”,<br />

evi<strong>de</strong>nciado na “crise do Golfo.” 493<br />

Com a <strong>de</strong>smembramento da União Soviética, ao conjecturar-se o alargamento da Europa a<br />

Leste, mais argumentos se lhe ofereceram para a importância geopolítica portuguesa, conferindo à<br />

posição sulista <strong>de</strong> Lisboa um papel <strong>de</strong> contrabalanço na política europeia, reiterando o interesse que o<br />

país continuará a <strong>de</strong>dicar à cooperação com África, <strong>de</strong>sfazendo assim os receios <strong>de</strong> que a consolidação<br />

das <strong>de</strong>mocracias nascentes no Leste europeu venha a provocar um <strong>de</strong>sinteresse comunitário “pela ajuda<br />

487 I<strong>de</strong>m, “Um País em Mudança”, discurso proferido em Braga, em 10.06.1990, in Mário Soares, Intervenções 5 […] cit., p.32.<br />

488 I<strong>de</strong>m, “A União Europeia e os 500 Anos do Brasil”, publicado no Expresso, 6.05.2000, in Mário Soares, Português e Europeu<br />

[…] cit., p. 152.<br />

489 I<strong>de</strong>m, “Um País em Mudança”, discurso proferido em Braga, em 10.06.1990, in Mário Soares, Intervenções 5 […] cit., p. 35.<br />

Esta i<strong>de</strong>ia é repetida noutras intervenções, como elucida a seguinte <strong>de</strong>claração: “Por outro lado, nós não nos po<strong>de</strong>mos esquecer<br />

<strong>de</strong> que somos um país periférico em relação ao centro da Europa, estamos <strong>de</strong>bruçados sobre o atlântico e o nosso mais próximo<br />

vizinho chama-se EUA”, entrevista concedida ao Diário <strong>de</strong> Notícias, em 6.11.1990, in Mário Soares, Intervenções 5 […] cit., p.<br />

536.<br />

490 Entrevista concedida por Mário Soares ao Diário <strong>de</strong> Notícias, em 6.11.1990, in Mário Soares, Intervenções 5 […] cit., p. 536.<br />

491 “É a Cultura que representa o espírito <strong>de</strong> uma Nação”, entrevista concedida por Mário Soares, ao Jornal <strong>de</strong> Letras, em<br />

18.02.1992, in Mário Soares, Intervenções 7 […] cit., p. 243.<br />

492 “Não acredito no <strong>de</strong>clínio da Europa”, entrevista concedida por Mário Soares ao Sud-Ouest, em 26.05.1989, in Mário Soares,<br />

Intervenções 4 […] cit., p. 426.<br />

493 Mário Soares, “Portugal, país euro-atlântico”, conferência pronunciada no Porto, em 12.09.1990, a convite do Fórum<br />

Portucalense, in Mário Soares, Intervenções 5 […] cit., p. 220.<br />

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