Capítulo I - Estudo Geral - Universidade de Coimbra
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Mário Soares e a Europa – pensamento e acção<br />
será possível quando (…) houver coragem <strong>de</strong> iniciar o processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>scolonização.” 428 Em conflito<br />
estão “os interesses metropolitanos, sujeitos à crescente atracção económica da Europa e os interesses<br />
dos gran<strong>de</strong>s monopólios coloniais” 429 , e são estes “grupos <strong>de</strong> pressão económica,” que “constituem as<br />
únicas influências com peso real nas <strong>de</strong>cisões governamentais,” 430 que fazem com que o regime seja<br />
impermeável a quaisquer intentos <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rnização e mudança da estrutura económico-social e política.<br />
Soares contraria os argumentos da necessida<strong>de</strong> do império colonial para manutenção da<br />
in<strong>de</strong>pendência nacional, advogando que, pelo contrário, é a guerra colonial que põe em risco essa<br />
in<strong>de</strong>pendência, já que o país se vai “exaurindo economicamente num esforço <strong>de</strong>sproporcionado e o<br />
melhor da nossa juventu<strong>de</strong> vai sendo imolada e estropiada.” 431 Arguindo que esta guerra estaria a<br />
<strong>de</strong>pauperar a economia nacional, faz alusão “à miséria” dos que são “forçados à emigração, como forma<br />
<strong>de</strong> resolução dos seus problemas básicos”, situação gerada graças “em parte, à exploração colonial.”<br />
Assim, tece a teia argumentativa pragmática <strong>de</strong> que “a política colonialista do Governo bloqueia toda a<br />
evolução portuguesa – tanto no domínio económico e social como no campo político.” 432 Consi<strong>de</strong>ra o<br />
colonialismo salazarista a evidência do latente parasitismo português que se seguiu aos<br />
Descobrimentos e que, após o interregno da República, tem assim continuida<strong>de</strong>. Reflectindo sobre a<br />
crise nacional, Soares dá continuida<strong>de</strong> a um dos temas “preferidos da chamada geração <strong>de</strong> setenta” 433 ,<br />
evi<strong>de</strong>nciando uma sequência <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ias <strong>de</strong> pensadores como Antero <strong>de</strong> Quental e Oliveira Martins.<br />
Assim, adapta e renova os mesmos valores da Geração <strong>de</strong> 70 para pensar o Portugal contemporâneo,<br />
num novo contexto político e económico.<br />
A inserção do país num novo mundo político, exige uma nova abordagem sobre os territórios<br />
coloniais, com a “auto-<strong>de</strong>terminação do Ultramar,” 434 pois “a <strong>de</strong>fesa dos legítimos interesses criados<br />
pelas populações brancas radicadas em África e o <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong> manutenção da presença <strong>de</strong> Portugal,<br />
sobretudo no domínio linguístico e cultural, não po<strong>de</strong>m ser confundidos nem com uma vitória militar<br />
(…) nem com a rígida sustentação do status quo (…).” 435 Tal confusão não só é contrária ao espírito<br />
universalista português, como só servirá para matar os laços históricos da cultura portuguesa e africana,<br />
suscitando uma revolta racial e a “perda da nossa tradição <strong>de</strong> multirracialismo, porventura o traço mais<br />
positivo da nossa presença em África.” 436 É esta tradição que é necessário recuperar, como<br />
impulsionadora não apenas em tempos <strong>de</strong> necessária <strong>de</strong>scolonização, mas também como sentimento<br />
orientador da acção política e diplomática que Portugal <strong>de</strong>ve promover com os territórios com os quais<br />
428 Entrevista concedida por Mário Soares, em Paris, à agência noticiosa cubana Prensa Latina, em Março <strong>de</strong> 1971, in Mário<br />
Soares, Escritos do Exílio […] cit., pp. 72, 73.<br />
429 Mário Soares, “A Oposição e o Governo em Portugal”, 1967 (sem referência <strong>de</strong> publicação ou discurso), Arquivo Fundação<br />
Mário Soares, pasta 00002 00, imagens 113-117.<br />
430 Mário Soares, “Portugal e África”, artigo para publicação no jornal Triunfo, 16.02.1972, Arquivo Fundação Mário Soares, pasta<br />
000034 001, imagens 200-204.<br />
431 “Nos 40 Anos do Estados Novo - Um Projecto”, abaixo-assinado dirigido ao Presi<strong>de</strong>nte da República, redigido por Mário<br />
Soares, Arquivo Fundação Mário Soares, pasta 00002 00, imagens 71-97.<br />
432 Entrevista concedida por Mário Soares, em Paris, à agência noticiosa cubana Prensa Latina, em Março <strong>de</strong> 1971, in Mário<br />
Soares, Escritos do Exílio […] cit., p. 73.<br />
433 “Destruir o Sistema, Construir uma Nova Vida”, relatório do secretário-geral do PS, discutido, lido e aprovado no Congresso<br />
<strong>de</strong> Maio <strong>de</strong> 1973, na Alemanha, in Mário Soares, Escritos do Exílio […] cit., pp. 317.<br />
434 Mário Soares, “A Oposição e o Governo em Portugal”, 1967 (sem referência <strong>de</strong> publicação ou discurso), Arquivo Fundação<br />
Mário Soares, pasta 00002 00, imagens 113-117.<br />
435 Mário Soares, “Notas Esparsas sobre a Actualida<strong>de</strong> Política e Nacional” in Mário Soares, Escritos Políticos […] cit., p. 163.<br />
436 I<strong>de</strong>m, ibi<strong>de</strong>m.<br />
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