O perfil de investimento da classe média brasileira - uma ... - UTFPR

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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ - UTFPR/PR DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃO GESTÃO E ECONOMIA ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DE NEGÓCIOS BRUNA LOUISE VARGAS O PERFIL DE INVESTIMENTO DA CLASSE MÉDIA BRASILEIRA: UMA VISÃO CULTURAL CURITIBA OUTUBRO 2007

UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ - <strong>UTFPR</strong>/PR<br />

DEPARTAMENTO DE ADMINISTRAÇÃO GESTÃO E ECONOMIA<br />

ESPECIALIZAÇÃO EM GESTÃO DE NEGÓCIOS<br />

BRUNA LOUISE VARGAS<br />

O PERFIL DE INVESTIMENTO DA CLASSE MÉDIA BRASILEIRA: UMA VISÃO<br />

CULTURAL<br />

CURITIBA<br />

OUTUBRO 2007


BRUNA LOUISE VARGAS<br />

O PERFIL DE INVESTIMENTO DA CLASSE MÉDIA BRASILEIRA: UMA VISAO<br />

CULTURAL<br />

Monografia apresenta<strong>da</strong> como requisito parcial<br />

para obtenção do grau <strong>de</strong> Especialista em<br />

Gestão <strong>de</strong> Negócios, do Departamento<br />

Acadêmico <strong>de</strong> Gestão e Economia, <strong>da</strong><br />

Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná.<br />

Orientador: Prof. Jorge Carlos C. Guerra, LD.<br />

CURITIBA<br />

OUTUBRO 2007


Vargas, Bruna L.<br />

Perfil <strong>de</strong> <strong>investimento</strong> <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> – <strong>uma</strong> visão<br />

cultural / Bruna Louise Vargas – Cutitiba, 2007-10-22<br />

Monografia (Especialização) – Departamento <strong>de</strong> Administração Gertão e<br />

Economia, Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná.<br />

1. Classe Média. 2. Investimentos. 3. Cultura. I. Título


BRUNA LOUISE VARGAS<br />

O PERFIL DE INVESTIMENTO DA CLASSE MÉDIA BRASILEIRA: UMA VISÃO<br />

CULTURAL<br />

Monografia julga<strong>da</strong> e aprova<strong>da</strong> como requisito parcial para a obtenção do grau <strong>de</strong><br />

Especialista em Gestão <strong>de</strong> Negócios, do Departamento Acadêmico <strong>de</strong> Gestão e<br />

Economia, <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná.<br />

Curitiba, 22 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 2007.<br />

Prof. Denise Rauta Buiar<br />

Coor<strong>de</strong>nadora <strong>de</strong> Curso<br />

Departamento Acadêmico <strong>de</strong> Gestão e Economia<br />

i<br />

BANCA EXAMINADORA<br />

Prof. Dr. Jorge Carlos Corrêa Guerra<br />

Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná<br />

Orientador<br />

Profa. M.Sc. Ana Cristina Macedo Magalhães<br />

Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná<br />

Profa. Isaura Alberton <strong>de</strong> Lima<br />

Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná


“O caminho mais longo é o que fazemos <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> nós.”<br />

ii<br />

(Clarice Lispector)


Resumo <strong>da</strong> monografia apresenta<strong>da</strong> à UTFPr como parte dos requisitos necessários a<br />

obtenção do grau <strong>de</strong> Especialista em Gestão <strong>de</strong> Negócios.<br />

O PERFIL DE INVESTIMENTO DA CLASSE MÉDIA BRASILEIRA: UMA VISÃO<br />

CULTURAL<br />

BRUNA LOUISE VARGAS<br />

Outubro/2007<br />

Orientador: Jorge Carlos C. Guerra, LD.<br />

Curso: Especialização em Gestão <strong>de</strong> Negócios<br />

O presente estudo tem por objetivo principal analisar o <strong>perfil</strong> <strong>de</strong> <strong>investimento</strong> <strong>da</strong><br />

<strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> tendo como visão principal a cultura. Abor<strong>da</strong>ndo <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

conceitos básicos como cultura e <strong>classe</strong> <strong>média</strong> até conceitos mais <strong>de</strong>senvolvidos como<br />

cultura e <strong>investimento</strong>s no Brasil, riscos em <strong>investimento</strong>s, cultura do medo e a<br />

formação <strong>de</strong> opinião.<br />

Para garantir e i<strong>de</strong>ntificar os objetivos iniciais a serem alcançados, foi realizado<br />

um estudo <strong>de</strong> caso através <strong>da</strong> análise e i<strong>de</strong>ntificação dos conceitos relacionados acima<br />

em quatro trabalhos acadêmicos cujos temas são diretamente relacionados com<br />

<strong>investimento</strong>s no mercado financeiro brasileiro.<br />

Para fun<strong>da</strong>mentar o estudo foram realiza<strong>da</strong>s pesquisas bibliográficas em livros,<br />

artigos, teses, monografias, dissertações, periódicos e publicações disponíveis na<br />

internet relacionados aos assuntos. Posteriormente, no estudo <strong>de</strong> caso, a base do<br />

estudo está nas monografias dos alunos Maurílio Ribeiro Valle, Deise <strong>da</strong> Silva Barcelos,<br />

Sandro Lambach e Eduardo <strong>da</strong> Cunha Pilatti e Luiz Fernando Salvi, todos alunos <strong>da</strong><br />

Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná.<br />

Através do estudo aprofun<strong>da</strong>do dos conceitos teóricos e <strong>da</strong>s monografias que<br />

compõem o estudo <strong>de</strong> caso, foi possível observar a forte influencia cultural sobre as<br />

<strong>de</strong>cisões dos ci<strong>da</strong>dãos <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> quando no momento <strong>de</strong> investir ou<br />

programar seu futuro – no caso <strong>da</strong> compra <strong>de</strong> produtos <strong>de</strong> previdência priva<strong>da</strong>, por<br />

exemplo. Foi possível também observar a cautela que os investidores <strong>de</strong>sta <strong>classe</strong><br />

social – normalmente pequenos investidores – no momento <strong>de</strong> aplicar seus fundos.<br />

Muito <strong>de</strong>sta cautela se dá, pela também inseri<strong>da</strong>, “cultura do medo”, que chega ao<br />

povo, principalmente através <strong>da</strong> mídia e veículos <strong>de</strong> comunicação. Veículos estes que<br />

atuam principalmente na cultura <strong>da</strong> formação <strong>da</strong> opinião <strong>da</strong>s pessoas em relação a<br />

<strong>de</strong>terminado assunto.<br />

Diante <strong>de</strong>s<strong>de</strong> estudo é possível enten<strong>de</strong>r porque, historicamente, a <strong>classe</strong> <strong>média</strong><br />

<strong>brasileira</strong> quase não modifica sua maneira <strong>de</strong> investir mesmo diante <strong>de</strong> um número<br />

ca<strong>da</strong> vez maior <strong>de</strong> possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s e alternativas.<br />

Palavras-Chaves: Classe Média, Investimentos, Cultura.<br />

iii


Abstract of monograph presented to UTFPr as fulfillment of requirements to the <strong>de</strong>gree<br />

of specialist of Business Management.<br />

THE PROFILE OF INVESTMENT OF THE BRAZILIAN MIDDLE CLASS: A<br />

CULTURAL VISION<br />

BRUNA LOUISE VARGAS<br />

October/2007<br />

Monograph Advisor: Jorge Carlos C. Guerra, LD.<br />

Program: Specialization of Business Management<br />

The present study the culture has for main objective to analyze the profile of<br />

investment of the Brazilian middle class being had as main vision. Approaching since<br />

basic concepts as culture and middle class until <strong>de</strong>veloped concepts more as culture<br />

and investments in Brazil, risks in investments, culture of the fear and the formation of<br />

opinion.<br />

To guarantee and to i<strong>de</strong>ntify the initial objectives to be reached, it was carried<br />

through a study of case through the analysis and i<strong>de</strong>ntification of the concepts related<br />

above in four aca<strong>de</strong>mic works whose subjects directly are related with investments in<br />

the Brazilian financial market.<br />

To base the study bibliographical research in books had been carried through,<br />

articles, thesis, monographs, dissertation, periodic and available publications in the<br />

internet related to the subjects. Later, in the case study, the base of the study is in the<br />

monographs of the stu<strong>de</strong>nts Maurílio Ribeiro Valle, Deise <strong>da</strong> Silva Barcelos, Sandro<br />

Lambach and Eduardo <strong>da</strong> Cunha Pilatti and Luiz Fernando Salvi, all stu<strong>de</strong>nts of the<br />

University Technological Fe<strong>de</strong>ral of the Paraná.<br />

Through the <strong>de</strong>epened study of the theoretical concepts and the monographs that<br />

compose the case study, it was possible to observe the fort influences cultural on the<br />

<strong>de</strong>cisions of the citizens of the Brazilian middle class when at the moment to invest or to<br />

program its future - in the case of the purchase of products of private provi<strong>de</strong>nce, for<br />

example. It was possible also to observe the caution that the investors of this social<br />

classroom - normally small investors - at the moment to apply its <strong>de</strong>ep ones. Much of<br />

this caution if gives, for the also inserted one, "culture of the fear", that it arrives at the<br />

people, mainly through the media and vehicles of communication. Vehicles these that<br />

mainly act in the culture of the formation of the opinion of the people in relation the<br />

<strong>de</strong>termined subject.<br />

Ahead since study it is possible to un<strong>de</strong>rstand because, historically, the Brazilian<br />

middle class almost does not modify its way to exactly invest ahead of a number each<br />

bigger time of possibilities and alternatives.<br />

Key-words: Middle class, Investment, Culture.<br />

iv


SUMÁRIO<br />

Capítulo 1 Introdução.............................................................................................. 10<br />

Capítulo 2 Referencial Teórico............................................................................... 12<br />

2.1 Cultura................................................................................................................... 12<br />

2.1.1 Classificação <strong>da</strong> Cultura............................................................................ 15<br />

2.1.1.1 Cultura Erudita.......................................................................................... 15<br />

2.1.1.2 Cultura Popular......................................................................................... 15<br />

2.1.1.3 Cultura <strong>de</strong> Massa..................................................................................... 16<br />

2.1.2 I<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> Cultural Nacional...................................................................... 17<br />

2.1.3 Cultura Global x Cultura Local .................................................................. 18<br />

2.2 Classe Média Brasileira......................................................................................... 19<br />

2.3 Cultura e Investimento no Brasil........................................................................... 24<br />

2.3.1 Ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> Poupança............................................................................ 27<br />

2.3.2 Fundos <strong>de</strong> Investimentos........................................................................... 27<br />

2.3.3 CDB´s......................................................................................................... 30<br />

2.3.4 Ações......................................................................................................... 30<br />

2.4 Risco <strong>de</strong> Investimento........................................................................................... 32<br />

2.4.1 Tipos <strong>de</strong> Riscos.......................................................................................... 33<br />

2.4.1.1 Risco <strong>de</strong> Mercado..................................................................................... 33<br />

2.4.1.2 Risco <strong>de</strong> Crédito....................................................................................... 35<br />

2.4.1.3 Risco Operacional.................................................................................... 36<br />

2.4.1.4 Risco Legal............................................................................................... 39<br />

v


2.5 Cultura do Medo.................................................................................................... 40<br />

2.5.1 Perigos duvidosos no trânsito e nas universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s................................... 42<br />

2.5.2 Criminali<strong>da</strong><strong>de</strong> no noticiário......................................................................... 44<br />

2.5.3 Juventu<strong>de</strong> em risco................................................................................... 48<br />

2.5.4 Negros........................................................................................................ 51<br />

2.5.5 “A heroína volta à tona”............................................................................. 53<br />

2.5.6 Aci<strong>de</strong>ntes Aéreos...................................................................................... 56<br />

2.6 Formar Opinião..................................................................................................... 60<br />

Capítulo 3 Estudo <strong>de</strong> Caso..................................................................................... 67<br />

3.1 Consi<strong>de</strong>rações Iniciais ......................................................................................... 67<br />

3.2 Estudos <strong>de</strong> Caso................................................................................................... 72<br />

3.2.1 O comportamento <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> em<br />

<strong>investimento</strong>s financeiros.......................................................................... 73<br />

3.2.2 Previdência priva<strong>da</strong>, sonho e produto: <strong>uma</strong> análise<br />

do negócio dos “sonhos” no Brasil............................................................ 74<br />

3.2.3 Estudo comparativo <strong>de</strong> rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> entre ca<strong>de</strong>rneta<br />

<strong>de</strong> poupança e clubes <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>..................................................... 78<br />

3.2.4 Estudo comparativo <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s na construção<br />

civil em Curitiba (Pr) e no mercado financeiro.......................................... 79<br />

Capítulo 4 Consi<strong>de</strong>rações Finais........................................................................... 81<br />

Referencias Bibliográficas......................................................................................... 85<br />

vi


LISTA DE SIGLAS<br />

ANBID Associação Nacional <strong>de</strong> Bancos <strong>de</strong> Investimento<br />

APIMEC Associação <strong>de</strong> Analistas e Profissionais do Mercado <strong>de</strong> Capitais<br />

BOVESPA Bolsa <strong>de</strong> Valores <strong>de</strong> São Paulo<br />

CDB Certificado <strong>de</strong> Depósito Bancário<br />

CDI Certificado <strong>de</strong> Depósito Interfinanceiro<br />

CVM Comissão dos Valores Mobiliários<br />

FGV Fun<strong>da</strong>ção Getúlio Vargas<br />

IBGE Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia e Estatística<br />

IBOVESPA Índice <strong>da</strong> Bolsa <strong>de</strong> Valores <strong>de</strong> São Paulo<br />

IBX Índice Brasil<br />

IGP-M Índice Geral <strong>de</strong> Preços <strong>de</strong> Mercado<br />

IPCA Índice <strong>de</strong> Preços ao Consumidor Amplo<br />

IPEA Instituto <strong>de</strong> Pesquisas Econômicas Aplica<strong>da</strong>s<br />

IR Imposto <strong>de</strong> Ren<strong>da</strong><br />

PGBL Plano Gerador <strong>de</strong> Beneficio Livre<br />

POF Pesquisa <strong>de</strong> Orçamentos Familiares<br />

SEBRAE Serviço Brasileiro <strong>de</strong> Apoio às Micro e Pequenas Empresas<br />

SELIC Sistema Especial <strong>de</strong> Liqui<strong>da</strong>ção e Custodia<br />

SESI Serviço Social <strong>da</strong> Indústria<br />

TR Taxa Referencial<br />

VGBL Vi<strong>da</strong> Gerador <strong>de</strong> Beneficio Livre<br />

vii


1 Introdução<br />

Os <strong>investimento</strong>s <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> nas ultimas déca<strong>da</strong>s não tem<br />

sofrido gran<strong>de</strong>s mu<strong>da</strong>nças apesar do crescimento do número e <strong>da</strong> diversi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

produtos disponíveis no mercado <strong>de</strong> capitais. Será que o problema dos<br />

<strong>investimento</strong>s <strong>da</strong> <strong>classe</strong> media está nos investidores ou nas empresas “ven<strong>de</strong>doras”<br />

dos produtos? Será que os brasileiros <strong>de</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> têm medo <strong>de</strong> diversificar<br />

seus <strong>investimento</strong>s ou <strong>de</strong> mu<strong>da</strong>r o <strong>perfil</strong> com o qual já estão acost<strong>uma</strong>dos e<br />

confiantes há anos?<br />

Justificativa: a falta <strong>de</strong> diversificação e <strong>de</strong>senvolvimento na obtenção <strong>de</strong><br />

produtos do mercado financeiro brasileiro pela <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong>.<br />

Objetivo geral: i<strong>de</strong>ntificar o <strong>perfil</strong> <strong>de</strong> <strong>investimento</strong> <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong><br />

visando sempre os aspectos culturais <strong>da</strong> população, tanto no contexto histórico,<br />

como no social e econômico.<br />

Objetivos específicosão: i<strong>de</strong>ntificar os conceitos <strong>de</strong> cultura e como esta<br />

cultura afeta nas <strong>de</strong>cisões <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s <strong>da</strong> <strong>classe</strong> media <strong>brasileira</strong>. I<strong>de</strong>ntificar a<br />

cultura do medo relaciona<strong>da</strong> à aquisição <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s.<br />

Metodologia: Metodologia Microindiciaria <strong>de</strong> Ginsburg e <strong>da</strong> historia cultural,<br />

on<strong>de</strong>, por evi<strong>de</strong>ncias e sinais, num trabalho do busca e analise <strong>de</strong> informações,<br />

assim como com trabalhos com a micro-história, ou historia <strong>da</strong>s pessoas e grupos.<br />

Torna-se <strong>uma</strong> ferramenta <strong>de</strong> analise qualitativa com gran<strong>de</strong> diversi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> utilização<br />

nos ramos <strong>da</strong> ciência.<br />

Assim, no seguinte trabalho será tratado o <strong>perfil</strong> <strong>de</strong> <strong>investimento</strong> <strong>da</strong> <strong>classe</strong><br />

<strong>média</strong> <strong>brasileira</strong>, sempre ressaltando os aspectos culturais, n<strong>uma</strong> divisão em quatro<br />

capítulos on<strong>de</strong> serão abor<strong>da</strong>dos os seguintes aspectos:<br />

O capitulo 1 é composto por esta Introdução.<br />

No capitulo 2 faz-se a base teórica para o estudo em questão, on<strong>de</strong> serão<br />

abor<strong>da</strong>dos aspectos <strong>de</strong> Cultura; Classe Média Brasileira; Cultura <strong>de</strong> Investimento no<br />

Brasil; Risco <strong>de</strong> Investimento; Cultura do Medo e Formar Opinião.<br />

No próximo item, o capítulo 3, será visto o estudo <strong>de</strong> caso relatando<br />

sucintamente os trabalhos acadêmicos que dão base ao estudo <strong>de</strong> caso, citando os<br />

títulos: “O comportamento <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> em <strong>investimento</strong>s financeiros”<br />

<strong>de</strong> Maurílio Ribeiro; “Previdência priva<strong>da</strong>, sonho e produto: <strong>uma</strong> análise do negócio<br />

dos “sonhos” no Brasil” <strong>de</strong> Deise <strong>da</strong> Silva Barcelos; “Estudo comparativo <strong>de</strong><br />

10


entabili<strong>da</strong><strong>de</strong> entre ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança e clubes <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>” <strong>de</strong> Sandro<br />

Lambrach; “Estudo comparativo <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s na construção civil em Curitiba (Pr)<br />

e no mercado financeiro” <strong>de</strong> Eduardo <strong>da</strong> Cunha Pilatti e Luiz Fernando Salvi.<br />

Finalizando o presente estudo, o capítulo 4 traz as consi<strong>de</strong>rações finais <strong>de</strong><br />

todo o trabalho, incluindo conclusões e questionamentos relacionados ao tema.<br />

11


2 Referencial Teórico<br />

O presente capítulo tem como objetivo fazer um referencial teórico do tema<br />

em estudo, a fim <strong>de</strong> proporcionar um melhor embasamento ao trabalho. O conteúdo<br />

envolve temas direta ou indiretamente relacionados ao objetivo final <strong>da</strong> pesquisa,<br />

tendo como base materiais bibliográficos e <strong>da</strong> Internet.<br />

Inicialmente abrange temas como cultura – evi<strong>de</strong>nciando principalmente seu<br />

conceito – e a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong>. Seguido <strong>de</strong> capítulos relacionados a<br />

<strong>investimento</strong>s <strong>de</strong> pessoas físicas, suas culturas próprias e riscos. E, encerrando<br />

esse capitulo os capítulos que abrangem a “cultura do medo” e o “formar opinião”.<br />

2.1 Cultura<br />

Para Katja Plotz Fróis, em seu artigo, “Globalização e Cultura”, publicado em<br />

10 <strong>de</strong> novembro <strong>de</strong> 2004:<br />

“O termo cultura <strong>de</strong>riva do verbo latino colore, cultivar, e estava<br />

originalmente relacionado ao cultivo <strong>de</strong> terra. Provavelmente a relação<br />

anímica com a natureza como parâmetro para a compreensão do mundo<br />

fez com que o termo agrícola passasse a traduzir, também, os padrões <strong>de</strong><br />

comportamento e <strong>de</strong> relacionamento dos homens. Passou-se a <strong>de</strong>signar <strong>de</strong><br />

cultura tudo que aludisse a normas, regras e conteúdos sociais cultivados<br />

pelo homem ”.<br />

Já Alfredo Bosi (1992), em “Dialética <strong>da</strong> Colonização”, <strong>de</strong>fine que a palavra<br />

cultura <strong>de</strong>riva do verbo latino colo. Colo que para os romanos significou “eu moro”,<br />

“eu ocupo a terra”. Como tempo verbal no presente, <strong>da</strong>-se então a relação <strong>de</strong> cultura<br />

como idéia <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> e trabalho: eu cultivo a terra – a Técnica.<br />

A palavra cultura, não po<strong>de</strong> ser encara<strong>da</strong> como <strong>uma</strong> simples palavra, mas<br />

como <strong>uma</strong> categoria intelectual, um conceito. Cultura po<strong>de</strong> ter vários significados,<br />

mas <strong>de</strong>ntre eles, po<strong>de</strong>-se mencionar dois conceitos importantes e usualmente<br />

utilizados. A cultura no sentido <strong>de</strong> sofisticação, <strong>de</strong> sabedoria quando se refere a um<br />

estado educacional e como conceito chave para a interpretação <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> social.<br />

Nesse sentido, abor<strong>da</strong>ndo a maneira <strong>de</strong> viver total <strong>de</strong> um grupo, socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, país ou<br />

pessoa. Para a Antropologia Social e Sociologia, cultura é um mapa, um receituário,<br />

um código através do qual as pessoas <strong>de</strong> um <strong>da</strong>do grupo pensam, classificam,<br />

estu<strong>da</strong>m e modificam o mundo.<br />

12


Para Frois (2004), “o mundo, como conhecemos hoje, compõe-se <strong>de</strong><br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s caracteriza<strong>da</strong>s por culturas distintas. As raízes <strong>de</strong>ssas culturas,<br />

geralmente com fun<strong>da</strong>mento religioso, são tão antigas quanto o processo <strong>de</strong><br />

formação <strong>de</strong>ssas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s [...]”, é o padrão <strong>de</strong> significados transmitidos<br />

historicamente. O processo <strong>de</strong> formação <strong>de</strong> <strong>uma</strong> civilização é longo e lento, on<strong>de</strong><br />

conta à preservação <strong>de</strong> tradições, o incremento dos saberes e a transmissão <strong>de</strong>ssa<br />

tradição sempre acresci<strong>da</strong>, mas sempre construí<strong>da</strong> <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> parâmetros aceitos<br />

socialmente e regulados pelo corpo <strong>da</strong> própria cultura. Assim, a cultura torna-se a<br />

expressão do caráter <strong>de</strong> um povo.<br />

A cultura, na<strong>da</strong> mais é, do que o conjunto <strong>de</strong> conhecimentos adquiridos,<br />

conjunto <strong>da</strong>s estruturas sociais, religiosas, etc., <strong>da</strong>s manifestações intelectuais e<br />

artísticas, etc., que caracteriza <strong>uma</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>. É a soma <strong>de</strong> costumes, hábitos,<br />

normas e “regras” acumula<strong>da</strong>s durante to<strong>da</strong> a história <strong>de</strong> <strong>uma</strong> população ou grupo<br />

<strong>de</strong> indivíduos com a participação direta do homem. Essas normas dizem respeito<br />

aos modos, mais (ou menos) apropria<strong>da</strong>s <strong>de</strong> comportamentos diante <strong>de</strong> certas<br />

situações, porém, não é um código escolhido ou imposto simplesmente, a influência<br />

dos pensamentos e opiniões <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> indivíduo são tão, ou mais, importantes do que<br />

esses hábitos que regem <strong>de</strong>terminado grupo. Não se po<strong>de</strong> esquecer que um dos<br />

papéis importantes <strong>de</strong>ssas “regras” é o <strong>de</strong> relacionar indivíduos entre si e o próprio<br />

grupo com o ambiente on<strong>de</strong> vivem.<br />

Segundo Marilena Chauí (1989) 1 , o conceito <strong>de</strong> cultura como cultivo foi<br />

per<strong>de</strong>ndo terreno na história do Oci<strong>de</strong>nte, e a oposição entre natureza e cultura<br />

ganha <strong>de</strong>staque. De acordo com essa oposição, a cultura passa a ser entendi<strong>da</strong><br />

como produção e criação <strong>da</strong> linguagem, <strong>da</strong> religião, dos instrumentos <strong>de</strong> trabalho,<br />

<strong>da</strong>s formas <strong>de</strong> lazer, <strong>da</strong> música, <strong>da</strong> <strong>da</strong>nça, dos sistemas <strong>de</strong> relações sociais,<br />

particularmente os sistemas <strong>de</strong> relações <strong>de</strong> parentesco e as relações <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r. Para<br />

que a vi<strong>da</strong> exista e persevere, ela exige.<br />

Para Chauí (1989):<br />

“É <strong>da</strong>s respostas que <strong>da</strong>mos as exigências <strong>da</strong> vi<strong>da</strong> que nasce a cultura.<br />

Cultura é o que fazer, como fazer o que se faz, para quê fazer e para quem<br />

se faz, [...]. A cultura constitui-se em to<strong>da</strong>s as ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s que satisfazem<br />

nossas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, mesmo supérfluas. Somos todos produtos e<br />

produtores <strong>de</strong> cultura”.<br />

1 Disponível em “Glossário <strong>de</strong> Cultura”, publicado pelo SESI (Serviço Social <strong>da</strong> Indústria) em 2007.<br />

13


Sintetizando, po<strong>de</strong>mos utilizar a caracterização dos principais elementos que<br />

<strong>de</strong>finem a cultura através <strong>da</strong> <strong>de</strong>finição do Professor Robert Bainwood (1985), que<br />

diz:<br />

"A cultura é duradoura, embora os indivíduos que compõem um<br />

<strong>de</strong>terminado grupo <strong>de</strong>sapareçam. No entanto, a cultura também se modifica<br />

conforme mu<strong>da</strong>m as normas e entendimentos. Quase se po<strong>de</strong> dizer que a<br />

cultura vive nas mentes <strong>da</strong>s pessoas que a possuem. Mas as pessoas não<br />

nascem com ela; adquirem-na à medi<strong>da</strong> que crescem. A cultura é algo que<br />

perdura através do tempo.”<br />

A maioria dos estudiosos concor<strong>da</strong> com os elementos apontados por<br />

Braidwood e afirma que to<strong>da</strong> cultura:<br />

• É adquiri<strong>da</strong> pela aprendizagem, e não her<strong>da</strong><strong>da</strong> pelos instintos.<br />

• É transmiti<strong>da</strong> <strong>de</strong> geração a geração, através <strong>da</strong> linguagem.<br />

• É criação exclusiva dos seres h<strong>uma</strong>nos, sendo, portanto, um traço<br />

distintivo <strong>da</strong> h<strong>uma</strong>ni<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

• Inclui to<strong>da</strong>s as criações materiais e não materiais do homem.<br />

• Apresenta estruturas duradouras, mas que também sofrem evolução<br />

através <strong>da</strong> história.<br />

• É um instrumento indispensável à a<strong>da</strong>ptação do indivíduo ao meio social,<br />

tornando possível a expressão <strong>da</strong>s potenciali<strong>da</strong><strong>de</strong>s h<strong>uma</strong>nas.<br />

Como o mundo hoje não po<strong>de</strong> mais ser separado geograficamente, <strong>da</strong><br />

mesma maneira que os negócios tornaram-se globalizados, o mesmo acontece com<br />

a cultura. Devido à facili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> comunicação e troca <strong>de</strong> costumes e experiências,<br />

“o que une os indivíduos não são mais os vínculos territoriais, mas os laços culturais<br />

e simbólicos” (Sahlins, 1997). Assim, não se percebe mais o predomínio <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s<br />

culturas e a eliminação <strong>de</strong> outras, mas a recriação e fusão <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s <strong>de</strong>las. As<br />

culturas influenciam e são influencia<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido a essa impossibili<strong>da</strong><strong>de</strong> mundial <strong>de</strong><br />

qualquer isolamento, criando assim várias manifestações culturais.<br />

Segundo Stuard Hall (2003), essa fusão entre diferentes tradições culturais<br />

chama-se hibridismo. As culturas híbri<strong>da</strong>s, como são chama<strong>da</strong>s, frutos <strong>da</strong><br />

globalização, estão surgindo em to<strong>da</strong> parte <strong>de</strong>vido ao gran<strong>de</strong> número <strong>de</strong> pessoas<br />

que emigram <strong>de</strong> sua terra natal, atravessam fronteiras naturais e passam a viver em<br />

outras locali<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Essas pessoas retêm fortes vínculos com seus lugares <strong>de</strong><br />

origem, suas tradições, linguagens e histórias particulares, porém não tem a ilusão<br />

<strong>de</strong> retorno ao passado. São obriga<strong>da</strong>s a negociar com novas culturas, apropria-se<br />

14


<strong>de</strong> sua linguagem e costumes, sem serem, no entanto, assimila<strong>da</strong>s por elas e sem<br />

per<strong>de</strong>r completamente suas i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>s. Elas são os produtos <strong>de</strong> várias histórias e<br />

culturas interconecta<strong>da</strong>s, <strong>de</strong> novas migrações pós-coloniais. São pessoas que<br />

<strong>de</strong>vem apren<strong>de</strong>r a habitar, no mínimo, duas i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>s, a falar duas linguagens<br />

culturais, a traduzir e a negociar entre elas.<br />

2.1.1 Classificação <strong>da</strong> cultura<br />

Segundo Rodolfo Cascão (2007) <strong>uma</strong> divisão clássica cria<strong>da</strong> para explicar o<br />

conceito <strong>de</strong> cultura, já que hoje as culturas são muitas, é a que a separa em três<br />

campos: cultura erudita, cultura popular e cultura <strong>de</strong> massa.<br />

2.1.1.1 Cultura erudita<br />

Segundo Bernardo Oliveira (2002)<br />

“Erudição quer dizer instrução vasta e varia<strong>da</strong>, possibilita<strong>da</strong> pelo acesso aos<br />

bens culturais e à educação. A cultura erudita opõe-se ao ru<strong>de</strong> e, em geral,<br />

é i<strong>de</strong>ntifica<strong>da</strong> pelo conhecimento <strong>de</strong> autores e artistas clássicos. A produção<br />

cultural erudita é cultua<strong>da</strong> pela tradição e por instituições oficiais, como<br />

universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s, conservatórios, bibliotecas e museus. É ti<strong>da</strong> como a cultura<br />

<strong>da</strong> elite, <strong>uma</strong> vez que nem todos têm acesso a esses bens”.<br />

Normalmente esta cultura exige rigor na sua elaboração e por isso é cultiva<strong>da</strong><br />

por um público relativamente restrito, tem o status <strong>de</strong> algo sofisticado e privilegiado.<br />

É, às vezes, ridiculariza<strong>da</strong>, por seu caráter esnobe, acadêmico e formal, por ser<br />

dota<strong>da</strong> <strong>de</strong> requintes e exigências que não fazem muito sentido para a maioria <strong>da</strong><br />

população.<br />

2.1.1.2 Cultura popular<br />

Segundo Bernardo Oliveira (2002), “a cultura popular é conheci<strong>da</strong> como<br />

aquela cultura anônima produzi<strong>da</strong> pelas ‘pessoas comuns’”. Fazendo oposição a<br />

cultura erudita, que é transmiti<strong>da</strong> pela leitura e escrita ou por instituições oficiais. A<br />

cultura popular é geralmente transmiti<strong>da</strong> pelos costumes e pela orali<strong>da</strong><strong>de</strong>. A<br />

hierarquia <strong>da</strong> cultura popular é consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> vulgar, inferior e simplória. Quase<br />

sempre i<strong>de</strong>ntifica<strong>da</strong> pelo folclore e artesanato. As discussões provoca<strong>da</strong>s por<br />

15


movimentos multiculturalistas e interculturalistas, que consi<strong>de</strong>ram a diversi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

cultural, têm provocado mu<strong>da</strong>nças no sentido <strong>de</strong> reconhecer a importância <strong>da</strong><br />

cultura popular na constituição dos sujeitos e <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

2.1.1.3 Cultura <strong>de</strong> massa<br />

Segundo “Glossário <strong>de</strong> Cultura” lançado pelo SESI 2 (2007), a cultura <strong>de</strong><br />

massa é aquela vincula<strong>da</strong> pelos meios <strong>de</strong> comunicação <strong>de</strong> massa como rádio,<br />

televisão, jornais e revistas <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> circulação e, mais recentemente, pela<br />

internet. De acordo com os críticos <strong>da</strong> indústria cultural, sobre seu impacto no<br />

conjunto <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, ela impõe padrões culturais consumistas articulados com a<br />

mercadonização no campo cultural. Suas metas são as ven<strong>da</strong>s e o lucro e não o<br />

consumo cultural inerente ao processo <strong>de</strong> formação e <strong>de</strong>senvolvimento h<strong>uma</strong>nos.<br />

A existência <strong>da</strong> cultura <strong>de</strong> massas impera na situação em que aqueles que a<br />

praticam, na maioria <strong>da</strong>s vezes, segundo o estudioso Edimilson <strong>de</strong> Almei<strong>da</strong> Pereira<br />

"não sabem por que, só sabem que é assim". É o reino do "fazer porque todo mundo<br />

está fazendo", "precisar porque disseram que preciso" e <strong>da</strong>í em diante, sem que os<br />

indivíduos levem em conta sua real necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> ou satisfação em fazê-lo. Assim, a<br />

cultura <strong>de</strong> massa pressupõe a existência <strong>da</strong> indústria cultural, <strong>de</strong> um lado,<br />

produzindo artigos em série para serem consumidos pelo público; e, do outro, a<br />

"massa", um número in<strong>de</strong>terminado <strong>de</strong> pessoas (quanto mais, melhor), <strong>de</strong>spi<strong>da</strong>s <strong>de</strong><br />

suas características individuais, <strong>de</strong> <strong>classe</strong>, étnicas, <strong>de</strong> região, até mesmo, <strong>de</strong> país,<br />

que são trata<strong>da</strong>s como um todo razoavelmente homogêneo, para o qual esta<br />

produção é direciona<strong>da</strong>.<br />

Assim, a cultura <strong>de</strong> massas caracteriza-se por:<br />

• Ser constituí<strong>da</strong> pelos produtos <strong>da</strong> indústria cultural, que se <strong>de</strong>stinam à<br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo, visando respon<strong>de</strong>r ao "gosto médio" <strong>da</strong> população;<br />

• Ser produzi<strong>da</strong> por um grupo <strong>de</strong> profissionais que pertencem a <strong>uma</strong> <strong>classe</strong><br />

social diferente do público;<br />

• Ser dirigi<strong>da</strong> pela <strong>de</strong>man<strong>da</strong>, passando, portanto, por modismos;<br />

2 SESI – Serviço Social <strong>da</strong> Indústria: Prestador <strong>de</strong> serviços sociais aos trabalhadores <strong>da</strong>s indústrias<br />

do Brasil.<br />

16


• Ser feita para um público semiculto e passivo; o "povo", nesse caso, é só<br />

o alvo <strong>da</strong> produção, não sua origem;<br />

• Visar o divertimento como meio <strong>de</strong> passar o tempo.<br />

Po<strong>de</strong>-se falar seguramente em indústria cultural a partir do século XVIII. O<br />

fato marcante foi à multiplicação dos jornais na Europa. Se até a I<strong>da</strong><strong>de</strong> Média, a<br />

leitura e a escrita eram privilégios do clero e <strong>de</strong> parte <strong>da</strong> nobreza, isso se modifica<br />

no capitalismo. As características básicas do novo mo<strong>de</strong>lo sócio-econômico que se<br />

impunha eram a urbanização, a industrialização e, principalmente, a criação e<br />

ampliação do mercado consumidor. As ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s passam a ser pólos <strong>de</strong> importância<br />

social, econômica e cultural. A população vai abandonando o campo rumo à ci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

e ao trabalho nas fábricas. A mecanização barateia os produtos e,<br />

consequentemente, aumenta o mercado consumidor.<br />

A burguesia comercial e industrial se estabelece como <strong>classe</strong> hegemônica, e<br />

crescem as <strong>classe</strong>s <strong>média</strong>s.<br />

2.1.2 I<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> cultural nacional<br />

Por mais diversa e heterogênea que seja a face do povo brasileiro, será que<br />

existe um traço peculiar que caracterizaria a brasili<strong>da</strong><strong>de</strong>? Como falar <strong>da</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

nacional e não cair em imagens esteriotipa<strong>da</strong>s? Até nos indivíduos as i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

são fragmenta<strong>da</strong>s, manifesta<strong>da</strong>s <strong>de</strong> forma parcial nos diversos contextos. E nesse<br />

mundo globalizado, com o aumento <strong>da</strong> complexi<strong>da</strong><strong>de</strong> social, essa perspectiva torna-<br />

se mais difíc il ain<strong>da</strong>. Um gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>safio. O Brasil não existe espontaneamente como<br />

nação. O que ocorre é <strong>uma</strong> uni<strong>da</strong><strong>de</strong> dinâmica que se refaz constantemente através<br />

do território <strong>da</strong> língua, <strong>da</strong> miscigenação do povo, <strong>da</strong>s normas <strong>de</strong> convivência, <strong>da</strong><br />

produção material e <strong>de</strong> <strong>uma</strong> expressão cultural. Essa i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> é exatamente fugaz<br />

e instável, muitos elementos contraditórios convivem um com o outro. A cultura<br />

<strong>brasileira</strong> é na ver<strong>da</strong><strong>de</strong> plural. Uma pesquisa do SEBRAE 3 <strong>de</strong> 2002, “Cara <strong>brasileira</strong><br />

– um caminho para o ‘ma<strong>de</strong> in Brazil’”, apontou os seguintes elementos constitutivos<br />

<strong>de</strong> nossa i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>:<br />

“A cara do Brasil é <strong>uma</strong> amálgama cultural composta pelos recursos<br />

naturais e pelo sol, mas também pelas festas populares e religiosas e outras<br />

manifestações incorpora<strong>da</strong>s ao modo <strong>de</strong> viver popular: a música, o futebol,<br />

o papel <strong>da</strong>s mulheres na socie<strong>da</strong><strong>de</strong>”.<br />

3 SEBRAE - Serviço Brasileiro <strong>de</strong> Apoio às Micro e Pequenas Empresas<br />

17


As dimensões continentais, a mistura <strong>de</strong> raças a exigência <strong>de</strong> culturas<br />

diversas, a coexistência <strong>de</strong> populações indígenas e <strong>de</strong> pessoas com acesso a<br />

padrões <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rni<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>de</strong>senvolvimento comparáveis aqueles <strong>da</strong>s socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

tecnológicas criam no Brasil fortes contrastes que não encontram paralelo ao<br />

mundo.<br />

2.1.3 Cultura global X Cultura local 4<br />

A contemporanei<strong>da</strong><strong>de</strong> trouxe alterações profun<strong>da</strong>s na produção <strong>de</strong> valores,<br />

comportamentos e noções como a <strong>de</strong> tempo e espaço. Até o século XIX, as pessoas<br />

eram muito liga<strong>da</strong>s às idéias <strong>de</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> local e <strong>de</strong> pertencimento comunitário.<br />

A cultura local tendia a valorizar a memória e as tradições: o tempo cósmico<br />

do camponês traduzia <strong>uma</strong> enorme interpenetração entre o transcen<strong>de</strong>nte, à<br />

natureza e a vi<strong>da</strong> societária. A industrialização e o avanço do capitalismo<br />

<strong>de</strong>ssacralizam 5 o mundo e fazem com que as pessoas se liguem na aquisição <strong>de</strong><br />

produtos ca<strong>da</strong> vez mais acessíveis e <strong>de</strong>scartáveis: surge a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo e<br />

<strong>de</strong> massa. A partir <strong>de</strong>sse momento, com a afirmação progressiva do mercado e <strong>da</strong>s<br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s, é que se configura como expressão cultural à idéia <strong>de</strong> nação, que é um<br />

conceito mais recente do que se imagina, sendo <strong>uma</strong> ruptura em frente <strong>da</strong>quela<br />

cosmovisão localista e al<strong>de</strong>ã. Esse é o primeiro momento <strong>de</strong> um processo <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sterritorialização, e com a chega<strong>da</strong> do século XX começa-se a se falar em cultura<br />

mundial.<br />

O fim <strong>da</strong> Segun<strong>da</strong> Guerra Mundial marca o início <strong>de</strong> <strong>uma</strong> forte aceleração <strong>da</strong><br />

mundialização <strong>da</strong> economia, <strong>da</strong> política e também <strong>da</strong> cultura. O <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong><br />

<strong>uma</strong> cultura globaliza<strong>da</strong> encontra nos meios <strong>de</strong> comunicação <strong>uma</strong> ferramenta<br />

po<strong>de</strong>rosa <strong>de</strong> quebra <strong>de</strong> paradigmas, especialmente aqueles ligados a valores<br />

sociais. Essa nova forma <strong>de</strong> relacionar-se com a reali<strong>da</strong><strong>de</strong> mu<strong>da</strong> as percepções <strong>de</strong><br />

espaço e tempo, cria-se um mundo veloz, as distâncias se encurtam, as mídias<br />

passam a circular milhares <strong>de</strong> informações em <strong>uma</strong> rapi<strong>de</strong>z frenética, as reali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

ficam próximas, mas virtuais, as pessoas passam a ca<strong>da</strong> vez mais se individualizar e<br />

4 Texto disponível em: Glossário <strong>da</strong> Cultura – SESI – Departamento Nacional, 2007.<br />

5 Segundo dicionário Infopédia – disponível em www.infopedia.pt – <strong>de</strong>ssacralizar: <strong>de</strong>sprover do<br />

caráter sagrado; profanar.<br />

18


alienar a sua capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> convivência social. É um fenômeno <strong>de</strong> tal gran<strong>de</strong>za,<br />

que to<strong>da</strong> e qualquer análise a respeito <strong>de</strong>ssa socie<strong>da</strong><strong>de</strong> mundializa<strong>da</strong> tem <strong>de</strong><br />

obrigatoriamente pensar a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> contemporânea <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um contexto <strong>de</strong><br />

produção, circulação e consumo multicultural.<br />

A indústria cultural e <strong>da</strong> comunicação ten<strong>de</strong> a enxergar o sujeito não como<br />

ci<strong>da</strong>dão, mas meramente como consumidor. A mídia <strong>de</strong>dica-se a fabricar o presente,<br />

menosprezando a consciência histórica. Daí a importância <strong>de</strong> valorizar as culturas<br />

locais, <strong>de</strong> revitalizar as experiências locais e comunitárias, pois elas são a garantia<br />

<strong>de</strong> um fortalecimento do tecido social, <strong>da</strong> afirmação <strong>de</strong> nossa i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> diante <strong>de</strong><br />

<strong>uma</strong> massificação que favorece apenas a nossa <strong>de</strong>pendência às empresas<br />

multinacionais e ao capital especulativo, este não globalizado, mas com residência<br />

fixa em poucas potências mundiais.<br />

2.2 Classe <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong><br />

Difícil <strong>de</strong> classificar, a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> é tema <strong>de</strong> estudos sociais<br />

freqüentes no Brasil. Consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> como gran<strong>de</strong> produtora <strong>de</strong> idéias e cultura são<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>s <strong>de</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> hoje, no Brasil, segundo o Censo <strong>de</strong>mográfico 2000 e<br />

a POF 6 <strong>de</strong> 2003 realiza<strong>da</strong> pelo IBGE 7 , as famílias com ren<strong>da</strong> mensal, em valores <strong>de</strong><br />

2005, equivalente entre R$ 1.556,00 e R$ 17.351,00.<br />

Atitu<strong>de</strong>s e valores sempre fizeram parte <strong>da</strong>s tentativas teóricas <strong>de</strong> traçar um<br />

<strong>perfil</strong> <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong>. Critérios como a ocupação e a escolari<strong>da</strong><strong>de</strong> também são<br />

usa<strong>da</strong>s por pesquisadores, assim como <strong>da</strong>dos econômicos tais quais ren<strong>da</strong> e<br />

padrão <strong>de</strong> consumo. Os resultados po<strong>de</strong>m variar bastante conforme a metodologia.<br />

Segundo artigo “A <strong>classe</strong> <strong>média</strong> universal” 8 (2007) a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> po<strong>de</strong> ser<br />

<strong>de</strong>fini<strong>da</strong> como um estado terminal consi<strong>de</strong>rado "digno", <strong>de</strong> acordo com os padrões<br />

culturais <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> on<strong>de</strong> ela se encontra inseri<strong>da</strong>: diz-se que um indivíduo atingiu<br />

a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> a partir do instante em que ele <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> sentir incontrolável ânsia em<br />

melhorar <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, passa a consi<strong>de</strong>rar aquele patamar aceitável para si e para sua<br />

família, e planeja que seus filhos tenham aquele mesmo nível quando se tornarem<br />

adultos. Desta forma, a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> é um estado terminal estacionário: ela ten<strong>de</strong> a<br />

6 POF – Pesquisa <strong>de</strong> Orçamentos Familiares<br />

7 IBGE - Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia e Estatística<br />

8 Disponível em www.pedromundim.net/ClasseMedia.htm<br />

19


eproduzir-se a si própria, geração após geração, e os indivíduos que se inserem<br />

nela ten<strong>de</strong>m a permanecer nela. Este estado estacionário produz duas<br />

conseqüências que valem tanto para o país rico quanto para o pobre.<br />

Segundo o mesmo artigo, a primeira <strong>de</strong>ssas conseqüências é: apenas a<br />

<strong>classe</strong> <strong>média</strong> fixa os valores morais e a cultura <strong>de</strong> um povo. Pois o indivíduo que<br />

está satisfeito com o seu modo <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, certamente <strong>de</strong>seja conservar tudo àquilo em<br />

que acredita, e que julga ser o agente causal <strong>de</strong> ele haver conseguido atingir o<br />

patamar on<strong>de</strong> se encontra. Deseja também transmitir aos filhos aquele mesmo<br />

sistema <strong>de</strong> crenças e valores, para que eles, no futuro, tenham o mesmo tipo <strong>de</strong> vi<strong>da</strong><br />

"satisfatório". Mas e as outras <strong>classe</strong>s, os ricos e os pobres? Não po<strong>de</strong>m ter cultura<br />

própria e valores diferentes? Certamente que po<strong>de</strong>m, e <strong>de</strong> fato os tem. Mas existem<br />

razões para <strong>de</strong>scartá-las.<br />

O autor <strong>de</strong>ste artigo <strong>de</strong>scarta a <strong>classe</strong> rica como formadora <strong>da</strong> cultura<br />

nacional, em primeiro lugar porque ela é numericamente pequena, e em segundo<br />

lugar (e mais importante) porque, por suas características, a <strong>classe</strong> rica ten<strong>de</strong> à<br />

globalização e não à particularização. O rico tem recursos que lhe permitem<br />

prescindir <strong>da</strong> soli<strong>da</strong>rie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> vizinhos, do auxílio <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong><strong>de</strong> on<strong>de</strong> vive e do<br />

amparo dos órgãos <strong>de</strong> assistência do governo; ele po<strong>de</strong> ir estu<strong>da</strong>r no exterior e<br />

abeberar-se <strong>de</strong> numerosas fontes <strong>de</strong> cultura; via <strong>de</strong> regra fala mais <strong>de</strong> <strong>uma</strong> língua e<br />

viaja com freqüência; po<strong>de</strong> residir e sustentar-se on<strong>de</strong> <strong>de</strong>sejar, pois o capital é<br />

essencialmente apátri<strong>da</strong>. Assim sendo, os ricos ten<strong>de</strong>m a ser mais ci<strong>da</strong>dãos do<br />

mundo do que ci<strong>da</strong>dãos <strong>de</strong> seus países. Isto não é novo. No século XIX (bem antes<br />

do termo globalização entrar na mo<strong>da</strong>) não havia quase diferença nenh<strong>uma</strong> entre<br />

um aristocrata brasileiro e um aristocrata francês. Ambos tinham a mesma formação,<br />

falavam a mesma língua, circulavam nos mesmos ambientes. Por conseguinte, ao<br />

se procurar um exemplar que tipifique os ci<strong>da</strong>dãos <strong>de</strong> seu país, um indivíduo <strong>da</strong><br />

<strong>classe</strong> rica necessariamente é um exemplo mal escolhido. Po<strong>de</strong>-se <strong>de</strong>scartar<br />

igualmente a <strong>classe</strong> pobre como formadora <strong>da</strong> cultura nacional, por um motivo<br />

bastante simples: a <strong>classe</strong> pobre, como parte <strong>de</strong> seu esforço para sair <strong>de</strong> sua<br />

situação <strong>de</strong> carência, está constantemente a renegar sua própria cultura. Muitos<br />

<strong>de</strong>testarão ouvir isto, mas é fato. Isto ocorre porque a cultura não é <strong>uma</strong> escolha<br />

aleatória ou mera questão <strong>de</strong> preferência, mas algo ligado in<strong>de</strong>levelmente ao modo<br />

<strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, inclusive a nível material. Concor<strong>de</strong>-se ou não, melhorar <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> significa<br />

abandonar <strong>de</strong>terminados hábitos culturais e adquirir outros. A insistência em manter<br />

20


um modo <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> "tradicional" mesmo após enriquecer conduz a casos singulares e<br />

patológicos, como a elite árabe-saudita dos dias <strong>de</strong> hoje, que é riquíssima, mas vive<br />

<strong>de</strong> acordo com costumes arcaicos que foram inclusive atenuados por outros países<br />

árabes não tão ricos. Via <strong>de</strong> regra, para um pobre melhorar <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, ele tem que<br />

abandonar parte <strong>de</strong> sua i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> e cortar boa parte dos vínculos que o ligam a sua<br />

comuni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> origem. E a maioria faz isso, até, com prazer, pois não tem motivos<br />

para estar satisfeita com a vi<strong>da</strong> que leva. Um modo <strong>de</strong> subir na vi<strong>da</strong> é através do<br />

estudo. Po<strong>de</strong>mos imaginar <strong>uma</strong> comuni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> pescadores no interior, on<strong>de</strong> um<br />

menino consegue completar a escola. Este menino, mesmo que ain<strong>da</strong> resi<strong>da</strong> no<br />

local, certamente não terá muito diálogo com seus avós analfabetos, nem muito<br />

interesse por seu modo <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>. Outra maneira <strong>de</strong> subir é pelo <strong>de</strong>slocamento em<br />

direção a comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s mais ricas - a migração do campo para a ci<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

região para outra, ou <strong>de</strong> um país para outro - mas o indivíduo que se <strong>de</strong>sloca,<br />

necessariamente abandona parte <strong>da</strong> cultura <strong>de</strong> sua comuni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> origem, e adota<br />

parte <strong>da</strong> cultura <strong>de</strong> sua nova comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>. Em conseqüência disto tudo, a<br />

contribuição do pobre para a formação <strong>de</strong> <strong>uma</strong> i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong> cultural nacional é<br />

duvidosa. É difícil, mesmo, <strong>de</strong>finir o que seria a cultura <strong>da</strong> <strong>classe</strong> pobre, pois se trata<br />

<strong>de</strong> <strong>uma</strong> cultura mutante, indistinta, mista <strong>de</strong> costumes arcaicos e mo<strong>de</strong>rnos. Estu<strong>da</strong>r<br />

<strong>uma</strong> cultura em mutação (se não em extinção) po<strong>de</strong> ser interessante do ponto <strong>de</strong><br />

vista <strong>da</strong> Antropologia e <strong>da</strong> História, mas é pouco prático. Seria como tirar <strong>uma</strong> foto<br />

<strong>de</strong> <strong>uma</strong> multidão on<strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s pessoas estão em rápido movimento, e outras estão<br />

para<strong>da</strong>s. Como todo fotógrafo sabe, as imagens em movimento sairão borra<strong>da</strong>s, e<br />

as imagens estáticas sairão níti<strong>da</strong>s. As pessoas que estão imóveis neste hipotético<br />

retrato são a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> do país - a única que fixa os valores e os costumes, e<br />

que paulatinamente confere feições <strong>de</strong>finitivas ao país inteiro.<br />

A segun<strong>da</strong> conseqüência é o notável grau <strong>de</strong> semelhança entre as <strong>classe</strong>s<br />

<strong>média</strong>s <strong>de</strong> diversos países. Em termos <strong>de</strong> hábitos <strong>de</strong> consumo, é sempre a mesma<br />

coisa: a família tem <strong>uma</strong> casa, um carro, o pai tem um emprego, viajam nas férias,<br />

as crianças estão na escola, o filho tem <strong>uma</strong> guitarra ou coisa pareci<strong>da</strong>, a filha tem<br />

pelo menos alg<strong>uma</strong>s roupas <strong>de</strong> grife, etc. São pessoas que não vivem do capital, e<br />

sim do trabalho, mas que possuem um conjunto <strong>de</strong> bens consi<strong>de</strong>rados<br />

imprescindíveis a <strong>uma</strong> vi<strong>da</strong> "digna". Isto vale para a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> dos EUA, <strong>da</strong> Índia<br />

ou do Brasil. A diferença está na quali<strong>da</strong><strong>de</strong> intrínseca <strong>da</strong> ca<strong>da</strong> um <strong>de</strong>stes itens: a<br />

21


marca do carro, o tamanho <strong>da</strong> casa, qual o pacote turístico nas férias, o prazo do<br />

financiamento imobiliário, a quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> escola, do hospital, etc.<br />

Em “A Classe Média Universal” (2007), o autor <strong>de</strong>staca que o gran<strong>de</strong><br />

elemento formador <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> foi o imigrante, que já trazia consigo<br />

<strong>uma</strong> cultura <strong>de</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong>, a qual propugnava a melhoria <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> mediante o<br />

trabalho, o planejamento, a poupança e a aquisição <strong>de</strong> cultura (i<strong>de</strong>ais que<br />

contrastavam com o patrimonialismo do país colonial). Outro elemento formador <strong>da</strong><br />

<strong>classe</strong> <strong>média</strong> foram famílias ricas cujos filhos tradicionalmente tinham um diploma<br />

superior (mero adorno), mas que, com o tempo, foram per<strong>de</strong>ndo o patrimônio, <strong>de</strong><br />

modo que a profissão tornou-se a única fonte <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> dos <strong>de</strong>scen<strong>de</strong>ntes.<br />

No Brasil, segundo o Censo Demográfico 2000 e <strong>da</strong> POF 2003, po<strong>de</strong>-se<br />

consi<strong>de</strong>rar que hoje são cerca <strong>de</strong> 15,4 milhões <strong>de</strong> famílias, equivalente a 31,7% do<br />

total <strong>de</strong> famílias existentes no país. O que resulta em aproxima<strong>da</strong>mente 57,8<br />

milhões <strong>de</strong> pessoas. Sendo assim temos a ren<strong>da</strong> família per capita familiar variando<br />

entre 1,7 e 19,4 salários mínimos.<br />

Concentra<strong>da</strong>s em sua maioria na Região Su<strong>de</strong>ste (57,2%) e Sul (18,3%) do<br />

Brasil. O estado campeão no encontro <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> é no estado <strong>de</strong> São Paulo<br />

on<strong>de</strong> estão 33,8% <strong>de</strong>ssas famílias. Em segundo lugar vem o Rio <strong>de</strong> Janeiro com<br />

11,9% seguido <strong>de</strong> Minas Gerais com 9,8%, <strong>da</strong>dos também do Censo Demográfico<br />

2000 e <strong>da</strong> POF 2003.<br />

Consi<strong>de</strong>rando a contagem estadual <strong>de</strong>ste mesmo censo e pesquisa, os <strong>da</strong>dos<br />

<strong>de</strong> alguns estados surpreen<strong>de</strong>m. Das famílias resi<strong>de</strong>ntes no Distrito Fe<strong>de</strong>ral, 50%<br />

são consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>s <strong>de</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong>. Em São Paulo são 46,9%, em Santa Catarina<br />

41,3%, no Rio <strong>de</strong> Janeiro 39,9% e no Rio Gran<strong>de</strong> do Sul 36,5%. Em contraste, <strong>da</strong>s<br />

famílias <strong>de</strong> todo o Nor<strong>de</strong>ste Brasileiro, somente, 15,3% <strong>da</strong>s famílias po<strong>de</strong>m ser<br />

classifica<strong>da</strong>s <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong>ste grupo social.<br />

Em termos <strong>de</strong> hábitos <strong>de</strong> consumo, como citado no artigo referido acima, os<br />

hábitos <strong>de</strong> consumo <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> seguem um padrão. Seu consumo<br />

correspon<strong>de</strong> a 50% <strong>de</strong> todo o mercado consumidor brasileiro, <strong>da</strong>dos <strong>da</strong> POF 2003.<br />

Gastos com roupas, diversão, educação fazem parte <strong>de</strong>ste “padrão” <strong>de</strong> consumo e<br />

ganham dos gastos como, por exemplo, alimentação e saú<strong>de</strong>. Enquanto a <strong>classe</strong><br />

pobre gasta em torno <strong>de</strong> 31% dos seus gastos com alimentação, a <strong>classe</strong> media<br />

gasto pouco mais <strong>da</strong> meta<strong>de</strong> – 16,5%. Porém, quando se fala em educação, os<br />

números <strong>da</strong> <strong>classe</strong> pobre indicam somente 0,9% dos gastos para esse fim enquanto<br />

22


a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>de</strong>dica <strong>uma</strong> parcela <strong>de</strong> 3,9%. As <strong>de</strong>spesas com recreação e cultura<br />

chegam a 2,2% do total <strong>de</strong> <strong>de</strong>spesas contra apenas 1,0% na <strong>classe</strong> pobre, <strong>da</strong>dos<br />

retirados do Censo Demográfico 2000 e POF 2003.<br />

Segundo o economista Marcio Pochmann com base na POF 2003 o padrão<br />

<strong>de</strong> consumo <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> mudou, <strong>de</strong> 1987 a 2003 <strong>de</strong>spesas com<br />

alimentação caíram <strong>de</strong> 24,5% a 15,9%. Assim como vestiário, <strong>de</strong> 11% a 5% no<br />

mesmo período. Já as <strong>de</strong>spesas com habitação subiram <strong>de</strong> 17,6% a 29,5% bem<br />

como o transporte <strong>de</strong> 8,7% a 16,9%. Despesas com educação tiveram um pequeno<br />

aumento <strong>de</strong> 2,2% a 3,6%.<br />

Entre 1980 e 2000 a ren<strong>da</strong> <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> caiu <strong>de</strong> 32,2% para 23,1% sobre<br />

a ren<strong>da</strong> total <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> assalaria<strong>da</strong> urbana. Em contraparti<strong>da</strong> gastos como <strong>de</strong><br />

telefone e emprega<strong>da</strong> domésticas crescem. Educação, saú<strong>de</strong> e segurança que<br />

<strong>de</strong>veriam ser prestados pelo governo comprometem 31% dos gastos <strong>da</strong>s famílias<br />

(em 1980, essa porcentagem era <strong>de</strong> 12%). E <strong>de</strong>vido à diminuição <strong>da</strong> ren<strong>da</strong> e<br />

aumento <strong>da</strong>s <strong>de</strong>spesas, torna-se ca<strong>da</strong> vez mais difícil a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> manter seu<br />

padrão <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>.<br />

Mas, segundo Guiliano Guan<strong>da</strong>lini e Julia Duailibi em seu artigo “Congelaram<br />

a Classe Média”, <strong>de</strong> 17/12/2006 é visto que a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> está em crise.<br />

A proporção <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> no Brasil está praticamente estagna<strong>da</strong> há 25 anos. Ao<br />

fim <strong>de</strong> 2006, ela se encontra curva<strong>da</strong> sob <strong>uma</strong> brutal carga tributária, sufoca<strong>da</strong> por<br />

gastos com serviços como educação e saú<strong>de</strong> (que <strong>de</strong>veriam ser financiados pelos<br />

seus impostos) e quase inibi<strong>da</strong> em sua capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> poupar e adquirir patrimônio.<br />

Mas há um segundo aspecto na crise <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> – e ele não interessa apenas<br />

aos brasileiros que já pertencem a ela. Ao contrário do que vem acontecendo em<br />

países que estão chamando a atenção do mundo, quase não se observa expansão<br />

na <strong>classe</strong> <strong>média</strong> do Brasil.<br />

De 1980 para cá, apenas em dois breves períodos houve um aumento<br />

significativo <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong>: em 1986, com o Plano Cruzado, e <strong>de</strong>z anos<br />

<strong>de</strong>pois, como efeito do Real. Em ambos os momentos, a que<strong>da</strong> <strong>da</strong> inflação propiciou<br />

um aumento dos salários reais. Mas nas duas ocasiões os avanços foram<br />

transitórios – apenas soluços estatísticos. O país foi abalado por crises financeiras e<br />

os ganhos logo foram revertidos.<br />

"Após o Plano Real, entre 1995 e 1998, a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> subiu um <strong>de</strong>grau na<br />

pirâmi<strong>de</strong> <strong>de</strong> consumo. Des<strong>de</strong> então, não se moveu mais, diferentemente <strong>da</strong> <strong>classe</strong><br />

23


pobre", diz Margareth Utimura 9 , diretora do instituto <strong>de</strong> pesquisa LatinPanel. Mais<br />

impostos, mais gastos com serviços, mais imperativos <strong>de</strong> consumo fizeram com que<br />

a poupança <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>de</strong>sabasse. Segundo o IBGE, em 1987 as famílias do<br />

segmento conseguiam guar<strong>da</strong>r 11% <strong>de</strong> seus rendimentos e assim investir na<br />

ampliação do patrimônio próprio. Em 2003, esse porcentual recuou a míseros 4%.<br />

2.3 Cultura e <strong>investimento</strong> no Brasil<br />

O estilo <strong>de</strong> colonização <strong>brasileira</strong> e <strong>da</strong> formação <strong>da</strong> população nacional<br />

influenciou certamente a cultura no Brasil, presente ain<strong>da</strong> hoje. Des<strong>de</strong> a formação<br />

do país, a população esteve subjuga<strong>da</strong> a interesses <strong>de</strong> minorias oligárquicas, que<br />

controlavam o po<strong>de</strong>r, direta ou indiretamente, e eram beneficia<strong>da</strong>s em <strong>de</strong>trimento <strong>da</strong><br />

maioria dos indivíduos.<br />

Na área econômica, o panorama foi semelhante. Com o governo, muitas<br />

vezes, intervindo para proteger interesses <strong>de</strong> minorias que o pressionavam, com o<br />

intuito <strong>de</strong> obterem vantagens sob diversos aspectos. A população foi assola<strong>da</strong> pela<br />

inflação, que corroía os salários e o valor <strong>da</strong>s mercadorias, e os índices <strong>de</strong> preços<br />

como o IPCA 10 do IBGE e o IGP-M 11 , calculado pela FGV 12 , registraram variações<br />

anuais positivas superiores a 300% ao ano entre 1987 e 1993, segundo <strong>da</strong>dos do<br />

IPEA 13 . A moe<strong>da</strong> mudou <strong>de</strong> nome alg<strong>uma</strong>s vezes – Cruzeiro, Cruzado, Cruzado<br />

Novo – o que não garantiu o controle <strong>da</strong> inflação.<br />

Com tais instabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s políticas e econômicas, a população em geral não<br />

adquiriu a cultura <strong>da</strong> poupança, principalmente face aos longos períodos <strong>de</strong><br />

hiperinflação, época em que era preferível consumir a economizar para minimizar as<br />

per<strong>da</strong>s em função <strong>da</strong> <strong>de</strong>svalorização real <strong>da</strong> moe<strong>da</strong>.<br />

Esta afirmação po<strong>de</strong> ser reforça<strong>da</strong> segundo <strong>da</strong>dos do IBGE contidos na POF,<br />

sinalizando que apenas 4,52% do recebimento médio mensal familiar correspon<strong>de</strong>m<br />

a rendimentos provenientes <strong>de</strong> aplicações <strong>de</strong> capital, indicando que a formação <strong>de</strong><br />

poupança não é um traço marcante na cultura <strong>brasileira</strong>. Tal percentual chega a<br />

9<br />

Margareth Utimura, diretora do Instituto <strong>de</strong> pesquisas LatinPanel, cita<strong>da</strong> no artigo <strong>de</strong> Gua<strong>da</strong>lini e<br />

Duailibi (2006).<br />

10<br />

IPCA - Índice <strong>de</strong> Preços ao Consumidor Amplo<br />

11<br />

IGP-M - Índice Geral <strong>de</strong> Preços <strong>de</strong> Mercado<br />

12<br />

FGV – Fun<strong>da</strong>ção Getulio Vargas<br />

13<br />

IPEA - Instituto <strong>de</strong> Pesquisas Econômicas Aplica<strong>da</strong>s<br />

24


atingir 6,84% do recebimento mensal médio <strong>de</strong> famílias que ganham mais <strong>de</strong> 30<br />

salários mínimos, o que ain<strong>da</strong> po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado um patamar baixo, são <strong>da</strong>dos e<br />

opiniões <strong>de</strong> Almir Ferreira <strong>de</strong> Sousa e Caio Gragata Torralvo (2003).<br />

As instabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s político-econômicas também po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong>s<br />

fatores para explicar tamanho conservadorismo do brasileiro quando o assunto é<br />

<strong>investimento</strong>. Segundo <strong>da</strong>dos <strong>da</strong> ANBID 14 , contidos nas Estatísticas Diárias dos<br />

fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>, cerca <strong>de</strong> 60% <strong>de</strong> todos os recursos investidos na indústria<br />

<strong>de</strong> fundo <strong>de</strong> <strong>investimento</strong> no Brasil, em 19/08/2003, estavam <strong>de</strong>stinados a<br />

aplicações em ren<strong>da</strong> fixa e DI 15 , <strong>de</strong> baixíssimo risco. Ao mesmo tempo, apenas 6,6%<br />

do patrimônio <strong>da</strong> indústria <strong>de</strong> fundos estavam aplicados em fundos <strong>de</strong> ações e<br />

1,39%, em fundos cambiais, <strong>de</strong> maior risco.<br />

Para Souza e Torralvo (2003), gran<strong>de</strong> parte <strong>da</strong> população ain<strong>da</strong> opta por<br />

aplicações em ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança, tradicional <strong>investimento</strong> do mercado<br />

brasileiro caracterizado pelo baixo risco. No entanto, a rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> auferi<strong>da</strong> pelas<br />

ca<strong>de</strong>rnetas <strong>de</strong> poupança po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> insatisfatória e chega até, muitas<br />

vezes, a ficar abaixo <strong>da</strong> inflação medi<strong>da</strong> em <strong>de</strong>terminado período, o que implica<br />

per<strong>da</strong> <strong>de</strong> dinheiro em termos reais. Mesmo assim, os <strong>de</strong>pósitos em ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong><br />

poupança alcançaram R$ 138,8 bilhões em junho <strong>de</strong> 2003, <strong>de</strong> acordo com <strong>da</strong>dos<br />

presentes na Nota para Imprensa sobre Operações <strong>de</strong> Crédito no Sistema<br />

Financeiro Nacional do Banco Central do Brasil, publica<strong>da</strong> no site <strong>da</strong> Instituição<br />

(http://www.bcb.gov.br).<br />

Segundo o Jornal do Commercio do Rio <strong>de</strong> Janeiro (2005) 16 o Governo, junto<br />

com enti<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> mercado, batalha agora para <strong>de</strong>smistificar o mundo dos<br />

<strong>investimento</strong>s e para ven<strong>de</strong>r a imagem <strong>de</strong> que a economia do País está forte,<br />

consoli<strong>da</strong><strong>da</strong> e, principalmente, estabiliza<strong>da</strong>. Mas é difícil modificar a cultura <strong>de</strong><br />

<strong>investimento</strong>s <strong>de</strong> um País que passou por períodos <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> volatili<strong>da</strong><strong>de</strong>, com a<br />

bolha inflacionária como a <strong>brasileira</strong>, no final <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1980.<br />

O processo <strong>de</strong> toma<strong>da</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão com relação ao consumo tem influência<br />

direta sobre a administração financeira pessoal. Quando se <strong>de</strong>para com a<br />

possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> comprar <strong>uma</strong> mercadoria ou contratar um serviço, o consumidor é<br />

forçado a tomar <strong>uma</strong> <strong>de</strong>cisão: efetuar a compra e satisfazer um <strong>de</strong>sejo ou poupar.<br />

14 ANBID - Associação Nacional <strong>de</strong> Bancos <strong>de</strong> Investimento<br />

15 DI: Fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s pós -fixados que seguem taxas <strong>de</strong> juros do CDI<br />

16 Disponível em http://www.tra<strong>de</strong>rbrasil.com/imprensa/Commercio_040705-1.pdf<br />

25


Este processo po<strong>de</strong> tornar-se bastante complexo, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo do grau <strong>de</strong><br />

envolvimento do consumidor e <strong>da</strong>s influências a que estará submetido. Dentre estas,<br />

po<strong>de</strong>-se citar fatores psicológicos, culturais e sociais, além <strong>da</strong> influência <strong>de</strong><br />

campanhas <strong>de</strong> marketing. Cabe aos profissionais <strong>de</strong>ssa área “estimular a<br />

conscientização <strong>de</strong> seus consumidores sobre suas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s” (Engel, 2000,<br />

p.118) e transformar essas necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s “em <strong>de</strong>sejos, concentrando-se nos<br />

benefícios <strong>da</strong>s necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s atendi<strong>da</strong>s pelos produtos que estão comercializando”<br />

(Sandhusen, 2003, p.3) . Desta forma, quando os consumidores reconhecem <strong>uma</strong><br />

necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>, “eles geralmente se tornam mais receptivos à propagan<strong>da</strong> que eles<br />

antes po<strong>de</strong>riam ter ignorado completamente” (Engel, 2000, p.124).<br />

Para Paulo Ângelo Souza (2007) é claro que a cultura <strong>de</strong> poupança e<br />

<strong>investimento</strong> exige disciplina, planejamento e estratégia e, sendo assim, o valor<br />

<strong>de</strong>stacado para <strong>investimento</strong> tem que ser compatível e coerente com o orçamento<br />

pessoal, sem <strong>de</strong>sfalecer as finanças domesticas.<br />

Segundo o Jornal do Commercio do Rio <strong>de</strong> Janeiro (2005) o mercado<br />

acionário tem crescido, não só em número <strong>de</strong> investidores, mas <strong>de</strong> empresas<br />

abrindo o capital. No entanto, o Brasil ain<strong>da</strong> sofre muito com turbulências políticas e<br />

oscilações externas. O investidor estrangeiro também é fun<strong>da</strong>mental para a<br />

sustentação <strong>da</strong> BOVESPA 17 , porque o número <strong>de</strong> aplicadores pessoa física ain<strong>da</strong> é<br />

consi<strong>de</strong>rado muito baixo, principalmente se comparado ao americano. Essa<br />

ausência se <strong>de</strong>ve, em parte, pelo ganho fácil obtido com a taxa <strong>de</strong> juros, mas<br />

também pela falta <strong>de</strong> cultura <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s. Segundo Humberto Casagran<strong>de</strong><br />

Neto, presi<strong>de</strong>nte nacional <strong>da</strong> APIMEC 18 “[...] o povo brasileiro, em geral, não tem<br />

<strong>perfil</strong> <strong>de</strong> investidor [...]. É <strong>uma</strong> parcela irrisória <strong>da</strong> população que aposta em Bolsa. O<br />

brasileiro não tem cultura, como os norte-americanos, por exemplo, <strong>de</strong> investir em<br />

ren<strong>da</strong> variável.”<br />

Mas, segundo Jornal do Commercio do Rio <strong>de</strong> Janeiro (2005), as aplicações<br />

no País passam por <strong>uma</strong> transformação, lenta, gradual e segura. Imóveis e ouro –<br />

tradicionais <strong>investimento</strong>s em épocas <strong>de</strong> crise e gran<strong>de</strong>s turbulências - já não são as<br />

opções mais procura<strong>da</strong>s. O surgimento <strong>de</strong> diversos fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong> e o<br />

crescimento do mercado acionário tornam-se, aos poucos, alternativas viáveis.<br />

17 BOVESPA - Bolsa <strong>de</strong> Valores <strong>de</strong> São Paulo<br />

18 APIMEC - Associação <strong>de</strong> Analistas e Profissionais do Mercado <strong>de</strong> Capitais<br />

26


A seguir, veremos <strong>de</strong> maneira sucinta alg<strong>uma</strong>s alternativas que o investidor<br />

encontra no mercado financeiro brasileiro.<br />

2.3.1 Ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança<br />

Oferta<strong>da</strong> pela maioria dos bancos, a ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança é a mais<br />

tradicional forma <strong>de</strong> aplicação financeira do mercado brasileiro (Louis Frankenberg,<br />

1999, p.140-141). Mesmo após atravessar períodos difíceis, como no governo do<br />

presi<strong>de</strong>nte Collor, a ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança não per<strong>de</strong>u sua populari<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Muitas pessoas optam pelo <strong>investimento</strong> em ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança por esta<br />

oferecer segurança e liqui<strong>de</strong>z. Sua remuneração são os juros e seu rendimento é <strong>de</strong><br />

6% ao ano mais a TR 19 o que garante que o ganho ultrapasse a taxa <strong>de</strong> inflação.<br />

Além <strong>de</strong>ssas taxas, o fato <strong>de</strong> não incidir sobre ela o imposto <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> e ser isenta <strong>de</strong><br />

taxa <strong>de</strong> administração, torna-a vantajosa e interessante para muitas <strong>classe</strong>s sociais.<br />

Outra facili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança se <strong>de</strong>ve ao resgate do montante<br />

<strong>de</strong>positado nela. Mantendo o dinheiro na conta, ele ren<strong>de</strong> 6% ao ano, sendo o<br />

mesmo creditado com taxas <strong>de</strong> 0,5% ao mês a ca<strong>da</strong> 30 dias. Na necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ser<br />

resgatado o aplicador po<strong>de</strong> retirar todo ou parte do dinheiro per<strong>de</strong>ndo apenas o<br />

rendimento do mês já iniciado quando do saque (Louis Frankenberg, 1999, p.140-<br />

141)<br />

2.3.2 Fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s<br />

Atualmente existe a disposição no mercado brasileiro milhares <strong>de</strong> fundos <strong>de</strong><br />

<strong>investimento</strong>s e já são, segundo Mara Luquet e Andréa Assef (2007, p.47) em<br />

número maior do que o número <strong>de</strong> ações negocia<strong>da</strong>s na Bolsa <strong>de</strong> Valores. Com a<br />

que<strong>da</strong> nas taxas <strong>de</strong> juros na economia <strong>brasileira</strong> a tendência é que haja um<br />

crescimento na oferta, ca<strong>da</strong> vez maior na diversifica<strong>da</strong>, <strong>de</strong> fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>.<br />

Ca<strong>da</strong> um <strong>de</strong>sses fundos possui sua particulari<strong>da</strong><strong>de</strong>, sua política <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s e<br />

sua composição <strong>de</strong> carteira e po<strong>de</strong>m variar <strong>de</strong> fundos dos mais conservadores aos<br />

mais arrojados.<br />

19 TR – Taxa Referencial: <strong>uma</strong> taxa referencial dos juros calcula<strong>da</strong> pelo Banco Central do Brasil.<br />

27


Segundo Luquet e Assef (2007, p.12) “os fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s po<strong>de</strong>m ser<br />

comparados a um condomínio que reúne vários investidores com interesses<br />

comuns. Eles são o melhor caminho para quem tem pouco dinheiro ou pouco tempo<br />

para acompanhar mercados”.<br />

Po<strong>de</strong>mos dividir, basicamente, os fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s em duas gran<strong>de</strong>s<br />

categorias: ren<strong>da</strong> fixa (mais conservadores) e variável (com maiores riscos).<br />

Os estudos <strong>de</strong> Luquet e Assef (2007, p.19) montram que os fundos <strong>de</strong> ren<strong>da</strong><br />

fixa aparecem inicialmente, em 1982, para financiar o setor público. Hoje, meta<strong>de</strong> <strong>da</strong><br />

divi<strong>da</strong> publica é financia<strong>da</strong> por ele <strong>da</strong> seguinte forma: o governo emite títulos para<br />

captar recursos e se financiar e esses papéis são comprados por gestores ou<br />

investidores. São, também, <strong>uma</strong> maneira <strong>de</strong> financiar a aposentadoria e para tal<br />

finali<strong>da</strong><strong>de</strong>, já existem disponíveis no mercado fundos específicos como os PGBLs 20<br />

e VGBLs 21 . Po<strong>de</strong>m ser divididos em prefixados e pós-fixados.<br />

Os fundos pós-fixados, no mercado, são os chamados fundos DI e seguem<br />

taxas diárias <strong>de</strong> juros CDI 22 utiliza<strong>da</strong>s nas operações entre bancos (CDI). Sendo<br />

assim, esses fundos não correm riscos <strong>de</strong> oscilações na taxa <strong>de</strong> juros, pois se as<br />

taxas sobem os fundos acompanham (Luquet e Assef, 2007, p.26).<br />

Os prefixados são aqueles que acor<strong>da</strong>m previamente <strong>uma</strong> taxa entre o<br />

emissor e o comprador <strong>de</strong>sses papéis. Sendo que esses papéis po<strong>de</strong>m ser públicos<br />

ou privados. Ao contrário dos pós-fixados, sofrem o risco <strong>de</strong> oscilação <strong>da</strong> taxa<br />

básica <strong>de</strong> juros (Luquet e Assef, 2007, p.26).<br />

Os fundos <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> variável são compostos basicamente pelos fundos <strong>de</strong><br />

ações – que têm a maior parcela <strong>de</strong> seu patrimônio aplica<strong>da</strong> em ações negocia<strong>da</strong>s<br />

em bolsas <strong>de</strong> valores como a Bovespa – e alguns fundos <strong>da</strong> categoria <strong>de</strong><br />

multimercados – na qual estão à maioria dos fundos <strong>de</strong>rivativos (Luquet e Assef,<br />

2007, p.27).<br />

Os fundos <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> fixa são mais rentáveis quanto mais longos os prazos <strong>da</strong><br />

aplicação. Isso se teve ao fato <strong>de</strong> que a alíquota <strong>de</strong> IR 23 cai com o passar do tempo<br />

<strong>da</strong> aplicação.<br />

20 PGBL – Plano Gerador <strong>de</strong> Beneficio Livre<br />

21 VGBL – Vi<strong>da</strong> Gerador <strong>de</strong> Beneficio Livre<br />

22 CDI – Certificado <strong>de</strong> Depósito Interfinanceiro: Títulos <strong>de</strong> emissão <strong>de</strong> instituições financeiras com<br />

objetivo <strong>de</strong> transferir recursos entre estas instituições.<br />

23 IR – Imposto <strong>de</strong> Ren<strong>da</strong>: <strong>de</strong>dução obrigatória sobre as ren<strong>da</strong>s <strong>de</strong> <strong>uma</strong> pessoa ou empresa pagas ao<br />

governo.<br />

28


Outra maneira <strong>de</strong> se dividir os fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s é utilizar a<br />

classificação <strong>da</strong> CVM 24 . Esta classificação aju<strong>da</strong> no estudo <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong><br />

<strong>investimento</strong> já que os classifica com base na composição <strong>de</strong> suas carteiras. Essa<br />

divisão também po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> <strong>de</strong>vido ao fato <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong>s instituições<br />

financeiras também dividirem suas carteiras <strong>de</strong> fundos seguindo essas<br />

<strong>de</strong>nominações.<br />

Segundo a CVM os fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s divi<strong>de</strong>m-se em 25 :<br />

• Curto Prazo: São consi<strong>de</strong>rados fundos mais conservadores e indicados<br />

para <strong>investimento</strong>s <strong>de</strong> curtíssimo prazo, pois suas cotas são menos sensíveis às<br />

oscilações <strong>da</strong>s taxas <strong>de</strong> juros. Esses fundos investem seus recursos exclusivamente<br />

em títulos públicos fe<strong>de</strong>rais ou privados <strong>de</strong> baixo risco <strong>de</strong> crédito, com prazo máximo<br />

a <strong>de</strong>correr <strong>de</strong> papéis <strong>de</strong> 375 dias e o prazo máximo <strong>da</strong> carteira é <strong>de</strong> 60 dias. Esses<br />

títulos po<strong>de</strong>m ser <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> fixa, pós ou prefixados, e sua rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> esta<br />

geralmente liga<strong>da</strong> à taxa <strong>de</strong> juros usa<strong>da</strong> nas operações <strong>de</strong> bancos conheci<strong>da</strong> como<br />

CDI.<br />

• Referenciado: leva este nome por i<strong>de</strong>ntificarem em seu nome o indicador<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenho que sua carteira acompanha, po<strong>de</strong>ndo investir, no mínimo 80% <strong>de</strong><br />

sua carteira em títulos públicos fe<strong>de</strong>rais ou <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> fixa privados classificados na<br />

categoria <strong>de</strong> baixo risco <strong>de</strong> crédito. Os mais conhecidos fundos referenciados são os<br />

chamados DI que buscam acompanhar a variação diária <strong>da</strong>s taxas <strong>de</strong> juros SELIC 26<br />

ou CDI e são beneficiados na alta dos juros.<br />

• Ren<strong>da</strong> Fixa: ao contrário dos fundos referenciados DI são fundos<br />

beneficiados na redução <strong>da</strong>s taxas <strong>de</strong> juros. Os fundos <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> fixa aplicam no<br />

mínimo 80% do seu patrimônio em títulos <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> fixa prefixa<strong>da</strong> – que ren<strong>de</strong>m <strong>uma</strong><br />

taxa <strong>de</strong> juros previamente acor<strong>da</strong><strong>da</strong> – ou pós-fixa<strong>da</strong> – que acompanham a variação<br />

<strong>da</strong> taxa <strong>de</strong> juro ou índice <strong>de</strong> preços – e, além disso, utilizam instrumentos <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>rivativos com o objetivo <strong>de</strong> proteção.<br />

• Multimercados: são fundos que combinam <strong>investimento</strong>s nos mercados<br />

<strong>de</strong> ren<strong>da</strong> fixa, cambio, ações, entre outros e <strong>de</strong>vido a este fato envolve vários fatores<br />

<strong>de</strong> risco. Utilizam-se ativamente <strong>de</strong> instrumentos <strong>de</strong> <strong>de</strong>rivados para alavancagem <strong>de</strong><br />

24<br />

CVM - Comissão dos Valores Mobiliários: órgão fiscalizador <strong>de</strong> ativi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> bolsas <strong>de</strong> valores e<br />

pregões.<br />

25<br />

Disponível no site oficial <strong>da</strong> CVM: www.cvm.gov.br<br />

26<br />

SELIC – Sistema Especial <strong>de</strong> Liqui<strong>da</strong>ção e Custodia: é o <strong>de</strong>positário central dos títulos <strong>da</strong> dívi<strong>da</strong><br />

pública fe<strong>de</strong>ral interna.<br />

29


suas posições ou para proteção <strong>de</strong> suas carteiras. São fundos <strong>de</strong> alta flexibili<strong>da</strong><strong>de</strong> e<br />

por isso <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m muito do seu gestor.<br />

• Ações: são fundos indicados para quem tem objetivo <strong>de</strong> <strong>investimento</strong> <strong>de</strong><br />

longo prazo, pois investem pelo menos 67% <strong>de</strong> seu patrimônio em ações que são<br />

negocia<strong>da</strong>s na bolsa <strong>de</strong> valores. Por isso, estão sujeitos a oscilações <strong>de</strong> preços <strong>da</strong>s<br />

ações que compõem a sua carteira. Alguns <strong>de</strong>sses fundos têm como objetivo<br />

acompanhar a variação <strong>de</strong> índices do mercado <strong>de</strong> ações, como o IBOVESPA 27 e o<br />

IBX 28 .<br />

• Cambiais: são fundos que <strong>de</strong>vem manter no mínimo 80% do seu<br />

patrimônio investido em ativos relacionados direta ou indiretamente a variação <strong>de</strong><br />

preços <strong>de</strong> <strong>uma</strong> moe<strong>da</strong> estrangeira ou a <strong>uma</strong> taxa <strong>de</strong> juros (cupom cambial).<br />

• Divi<strong>da</strong> Externa: são fundos mantidos no exterior e que aplicam no mínimo<br />

80% <strong>de</strong> seu patrimônio em títulos do Brasil negociados no mercado internacional. O<br />

restante do patrimônio po<strong>de</strong> ser aplicado em títulos <strong>de</strong> créditos com transações no<br />

exterior.<br />

2.3.3 CDBs<br />

São Certificados <strong>de</strong> Depósitos Bancários (CDB´s) emitidos pelos bancos.<br />

Esses <strong>investimento</strong>s ren<strong>de</strong>m a <strong>uma</strong> taxa <strong>de</strong> juros prefixa<strong>da</strong> ou pós-fixa<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ndo <strong>da</strong> forma que foi negociado. Quem compra CDB está emprestando<br />

dinheiro ao banco em troca <strong>de</strong> rendimentos negociados, com o prazo mínimo <strong>de</strong> 30<br />

dias.<br />

2.3.4 Ações<br />

Segundo <strong>de</strong>finição <strong>da</strong> ANBID 29 , as ações são valores mobiliários que<br />

representam à proprie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> parte do capital social <strong>de</strong> <strong>uma</strong> empresa.<br />

Comprando <strong>uma</strong> ação o comprador está investindo em <strong>uma</strong> empresa, passa a ser<br />

acionista e ganha a participação nos resultados proporcionalmente à quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

27<br />

IBOVESPA – Índice <strong>da</strong> Bolsa <strong>de</strong> Valores <strong>de</strong> São Paulo<br />

28<br />

IBX – Índice Brasil<br />

29<br />

ANBID – Associação Nacional dos Bancos <strong>de</strong> Investimentos.<br />

30


cotas adquiri<strong>da</strong>s. Existem hoje no mercado, segundo a ANBID dois tipos <strong>de</strong> ações,<br />

são elas:<br />

• Ações ON: são as chama<strong>da</strong>s ações ordinárias normativas que dão a seus<br />

donos direito a votar nas assembléias <strong>da</strong> empresa, mas normalmente não dão a eles<br />

o direito a veto.<br />

• Ações PN: assim são chama<strong>da</strong>s as Ações Preferenciais Normativas.<br />

Essas ações são típicas do mercado brasileiro e são aquelas que não dão o direito<br />

do acionista a votar em assembléia. Porém, o dono <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> ação tem<br />

preferência no recebimento dos divi<strong>de</strong>ndos pagos pela empresa quando ela dá<br />

lucro. Essas ações têm maior liqui<strong>de</strong>z, pois permitem a empresa a emitir ações sem<br />

precisar ter sócios com direito a voto e assim não corre o risco <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r o controle<br />

<strong>da</strong> empresa. Porém, recentemente, <strong>uma</strong> lei estabeleceu o limite para a emissão<br />

<strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> ação como sendo <strong>uma</strong> ação PN para ca<strong>da</strong> ação ON.<br />

Segundo <strong>da</strong>dos do Artigo “Mercado <strong>de</strong> ações: hora <strong>de</strong> manter sangue frio” 30<br />

<strong>de</strong> 11 <strong>de</strong> maio <strong>de</strong> 2004 as pessoas físicas que aplicam em bolsa têm aumentado<br />

consi<strong>de</strong>ravelmente. Em janeiro <strong>de</strong> 2003 o grupo representava 24% dos investidores.<br />

No final <strong>de</strong> março, a quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> pessoas físicas na BOVESPA saltou para 29%.<br />

Contudo, as oscilações do IBOVESPA no mês <strong>de</strong> abril, gera<strong>da</strong>s pela insegurança<br />

interna e externa, provocou <strong>uma</strong> redução <strong>de</strong> 29,2% para 26,9% <strong>da</strong> participação <strong>de</strong><br />

pessoas físicas. No período, os principais índices que compõem a Bolsa registraram<br />

<strong>de</strong>sempenho negativo. Nos três primeiros meses <strong>de</strong> 2004, o IBOVESPA obteve <strong>uma</strong><br />

variação no vermelho <strong>de</strong> 11,8%.<br />

Apesar <strong>da</strong> alta volatili<strong>da</strong><strong>de</strong> do mercado <strong>de</strong> ações, Humberto Casagran<strong>de</strong>, <strong>da</strong><br />

APIMEC 31 diz que “quem fica em apuros no mercado acionário, são somente os que<br />

fizeram a aposta erra<strong>da</strong>”. E classifica que, um <strong>investimento</strong> na bolsa é bem feito<br />

quando o aplicador presta atenção em três aspectos:<br />

1 – O recurso disponível para a compra <strong>de</strong> ações não é necessário para<br />

outros quesitos mais importantes como pagamento <strong>de</strong> contas fixas como aluguel,<br />

alimentação, estudos, etc.;<br />

2 – O investidor procura <strong>uma</strong> empresa com fun<strong>da</strong>mentos solidificados para<br />

compor a carteira <strong>de</strong> ações;<br />

3 – A visão do <strong>investimento</strong> é em longo prazo.<br />

30 Disponível em www.acionista.com.br<br />

31 APIMEC – Associação dos Analistas e Profissionais <strong>de</strong> Investimentos do Mercado <strong>de</strong> Capitais.<br />

31


O presi<strong>de</strong>nte a APIMEC-SUL, Lucio Flavio ain<strong>da</strong> acrescenta que é necessário<br />

<strong>de</strong>svencilhar a Bolsa <strong>de</strong> Valores com os títulos <strong>da</strong>s empresas.<br />

"É errado dizer que aplicamos em Bolsa. Na ver<strong>da</strong><strong>de</strong> a BOVESPA é um<br />

local em que profissionais atuam e dão liqui<strong>de</strong>z às ações <strong>da</strong>s empresas. Os<br />

investidores compram as ações <strong>de</strong>stas empresas. Nesse caso, a Bolsa<br />

po<strong>de</strong> até estar volátil, mas existem companhias que são estáveis e têm<br />

bons fun<strong>da</strong>mentos".<br />

Ele também parte <strong>da</strong> mesma opinião <strong>de</strong> que as aplicações <strong>de</strong>vem ser<br />

efetua<strong>da</strong>s com visão <strong>de</strong> longo prazo e explica que os receios existem, pois to<strong>da</strong>s as<br />

pessoas são avessas ao risco.<br />

2.4 Risco <strong>de</strong> <strong>investimento</strong><br />

Risco po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finido, segundo a Wikipédia 32 , como a tentativa <strong>de</strong> se medir<br />

o grau <strong>de</strong> incerteza na obtenção do retorno esperado em <strong>uma</strong> <strong>de</strong>termina<strong>da</strong><br />

aplicação financeira ou <strong>investimento</strong> realizado. É a possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s coisas não<br />

saírem conforme o planejado. Vai sempre existir, por melhor que tenha sido o<br />

planejamento, porque é <strong>de</strong>rivado do fato <strong>de</strong> o futuro ser incerto.<br />

Dessa forma, ain<strong>da</strong> segundo informações <strong>da</strong> Wikipedia, os <strong>investimento</strong>s<br />

po<strong>de</strong>m ser classificados como <strong>de</strong> baixo, médio e alto risco. Geralmente,<br />

<strong>investimento</strong>s <strong>de</strong> baixo risco apresentam um maior nível <strong>de</strong> segurança ao investidor,<br />

mas em contraparti<strong>da</strong> cost<strong>uma</strong>m ter um retorno menor. Investimentos <strong>de</strong> alto risco,<br />

por outro lado, po<strong>de</strong>m trazer um retorno mais alto, mas com um grau muito maior <strong>de</strong><br />

incerteza, po<strong>de</strong>ndo até mesmo trazer prejuízos aos investidores.<br />

Segundo Roberto Spolidoro Gomes em artigo publicado na Revista<br />

Negócios 33 , o mercado financeiro brasileiro consi<strong>de</strong>ra basicamente três tipos <strong>de</strong><br />

perfis <strong>de</strong> investidores quanto a tolerância ao risco dos <strong>investimento</strong>s: o agressivo, o<br />

mo<strong>de</strong>rado e o conservador.<br />

O agressivo está disposto a tudo para alavancar seu patrimônio. Ele encara<br />

qualquer <strong>de</strong>safio e sabe que para ter a melhor rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong>, também se corre o<br />

maior risco. Não, propriamente, o risco <strong>de</strong> zerar o capital, mas <strong>de</strong> ter <strong>uma</strong><br />

rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> negativa em algum mês.<br />

32 Wikipédia – Enciclopédia eletrônica disponível em www.wikipedia.org.br<br />

33 Disponível em: http://www.revistanegocios.com.br/ver_noticias.asp?cat=7&nt=480<br />

32


O mo<strong>de</strong>rado também quer a alavancagem do capital, mas tem medo <strong>de</strong> ter a<br />

famosa rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> negativa, mas mesmo assim topa arriscar um pouco.<br />

Já o conservador, não quer nem saber <strong>de</strong> bolsa, dólar ou qualquer outro<br />

<strong>investimento</strong> <strong>de</strong> alavancagem. Acha tudo isto <strong>uma</strong> loucura e pensa que bolsa é<br />

“cassino”. Prefere ficar nos tradicionais CDBs e ren<strong>da</strong>s fixas.<br />

2.4.1 Tipos <strong>de</strong> riscos<br />

Segundo o Unibanco Global Risk Management <strong>de</strong> Antonio Marcos Duarte<br />

Junior as novas tendências <strong>de</strong> gerenciamento <strong>de</strong> riscos <strong>de</strong>vem aten<strong>de</strong>r aos<br />

seguintes tipos <strong>de</strong> riscos:<br />

1) Risco <strong>de</strong> Mercado;<br />

2) Risco <strong>de</strong> Crédito;<br />

3) Risco Operacional;<br />

4) Risco Legal.<br />

2.4.1.1 Risco <strong>de</strong> mercado<br />

O risco <strong>de</strong> mercado po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finido como <strong>uma</strong> medi<strong>da</strong> numérica <strong>da</strong><br />

incerteza relaciona<strong>da</strong> aos retornos esperados <strong>de</strong> um <strong>investimento</strong>, em <strong>de</strong>corrência<br />

<strong>de</strong> variações em fatores como taxas <strong>de</strong> juros, taxas <strong>de</strong> câmbio, preços <strong>de</strong> ações e<br />

commodities 34 .<br />

As principais subáreas do risco <strong>de</strong> mercado são:<br />

1) Risco <strong>de</strong> Taxas <strong>de</strong> Juros;<br />

2) Risco <strong>de</strong> Taxas <strong>de</strong> Câmbio;<br />

3) Risco <strong>de</strong> Commodities;<br />

4) Risco <strong>de</strong> Ações;<br />

5) Risco <strong>de</strong> Liqui<strong>de</strong>z;<br />

6) Risco <strong>de</strong> Derivativos;<br />

7) Risco <strong>de</strong> Hedge;<br />

8) Risco <strong>de</strong> Concentração (mercado).<br />

34 Commdities: Títulos correspon<strong>de</strong>ntes a negociações com produtos agropecuários, metais, minérios<br />

e outros produtos primários nas bolsas <strong>de</strong> mercadorias.<br />

33


2.4.1.1.1 Risco <strong>de</strong> taxas <strong>de</strong> juros<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong> no valor econômico <strong>de</strong> <strong>uma</strong> carteira <strong>de</strong>corrente dos efeitos <strong>de</strong><br />

mu<strong>da</strong>nças adversas <strong>da</strong>s taxas <strong>de</strong> juros.<br />

2.4.1.1.2 Risco <strong>de</strong> taxas <strong>de</strong> câmbio<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido a mu<strong>da</strong>nças adversas nas taxas <strong>de</strong> câmbio.<br />

2.4.1.1.3 Risco <strong>de</strong> commodities<br />

commodities.<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido a mu<strong>da</strong>nças no valor <strong>de</strong> mercado <strong>de</strong> carteiras <strong>de</strong><br />

2.4.1.1.4 Risco <strong>de</strong> ações<br />

ações.<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido a mu<strong>da</strong>nças no valor <strong>de</strong> mercado <strong>de</strong> carteiras <strong>de</strong><br />

2.4.1.1.5 Risco <strong>de</strong> liqui<strong>de</strong>z<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido à incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> se <strong>de</strong>sfazer rapi<strong>da</strong>mente <strong>uma</strong><br />

posição, ou obter “funding” 35 , <strong>de</strong>vido às condições <strong>de</strong> mercado.<br />

2.4.1.1.6 Risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>rivativos<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido ao uso <strong>de</strong> <strong>de</strong>rivativos (seja para especulação, seja<br />

para “hedge” 36 ).<br />

35<br />

“Funding”: Termo do mercado financeiro que normalmente signifi ca a substituição <strong>de</strong> <strong>uma</strong> dívi<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

curto prazo por <strong>uma</strong> dívi<strong>da</strong> <strong>de</strong> longo prazo.<br />

36<br />

“Hedge”: é <strong>uma</strong> forma <strong>de</strong> proteger <strong>uma</strong> aplicação contra as oscilações do mercado. O investidor<br />

que faz um “hedge” admite que está assumindo <strong>uma</strong> posição <strong>de</strong>risco e que po<strong>de</strong> não ganhar tudo<br />

aquilo que espera mas, pelo menos, ele se protege e não per<strong>de</strong> tudo (Antonio Gonçalves, Instituto<br />

Bennet).<br />

34


2.4.1.1.7 Risco <strong>de</strong> Hedge<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido ao uso inapropriado <strong>de</strong> instrumentos para “hedge”.<br />

2.4.1.1.8 Risco <strong>de</strong> concentração (mercado)<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido à não diversificação do risco <strong>de</strong> mercado <strong>de</strong> carteiras<br />

<strong>investimento</strong>s.<br />

2.4.1.2 Risco <strong>de</strong> crédito<br />

O risco <strong>de</strong> crédito po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finido como <strong>uma</strong> medi<strong>da</strong> numérica <strong>da</strong> incerteza<br />

relaciona<strong>da</strong> ao recebimento <strong>de</strong> um valor contratado/compromissado, a ser pago por<br />

um tomador <strong>de</strong> um empréstimo, contraparte <strong>de</strong> um contrato ou emissor <strong>de</strong> um título,<br />

<strong>de</strong>sconta<strong>da</strong>s as expectativas <strong>de</strong> recuperação e realização <strong>de</strong> garantias.<br />

As principais subáreas do risco <strong>de</strong> crédito são:<br />

1) Risco <strong>de</strong> Inadimplência.<br />

2) Risco <strong>de</strong> Degra<strong>da</strong>ção <strong>de</strong> Crédito.<br />

3) Risco <strong>de</strong> Degra<strong>da</strong>ção <strong>de</strong> Garantias<br />

4) Risco Soberano<br />

5) Risco <strong>de</strong> Financiador.<br />

6) Risco <strong>de</strong> Concentração (crédito).<br />

2.4.1.2.1 Risco <strong>de</strong> inadimplência<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong> pela incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> pagamento do tomador <strong>de</strong> um<br />

empréstimo, contraparte <strong>de</strong> um contrato ou emissor <strong>de</strong> um título.<br />

2.4.1.2.2 Risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>gra<strong>da</strong>ção <strong>de</strong> crédito<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s pela <strong>de</strong>gra<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> quali<strong>da</strong><strong>de</strong> creditícia do tomador <strong>de</strong> um<br />

empréstimo, contraparte <strong>de</strong> <strong>uma</strong> transação ou emissor <strong>de</strong> um título, levando a <strong>uma</strong><br />

diminuição no valor <strong>de</strong> suas obrigações.<br />

35


2.4.1.2.3 Risco <strong>de</strong> <strong>de</strong>gra<strong>da</strong>ção <strong>da</strong>s garantias<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s pela <strong>de</strong>gra<strong>da</strong>ção <strong>da</strong> quali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong>s garantias ofereci<strong>da</strong>s por<br />

um tomador <strong>de</strong> um empréstimo, contraparte <strong>de</strong> <strong>uma</strong> transação ou emissor <strong>de</strong> um<br />

título.<br />

2.4.1.2.4 Risco soberano<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s pela incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> um tomador <strong>de</strong> um empréstimo,<br />

contraparte <strong>de</strong> <strong>uma</strong> transação ou emissor <strong>de</strong> um título, em honrar seus<br />

compromissos em função <strong>de</strong> restrições impostas por seu país se<strong>de</strong>.<br />

2.4.1.2.5 Risco <strong>de</strong> financiador<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s por inadimplência do financiador <strong>de</strong> <strong>uma</strong> transação,<br />

potencializa<strong>da</strong> quando o contrato não contempla acordo <strong>de</strong> liqui<strong>da</strong>ção por<br />

compensação <strong>de</strong> direitos e obrigações (nettiag agreement).<br />

2.4.1.2.6 Risco <strong>de</strong> concentração (crédito)<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s em <strong>de</strong>corrência <strong>da</strong> não diversificação <strong>de</strong> risco <strong>de</strong> crédito <strong>de</strong><br />

<strong>investimento</strong>s.<br />

2.4.1.3 Risco operacional<br />

O risco operacional po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finido como <strong>uma</strong> medi<strong>da</strong> numérica <strong>da</strong><br />

incerteza dos retornos <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição caso seus sistemas, práticas e medi<strong>da</strong>s <strong>de</strong><br />

controle não sejam capazes <strong>de</strong> resistir à falhas h<strong>uma</strong>nas, <strong>da</strong>nos à infra-estrutura <strong>de</strong><br />

suporte, utilização in<strong>de</strong>vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los matemáticos ou produtos, alterações no<br />

ambiente dos negócios, ou a situações adversas <strong>de</strong> mercado.<br />

As principais subáreas do risco operacional são:<br />

1) Risco <strong>de</strong> Overload.<br />

2) Risco <strong>de</strong> Obsolescência.<br />

36


3) Risco <strong>de</strong> Presteza e Confiabili<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

4) Risco <strong>de</strong> Equipamento.<br />

5) Risco <strong>de</strong> Erro Não Intencional.<br />

6) Risco <strong>de</strong> Frau<strong>de</strong>.<br />

7) Risco <strong>de</strong> Qualificação.<br />

8) Risco <strong>de</strong> Produtos & Serviços.<br />

9) Risco <strong>de</strong> Regulamentação.<br />

10) Risco <strong>de</strong> Mo<strong>de</strong>lagem.<br />

11) Risco <strong>de</strong> Liqui<strong>da</strong>ção Financeira.<br />

12) Risco Sistêmico.<br />

13) Risco <strong>de</strong> Concentração (Operacional).<br />

14) Risco <strong>de</strong> imagem.<br />

15) Risco <strong>de</strong> Catástrofe.<br />

2.4.1.3.1 Risco <strong>de</strong> Overload<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s por sobrecargas nos sistemas elétricos, telefônico, <strong>de</strong><br />

processamento <strong>de</strong> <strong>da</strong>dos, etc.<br />

2.4.1.3.2 Risco <strong>de</strong> obsolescência<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s pela não substituição freqüente dos equipamentos e<br />

softwares antigos.<br />

2.4.1.3.3 Risco <strong>de</strong> presteza e confiabili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

Riscos <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s pelo fato <strong>de</strong> informações não po<strong>de</strong>rem ser recebi<strong>da</strong>s,<br />

processa<strong>da</strong>s, armazena<strong>da</strong>s e transmiti<strong>da</strong>s em tempo hábil e <strong>de</strong> forma confiável.<br />

2.4.1.3.4 Risco <strong>de</strong> equipamento<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s por falhas nos equipamentos elétricos, <strong>de</strong> processamento e<br />

transmissão <strong>de</strong> <strong>da</strong>dos, telefônicos, <strong>de</strong> segurança, etc.<br />

37


2.4.1.3.5 Risco <strong>de</strong> erro não intencional<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> equívoco, omissão, distração ou<br />

negligência <strong>de</strong> funcionários.<br />

2.4.1.3.6 Risco <strong>de</strong> frau<strong>de</strong>s<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> comportamentos fraudulentos<br />

(adulteração <strong>de</strong> controles, <strong>de</strong>scumprimento intencional <strong>de</strong> normas <strong>da</strong> empresa,<br />

<strong>de</strong>svio <strong>de</strong> valores, divulgação <strong>de</strong> informações erra<strong>da</strong>s, etc.).<br />

2.4.1.3.7 Risco <strong>de</strong> qualificação<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s pelo fato <strong>de</strong> funcionários <strong>de</strong>sempenharem tarefas sem<br />

qualificação profissional apropria<strong>da</strong> à função.<br />

2.4.1.3.8 Risco <strong>de</strong> produtos e serviços<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s em <strong>de</strong>corrência <strong>da</strong> ven<strong>da</strong> <strong>de</strong> produtos ou prestação <strong>de</strong><br />

serviços ocorrerem <strong>de</strong> forma in<strong>de</strong>vi<strong>da</strong> ou sem aten<strong>de</strong>r às necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s e <strong>de</strong>man<strong>da</strong>s<br />

<strong>de</strong> clientes.<br />

2.4.1.3.9 Risco <strong>de</strong> regulamentação<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> alterações, improprie<strong>da</strong><strong>de</strong>s ou<br />

inexistência <strong>de</strong> normas para controles internos ou externos.<br />

2.4.1.3.10 Risco <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>lagem<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s pelo <strong>de</strong>senvolvimento, utilização ou interpretação incorreta<br />

dos resultados fornecidos por mo<strong>de</strong>los, incluindo a utilização <strong>de</strong> <strong>da</strong>dos incorretos.<br />

38


2.4.1.3.11 Risco <strong>de</strong> liqui<strong>da</strong>ção financeira<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> filas nos procedimentos e controles <strong>de</strong><br />

finalização <strong>da</strong>s transações.<br />

2.4.1.3.12 Risco sistêmico<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido a alterações no ambiente operacional.<br />

2.4.1.3.13 Risco <strong>de</strong> concentração (operacional)<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s por <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r <strong>de</strong> poucos produtos, clientes e/ou mercados.<br />

2.4.1.3.14 Risco <strong>de</strong> imagem<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s em <strong>de</strong>corrência <strong>de</strong> alterações <strong>da</strong> reputação junto a clientes,<br />

concorrentes, órgãos governamentais, etc.<br />

2.4.1.3.15 Risco <strong>de</strong> catástrofe<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido a catástrofes (naturais ou não).<br />

2.4.1.4 Risco legal<br />

O risco legal po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>finido como <strong>uma</strong> medi<strong>da</strong> numérica <strong>da</strong> incerteza dos<br />

retornos <strong>de</strong> <strong>uma</strong> instituição caso seus contratos não possam ser legalmente<br />

amparados por falta <strong>de</strong> representativi<strong>da</strong><strong>de</strong> por parte <strong>de</strong> um negociador, por<br />

documentação insuficiente, insolvência ou ilegali<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

As principais subáreas do risco legal são:<br />

1) Risco <strong>de</strong> Legislação.<br />

2) Risco Tributário.<br />

3) Risco <strong>de</strong> Contrato.<br />

39


2.4.1.4.1 Risco <strong>de</strong> legislação<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> sanções por reguladores e in<strong>de</strong>nizações por<br />

<strong>da</strong>nos a terceiros por violação <strong>da</strong> legislação vigente.<br />

2.4.1.4.2 Risco tributário<br />

tributos.<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>vido a criação ou nova interpretação <strong>da</strong> incidência <strong>de</strong><br />

2.4.1.4.3 Risco <strong>de</strong> contrato<br />

Risco <strong>de</strong> per<strong>da</strong>s <strong>de</strong>correntes <strong>de</strong> julgamentos <strong>de</strong>sfavoráveis por contratos<br />

omissos, mal redigidos ou sem o <strong>de</strong>vido amparo legal.<br />

2.5 Cultura do medo<br />

Todos sabem que o medo é <strong>uma</strong> reação protetora e saudável do ser h<strong>uma</strong>no.<br />

O medo "normal" vem <strong>de</strong> estímulos reais <strong>de</strong> ameaça à vi<strong>da</strong>. A ca<strong>da</strong> situação nova,<br />

inespera<strong>da</strong>, que representa um perigo, surge o medo. Mas e quando tudo tem<br />

causado medo e não conseguimos agir? Todo mundo teme algo - assaltos, aviões,<br />

seqüestro, doença, <strong>de</strong>ntista, cirurgia, dor, solidão, entre outros. Claro que a<br />

intensi<strong>da</strong><strong>de</strong> do medo será intensifica<strong>da</strong> pelo histórico <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> um.<br />

No mundo oci<strong>de</strong>ntal nascemos e crescemos n<strong>uma</strong> cultura do medo. Em<br />

nenhum momento <strong>da</strong> história ou nas socie<strong>da</strong><strong>de</strong>s contemporâneas, tantas pessoas<br />

tiveram tanto medo. O sociólogo Barry Glasser (1999) em seu livro Cultura do medo<br />

tem o gran<strong>de</strong> mérito <strong>de</strong> revelar como se <strong>da</strong> à extraordinária manipulação <strong>de</strong> nossas<br />

atitu<strong>de</strong>s e, a partir <strong>da</strong>í, como se <strong>de</strong>u o fantástico aumento <strong>da</strong> percepção do medo.<br />

É certo que medo, baseado em avaliações reais, é um instrumento no auxilio<br />

ao escape ou enfrentamento <strong>de</strong> perigos reais. O falso medo, porém, aquele baseado<br />

em estimativas irrealistas, é fonte <strong>de</strong> sofrimento e <strong>de</strong>termina políticas equivoca<strong>da</strong>s<br />

(Paulo Sergio Pinheiro, 2003, p.12).<br />

Segundo Pinheiro (2003, p.13) é útil <strong>de</strong>terminarmos qual é o padrão<br />

americano <strong>de</strong> violência – e trabalhá-lo comparativamente – já que os Estados<br />

40


Unidos e o Brasil têm muito em comum quanto à violência: entre os <strong>de</strong>z países mais<br />

industrializados, ambos têm as mais altas taxas <strong>de</strong> homicídios. Nos Estados Unidos<br />

a taxa é <strong>de</strong> 8,22 e no Brasil 25 homicídios por 100 mil habitantes ao ano.<br />

“Quanto melhor as estatísticas, mais pessimista a população se torna”<br />

(Pinheiro, 2003, p.13). Um dos mais graves paradoxos <strong>de</strong>sta contradição é induzir a<br />

população e os governos a ignorarem fatores que aliviam os temores, o que acaba<br />

por contribuir para que tudo aquilo que tanto se teme torne-se reali<strong>da</strong><strong>de</strong>. A<br />

causali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> violência nunca se <strong>de</strong>ve a um único fator, mas sempre a um conjunto<br />

<strong>de</strong> fatores em contextos preciosos. Nos Estados Unidos, como no Brasil, a violência<br />

interpessoal esta profun<strong>da</strong>mente liga<strong>da</strong> na enorme <strong>de</strong>sigual<strong>da</strong><strong>de</strong>. A essa<br />

<strong>de</strong>sigual<strong>da</strong><strong>de</strong> material soma-se a social, que no Brasil tem mostrado gran<strong>de</strong><br />

estabili<strong>da</strong><strong>de</strong> nos últimos 20 anos, não se percebendo nenh<strong>uma</strong> diferença entre o<br />

período <strong>da</strong> ditadura militar e o subseqüente, <strong>de</strong> <strong>de</strong>mocracia, quanto ao tratamento<br />

<strong>da</strong> <strong>de</strong>scendência africana. Não se preten<strong>de</strong> com isso afirmar que as <strong>de</strong>sigual<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

econômicas, sociais e raciais sejam a causa <strong>da</strong> violência. De qualquer modo, a<br />

pobreza tem estreita correlação com a violência contra as crianças, o crime e o uso<br />

<strong>de</strong> drogas (Glassner, 1999, p.13).<br />

Quando maior a diferença entre ricos e pobres n<strong>uma</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, mais altas<br />

são as taxas <strong>de</strong> mortali<strong>da</strong><strong>de</strong> por doenças cardíacas, câncer e homicídios. A<br />

combinação <strong>de</strong> <strong>de</strong>sigual<strong>da</strong><strong>de</strong> e pobreza extrema é sempre explosiva.<br />

A percepção <strong>de</strong> que o crime está aumentando leva os americanos a comprar<br />

e portar mais armas e este é mais um <strong>da</strong>do que aproxima o Brasil e os Estados<br />

Unidos: a maioria dos homicídios nos dois países é perpetra<strong>da</strong> com armas <strong>de</strong> fogo.<br />

Mas, por que há tanto temor na socie<strong>da</strong><strong>de</strong> e quais dos medos a que esta<br />

submeti<strong>da</strong> não tem fun<strong>da</strong>mento? Segundo Glassner (1999, pg. 14) “apren<strong>de</strong>r a<br />

i<strong>de</strong>ntificar os medos exagerados ou falsos [...] apren<strong>de</strong>r a distinguir entre<br />

acontecimentos isolados ou rumores e aqueles legitimamente ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros”. Várias<br />

hipóteses são elabora<strong>da</strong>s simplesmente pelo bom senso, como a <strong>da</strong><br />

responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> mídia, especialmente a televisão e a cobertura <strong>da</strong><strong>da</strong> ao crime.<br />

Evi<strong>de</strong>ntemente qualquer estudo sobre a cultura do medo que <strong>de</strong>ixasse <strong>de</strong> lado os<br />

efeitos e a influencia <strong>da</strong> mídia sobre o comportamento dos ci<strong>da</strong>dãos seria<br />

incompleto (Pinheiro, 2003, p.14). Os percentuais estatísticos que impressionam e<br />

apavoram muitas vezes não contem números confiáveis, e preten<strong>de</strong>m ser vali<strong>da</strong>ção<br />

cientifica <strong>de</strong> ocorrências pouco significativas. Quase todos os pavores disseminados<br />

41


entre os americanos surgem <strong>da</strong> tendência <strong>de</strong> tratar como causa do perigo não as<br />

distorções sociais mais inquietantes, mas as práticas isola<strong>da</strong>s perpetra<strong>da</strong>s por<br />

indivíduos perturbados, em especial tudo que diga respeito aos aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong><br />

trânsito. Deste modo, políticas públicas totalmente insanas passam bati<strong>da</strong>s<br />

enquanto a atenção <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong> se concentra na insani<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> alguns indivíduos<br />

isolados.<br />

Segundo Glassner (1999, pg. 75) “se o mistério sobre pânicos infun<strong>da</strong>dos<br />

inclui o fato <strong>de</strong> como eles são vendidos a pessoas que sofrem <strong>de</strong> perigos reais com<br />

os quais se preocupar, no caso <strong>de</strong> temores mais justificáveis a questão é um pouco<br />

diferente”.<br />

A questão <strong>de</strong> problemas como criminali<strong>da</strong><strong>de</strong>, o consumo <strong>de</strong> drogas, o abuso<br />

<strong>de</strong> crianças, doenças graves e outras calami<strong>da</strong><strong>de</strong>s são como estas nos atrapalham<br />

sobre a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira natureza e extensão dos fatos. São problemas existentes na<br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong> atual, porém, será que o medo diante <strong>de</strong> situações tão críticas e<br />

avassaladoras, é ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iro? Será que o que sentimos é <strong>uma</strong> reação psicológica <strong>de</strong><br />

nosso corpo ou simplesmente <strong>uma</strong> reação à maneira <strong>de</strong> como os fatos nos são<br />

apresentados?<br />

Diante <strong>de</strong> tamanha dúvi<strong>da</strong> Glassner (1999), em seu livro, dispõe alg<strong>uma</strong>s<br />

histórias reais on<strong>de</strong> fatos são apresentados.<br />

2.5.1 Perigos duvidosos no trânsito e nas universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

“Comece com receios bobos, risíveis se não fossem apresentados com<br />

serie<strong>da</strong><strong>de</strong> absoluta por organizações influentes, políticos e imprensa.<br />

Promovidos pelos mesmos meios que os outros medos – e freqüentemente<br />

com os mesmos fins – representam um confortável ponto <strong>de</strong> entra<strong>da</strong> na<br />

sacola dos truques dos arautos do medo. Torna-se mais fácil, reconhecer<br />

como somos enganados a respeito <strong>de</strong> preocupações sérias, <strong>de</strong>pois que<br />

vemos as mesmas técnicas funcionarem na promoção <strong>de</strong> perigos frívolos.<br />

37 ”<br />

A mídia americana relata fatos a sua população <strong>de</strong> maneira alarmista. Aos<br />

aci<strong>de</strong>ntes automobilísticos não seria diferente. A “fúria no transito”, como<br />

<strong>de</strong>nominam fatos agressivos <strong>de</strong> motoristas sobre os <strong>de</strong>mais, vem crescendo “mais<br />

<strong>de</strong> 50% ao ano <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1990” segundo relato <strong>da</strong> revista People. Porém, para o AAA 38 ,<br />

37 Barry Glassner – “A Cultura do Medo”, 1999, p.49<br />

38 AAA - American Automobile Association – Associação Americana <strong>de</strong> Automóveis]<br />

42


comumente citado nas pesquisas relaciona<strong>da</strong>s a trânsito nos Estados Unidos, este<br />

número é <strong>de</strong> “7% ao ano”.<br />

A diferença entre os números <strong>da</strong> imprensa e do AAA é <strong>de</strong>vido a histórias<br />

como a ocorri<strong>da</strong> no final <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1990 em <strong>uma</strong> freeway em Los Angeles on<strong>de</strong><br />

<strong>uma</strong> guar<strong>da</strong> policial <strong>de</strong> folga levou um tiro e morreu. Os repórteres <strong>de</strong>screveram o<br />

caso como “um ato fortuito <strong>de</strong> violência, como outras ocorrências <strong>da</strong> chama<strong>da</strong><br />

violência associa<strong>da</strong> à fúria no trânsito, que se tornou <strong>uma</strong> praga para os motoristas<br />

do país.” Porém, o relato <strong>da</strong> imprensa estava infun<strong>da</strong>do. A versão ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira para a<br />

história é que assaltantes seguiam a vítima e seu marido <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a saí<strong>da</strong> <strong>de</strong> um<br />

shopping center, os forçaram a sair <strong>da</strong> freeway e roubaram o dinheiro do casal.<br />

Quando a guar<strong>da</strong> policial mostrou aos assaltantes o distintivo <strong>da</strong> policia estadual, os<br />

bandidos atiraram nela. Segundo o próprio marido o ocorrido não po<strong>de</strong>ria nunca ser<br />

classificado como “fúria no trânsito” (Glassner, 1999, p.52-53).<br />

Pouca dúvi<strong>da</strong> sobre as histórias <strong>de</strong> fúria no trânsito é que os responsáveis<br />

são <strong>de</strong>sconhecidos <strong>de</strong>pravados. A polícia e os jornalistas chamaram a atenção<br />

sobre novos tipos <strong>de</strong> pessoas esquisitas a nossa procura – ladrões invasores <strong>de</strong><br />

casa, assaltantes <strong>de</strong> carros, molestadores <strong>de</strong> crianças, carteiros <strong>de</strong>mentes.<br />

Relativamente a quase todos os temores americanos atuais, em vez <strong>de</strong> se enfrentar<br />

problemas sociais perturbadores, a discussão pública concentra-se em indivíduos<br />

perturbados.<br />

Arnold Nerenberg (1997), um psicólogo que se auto<strong>de</strong>nomina “o terapeuta do<br />

trânsito” diz que “existe <strong>uma</strong> necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> profun<strong>da</strong> <strong>de</strong> liberar a agressivi<strong>da</strong><strong>de</strong> contra<br />

um outro anônimo. A fúria no trânsito é <strong>uma</strong> <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m mental contagiosa.”. Tais<br />

dizeres servem apenas para ocultar o que o próprio Neremberg sabe ser o principal<br />

instrumento <strong>de</strong> assassinato no trânsito do país. Questionado diretamente pela<br />

revista People sobre se, realmente, existe alg<strong>uma</strong> diferença entre a atuali<strong>da</strong><strong>de</strong> e 20<br />

anos atrás, Neremberg admite: “Algo que agrava o problema é que temos mais<br />

americanos se armando. Milhões portam armas ilegalmente. Quanto mais armas nos<br />

carro, maior a probabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> que serão usa<strong>da</strong>s” 39 . Assim como Arnold<br />

Neremberg, existem especialistas que procuram chamar a atenção para a questão<br />

<strong>da</strong>s armas, porém raramente têm êxito.<br />

39 Citação <strong>de</strong> Free, “Make their Day”.<br />

43


Os pseudoperigos, como a fúria no trânsito, representam novas<br />

oportuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> evitar problemas que não se querem enfrentar, tais como ruas<br />

superlota<strong>da</strong>s e superabundância <strong>de</strong> armas, entre outros. Um exemplo envolve o ato<br />

<strong>de</strong> dirigir embriagado, comportamento que causa cerca <strong>de</strong> 85 vezes mais mortes do<br />

que ocorrências associa<strong>da</strong>s à fúria no transito (cerca <strong>de</strong> 17 mil contra 200). Quase<br />

meta<strong>de</strong> dos aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> trânsito com vitimas fatais envolvem álcool. Porém, no final<br />

<strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1990, alg<strong>uma</strong>s pesquisas feitas na Costa Leste Americana revelaram<br />

que as pessoas estavam mais preocupa<strong>da</strong>s com a fúria no trânsito do que com<br />

motoristas embriagados. Quem po<strong>de</strong> culpá-los se lêem no seu jornal local:<br />

“Não são os motoristas embriagados, idosos ou inexperientes que<br />

provocavam <strong>da</strong>nos. Pelo contrário, muitas pessoas ficam gravemente<br />

feri<strong>da</strong>s ou morrem todos os dias por causa <strong>de</strong> motoristas estressados, que<br />

<strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> lado o comportamento civilizado no trânsito” (Phila<strong>de</strong>lphia Daily<br />

News , 7 <strong>de</strong> agosto <strong>de</strong> 1997 ).<br />

Ao invés <strong>de</strong> serem entretidos por referências força<strong>da</strong>s envolvendo histórias<br />

sobre fúria no trânsito ou por arautos do medo que tentam confundir os assuntos,<br />

talvez fosse melhor que as concentrações fossem direciona<strong>da</strong>s a incivili<strong>da</strong><strong>de</strong>s mais<br />

grandiosas como racismo e homofobia 40 <strong>de</strong>vido ao fato <strong>de</strong> as preocupações a<br />

respeito do comportamento incivilizado dos americanos <strong>da</strong>tam pelo menos <strong>da</strong> época<br />

<strong>da</strong> expansão <strong>da</strong>s fronteiras.<br />

2.5.2 Criminali<strong>da</strong><strong>de</strong> no noticiário<br />

“Se o mistério sobre pânicos infun<strong>da</strong>dos inclui o fato <strong>de</strong> como eles são<br />

vendidos a pessoas que sofrem os perigos reais com os quais se preocuparem, no<br />

caso <strong>de</strong> temores mais justificáveis a questão é um pouco diferente ” (Glassner, 1999,<br />

p.75). Como li<strong>da</strong>r com a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira extensão e com problemas sobre a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira<br />

natureza <strong>de</strong> crimes, drogas e outros problemas <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>?<br />

Em gran<strong>de</strong> parte a resposta está em histórias divulga<strong>da</strong>s pela imprensa on<strong>de</strong><br />

esta se estimula a <strong>da</strong>r noticias extremas não por causa do aumento no número <strong>de</strong><br />

crimes violentos, mas por algum evento dramático. Como exemplo, a história<br />

conta<strong>da</strong> em “Cultura do Medo” <strong>de</strong> Barry Glassner (1999, pg. 76 a 78) <strong>de</strong> um sol<strong>da</strong>do<br />

recém-chegado em Detroit <strong>da</strong> Guerra do Golfo em 1991 que foi morto por um tiro do<br />

lado <strong>de</strong> fora do prédio on<strong>de</strong> morava. Segundo a imprensa local, algum assassino<br />

40 Homofobia – medo <strong>de</strong> seus semelhantes<br />

44


sem rosto o havia matado somente para roubar o carro. Seria a história <strong>de</strong> crime<br />

i<strong>de</strong>al do ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> jornais e editores – as vítimas inocentes, pessoas<br />

simpáticas; os criminosos brutos sem sentimentos se não fosse à investigação<br />

policial. Mas, a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira história não é esta. Enquanto vasculhava as lixeiras nas<br />

vizinhanças do crime um policial encontrou <strong>uma</strong> arma que se <strong>de</strong>scobriu pertencer ao<br />

irmão <strong>da</strong> esposa do sol<strong>da</strong>do, Michael Cato. Com 19 anos na época e atualmente<br />

cumprindo prisão perpétua, Michael Cato disse em confissão que cometera o crime<br />

pois sua irmã prometera <strong>da</strong>r-lhe <strong>uma</strong> parte do seguro <strong>de</strong> vi<strong>da</strong> do sol<strong>da</strong>do que era <strong>de</strong><br />

US$ 175 mil.<br />

Segundo Glassner (1999, pg. 78) se os re<strong>da</strong>tores <strong>da</strong>s noticias estivessem<br />

consultado criminologistas e investigadores especializados em homicídios, também<br />

tomariam conhecimento <strong>da</strong> improbabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> um ladrão <strong>de</strong> carro matar alguém ao<br />

estilo execução quando um simples tiro teria feito o trabalho. As vitimas <strong>de</strong> roubos<br />

<strong>de</strong> carro quase nunca levam tiros, especialmente quando não oferecem resistência.<br />

Ao contrário dos repórteres <strong>da</strong>s estações <strong>de</strong> TV, que vão atrás <strong>de</strong> qualquer<br />

matéria que inclua <strong>uma</strong> perseguição policial ou <strong>uma</strong> celebri<strong>da</strong><strong>de</strong> em apuros, os<br />

jornalistas <strong>de</strong> jornais e revistas têm a predileção particular por histórias <strong>de</strong> crime que<br />

os aju<strong>de</strong>m a enten<strong>de</strong>r outros fenômenos com os quais estão tendo problemas na<br />

cobertura. No caso <strong>de</strong>ste assassinato, o fenômeno em questão era a Guerra do<br />

Golfo. Quando ocorreu o assassinato, os repórteres avi<strong>da</strong>mente usaram-no para<br />

marcar o fim <strong>da</strong> guerra no Iraque e o início <strong>de</strong> <strong>uma</strong> nova fase na guerra doméstica<br />

contra o crime em an<strong>da</strong>mento.<br />

Se a imprensa simplesmente enten<strong>de</strong>sse <strong>de</strong> modo equivocado os fatos sobre<br />

um homicídio eventual, não seria gran<strong>de</strong> coisa. Mas o significado que dão a muitos<br />

homicídios e outros crimes violentos que escolhem para por em <strong>de</strong>staque é outra<br />

história. Certos lugares que jornalistas afirmam estar dominados pelo crime, como os<br />

locais <strong>de</strong> trabalho, são na ver<strong>da</strong><strong>de</strong> bastante seguros. Durante 1994 e 1995, mais <strong>de</strong><br />

500 matérias sobre violência no local <strong>de</strong> trabalho foram publica<strong>da</strong>s apenas em<br />

jornais, e muitas incluíam estatísticas realmente assustadoras: 2,2 milhões <strong>de</strong><br />

pessoas ataca<strong>da</strong>s por ano; assassinato como principal causa mortis relaciona<strong>da</strong> ao<br />

trabalho para mulheres e a terceira entre os homens. 41<br />

41 St. Petersberg Times, 28 <strong>de</strong> Agosto <strong>de</strong> 1994.<br />

45


Seriam números assustadores se o repórter contratado <strong>de</strong> Wall Street Jornal,<br />

Erik Larson não tivesse <strong>de</strong>cidido estu<strong>da</strong>r a questão mais afundo <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>sconfiar <strong>da</strong>s notícias. O resultado foi um relato pormenorizado publicado no Wall<br />

Street Jornal (<strong>de</strong> 13 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1994) com o título “Uma crise Falsa” em que<br />

Larson revelou como a imprensa criara <strong>uma</strong> epi<strong>de</strong>mia inexistente. Entre cerca <strong>de</strong><br />

121 milhões <strong>de</strong> trabalhadores, quase mil são assassinados no local <strong>de</strong> trabalho<br />

todos os anos, um índice <strong>de</strong> apenas um entre um entre 114 mil. Policiais,<br />

seguranças, motoristas <strong>de</strong> táxi e outros profissionais particularmente vulneráveis<br />

representam <strong>uma</strong> gran<strong>de</strong> parcela <strong>de</strong>ssas mortes.<br />

No total, menos que um entre ca<strong>da</strong> 20 homicídios ocorre no local <strong>de</strong> trabalho.<br />

Enquanto a maior parte do que diz a mídia gira em torno <strong>de</strong> funcionários<br />

<strong>de</strong>scontentes matando-se uns aos outros ou a seus chefes, poucos assassinatos em<br />

locais <strong>de</strong> trabalho realmente acontecem por causa <strong>de</strong> colegas ou ex-colegas <strong>de</strong><br />

trabalho. Cerca <strong>de</strong> 90% dos assassinatos no local <strong>de</strong> trabalho são cometidos por<br />

pessoas <strong>de</strong> fora que vêm para assaltar (Glassner, 1999, p.80).<br />

Relativo aos 2,2 milhões <strong>de</strong> pessoas ataca<strong>da</strong>s todos os anos no trabalho,<br />

cita<strong>da</strong>s acima, a maior parte dos ataques relatados era <strong>de</strong> pouca importância e não<br />

envolvia armas e, mais <strong>uma</strong> vez, a gran<strong>de</strong> maioria foi cometi<strong>da</strong> por pessoas<br />

estranhas ao local, não por colegas, ex-empregados ou chefes (Janice Lewis, 1995,<br />

p.287).<br />

Já que a violência no trabalho está longe <strong>de</strong> ser epi<strong>de</strong>mia, por que os<br />

jornalistas estavam tão dispostos a escrever sobre isso? Segundo Glassner (1999,<br />

p.81):<br />

“Talvez porque a violência no trabalho seja um modo <strong>de</strong> falar sobre a<br />

precarie<strong>da</strong><strong>de</strong> do mercado <strong>de</strong> trabalho sem confrontar diretamente o que<br />

coloca principalmente os trabalhadores em risco: as incessantes on<strong>da</strong>s <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>missões em massa nas empresas inicia<strong>da</strong>s no começo <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

1980”.<br />

A violência no local <strong>de</strong> trabalho não foi a primeira crise <strong>de</strong> criminali<strong>da</strong><strong>de</strong> usa<strong>da</strong><br />

por jornalistas como um modo indireto <strong>de</strong> falar <strong>de</strong> outros assuntos sobre os quais<br />

tinham dificul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> abor<strong>da</strong>r diretamente. Em 1970 iniciou-se <strong>uma</strong> on<strong>da</strong> <strong>de</strong> notícias<br />

que relatavam o perigo <strong>da</strong> brinca<strong>de</strong>ira tradicional <strong>da</strong>s crianças americanas,<br />

“travessuras ou gostosuras” em festas <strong>de</strong> Halloween, on<strong>de</strong> crianças po<strong>de</strong>riam ser<br />

feri<strong>da</strong>s ou envenena<strong>da</strong>s pelas guloseimas oferta<strong>da</strong>s por estranhos. Isso fez com que<br />

em 1985 <strong>uma</strong> pesquisa <strong>da</strong> ABC News em conjunto com o Washington Post<br />

46


mostrasse que 60% dos pais temiam que seus filhos pu<strong>de</strong>sses se tornar vitimas <strong>da</strong><br />

brinca<strong>de</strong>ira.<br />

O mito <strong>da</strong> brinca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Halloween foi <strong>de</strong>smascarado pelo sociólogo Joel<br />

Best <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> se sentir <strong>de</strong>sconfiado. Começou a investigar ca<strong>da</strong> inci<strong>de</strong>nte relatado<br />

<strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1958 e, em artigo publicado em 1985, afirmou que nunca ocorrera nenh<strong>uma</strong><br />

única morte ou ferimento grave relacionado à brinca<strong>de</strong>ira. Somente alguns<br />

inci<strong>de</strong>ntes foram <strong>de</strong>scobertos, mas as crianças teriam sofrido somente pequenos<br />

cortes. A maioria dos inci<strong>de</strong>ntes envolvia brinca<strong>de</strong>iras antigas <strong>de</strong> crianças travessas,<br />

outras vezes, envolvia pais esperançosos em ganhar dinheiro do seguro ou em<br />

processos judiciais.<br />

As histórias <strong>de</strong> Halloween <strong>de</strong>ram presságios do que se tornou matéria-prima<br />

<strong>da</strong> mídia nos últimos 25 anos do século XX: relatos <strong>de</strong> crimes em que crianças<br />

inocentes se tornam vitimas <strong>de</strong> adultos aparentemente inofensivos, que são na<br />

reali<strong>da</strong><strong>de</strong> pervertidos.<br />

Em suas pesquisas <strong>de</strong> matérias sobre crimes contra crianças. Glassner<br />

(1999) se coloca perplexo com a freqüência com que os jornalistas tiram conclusões<br />

infun<strong>da</strong><strong>da</strong>s sobre tendências pedófilas <strong>de</strong> indivíduos e grupos sociais.<br />

Em março <strong>de</strong> 1996, na ci<strong>da</strong><strong>de</strong>zinha escocesa <strong>de</strong> Dunblane, Thomas Hamilton<br />

invadiu <strong>uma</strong> escola, baleou 16 crianças e o professor <strong>de</strong>las, e <strong>de</strong>pois se suicidou<br />

(Glassner, 1999, p.92). A Newsweek (1996) comentou: “Muito previsivelmente, o<br />

vilão era um solitário amargurado e suspeito <strong>de</strong> pedofilia”. Em <strong>uma</strong> matéria posterior<br />

um colunista <strong>da</strong> mesma revista escreveu: “Ele era um pouco mais velho, <strong>uma</strong> versão<br />

enlouqueci<strong>da</strong> do grupo social que agora ameaça nossa socie<strong>da</strong><strong>de</strong> mais do que<br />

qualquer outro homem sozinho sem esperança”.<br />

Não foi apresenta<strong>da</strong> prova alg<strong>uma</strong> para justificar essa mácula contra homens<br />

solteiros e solitários. No entanto, homens casados, com maior acesso a crianças e<br />

mulheres, praticam a maior parte <strong>da</strong> violência contra elas. A conexão pedófila<br />

também é tênue. Os assassinos <strong>de</strong> crianças talvez sejam suspeitos <strong>de</strong> pedofilia,<br />

mas muitos poucos são pedófilos comprovados e confessos (Glassner, 1999, p.93).<br />

O próprio Hamilton, em <strong>uma</strong> carta envia<strong>da</strong> à imprensa pouco antes do<br />

inci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong>clarou que “não era um pervertido”, e insinuou que foram os rumores em<br />

seu contrário em Dublane que o levaram a cometer o ato hediondo. 42<br />

42 Revista People, 01 <strong>de</strong> abril <strong>de</strong> 1996, p.42-49.<br />

47


Alg<strong>uma</strong>s matérias sobre Hamilton representavam preconceitos antigos, que<br />

estabeleciam <strong>uma</strong> ligação entre homossexuali<strong>da</strong><strong>de</strong> e pedofilia. O critico <strong>da</strong> mídia,<br />

Lance Morrow, fez <strong>uma</strong> avaliação perspicaz sobre esse caso em busca <strong>de</strong> um<br />

significado mais profundo do seu gesto. “Supomos que o efeito monstruoso <strong>de</strong>ve ser<br />

resultado <strong>de</strong> <strong>uma</strong> causa monstruosa. Mas não surgiram mais evi<strong>de</strong>ncias que<br />

possibilitassem sua erupção” afirmou em artigo a revista Time (25 <strong>de</strong> março <strong>de</strong><br />

1996, p.78). Descrever o ato <strong>de</strong> Hamilton como um “<strong>de</strong>sejo pedófilo que se tornou<br />

violento, era ina<strong>de</strong>quado, <strong>uma</strong> banalização... quase um sacrilégio em sua<br />

assimetria”, escreveu Morrow. O que não significa dizer que as mortes sejam<br />

inexplicáveis. Na reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, quatro causas po<strong>de</strong>m ser i<strong>de</strong>ntifica<strong>da</strong>s prontamente, os<br />

dois revólveres e <strong>da</strong>s duas pistolas semi-automáticas que Hamilton usou no<br />

assassinato em massa. Privado <strong>da</strong>s armas, Hamilton nunca seria capaz <strong>de</strong><br />

assassinar tantas pessoas. “Nos dias seguintes ao <strong>de</strong>rramamento <strong>de</strong> sangue,<br />

emergiram os pedidos previsíveis para endurecer a lei <strong>de</strong> controle <strong>de</strong> armas no<br />

país”, afirmou a revista People. Depois <strong>da</strong> tragédia, a Câmara dos Comuns reforçou<br />

a já severa legislação britânica sobre porte <strong>de</strong> armas, <strong>de</strong>clarando ilegal to<strong>da</strong>s as<br />

armas <strong>de</strong> calibre superior a 22.<br />

2.5.3 Juventu<strong>de</strong> em risco<br />

As crianças americanas enfrentam perigos muito mais graves do que a<br />

imaginam seus pais. Jornalistas, políticos e grupos militantes repetem essa<br />

conclusão sem parar. Um modo pelo qual a repetem é por meio <strong>de</strong> histórias como as<br />

já relata<strong>da</strong>s anteriormente, o outro modo é asseverando que as crianças enfrentam<br />

riscos imensos, que o púb lico e os legisladores não conseguem avaliar.<br />

Relatou o New York Times (<strong>de</strong> 01 <strong>de</strong> outubro <strong>de</strong> 1995, p.20,24) “Suicídio,<br />

tornou-se <strong>uma</strong> <strong>da</strong>s maiores causa mortis entre adolescentes americanos, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />

aci<strong>de</strong>ntes automobilísticos e homicídios” após um artigo publicado na seção <strong>de</strong><br />

esportes do próprio New York Times, on<strong>de</strong> relatou o suicídio <strong>de</strong> um jovem<br />

americano que era um dos capitães do time <strong>de</strong> futebol <strong>da</strong> escola <strong>de</strong> ensino médio<br />

que freqüentava e o aluno mais popular <strong>da</strong> turma que já estava sendo chamado a<br />

Harvard e Princeton. Um jovem “boa pinta” e nota <strong>de</strong>z em to<strong>da</strong>s as matérias, mas<br />

mesmo com to<strong>da</strong>s as quali<strong>da</strong><strong>de</strong>s se enforcou em <strong>uma</strong> árvore e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>u um tiro<br />

48


na cabeça com um revólver. O que é assustador, afirmou um especialista em saú<strong>de</strong><br />

pública citado na matéria, é que o suicídio cometido por jovens “é um problema<br />

nacional <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> publica praticamente <strong>de</strong>sconhecido”. A estatística <strong>de</strong> ocorrências<br />

<strong>de</strong> suicídios entre jovens adultos e adolescentes praticamente triplicou entre 1952 e<br />

1992, chegando a 1.842 casos em 1992, relata o New York Times em <strong>uma</strong> matéria<br />

sobre suicídios (Glassner, 1999, p.115-116).<br />

Esses números, porém e po<strong>de</strong>m ser lidos <strong>de</strong> um modo menos alarmista.<br />

Depois <strong>de</strong> um período <strong>de</strong> 40 anos, em que o crescimento nos índices <strong>de</strong> divórcio e<br />

pobreza, a diminuição dos <strong>investimento</strong>s em educação e serviços <strong>de</strong> orientação e o<br />

advento <strong>da</strong> AIDS impõem mais estresse que nunca sobre os adolescentes<br />

americanos, cerca <strong>de</strong> um em ca<strong>da</strong> <strong>de</strong>z mil achou conveniente pôr fim em sua vi<strong>da</strong>.<br />

Não que os números e os casos não sejam trágicos, mas po<strong>de</strong>-se comparar com<br />

outros números, como um em ca<strong>da</strong> nove jovens passa fome durante parte <strong>de</strong> ca<strong>da</strong><br />

mês, por exemplo, e a quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> jovens americanos que tem fome aumentou<br />

50% entre meados <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1980 e meados <strong>da</strong> <strong>de</strong> 1990. 43<br />

O fato <strong>de</strong> suicídio ser a terceira causa mortis entre adolescentes também<br />

merece reflexão. Os adolescentes têm pouca probabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> morrer <strong>de</strong> câncer,<br />

doenças do coração ou HIV. Principais causas mortis <strong>de</strong> adultos, tais doenças levam<br />

anos para progredir. Felizmente, vivemos em <strong>uma</strong> época e num lugar on<strong>de</strong>, ao<br />

contrário <strong>da</strong> maioria <strong>da</strong>s culturas através <strong>da</strong> história, gran<strong>de</strong> parte <strong>da</strong>s pessoas<br />

sobrevive até chegar à i<strong>da</strong><strong>de</strong> adulta. Não surpreen<strong>de</strong> que os jovens que per<strong>de</strong>m<br />

suas vi<strong>da</strong>s sejam vitimas <strong>de</strong> causas imediatas, isto é, aci<strong>de</strong>ntes, homicídios e<br />

suicídio (Glassner, 1999, p. 117).<br />

A mu<strong>da</strong>nça bem documenta<strong>da</strong> <strong>de</strong> como os adolescentes põe fim às suas<br />

vi<strong>da</strong>s é muito mais esclarecedora que a especulação a respeito <strong>da</strong> periculosi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong> americana ou <strong>da</strong>s flutuações numéricas dos adolescentes que cometem<br />

suicídio. Atualmente, mais jovens são em sucedidos em suas tentativas <strong>de</strong> suicídio<br />

porque <strong>uma</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> maior – cerca <strong>de</strong> 60% – usa armas. Com vimos, a fácil<br />

disponibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> armas também é responsável pela maioria dos homicídios e por<br />

43 Fonte: Relatórios sobre fome do Institute for Food and Development Policy – Instituto <strong>de</strong> Política<br />

para Alimentos e Desenvolvimento – e do Urban Institute – Instituto Urbano .<br />

49


muitos aci<strong>de</strong>ntes fatais entre adolescentes, às outras duas principais causa mortis<br />

para essa faixa etária. 44<br />

A responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> pela perpetuação <strong>da</strong> confusão não esta somente nas<br />

mãos <strong>de</strong> jornalistas, advogados célebres e políticos. A organização National Safe<br />

Campaign 45 , cujo objetivo é educar os pais sobre as principais causas <strong>de</strong> morte e<br />

incapaci<strong>da</strong><strong>de</strong> entre as crianças, faz sua própria pesquisa sobre as preocupações<br />

dos pais. Os resultados confirmam que o seqüestro permanece no topo <strong>da</strong> lista. E,<br />

sob esses resultados, os marqueteiros também i<strong>de</strong>alizam <strong>uma</strong> ampla varie<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

estratégias para lucrar com a causa <strong>da</strong>s crianças <strong>de</strong>sapareci<strong>da</strong>s.<br />

Entre as empresas mais criativas esta a Advo Inc., que envia, a ca<strong>da</strong> semana,<br />

aproxima<strong>da</strong>mente 57 milhões <strong>de</strong> cartões postais a domicílios americanos. Ca<strong>da</strong><br />

cartão apresenta, <strong>de</strong> um lado, o rosto sorri<strong>de</strong>nte, com a <strong>da</strong>ta <strong>de</strong> nascimento, cor dos<br />

olhos, cor do cabelo e outras informações essenciais <strong>de</strong> <strong>uma</strong> criança <strong>de</strong>sapareci<strong>da</strong>,<br />

e do outro lado, <strong>uma</strong> propagan<strong>da</strong> sobre um negócio local. A pergunta “Você me<br />

viu?”, impressa acima <strong>da</strong> foto <strong>da</strong> criança, possui vários significados: pergunta se<br />

vimos à criança e, ao mesmo tempo, se percebemos a propagan<strong>da</strong> e o produto ou o<br />

serviço anunciado (Glassner, 1999, p. 130).<br />

O medo cresce, segundo Glassner (1999, p.137) proporcionalmente à culpa<br />

inconfessa. Ao se cortar gastos com propagan<strong>da</strong>s educacionais, médicos e<br />

antipobreza para os jovens, comete-se gran<strong>de</strong> violência contra eles. Porém, em vez<br />

<strong>de</strong> se enfrentar a responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> coletiva, projeta-se a violência contra os próprios<br />

jovens e contra estranhos que se imagina que irão atacá-los. Para os jovens que se<br />

<strong>de</strong>sencaminham, as conseqüências <strong>da</strong>s projeções são terríveis. Quanto mais as<br />

pessoas sentem medo <strong>da</strong> criminali<strong>da</strong><strong>de</strong>, mais punitivas são suas atitu<strong>de</strong>s em<br />

relação a criminosos jovens e os políticos capitalizam essa correlação para construir<br />

prisões.<br />

A um custo anual <strong>de</strong> US$ 30 mil ou mais por jovem e com cem mil jovens<br />

presos, é o complexo industrial <strong>da</strong>s prisões e não a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> americana que sai<br />

ganhando com leis que exigem penas mais longas e mais severas para jovens.<br />

Quanto aos campos correcionais, 30 Estados os construíram entre o final <strong>da</strong> déca<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong> 1980 e meados <strong>da</strong> <strong>de</strong> 1990, com um total <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> sete mil leitos. O dinheiro<br />

44 Fonte: Firearm Suici<strong>de</strong> in the U.S., Relatório <strong>da</strong> Educational Fund to End Handgun Violence –<br />

Fundo Educacional para o Fim <strong>da</strong> Violência com Armas Leves –, 1995.<br />

45 Campanha Nacion al por Crianças em Segurança<br />

50


que teria sido mais bem empregado em educação, habitação, geração <strong>de</strong> empregos<br />

ou nutrição para jovens em risco foi usado para contratar <strong>de</strong> ex-sargentos<br />

instrutores, transportar criminosos, raspar suas cabeças, submete -los a marchas<br />

antes do nascer do sol e ro<strong>da</strong><strong>da</strong>s infinitas <strong>de</strong> abdominais, a ensiná-los a dizer<br />

“senhor” e “senhora” para todo mundo. O resultado? Gran<strong>de</strong>s oportuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

fotográficas para políticos duros no combate ao crime. Os estudos revelaram que os<br />

graduados em campos correcionais têm a mesma probabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> cometer crimes<br />

futuros que as pessoas em liber<strong>da</strong><strong>de</strong> condicional <strong>de</strong> instituições <strong>de</strong> <strong>de</strong>tenção<br />

normais (Glassner, 1999, p. 137-140).<br />

2.5.4 Negros<br />

Os jornalistas, os políticos e outros formadores <strong>de</strong> opinião fomentam o medo<br />

em relação a <strong>de</strong>terminados grupos sociais, tanto por aquilo que pregam como por<br />

aquilo que não divulgam. Consi<strong>de</strong>remos o medo americano em relação aos negros.<br />

Esse medo se perpetua pela atenção excessiva <strong>da</strong><strong>da</strong> aos perigos causados por <strong>uma</strong><br />

pequena porcentagem <strong>de</strong> afro-americanos contra outras pessoas, assim como por<br />

<strong>uma</strong> relativa falta <strong>de</strong> atenção para os perigos que a própria maioria <strong>de</strong> negras<br />

enfrenta (Glassner, 1999, p. 193).<br />

Os perigos para os negros <strong>de</strong>saparecerem <strong>da</strong> vista <strong>de</strong> todos sempre que se<br />

pinta um quadro colorido e ilimitado dos riscos que ameaçam os afro-americanos: os<br />

<strong>de</strong>bates sobre as tendências <strong>de</strong> incidência <strong>de</strong> doenças, que não mencionam o fato<br />

<strong>de</strong> que os homens negros têm, em relação aos homens brancos, quatro vezes mais<br />

chances <strong>de</strong> se infectar com o vírus <strong>da</strong> AIDS e duas vezes mais <strong>de</strong> sofrer câncer <strong>de</strong><br />

próstata e doenças cardíacas; os relatórios sobre melhoras no índice <strong>de</strong> suicídios<br />

entre adolescentes, que <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> dizer que o índice referente a brancos cresceu<br />

apenas 22% entre 1980 e 1995, enquanto o índice para negros aumentou 146%; ou<br />

pesquisas relativas à diferença entre a ren<strong>da</strong> <strong>de</strong> <strong>uma</strong> família americana <strong>de</strong> <strong>classe</strong><br />

<strong>média</strong> e as <strong>de</strong>spesas para manter seu estilo <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>, que não revelam que o<br />

problema é mais acentuado para os negros. (Os negros com formação superior<br />

ganham o mesmo ou menos do que os brancos com diplomas do ensino médio)<br />

(Glassner, 1999, p.193).<br />

51


Segundo Glassner (1999, p.194) a mais clamorosa omissão ocorre na<br />

cobertura jornalística sobre crimes. Os negros são muito mais as vítimas do que os<br />

autores <strong>de</strong> crimes. Porem, enquanto vítimas, não atraem os mesmo holofotes <strong>da</strong><br />

mídia que atraem quando são os autores. Uma gran<strong>de</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> estudos<br />

mostra que, quando se trata <strong>de</strong> vítimas <strong>da</strong> criminali<strong>da</strong><strong>de</strong>, a mídia <strong>da</strong> <strong>uma</strong> atenção<br />

bem maior aos brancos e às mulheres.<br />

Mas, quem apresenta a chance real <strong>de</strong> ser morto? A resposta são homens<br />

pertencentes a minorias. Um negro tem quase 18 vezes mais chances <strong>de</strong> ser morto<br />

que um branco. Em s<strong>uma</strong>, o índice <strong>de</strong> homicídios envolvendo negros alcança o<br />

dobro do índice <strong>de</strong> mortes dos sol<strong>da</strong>dos americanos na Segun<strong>da</strong> Guerra Mundial. E<br />

para os negros, entre 15 e 30 anos, a violência é a principal e única causa mortis<br />

(Glassner, 1999, p.196).<br />

Para Glassner (1999, 9.197) a pouca atenção <strong>da</strong> polícia é um dos diversos<br />

fatores que os jornalistas alegam para justificar por que as vitimas brancas recebem<br />

mais atenção <strong>da</strong> mídia do que as vítimas negras. Os jornalistas também citam as<br />

queixas dos li<strong>de</strong>res afro-americanos sobre a excessiva atenção <strong>da</strong><strong>da</strong> pela imprensa<br />

aos problemas e às patologias nas comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s negras.<br />

O subnoticiário envolvendo vitimas negras também faz com que as vitimas<br />

brancas pareçam mais onipresentes do que realmente são, alimentando os temores<br />

dos brancos em relação aos criminosos negros, algo que não beneficia nem negros<br />

nem brancos. Helen Benedict, professora <strong>de</strong> jornalismo <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

Columbia, mostrou que o estupro <strong>de</strong> mulheres brancas por homens negros – que<br />

representa <strong>uma</strong> proporção muito pequena <strong>de</strong> todos os estupros – recebe <strong>uma</strong><br />

consi<strong>de</strong>rável atenção <strong>da</strong> mídia. Em um estudo in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte a respeito <strong>de</strong><br />

preocupações femininas sobre o crime, Esther Madriz, professora <strong>de</strong> sociologia <strong>da</strong><br />

Facul<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Hunter, <strong>de</strong>scobriu que os artigos jornalísticos “reforçaram a visão <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, na qual os negros estão em primeiro lugar entre os temores femininos”.<br />

Sobre esse assunto Glassner (1999, p.199-200) opina que há um estudo que<br />

mereceria ser feito: durante a déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1990, comparar a atenção e a empatia<br />

concedi<strong>da</strong>s pela imprensa americana aos negros mortos nas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s americanas e,<br />

digamos, aos bósnios mortos na guerra civil <strong>da</strong>quele país. Não seria surpresa se os<br />

bósnios levassem vantagem. A tendência <strong>de</strong> não <strong>da</strong>r importâncias as vitimas negras<br />

se esten<strong>de</strong> inclusive à cobertura <strong>de</strong> crimes que merecem indiscutivelmente ser<br />

noticiados, como os que envolvem policiais atingidos por tiros disparados por<br />

52


colegas <strong>de</strong> corporação. Richard Goldstein constatou que apenas o Daily News<br />

lembrou que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1941, 20 policiais negros nova-iorquinos tinham sido alvejados<br />

por colegas brancos. Durante esse tempo, nem um único policial branco foi baleado<br />

por um policial negro.<br />

2.5.5 “A heroína volta à tona”<br />

“Assim como as estrelas <strong>de</strong> Hollywood, muitas notícias alarmantes têm seu<br />

apogeu e <strong>de</strong>pois <strong>de</strong>saparecem <strong>de</strong> vista, mais ou menos <strong>de</strong> modo permanente”<br />

(Glassner, 1999, p.223). Possíveis ameaças em guloseimas <strong>de</strong> Halloween causaram<br />

pânico. “Outros medos apresentam um po<strong>de</strong>r mais sustentável, como sugerido pelo<br />

<strong>de</strong>bate relativo ao alarmismo sobre negros” (Glassner, 1999, p.223).<br />

Outros alarmismos perenes <strong>de</strong>vem sua longevi<strong>da</strong><strong>de</strong> a apoios po<strong>de</strong>rosos.<br />

Durante três déca<strong>da</strong>s, os presi<strong>de</strong>ntes americanos e as organizações <strong>de</strong> mídia<br />

trabalharam em uníssono 46 para promover o medo a respeito do consumo <strong>de</strong><br />

drogas. As contrario <strong>de</strong> quase todo outro risco, as drogas ilícitas não têm grupo <strong>de</strong><br />

interesse algum para <strong>de</strong>fendê-las. Assim, as drogas são um assunto excelente para<br />

vencer pesquisas <strong>de</strong> opinião e eleições. 47<br />

O consumo <strong>de</strong> drogas é um problema grave, que merece atenção séria <strong>da</strong><br />

opinião pública. Porém, o sensacionalismo em vez <strong>da</strong> racionali<strong>da</strong><strong>de</strong> guia <strong>de</strong>bates<br />

nacionais. Com informações equivoca<strong>da</strong>s sobre quem usa drogas, que drogas as<br />

pessoas consomem e o que isso acarreta, são <strong>de</strong>sperdiça<strong>da</strong>s imensas quantias <strong>de</strong><br />

dinheiro ao invés <strong>de</strong> se tratar <strong>de</strong> problemas socais e particulares <strong>de</strong> maneira mais<br />

efetiva (Glassner, 1999, p.223).<br />

David Fan (1996), professor <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> Minnesota realizou um<br />

estudo 48 que fazia <strong>uma</strong> correlação entre a quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> matérias na imprensa que<br />

incluíra a expressão “problemas provocados pelas drogas” e as mu<strong>da</strong>nças na<br />

opinião publica entre 1985 e 1994. Às vezes, durante esse período, apenas um entre<br />

20 americanos consi<strong>de</strong>rava as drogas o problemas mais importante do país; outras<br />

46<br />

Uníssono = Unanimi<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

47<br />

Fonte: William Elwood, “Rhetoric in the War on Drugs, 1994 e Eva Bertram, “Drug War Politics”,<br />

1996.<br />

48<br />

Estudo <strong>de</strong>nominado: “News Media Framing Sets Public Opinion that Drugs Is the Country’s most<br />

Important Problem”, 1996.<br />

53


vezes, dois entre três. A imensa variação po<strong>de</strong> ser explica<strong>da</strong> pela alteração na<br />

cobertura jornalística.<br />

Os psicólogos chamam isso <strong>de</strong> disponibili<strong>da</strong><strong>de</strong> heurística 49 . Diante <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

pesquisa, que pergunta sobre a relativa importância <strong>de</strong> um assunto. Provavelmente<br />

atribuímos gran<strong>de</strong> valor a tudo o que a mídia enfatiza naquele momento, porque nos<br />

lembramos instantaneamente <strong>da</strong>quele assunto. On<strong>de</strong> há <strong>uma</strong> correspondência<br />

razoável entre ênfase <strong>da</strong> mídia e ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira gravi<strong>da</strong><strong>de</strong> dos problemas sociais, a<br />

disponibili<strong>da</strong><strong>de</strong> heurística não é problemática. Porém, em relação aos “problemas<br />

provocados pelas drogas”, a correspondência foi torpe, <strong>de</strong>vido a gran<strong>de</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> informação <strong>de</strong> ma quali<strong>da</strong><strong>de</strong> difundi<strong>da</strong> (Glassner, 1999, p. 226).<br />

O alarmismo sobre o consumo <strong>de</strong> drogas por adolescentes procura traçar o<br />

retrato <strong>de</strong> alguns jovens, a maioria dos quais com as suas triste historias conta<strong>da</strong>s<br />

apenas nos jornais <strong>de</strong> suas ci<strong>da</strong><strong>de</strong>s natais ou nos noticiários locais <strong>de</strong> radio e TV.<br />

Uma notável exceção, <strong>uma</strong> jovem chama<strong>da</strong> Miki Konntz, atraiu a atenção <strong>da</strong> mídia<br />

nacional americana, que contou e recontou sua historia durante anos. A maneira<br />

pelo qual gran<strong>de</strong> parte <strong>da</strong> mídia realmente relatou a historia ilustra algo que já vimos<br />

neste trabalho. Raramente as historias <strong>da</strong>s pessoas são aquelas que os jornalistas<br />

relatam (Glassner, 1999, p.238).<br />

A “garota mais popular do último ano do colegial, lí<strong>de</strong>r <strong>de</strong> torci<strong>da</strong> e aluna<br />

acima <strong>da</strong> media, que estava <strong>de</strong> malas prontas para entrar na facul<strong>da</strong><strong>de</strong>” (Associated<br />

Press), Miki tornou-se <strong>uma</strong> pessoa vicia<strong>da</strong> em crack e per<strong>de</strong>u a vi<strong>da</strong> em<br />

conseqüência disso, registrou a mídia após a morte <strong>de</strong> Miki através <strong>de</strong> um tiro <strong>da</strong>do<br />

por Chris, seu amigo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sexta série a mando <strong>de</strong> um traficante <strong>de</strong> crack. Os<br />

artigos tinham o traficante, um negro <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 45 anos, como vilão <strong>da</strong> historia<br />

pois ele vendia até US$ 30.000 por mês em crack e atraía os adolescentes brancos<br />

ao vício. Semelhante às <strong>de</strong>mais coberturas jornalísticas, o artigo <strong>da</strong> Revista Rolling<br />

Stone também jogou a maior parte <strong>da</strong> culpa do assassinato <strong>de</strong> Miki sobre o<br />

traficante e disse: “ele tem um gra<strong>de</strong> po<strong>de</strong>r sobre jovens brancas <strong>de</strong> <strong>classe</strong> media,<br />

antes intocáveis” (Glassner, 1999, p. 238-240).<br />

O que não sabia a mídia, é que bem antes <strong>de</strong> morrer, Miki consumia drogas e<br />

bebi<strong>da</strong>s, às vezes em gran<strong>de</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong>, mas, significativamente, o crack não era<br />

sua droga preferi<strong>da</strong>. Consi<strong>de</strong>rá-la <strong>uma</strong> pessoa vicia<strong>da</strong> em crack permitia a criação<br />

49 Disponibili<strong>da</strong><strong>de</strong> Heurística: Quando um fenômeno é julgado popular ou importante quão<br />

prontamente ele é lembrado pela população.<br />

54


<strong>de</strong> manchetes bem elabora<strong>da</strong>s, como “Um golpe no sonho americano” do Post-<br />

Gazette, e subenredos pseudo-sociológicos sobre a migração <strong>de</strong> <strong>uma</strong> droga <strong>da</strong><br />

ci<strong>da</strong><strong>de</strong> gran<strong>de</strong> para o interior do país. A irmã e outras pessoas próximas a Miki<br />

disseram que ela usara crack apenas alg<strong>uma</strong>s vezes. Mas, em geral, ela consumia<br />

maconha, álcool e Somas (remédio utilizado como relaxante muscular).<br />

A história <strong>de</strong> Miki Koontz ilustra <strong>uma</strong> coisa: a tendência dos jornalistas <strong>de</strong><br />

creditar a causa mortis a qualquer droga que esteja sendo alar<strong>de</strong>a<strong>da</strong> no momento.<br />

Em 1994, a morte <strong>de</strong> Kurt Cobain foi classifica<strong>da</strong> como parte do “ressurgimento do<br />

uso <strong>da</strong> heroína na déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1990”. Apesar <strong>de</strong> Cobain não tem morrido <strong>de</strong>vido a<br />

<strong>uma</strong> overdose <strong>de</strong> heroína, mas porque se suicidou, os artigos jornalísticos dizem,<br />

sem provas, que Cobain “matou-se porque não foi capaz <strong>de</strong> abandonar o vicio <strong>da</strong><br />

heroína”. No entanto, um mês antes <strong>de</strong> seu suicídio, quando ele quase morreu <strong>de</strong><br />

overdose, a droga em questão não era a heroína, ele havia entrado em coma <strong>de</strong>pois<br />

do consumo excessivo <strong>de</strong> champagne e Rohypnol (remédio para induzir o sono). 50<br />

Por que será que não houve nenh<strong>uma</strong> história a respeito <strong>da</strong> mistura entre<br />

álcool e remedios, algo comum as mortes por overdose? Ou, simplesmente, sobre o<br />

uso abusivo <strong>de</strong> medicamentos, motivo mais freqüente <strong>da</strong> internação <strong>de</strong><br />

adolescentes em prontos-socorros do que a cocaína, heroína, maconha e LSD<br />

juntos? (Glassner, 1999, p.241) 51<br />

Porque provavelmente a <strong>de</strong>pendência dos políticos em relação a indústria<br />

farmacêutica para o levantamento <strong>de</strong> fundos para as campanhas eleitorais e a<br />

<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> imprensa em relação à mesma industria para receitas publicitárias<br />

têm algo a ver com aquelas formas <strong>de</strong> consumo abusivo que eles <strong>de</strong>ploram. No ano<br />

eleitoral <strong>de</strong> 1996, apenas o PAC 52 <strong>da</strong> indústria <strong>de</strong> substâncias medicinais distribuiu<br />

US$ 1,6 milhão para campanhas fe<strong>de</strong>rais. E a indústria farmacêutica, o setor mais<br />

lucrativo <strong>da</strong> economia americana, está entre os maiores anunciantes <strong>de</strong> TV, revistas<br />

e jornais (Glassner, 1999, p. 243). 53<br />

50 Fonte: Arthur Santana e Charles Hall, “Banned ‘Date Rate’ Drug Is Linked to Six Assaults”,<br />

Washington Post, 14 <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 1996: Laura Everson e Sam Whiting, “Heroin´s in Fashion and<br />

Death Statistics Prove It”, San Francisco Chronicle, 30 <strong>de</strong> julho <strong>de</strong> 1996.<br />

51 Fonte: Mike Males, The Scapegoat Generation, 1996, cap.6; Pete Stark, “Incresed Regulations of<br />

Prescription Drugs Is Necessary”, 1994, p. 142-149.<br />

52 PAC – Political Action Committee – Comitê <strong>de</strong> Ação Política – organização forma<strong>da</strong> por um grupo<br />

<strong>de</strong> interesse para arreca<strong>da</strong>r fundos, aju<strong>da</strong>ndo candi<strong>da</strong>tos que apóiam suas idéias a concorrer a<br />

cargos eletivos.<br />

53 Fo nte: Fe<strong>de</strong>ral Election Commission.<br />

55


2.5.6. Aci<strong>de</strong>ntes Aéreos<br />

Em to<strong>da</strong> a historia <strong>da</strong> aviação comercial, <strong>de</strong> 1914 em diante, menos <strong>de</strong> 13 mil<br />

pessoas morreram em aci<strong>de</strong>ntas aéreos. Em apenas um ano, três vezes mais<br />

americanos per<strong>de</strong>ram suas vi<strong>da</strong>s em aci<strong>de</strong>ntes automobilísticos. A probabili<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

media <strong>de</strong> um individuo morrer em um aci<strong>de</strong>nte aéreo é <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> <strong>uma</strong> em quatro<br />

milhões (Glassner, 1999, p.295) 54 .<br />

A mídia faz alusão a esses tipos <strong>de</strong> números. Ela é capaz <strong>de</strong> divulgar<br />

estatísticas exagera<strong>da</strong>s sobre sensibili<strong>da</strong><strong>de</strong> química múltipla, uso <strong>de</strong> heroína entre a<br />

<strong>classe</strong> <strong>média</strong>, fúria no transito e muito outros pânicos supérfluos, mas não sobre<br />

aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> avião. Faz questão <strong>de</strong> que seus leitores e telespectadores saibam que<br />

a probabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> morrer em um aci<strong>de</strong>nte aéreo é praticamente a mesma “<strong>de</strong> ser<br />

atingido na cabeça por um meteorito”, afirmação <strong>de</strong> um editorial do USA To<strong>da</strong>y em<br />

15 <strong>de</strong> <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 1994.<br />

Os relatos <strong>da</strong> mídia não são perfeitos. Ocasionalmente, alguns números são<br />

distorcidos. Em 13 <strong>de</strong> janeiro 1988, a manchete do Washington Post dizia: “Índice <strong>de</strong><br />

aci<strong>de</strong>ntes aéreos é o mais alto em 13 anos”, ain<strong>da</strong> que o índice <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>ntes na<br />

reali<strong>da</strong><strong>de</strong> estivesse <strong>de</strong>clinado há vários anos. Os re<strong>da</strong>tores e editores fizeram <strong>uma</strong><br />

confusão entre incidência 55 e índice 56 . Embora o número total <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>ntes tivesse<br />

aumentado o índice – ou número <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>ntes por ca<strong>da</strong> cem mil <strong>de</strong>colagens –<br />

<strong>de</strong>clinara. Em outras palavras, mais aviões estavam levantando vôo e, portanto,<br />

havia mais aci<strong>de</strong>ntes, mas a probabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> ser vitima <strong>de</strong> um <strong>de</strong>sses aci<strong>de</strong>ntes<br />

diminuíra. Na reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1960, a quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> vôos mais do que<br />

dobrou e, no entanto, o índice <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>ntes caiu 85%.<br />

No entanto, erros como esses são exceções. De modo geral a imprensa faz<br />

questão que seus leitores saibam que as estatísticas <strong>de</strong> segurança <strong>da</strong>s companhias<br />

aéreas dos Estados Unidos são impressionantes. Porem, surpreen<strong>de</strong>ntemente, a<br />

mídia promove o medo <strong>de</strong> voar.<br />

Glassner (1999, p.296) analisou a cobertura sobre segurança aérea nos<br />

principais jornais, revistas e re<strong>de</strong>s <strong>de</strong> televisão dos Estados Unidos durante três<br />

anos - 1994 até 1996 – e encontrou jornalistas que juntam inci<strong>de</strong>ntes isolados,<br />

54<br />

Dados <strong>de</strong> David Hinson <strong>da</strong> Fe<strong>de</strong>ral Aviation Administration – Administração Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Aviação,<br />

1994 e 1996.<br />

55<br />

Incidência: Número total <strong>de</strong> ocorrências.<br />

56<br />

Índice: Numero <strong>de</strong> ocorrências por ca<strong>da</strong> cem mil.<br />

56


<strong>de</strong>screvendo-os como tendências perigosas, e permitindo que essas ofusquem a<br />

reali<strong>da</strong><strong>de</strong> mais ampla sobre segurança em viagens aéreas.<br />

Para Glassner (1999, p.300): “Em 1995 a mídia encontrou pretextos <strong>de</strong><br />

manter vivo o medo <strong>de</strong> voar. Escreveram relatos comprometedores sobe a agência<br />

governamental encarrega<strong>da</strong> <strong>de</strong> garantir a segurança <strong>da</strong>s viagens aéreas”.<br />

Durante os últimos anos a FAA 57 exigiu a implantação <strong>de</strong> diversas medi<strong>da</strong>s <strong>de</strong><br />

segurança, sendo que apenas um pequeno número foi em resposta a pressões<br />

<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> algum aci<strong>de</strong>nte. É ver<strong>da</strong><strong>de</strong> que, antes <strong>de</strong> estabelecer <strong>uma</strong> nova regra, a<br />

FAA realiza analises <strong>de</strong> custo e beneficio para avaliar se <strong>uma</strong> quanti<strong>da</strong><strong>de</strong> suficiente<br />

<strong>de</strong> vi<strong>da</strong>s e bens seria salvos para justificar o custo <strong>da</strong> nova regulamentação. Em<br />

raciocino, <strong>de</strong>scrito <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado modo, talvez pareça quase imoral. Em vez <strong>de</strong><br />

imediatamente exigir <strong>uma</strong> correção que sabem que prevenirá aci<strong>de</strong>ntes, os<br />

funcionários analisam <strong>da</strong>dos <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>ntes que abrangem períodos <strong>de</strong> <strong>de</strong>z ou vinte<br />

anos, e extrapolam o numero <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>s que po<strong>de</strong>m ser perdi<strong>da</strong>s no futuro. Depois,<br />

multiplicam esse numero pela estimativa governamental do valor <strong>de</strong> <strong>uma</strong> vi<strong>da</strong> (US$<br />

2,6 milhões), adicionam o valor presumido pela per<strong>da</strong> dos bens e comparam o<br />

resultado com o custo <strong>da</strong> nova regulamentação. Se a medi<strong>da</strong> <strong>de</strong> segurança custa<br />

mais do que o valor <strong>da</strong>s vi<strong>da</strong>s e dos bens que salvará, a agência po<strong>de</strong> optar por<br />

<strong>de</strong>ixar que alg<strong>uma</strong>s pessoas morram (Glassner, 1999, p.300-3001).<br />

Para Jeff Brazil (1994):<br />

“Os repórteres não foram capazes <strong>de</strong> evitar a tentação <strong>de</strong> justapor esse<br />

processo impessoal a comentários pungentes <strong>de</strong> homens e mulheres que<br />

per<strong>de</strong>ram entes queridos em aci<strong>de</strong>ntes que po<strong>de</strong>riam ter sido evitados caso<br />

a FAA não tivesse realizado análises <strong>de</strong> custo e beneficio. Obviamente, a<br />

agencia não foi vista com bons olhos. Mas não faz sentido se impor to<strong>da</strong>s<br />

as regras que talvez salvem <strong>uma</strong> vi<strong>da</strong>, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> custos. De alg<strong>uma</strong><br />

forma, sempre que a FAA estabelece <strong>uma</strong> nova exigência, o dinheiro<br />

precisa sair <strong>de</strong> algum lugar. Na maioria <strong>da</strong>s vezes vem do aumento do<br />

preço <strong>da</strong>s passagens, que, por sua vez, po<strong>de</strong> impedir que alg<strong>uma</strong>s pessoas<br />

viajem <strong>de</strong> avião e faz com que outras peguem a estra<strong>da</strong>, on<strong>de</strong> enfrentarão<br />

riscos maiores <strong>de</strong> se ferir ou morrer”.<br />

Como não se preocupam com estatística ou causas científicas,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente do tipo <strong>de</strong> pânico aéreo que estejam fomentando no momento,<br />

os jornalistas se baseiam em suas próprias <strong>de</strong>clarações explosivas ou, às vezes,<br />

citam pessoas que não tem nenhum tipo <strong>de</strong> conhecimento no assunto.<br />

Ao contar a historia <strong>de</strong> <strong>uma</strong> mãe que pediu para que a filha viajasse por terra<br />

ao invés <strong>de</strong> voar em <strong>uma</strong> aeronave que cairia em sua rota, a Revista Time produziu<br />

57 FAA - Fe<strong>de</strong>ral Aviation Administration - Administração Fe<strong>de</strong>ral <strong>de</strong> Aviação.<br />

57


duas ilusões. Deu a impressão <strong>de</strong> que as notícias alarmantes que ela e a maioria<br />

dos meios <strong>de</strong> comunicação difundiam sobre as companhias aéreas regionais<br />

estavam a serviço do salvamento <strong>de</strong> vi<strong>da</strong>s.<br />

Para dramatizar as probabili<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong> envolvimentos em aci<strong>de</strong>ntes aéreos, os<br />

jornalistas também usavam vitimas reais dos aci<strong>de</strong>ntes. Depois <strong>de</strong> todos os gran<strong>de</strong>s<br />

aci<strong>de</strong>ntes, os repórteres escolhem um pequeno numero <strong>de</strong> vitimas simpáticas e<br />

apresentam seus perfis e suas historias (Glassner, 1999, p. 308).<br />

Em meados <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1990, enquanto a imprensa estava obceca<strong>da</strong> com<br />

os aci<strong>de</strong>ntes aéreos – que resultam em menos <strong>de</strong> <strong>uma</strong> dúzia <strong>de</strong> mortes nos<br />

melhores anos e poucas centenas nos piores – porque será que os <strong>de</strong>mais<br />

problemas que sofre a população não recebem a mesma atenção? Problemas como<br />

os aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> trabalho que em meados <strong>de</strong>sta déca<strong>da</strong> atingiram o numero <strong>de</strong> mais<br />

<strong>de</strong> cinco mil mortes e quase sete milhões <strong>de</strong> pessoas feri<strong>da</strong>s. Um número enorme<br />

<strong>de</strong>ssas vítimas tinha menos <strong>de</strong> 18 anos; muito mais <strong>de</strong> cinco mil crianças e<br />

adolescentes por ano precisaram recorrer aos prontos-socorros com ferimentos<br />

provocados por aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> trabalho. Os repórteres colecionavam centenas <strong>de</strong><br />

historias sobre falhas hipotéticas <strong>da</strong> FAA em <strong>uma</strong> época em que existiam falhas<br />

profun<strong>da</strong>s na OSHA 58 , agência cria<strong>da</strong> por <strong>uma</strong> lei do Congresso em 1970 a fim <strong>de</strong><br />

“assegurar, na medi<strong>da</strong> do possível, que ca<strong>da</strong> trabalhador ou trabalhadora do país<br />

tenham condições saudáveis <strong>de</strong> trabalho” 59 . Previsivelmente a taxa <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong><br />

trabalho estava subindo nos Estados Unidos, porem a cobertura <strong>da</strong> mídia sobre<br />

saú<strong>de</strong> e segurança dos locais <strong>de</strong> trabalho era ca<strong>da</strong> vez mais esporádica isso se<br />

<strong>de</strong>ve ao fato <strong>de</strong> que os órgãos <strong>de</strong> imprensa, em sua maioria, não têm repórteres<br />

cujo “furo” <strong>de</strong> reportagens seja a segurança do trabalhador 60 (Glassner, 1999, p.<br />

321-322).<br />

Para Glassner (1999, p.315) os jornalistas ten<strong>de</strong>m a oferecer alg<strong>uma</strong>s<br />

explicações para suas preocupações em relação à segurança aérea. Alguns dizem<br />

que os aci<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> avião são naturalmente dignos <strong>de</strong> noticia. “Quando um avião cai<br />

do céu, a historia é irreversível, ain<strong>da</strong> que <strong>de</strong> maneira mórbi<strong>da</strong>: as fotos do metal<br />

retorcido, <strong>da</strong> bagagem pendura<strong>da</strong> nas arvores, a mãe aos berros no aeroporto<br />

58<br />

OSHA - Occupational Health and Safety Administration - Organização <strong>de</strong> Segurança e Saú<strong>de</strong> do<br />

Trabalho<br />

59<br />

Fonte: Bureau of Labor Statistics, Nacional Insitute of Occupational Safety and Health – Escritório<br />

<strong>de</strong> Estatísticas do Trabalho, Instituto Nacional <strong>de</strong> Segurança e Saú<strong>de</strong> Ocupacional – ,1996<br />

60<br />

Fonte: Fank Swobo<strong>da</strong>, “The Growing Problem of Workplace Safety”, 1994.<br />

58


aon<strong>de</strong> o vôo nunca chegou”, escreveu Gareth Cook no Washington Monthly.<br />

Inquestionavelmente, aci<strong>de</strong>ntes aéreos produzem matérias jornalísticas sedutoras, o<br />

que explica a imediata erupção <strong>da</strong> cobertura. Mas existe um motivo pelo qual as<br />

noticias ficam presentes na mídia por meses, às vezes, por anos.<br />

Para alguns jornalistas, a segurança aérea merece objetivamente um alto<br />

nível <strong>de</strong> cobertura e não apenas o relato do drama que cerca os aci<strong>de</strong>ntes aéreos,<br />

pois as que<strong>da</strong>s <strong>de</strong> avião produzem efeitos duradouros na psicologia do publico e na<br />

economia. Que<strong>da</strong>s <strong>de</strong> aviões, não somente matam pessoas e abalam suas famílias<br />

para sempre, mas também custam milhões as agencias <strong>de</strong> aviação em reservas <strong>de</strong><br />

passagem cancela<strong>da</strong>s e que<strong>da</strong> no preço <strong>de</strong> suas ações, po<strong>de</strong>ndo chegar até a sua<br />

falência. Os aci<strong>de</strong>ntes também recor<strong>da</strong>m a vulnerabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> quem se move a 800<br />

km por hora, a 11 km acima <strong>da</strong> terra, fechados em <strong>uma</strong> aeronave pressuriza<strong>da</strong><br />

(Glassner, 1999, p. 315-316).<br />

Mas, alem <strong>da</strong>s causas apresenta<strong>da</strong>s acima que expõe explicações para que<br />

aci<strong>de</strong>ntes aéreos estejam constantemente na míd ia, existe mais <strong>uma</strong>, entre tantas<br />

que po<strong>de</strong>riam ser toma<strong>da</strong>s como ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras e aceitáveis. O motivo é, segundo <strong>uma</strong><br />

veterana repórter do Los Angeles Times, o que se chama nas re<strong>da</strong>ções <strong>de</strong>: ”noticia<br />

é o que acontece com seus editores”. Isso que dizer que os editores – e os patrões<br />

<strong>de</strong>les, os editores executivos e administradores seniores – voam muito. Assim como<br />

seus familiares, amigos e colegas <strong>de</strong> trabalho. Eles têm muito mais probabili<strong>da</strong><strong>de</strong> do<br />

que muitas pessoas <strong>de</strong> conhecer alguém que estava em um aci<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> avião ou<br />

evitou um por pouco. Eles também são capazes <strong>de</strong> imaginar que, a menos que seja<br />

<strong>da</strong><strong>da</strong> maior atenção à segurança aérea, eles conhecerão vitimas no futuro ou<br />

po<strong>de</strong>rão acabar eles mesmos em <strong>uma</strong> lista <strong>de</strong> vítimas fatais. Portanto, os aci<strong>de</strong>ntes<br />

aéreos estão muito mais próximos dos editores <strong>da</strong> mídia do que se imagina. O que<br />

faz com que eles dêem gran<strong>de</strong> atenção a um assunto que faz parte do seu<br />

cotidiano.<br />

Mas, por que será então que as pessoas aceitam asserções improváveis<br />

vin<strong>da</strong>s <strong>da</strong> mídia, dos políticos e pessoas influentes? Para Glassner (1999, p.326): “A<br />

explicação não esta na falta <strong>de</strong> inteligência por parte dos ouvintes, mas na<br />

perspicácia dos produtores dos programas e <strong>da</strong>s condições sociais [...]”.<br />

Segundo Glassner (1999, p. 328): “As <strong>de</strong>clarações alarmistas feitas por<br />

apresentadores <strong>de</strong> TV e a glorificação <strong>de</strong> pseudo-analistas são os dois truques<br />

indicadores do comércio dos arautos do medo. [...]”. Para Glassner (1999, p.328-<br />

59


329) se os jornalistas restringissem o uso <strong>de</strong> práticas como: o uso <strong>de</strong> historietas<br />

pungentes em vez <strong>de</strong> evidências cientifica, o batismo <strong>de</strong> inci<strong>de</strong>ntes isolados como<br />

sendo tendências, <strong>de</strong>scrições <strong>de</strong> grupos inteiros <strong>de</strong> pessoas como sendo perigosos<br />

por natureza, haveria menos pessoas ansiosas e mal informa<strong>da</strong>s. O sucesso <strong>de</strong> um<br />

pânico não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> apenas <strong>de</strong> quão bem ele é expresso, mas também, <strong>de</strong> quão<br />

bem ele expressa ansie<strong>da</strong><strong>de</strong>s culturais mais profun<strong>da</strong>s.<br />

2.6 Formar Opinião<br />

Para Patrick Champagne (1996, p.43) “a “opinião pública” faz parte <strong>da</strong>s<br />

formas elementares <strong>de</strong> percepção ou dos <strong>da</strong>dos imediatos <strong>da</strong> consciência pública”.<br />

Segundo institutos <strong>de</strong> son<strong>da</strong>gens, cientistas políticos, imprensa e meios políticos, a<br />

“opinião pública” apresenta-se na forma familiar e erudita. Embora não está prevista<br />

em nenh<strong>uma</strong> Constituição, ela é estreitamente associa<strong>da</strong> aos regimes <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>mocracia parlamentar e por isso, po<strong>de</strong>m chegar aos países <strong>de</strong> “Terceiro Mundo” e<br />

aos regimes autoritários através dos institutos <strong>de</strong> son<strong>da</strong>gem. Esses ao avaliarem a<br />

“opinião pública” dizem que ela se tornou <strong>uma</strong> instituição social.<br />

Os historiadores e sociólogos mostram a antigui<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> noção <strong>de</strong> “opinião<br />

pública” e lembram que, <strong>de</strong> fato, trata-se <strong>de</strong> um referente imaginário, i<strong>de</strong>al e utópico<br />

o que leva a pensar que a “opinião pública” não passa do produto do encontro entre<br />

um fantasma político tradicional – levar “o povo” a falar dos regimes em que,<br />

supostamente, ele é a fonte <strong>da</strong> legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> do po<strong>de</strong>r – e <strong>uma</strong> tecnologia social<br />

mo<strong>de</strong>rna: a son<strong>da</strong>gem, questionário fechado e o apuramento quase instantâneo<br />

através <strong>de</strong> computadores (Champagne, 1996, p.44).<br />

Mas, afinal, como po<strong>de</strong>mos falar <strong>de</strong> "opinião pública" sem perceber um<br />

sentido, <strong>de</strong>ntre to<strong>da</strong>s as significações constituí<strong>da</strong>s ao longo <strong>da</strong> história, para as<br />

palavras que compõem essa expressão que tanto nos vai acompanhar neste<br />

capitulo?<br />

Segundo o Dicionário Petit Robert, por exemplo, a noção <strong>de</strong> opinião po<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>signar o resultado <strong>de</strong> um julgamento individual firme (nesse caso, é sinônimo <strong>de</strong><br />

"apreciação", "parecer", "certeza", "convicção") ou, inversamente, julgamento<br />

individual incerto e subjetivo (significando "impressão", "imaginação", "ponto <strong>de</strong><br />

vista", "sentimento", "conjetura", "suposição", "presunção") ou, até mesmo, a<br />

60


ausência pura e simples <strong>de</strong> qualquer julgamento (é o caso <strong>da</strong> "crença", "preconceito"<br />

ou "prevenção"). Tal noção po<strong>de</strong> <strong>de</strong>signar, igualmente, um produto não mais<br />

individual, mas coletivo e, então, exprime tanto <strong>uma</strong> posição intelectual refleti<strong>da</strong>, ate<br />

mesmo muito elabora<strong>da</strong> – como é o caso <strong>de</strong> <strong>uma</strong> "doutrina" religiosa (fala-se <strong>de</strong><br />

"opinião <strong>da</strong> Igreja" a respeito <strong>de</strong> tal problema <strong>de</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>) ou <strong>de</strong> um "sistema"<br />

filosófico ou político – quanto um conjunto <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>s coletivas "espontâneas" ou <strong>de</strong><br />

representações compartilha<strong>da</strong>s por um grupo social. (Champagne, 1996, p.45)<br />

Também <strong>de</strong> Champagne (1996, p.45) a mesma varie<strong>da</strong><strong>de</strong> semântica observa-<br />

se para a palavra "público" que po<strong>de</strong> qualificar o que se refere ao "povo"<br />

consi<strong>de</strong>rado em ser conjunto (e, então, significa "comum", "geral"); opõe-se,<br />

igualmente, a "privado" e <strong>de</strong>signa o que, formalmente, é "aberto a todos" por<br />

exemplo, um jardim "público" ou um escritor "público"), isto é, na reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, a todos<br />

os que o <strong>de</strong>sejarem ou pu<strong>de</strong>rem, ou ain<strong>da</strong>, o que pertence ao Estado e pressupõe<br />

um "interesse coletivo" ou "geral" (“domínio público”, "direito público", etc.). No<br />

entanto, esse adjetivo tem, igualmente, um sentido mais diretamente político e<br />

<strong>de</strong>signa as pessoas que exercem <strong>uma</strong> função "oficial" ("homem público") e, enfim,<br />

por extensão, o que é "conhecido por todos" (“notório”).<br />

Para exprimir fatos e exemplos sobre formas <strong>de</strong> "opinião pública", pegamos<br />

como base os citados no livro Formar Opinião, <strong>de</strong> Patrik Champagne (1996)<br />

baseando na história francesa. Para o autor, Neste país durante o século XVIII, “a<br />

"opinião pública" é <strong>uma</strong> espécie <strong>de</strong> maquina <strong>de</strong> guerra i<strong>de</strong>ológica "improvisa<strong>da</strong>"<br />

pelas elites intelectuais e pela burguesia <strong>de</strong> magistratura a fim <strong>de</strong> legitimar suas<br />

próprias reivindicações no campo político [...]”.<br />

Para escritores e filósofos <strong>da</strong> época, a "opinião pública" é <strong>uma</strong> i<strong>de</strong>ologia<br />

profissional. É <strong>uma</strong> opinião manifesta<strong>da</strong> a respeito <strong>da</strong> política por grupos sociais<br />

restritos cuja profissão é produzir opiniões e que procuram entrar no jogo político<br />

modificando-o e transfigurando suas opiniões <strong>de</strong> elites letra<strong>da</strong>s em opinião universal,<br />

intemporal e anônima com valor na política. O que merece ser chamado "opinião<br />

pública" é, para esta parcela rica em capital cultural, sua própria opinião em matéria<br />

publica; no entanto, é <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong> forma, "<strong>de</strong>sparticulariza<strong>da</strong>" na medi<strong>da</strong> em que é<br />

apresenta<strong>da</strong> como a opinião <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong><strong>de</strong> – universal embora numericamente<br />

minoritária – dos sábios que examinam livre e publicamente as questões <strong>de</strong> religião<br />

ou política e, na época, comunicava-se, essencialmente por escrito. A publicação<br />

escrita ou, pelo menos, a <strong>de</strong>liberação, é consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> meio necessário para a<br />

61


formação <strong>de</strong> <strong>uma</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira "opinião pública" que transcen<strong>da</strong> as "opiniões<br />

individuais e particulares”. (Champagne, 1996, p.48-49).<br />

Para Champagne (1996, p.49), as pessoas que faziam parte <strong>da</strong> “assembléia<br />

<strong>da</strong> opinião pública" <strong>de</strong>veriam, teoricamente, "seguir <strong>uma</strong> vi<strong>da</strong> inteiramente livre <strong>de</strong><br />

preconceitos e traça<strong>da</strong> somente pela razão e eqüi<strong>da</strong><strong>de</strong> (embora fazendo<br />

concessões) no respeito pelos antigos costumes". Essa opinião publica "esclareci<strong>da</strong>"<br />

que, por esse motivo, supostamente, ilumina a nação inteira, não <strong>de</strong>sapareceu em<br />

nossos dias, embora coexista com aquela que é produzi<strong>da</strong> pelos institutos <strong>de</strong><br />

son<strong>da</strong>gens em suas pesquisas.<br />

Com efeito, <strong>da</strong> rejeição <strong>da</strong> legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> monarquia e sua substituição pela<br />

soberania nacional e/ou popular, a "opinião pública" não podia continuar sendo a <strong>da</strong>s<br />

minorias esclareci<strong>da</strong>s (os "sábios"). Sob a pressão <strong>de</strong> <strong>uma</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira corrente<br />

revolucionaria, ela <strong>de</strong>veria se alargar e tornar-se a <strong>de</strong> <strong>uma</strong> parcela muito mais<br />

numerosas do povo (os “ci<strong>da</strong>dãos"). Por outras palavras, a "opinião pública" tornou-<br />

se <strong>uma</strong> força <strong>de</strong> ação autônoma que reivindicava o exercício do po<strong>de</strong>r. Deixou <strong>de</strong><br />

ser um simples contrapeso ao po<strong>de</strong>r político ou um recurso contra a injustiça que<br />

podia ser <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ado pelas minorias esclareci<strong>da</strong>s. (Champagne, 1996, p.50-51)<br />

Os homens <strong>da</strong> Constituinte Francesa (e, mais tar<strong>de</strong>, os <strong>de</strong>putados "<strong>de</strong><br />

esquer<strong>da</strong>" no inicio <strong>da</strong> III República) – após a guerra franco-prussiana <strong>de</strong> 1870/71 –<br />

temiam que as cama<strong>da</strong>s sociais mais baixas, que <strong>de</strong>pendiam estreitamente <strong>da</strong>s<br />

antigas <strong>classe</strong>s dominantes, viessem a votar como seus senhores e, <strong>de</strong>vido a isso,<br />

somente os representantes eleitos por um corpo eleitoral, também selecionado,<br />

foram autorizados a afirmar a vonta<strong>de</strong> <strong>da</strong> nação. Portanto, vemos que,<br />

institucionalmente, a única fonte <strong>da</strong> "opinião pública" é constituí<strong>da</strong> pelos<br />

representantes eleitos que, durante <strong>uma</strong> gran<strong>de</strong> parte do século XIX, monopolizaram<br />

a expressão <strong>da</strong> "opinião pública" legitima e reconheci<strong>da</strong> do ponto <strong>de</strong> vista político.<br />

(Champagne, 1996, p.52-53)<br />

Consi<strong>de</strong>ra<strong>da</strong> pelos próprios revolucionários como <strong>de</strong>masia<strong>da</strong> incerta do ponto<br />

<strong>de</strong> vista político, a noção <strong>de</strong> "opinião pública" <strong>de</strong>sapareceu na pratica, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> 1793<br />

<strong>da</strong>ndo lugar, provisoriamente a expressão "espírito publico". Este passaria a<br />

<strong>de</strong>signar <strong>uma</strong> nova espécie <strong>de</strong> "opinião pública" por oposição àquela que,<br />

supostamente, é manipula<strong>da</strong> pelos contra-revolucionários; àquela que é "correta"<br />

porque está <strong>de</strong> acordo com o "Espírito <strong>da</strong> Revolução"; em s<strong>uma</strong>, aquela que, para o<br />

po<strong>de</strong>r, <strong>de</strong>verá ser compartilha<strong>da</strong> pelo povo.<br />

62


Uma outra forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir a "opinião pública" são as manifestações <strong>de</strong> rua.<br />

Em geral, as manifestações <strong>de</strong> rua são maneiras <strong>de</strong> exprimir opiniões contrárias aos<br />

conceitos pré-apresentados em candi<strong>da</strong>turas eleitorais e que não foram cumpri<strong>da</strong>s<br />

no período pós-eleitoral. Des<strong>de</strong> períodos revolucionários na França, po<strong>de</strong>mos ver a<br />

oposição entre os militares dos clubes que preten<strong>de</strong>m ser o próprio povo e os<br />

<strong>de</strong>putados como os únicos representantes legais do povo ser expressas através <strong>da</strong>s<br />

manifestações <strong>de</strong> ruas. (Chamagne, 1999, p.56-57)<br />

Proibi<strong>da</strong>s ate meados do século XIX, <strong>da</strong>ta que permitia nas ruas, até então,<br />

somente comemorações e celebrações, as manifestações <strong>de</strong> ruas continuaram<br />

durante muito tempo sendo um modo <strong>de</strong> expressão política. A maior parte <strong>de</strong>sses<br />

movimentos espontâneos procurava <strong>de</strong>rrubar pela força os regimes políticos<br />

percebidos como fracos ou enfraquecidos.<br />

As manifestações contemporâneas aparecem, segundo historiadores,<br />

somente entre fevereiro e maio <strong>de</strong> 1848, através <strong>de</strong> <strong>de</strong>sfiles pelas ruas <strong>de</strong> Paris <strong>de</strong><br />

cortejos pacíficos, maciços e disciplinados. Preten<strong>de</strong>ndo exprimir apoio ao governo<br />

provisório “republicano” ameaçado pela "reação burguesa". (Champagne, 1996,<br />

p.59)<br />

opinião.<br />

Champagne (1996, p.62) diz que:<br />

“[...] as fortes resistências do po<strong>de</strong>r em reconhecer as manifestações<br />

populares [...] como modo <strong>de</strong> ação política legitima é porque esta permitia<br />

precisamente que as pessoas exprimissem algo diferente do que po<strong>de</strong> ser<br />

dito com um boletim <strong>de</strong> voto ou assinatura <strong>de</strong> <strong>uma</strong> petição”.<br />

Sendo assim, as manifestações públicas são afirmações físicas <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

O aparecimento <strong>de</strong> <strong>uma</strong> imprensa é <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> importância no aparecimento,<br />

formação e difusão <strong>da</strong> "opinião pública", pois, faz com que noticias <strong>de</strong> um mundo<br />

inteiro seja difundi<strong>da</strong> ao mesmo tempo para a maioria <strong>da</strong> população gerando <strong>uma</strong><br />

fusão <strong>da</strong>s opiniões pessoais e locais em opiniões sociais e nacionais. As opiniões<br />

passam a ter mais força graças ao fato <strong>de</strong> serem compartilha<strong>da</strong>s e as toma<strong>da</strong>s <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>cisões, por isso, também po<strong>de</strong>m ser toma<strong>da</strong>s ao mesmo tempo.<br />

Na política, a imprensa contribui ca<strong>da</strong> vez mais para <strong>da</strong>r valor as coisas. Os<br />

jornalistas são ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iros li<strong>de</strong>res <strong>de</strong> opinião e participam ca<strong>da</strong> vez mais<br />

estreitamente <strong>da</strong>s manifestações. Eles e seus jornais manifestam-se praticamente<br />

em favor dos públicos, na ver<strong>da</strong><strong>de</strong> no lugar dos <strong>de</strong>les, ficando ao seu lado e<br />

colocando-se a serviço <strong>de</strong>le. Os jornalistas, por profissão, tornam-se influentes<br />

63


"lí<strong>de</strong>res <strong>de</strong> opinião": exprimem sua opinião que pensam ser também a opinião <strong>de</strong><br />

seus leitores e essa opinião pré-ajusta<strong>da</strong> ao publico, li<strong>da</strong> pelos leitores, ten<strong>de</strong> a<br />

tornar-se a opinião dos leitores e, por conseqüência, um importante componente do<br />

que é percebido como "opinião pública". A opinião do próprio público que passa<br />

pelos movimentos públicos <strong>de</strong> protesto e pela imprensa foi sendo reconheci<strong>da</strong><br />

progressivamente pelas elites políticas à medi<strong>da</strong> que a multidão foi <strong>de</strong>ixando <strong>de</strong> ser<br />

sinônimo <strong>de</strong> irracionali<strong>da</strong><strong>de</strong>. (Champage, 1996, p.68-72).<br />

Para Alfred Sauvy, em 1956 61 , a "opinião pública" existe e é um "po<strong>de</strong>r<br />

anônimo" que po<strong>de</strong>rá se tornar <strong>uma</strong> “força pública”. Segundo ele, <strong>de</strong>ve-se tomar o<br />

cui<strong>da</strong>do <strong>de</strong> estabelecer a distinção entre a "opinião pública" propriamente dita e a<br />

simples "maioria <strong>da</strong>s opiniões individuais sobre <strong>de</strong>terminado tema". Não se po<strong>de</strong><br />

esquecer, segundo Sauvy que a "opinião pública" se encontra, espontaneamente, do<br />

lado dos preconceitos e paixões.<br />

Segundo Champagne (1996, p.85), “nos últimos vinte amos, os estudos <strong>de</strong><br />

"opinião pública" têm sido limitados quase inteiramente às pesquisas <strong>de</strong> opinião<br />

realiza<strong>da</strong>s pelos institutos <strong>de</strong> son<strong>da</strong>gem sob a responsabili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> cientistas<br />

políticos”. Nas pesquisas <strong>de</strong> "opinião pública" não é possível comparar os resultados<br />

<strong>da</strong>s son<strong>da</strong>gens com o que seria obtido a partir <strong>de</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>iras consultas políticas<br />

nacionais, pois estas não <strong>de</strong>ixam mais que sucintas toma<strong>da</strong>s <strong>de</strong> posição por parte<br />

dos porta-vozes profissionais <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong> parte <strong>de</strong> população analisa<strong>da</strong>.<br />

Do ponto <strong>de</strong> vista técnico, para Champagne (1996, p.99), a questão que<br />

<strong>de</strong>vemos nos colocar não é se as pesquisas permitem ou não apren<strong>de</strong>r essa<br />

enti<strong>da</strong><strong>de</strong> política que é a "opinião pública", mas somente se permitem apreen<strong>de</strong>r as<br />

opiniões realmente existentes sobre <strong>de</strong>terminado problema, distinguindo<br />

especialmente as diversas formas que tais opiniões po<strong>de</strong>m assumir: opiniões<br />

priva<strong>da</strong>s já constituí<strong>da</strong>s, opiniões individuais que só existem em estado potencial,<br />

opiniões coletivamente labora<strong>da</strong>s e manifesta<strong>da</strong>s publicamente, grau <strong>de</strong> implicação<br />

dos indivíduos no problema levantado, nível <strong>de</strong> informação, etc.<br />

Para Champagne (1996, p.111-112):<br />

61 Alfred Sauvy, Lópinion publiuque, 1956.<br />

“Apesar <strong>da</strong> pretensão dos institutos <strong>de</strong> son<strong>da</strong>gens, estes estão longe <strong>de</strong><br />

registrar "estados <strong>de</strong> opinião". São contribuintes, sobretudo, para fazer<br />

acreditar que existe, a respeito <strong>de</strong> tudo ou quase tudo, <strong>uma</strong> "opinião<br />

pública" que é, permanentemente, movediça e flutuante [...]. Se os institutos<br />

<strong>de</strong> son<strong>da</strong>gens constituem um “progresso” é, talvez, no grau <strong>de</strong> sofisticação<br />

que traduzem à i<strong>de</strong>ologia <strong>de</strong>mocrática: ao acusarem os políticos <strong>de</strong> falar<br />

64


“em nome do povo”, os profissionais <strong>de</strong> pesquisas <strong>de</strong> opinião conseguem<br />

efetivamente melhor <strong>de</strong>sempenho ao levarem o próprio “povo” a falar <strong>da</strong><br />

mesma maneira”.<br />

A "opinião pública" dos institutos <strong>de</strong> son<strong>da</strong>gens é simplesmente a agregação<br />

estatística <strong>de</strong> opiniões priva<strong>da</strong>s que se tornam publicas. Não é <strong>uma</strong> opinião que se<br />

exprime em publico, quer seja por petições, tribuna livre na imprensa, <strong>de</strong>claração na<br />

televisão, carta <strong>de</strong> leitor envia<strong>da</strong> a um órgão <strong>de</strong> imprensa. Os institutos <strong>de</strong><br />

son<strong>da</strong>gem se <strong>de</strong>ixam levar, <strong>de</strong> alg<strong>uma</strong> forma, pelo que preten<strong>de</strong>m analisar.<br />

Diferentemente <strong>da</strong>s ciências naturais, a sociologia não trata <strong>de</strong> <strong>uma</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

imutável, fixa e <strong>da</strong><strong>da</strong> <strong>uma</strong> vez por to<strong>da</strong>s; a reali<strong>da</strong><strong>de</strong> social é <strong>uma</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong> histórica<br />

que é modifica<strong>da</strong> pelas representações sociais <strong>da</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong>. O objetivo <strong>da</strong> sociologia<br />

é, <strong>de</strong> fato, o estudo <strong>da</strong>s leis <strong>de</strong> transformação <strong>da</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong> social. (Champagne,<br />

1996, p.113,116)<br />

Segundo Champagne (1996, p117-118), embora nunca seja percebi<strong>da</strong>, a<br />

diferença <strong>de</strong> pontos <strong>de</strong> vista entre profissionais <strong>da</strong>s son<strong>da</strong>gens e sociólogos é<br />

consi<strong>de</strong>rável. Os primeiros acreditam na existência em si <strong>da</strong> "opinião pública" e<br />

procuram avalia-la o mais precisamente possível quando, afinal, do ponto <strong>de</strong> vista<br />

sociológico, ela não passa <strong>de</strong> <strong>uma</strong> crença coletiva cuja função política é garantir,<br />

nos regimes do tipo <strong>de</strong>mocrático, <strong>uma</strong> espécie <strong>de</strong> regulação <strong>da</strong> luta política. Sendo<br />

assim, não existe <strong>uma</strong> "ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira opinião pública", mas somente crenças na boa<br />

maneira <strong>de</strong> apreendê-la e avalia-la. Dito por outras palavras, a seu respeito existem<br />

apenas <strong>uma</strong> <strong>de</strong>finição social que é, por natureza, historicamente variável, e refere-se<br />

<strong>de</strong> fato, muito concretamente, ao campo social dos agentes que têm interesse a<br />

invocá-la, manipula-la ou agir sobre o que, do ponto <strong>de</strong> vista social, é <strong>de</strong>signado por<br />

esse nome.<br />

Aos jornalistas, em Champagne (1996, p.128):<br />

“são múltiplos os interesses pela tecnologia utiliza<strong>da</strong> pelos institutos <strong>de</strong><br />

son<strong>da</strong>gens em seus estudos progressivamente aperfeiçoa<strong>da</strong> pelos<br />

cientistas políticos. Antes <strong>de</strong> tudo, <strong>uma</strong> son<strong>da</strong>gem é um produto que tem<br />

<strong>uma</strong> função econômica para as empresas <strong>de</strong> imprensa: trata-se <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

informação que é <strong>de</strong>stina<strong>da</strong> a fazer ven<strong>de</strong>r os jornais. A imprensa escrita e<br />

as estações <strong>de</strong> rádio utilizam as son<strong>da</strong>gens, sobretudo as son<strong>da</strong>gens <strong>de</strong><br />

opinião segundo a lógica <strong>da</strong> informação es petacular e surpreen<strong>de</strong>nte, com<br />

publicação na primeira pagina e “exclusivi<strong>da</strong><strong>de</strong>” para atrair, pelo menos, a<br />

curiosi<strong>da</strong><strong>de</strong> ocasional dos leitores”.<br />

As pesquisas dos institutos <strong>de</strong> son<strong>da</strong>gem permitiam que os jornalistas se<br />

opusessem legitimamente aos políticos já que o faziam com as próprias armas do<br />

campo político e <strong>da</strong>dos concretos <strong>da</strong>s pesquisas. Anteriormente, com as entrevistas,<br />

65


os políticos diziam o que os eleitores queriam ouvir, no entanto, agora, com as<br />

pesquisas dos institutos <strong>de</strong> son<strong>da</strong>gens os jornalistas po<strong>de</strong>m usar a sua critica<br />

profissional para propor e expor suas próprias idéias e opiniões.<br />

Vemos assim o interesse mais geral <strong>da</strong> imprensa em multiplicar as<br />

son<strong>da</strong>gens: na medi<strong>da</strong> em que estas coletam, em gran<strong>de</strong> parte, os efeitos <strong>da</strong>s<br />

campanhas <strong>de</strong> opinião empreendi<strong>da</strong>s anteriormente pelos jornais sobre a vi<strong>da</strong><br />

política, obrigam os políticos a alimentar a imprensa com ações ou <strong>de</strong>clarações<br />

“para efeito <strong>da</strong> mídia” a fim <strong>de</strong> contrabalançarem essas campanhas, criando assim<br />

<strong>uma</strong> espécie <strong>de</strong> suspensão permanente propensa a alimentar um trabalho<br />

jornalístico, em parte, amplamente circular (Champagne, 1996, p.138)<br />

Com esse breve estudo, percebe-se que, a "opinião pública", <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o<br />

passado até hoje é <strong>de</strong> interesse dos políticos, meios <strong>de</strong> comunicação e influentes <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong>. Sendo assim, a "opinião pública" que anteriormente era a opinião <strong>de</strong> um<br />

pequeno grupo <strong>de</strong> “porta-vozes” <strong>da</strong> população em geral, po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rado não o<br />

que realmente ela é e nem a opinião <strong>da</strong> população, do popular, mas sim, o que hoje<br />

a mídia e as enti<strong>da</strong><strong>de</strong>s solicitadoras <strong>de</strong> estudos aos institutos <strong>de</strong> son<strong>da</strong>gens querem<br />

mostrar.<br />

66


3 Estudo <strong>de</strong> Caso<br />

Este caso tem como objetivo fazer um estudo comparativo entre os conceitos<br />

do referencial teórico com monografias <strong>de</strong> alunos do Curso <strong>de</strong> Especialização em<br />

Finanças <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do Paraná – <strong>UTFPR</strong>, Campus<br />

Curitiba.<br />

Este capítulo <strong>de</strong>screverá sucintamente ca<strong>da</strong> um dos quatro trabalhos – “O<br />

comportamento <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> em <strong>investimento</strong>s financeiros” <strong>de</strong> Maurílio<br />

Ribeiro Valle, “Previdência priva<strong>da</strong>, sonho e produto: <strong>uma</strong> análise do negocio dos<br />

“sonhos” no Brasil” <strong>de</strong> Denise <strong>da</strong> Silva Barcelos, “Estudo comparativo <strong>de</strong><br />

rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> entre ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança e clubes <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>” <strong>de</strong> Sandro<br />

Lambach e “Estudo comparativo <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s na construção civil em Curitiba<br />

(Pr) e no mercado financeiro” <strong>de</strong> Eduardo <strong>da</strong> Cunha Pilatti e Luiz Fernando Salvi –<br />

que iremos analisar para então aplicarmos os conhecimentos adquiridos no<br />

referencial teórico, focando, principalmente no que se refere à cultura do medo.<br />

3.1 Consi<strong>de</strong>rações Iniciais<br />

A metodologia utiliza<strong>da</strong> é a Metodologia Microindiciária <strong>de</strong> Ginsburg e <strong>da</strong><br />

História Cultural, a qual através <strong>de</strong> evidências e sinais, num trabalho <strong>de</strong> "<strong>de</strong>tetive",<br />

coleta e analisa informações.<br />

A Metodologia <strong>de</strong> Ginsburg, também se <strong>de</strong>staca por trabalhar com a micro-<br />

história, ou história <strong>da</strong>s pessoas e pequenos grupos, sendo <strong>uma</strong> ferramenta <strong>da</strong><br />

análise Qualitativa muito po<strong>de</strong>rosa e utiliza<strong>da</strong> em diversos ramos <strong>da</strong> Ciência.<br />

Conforme artigo <strong>de</strong> Filho (2005): verificando-se os novos mo<strong>de</strong>los<br />

historiográficos, a Nova História Cultural é que mais consegue trazer novos ares ao<br />

trabalho do historiador.<br />

A justificativa para isso está no esgotamento <strong>da</strong>s explicações ofereci<strong>da</strong>s por<br />

mo<strong>de</strong>los teóricos globalizantes, com tendências à totali<strong>da</strong><strong>de</strong>, nos quais o historiador<br />

era refém <strong>da</strong> busca <strong>da</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Esses argumentos globalilzados, por sua falta <strong>de</strong> capaci<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> interpretação<br />

<strong>de</strong> novos agentes históricos, passaram, então, a serem questionados. Outro <strong>da</strong>do<br />

que justifica essa investigação, segundo Filho(2005), é a <strong>de</strong> Pesavento (2002, p.<br />

7/8), on<strong>de</strong> “a Nova História Cultura correspon<strong>de</strong> hoje, a cerca <strong>de</strong> 80% <strong>da</strong> produção<br />

67


historiográfica nacional, expressa não só nas publicações especializa<strong>da</strong>s, sob forma<br />

<strong>de</strong> livros e artigos, como nas apresentações <strong>de</strong> trabalhos, em congressos e<br />

simpósios”. Também é significativamente utiliza<strong>da</strong> nas dissertações e teses,<br />

<strong>de</strong>fendi<strong>da</strong>s e em an<strong>da</strong>mento, nas universi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>brasileira</strong>s.<br />

Contudo Filho (2005) cita também alguns aspectos <strong>da</strong> Micro-história, <strong>uma</strong> vez<br />

que esta é um <strong>de</strong>sdobramento teórico que tem <strong>uma</strong> forte ligação com o surgimento<br />

<strong>da</strong> Nova História Cultural. O arcabouço intelectual que <strong>de</strong>u origem à Nova História<br />

Cultural tem sua ligação com um acontecimento no final <strong>da</strong> déca<strong>da</strong> <strong>de</strong> 1920, na<br />

França, <strong>de</strong> um novo pensamento sobre as questões historiográficas, i<strong>de</strong>ntifica<strong>da</strong><br />

como História <strong>da</strong>s Mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s.<br />

Esse novo modo <strong>de</strong> interpretação dos fatos históricos, segundo Filho (2005),<br />

buscava fugir <strong>da</strong> história historicizante: <strong>uma</strong> história que se furtava ao diálogo com<br />

as <strong>de</strong>mais Ciências H<strong>uma</strong>nas, a antropologia, a psicologia, a lingüística, a geografia,<br />

a economia, e, sobretudo, a sociologia.<br />

Em substituição <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> manejo dos fatos históricos, era preciso adotar,<br />

segundo Vainfas (2002, p. 17): <strong>uma</strong> história problematizadora do social, preocupa<strong>da</strong><br />

com as massas anônimas, seus modos <strong>de</strong> viver, sentir e pensar. Uma história com<br />

estruturas em movimento, com gran<strong>de</strong> ênfase no mundo <strong>da</strong>s condições <strong>de</strong> vi<strong>da</strong><br />

material, embora sem qualquer reconhecimento <strong>da</strong> <strong>de</strong>terminância do econômico na<br />

totali<strong>da</strong><strong>de</strong> social, à diferença <strong>da</strong> concepção marxista <strong>da</strong> história.<br />

Uma história não preocupa<strong>da</strong> com a apologia <strong>de</strong> príncipes ou generais em<br />

feitos singulares, senão com a socie<strong>da</strong><strong>de</strong> global, e com a reconstrução dos fatos em<br />

série passíveis <strong>de</strong> compreensão e explicação. Entretanto, muitas críticas vão se<br />

insurgir contra os <strong>de</strong>fensores <strong>da</strong> História <strong>da</strong>s Mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s. A mais comum e<br />

corrosiva <strong>de</strong>ssas críticas é <strong>de</strong> que a História <strong>da</strong>s Mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s torna multi-<br />

fragmentado o seu objeto <strong>de</strong> estudo. Isto é, "a chama<strong>da</strong> História <strong>da</strong>s Mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

abriu-se <strong>de</strong> tal modo a outros saberes e questionamentos que, no limite, pôs em<br />

risco a própria legitimi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> disciplina", conforme assegura Vainfas (I<strong>de</strong>m, p.<br />

55/56).<br />

Conforme Filho, acua<strong>da</strong> por críticas <strong>de</strong> várias formas, a História <strong>da</strong>s<br />

Mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s refugia-se na chama<strong>da</strong> Nova História Cultural. Sendo utiliza<strong>da</strong> a<br />

expressão Nova História Cultural é com intuito <strong>de</strong> separá-la <strong>da</strong>quilo que se<br />

convencionou chamar <strong>de</strong> Velha História Cultural.<br />

68


Segundo Pesavento (2004, p. 14/15), na Nova História Cultural foram<br />

<strong>de</strong>ixa<strong>da</strong>s <strong>de</strong> lado concepções <strong>de</strong> viés marxista, que entendiam a cultura integrante<br />

<strong>da</strong> superestrutura, como mero refluxo <strong>da</strong> infra-estrutura, ou mesmo <strong>da</strong> cultura como<br />

manifestação superior do espírito h<strong>uma</strong>no e, portanto, domínio <strong>da</strong>s elites. Também<br />

foram <strong>de</strong>ixa<strong>da</strong>s para trás concepções que opunham a cultura erudita à cultura<br />

popular, esta ingenuamente concebi<strong>da</strong> como reduto do autêntico. Longe vão<br />

também as assertivas her<strong>de</strong>iras <strong>de</strong> <strong>uma</strong> concepção <strong>da</strong> belle époque, que entendia a<br />

literatura e, por extensão, a cultura, como o sorriso <strong>da</strong> socie<strong>da</strong><strong>de</strong>, como produção<br />

para o <strong>de</strong>leite e a pura fruição do espírito.<br />

Assim, conforme Filho (2005), a Nova História Cultural, está trazendo <strong>uma</strong><br />

nova forma <strong>de</strong> a história tratar a cultura. Ain<strong>da</strong> segundo Pesavento (I<strong>de</strong>m, p. 15):<br />

Não mais como <strong>uma</strong> mera história do pensamento, on<strong>de</strong> se estu<strong>da</strong>va os gran<strong>de</strong>s<br />

nomes <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>da</strong><strong>da</strong> corrente ou escola. Mas, enxergar a cultura como um conjunto<br />

<strong>de</strong> significados partilhados e construídos pelos homens para explicar o mundo.<br />

Conforme Filho (2005), a Nova História Cultural, por tudo que foi acima<br />

mencionado, vai fazer ressalvas (sem, no entanto negá-lo) ao conceito <strong>de</strong><br />

mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s por classificá-lo ambíguo e excessivamente vago. Entretanto, a Nova<br />

História Cultural não nega a aproximação com as outras Ciências H<strong>uma</strong>nas, admite<br />

o conceito <strong>de</strong> longa duração e aceita os temas do cotidiano.<br />

Conforme in<strong>da</strong>gação <strong>de</strong> Vainfas (2002, p. 56): Os historiadores <strong>da</strong> cultura (...),<br />

não chegam propriamente a negar relevância dos estudos sobre o mental. Não<br />

recusam, pelo contrário, a aproximação com a antropologia e <strong>de</strong>mais ciências<br />

h<strong>uma</strong>nas, admitem a longa duração e não rejeitam os temas <strong>da</strong>s mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s e do<br />

cotidiano. Além disso, a Nova História Cultural quer também se aproximar <strong>da</strong>s<br />

massas anônimas.<br />

Desse modo, Filho (2005) diz que, assim, a Nova História Cultural revela <strong>uma</strong><br />

especial afeição pela informali<strong>da</strong><strong>de</strong>, por análises historiográficas que apresentem<br />

caminhos alternativos para a investigação histórica, indo on<strong>de</strong> as abor<strong>da</strong>gens<br />

tradicionais não foram.<br />

E foi neste mar <strong>de</strong> possibili<strong>da</strong><strong>de</strong>s novas que vários historiadores passaram a<br />

navegar. Um dos mais importantes e que, primeiramente, merece <strong>de</strong>staque,<br />

conforme Filho (2005), é o italiano Carlo Ginzburg, que em 1976 lança <strong>uma</strong> obra<br />

ímpar <strong>da</strong> Nova História Cultural (e por que não dizer, <strong>da</strong> Micro-História também),<br />

intitula<strong>da</strong> "O queijo e os vermes". Nela, o autor discorre sobre um moleiro con<strong>de</strong>nado<br />

69


como herege pela Inquisição Papal no século XVI. Po<strong>de</strong>-se consi<strong>de</strong>rar essa obra<br />

<strong>uma</strong> obra-síntese, <strong>uma</strong> vez que foi nela que Ginzburg abandonou o conceito <strong>de</strong><br />

mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s (as razões, já discutimos acima) e adotou o <strong>de</strong> cultura, <strong>de</strong>finindo-a<br />

como "o conjunto <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>s, crenças, códigos <strong>de</strong> comportamento próprios <strong>da</strong>s<br />

<strong>classe</strong>s subalternas em um certo período histórico" (GINZBURG, 1986, p. 16).<br />

Segundo Filho (2005), A partir <strong>de</strong> esta <strong>de</strong>finição ser possível, agora, recuperar<br />

o conflito <strong>de</strong> <strong>classe</strong>s em <strong>uma</strong> dimensão sociocultural, <strong>de</strong>ixando-se entrever no<br />

campo <strong>da</strong>s discussões teóricas aquilo que o historiador italiano chamou <strong>de</strong><br />

circulari<strong>da</strong><strong>de</strong> cultural, conceito que se opõe ao velho paradigma cultura popular X<br />

cultura erudita.<br />

Roger Chartier é outro pensador a ser <strong>de</strong>stacado <strong>da</strong> Nova História Cultural.<br />

Segundo Filho (2005), este, faz parte <strong>de</strong> <strong>uma</strong> geração contemporânea do <strong>de</strong>clínio<br />

<strong>da</strong>s mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s na França. Chartier é concor<strong>da</strong>nte <strong>da</strong>s idéias lança<strong>da</strong>s por<br />

Ginsburg pelo fato <strong>de</strong> também rejeitar a visão dicotômica cultura popular X cultura<br />

erudita em favor <strong>de</strong> <strong>uma</strong> visão mais ampla que, no limite, valoriza o<br />

dimensionamento <strong>da</strong> cultura no que diz respeito <strong>da</strong>s <strong>classe</strong>s sociais.<br />

Para isso, Chartier propõe um conceito <strong>de</strong> cultura como prática, e sugere para<br />

seu estudo as categorias <strong>de</strong> representação e apropriação. Representação analisa<strong>da</strong><br />

como algo que permite ver <strong>uma</strong> coisa ausente e que, segundo Chartier seria mais<br />

abrangente que o conceito <strong>de</strong> mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, <strong>uma</strong> vez que o ausente em si não po<strong>de</strong><br />

mais ser visitado.<br />

Segundo Pesavento (2004, p. 40): representar é, pois, fun<strong>da</strong>mentalmente,<br />

estar no lugar <strong>de</strong>, é presentificação <strong>de</strong> um ausente; é um apresentar <strong>de</strong> novo, que<br />

dá a ver <strong>uma</strong> ausência. A idéia central é, pois, a <strong>da</strong> substituição, que recoloca <strong>uma</strong><br />

ausência e torna sensível <strong>uma</strong> presença.<br />

Se o foco do conceito <strong>de</strong> representação é trazer para o presente o que não foi<br />

vivido e, <strong>de</strong>sse modo, po<strong>de</strong>r interpretá-lo, o <strong>de</strong> apropriação, segundo Chartier (1990,<br />

p. 26), é "construir <strong>uma</strong> história social <strong>da</strong>s interpretações remeti<strong>da</strong> para suas<br />

<strong>de</strong>terminações fun<strong>da</strong>mentais” que são o social, o institucional e, sobretudo, o<br />

cultural.<br />

Filho (2005) diz que “a proposta <strong>da</strong> Nova História Cultural seria o <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>codificar a reali<strong>da</strong><strong>de</strong> do já vivido por meio <strong>da</strong>s suas representações, <strong>de</strong>sejando<br />

chegar àquelas formas pelas quais a h<strong>uma</strong>ni<strong>da</strong><strong>de</strong> expressou-se a si mesmo e o<br />

mundo”.<br />

70


Para o historiador <strong>da</strong> cultura, isso é muito importante ressaltar, o passado só<br />

chega aos dias atuais por meio <strong>da</strong>s representações. Pesavento (2004, p. 42): "a<br />

rigor, o historiador [<strong>da</strong> cultura] li<strong>da</strong> com <strong>uma</strong> temporali<strong>da</strong><strong>de</strong> escoa<strong>da</strong>, com o não-<br />

visto, o não-vivido, que só se torna possível acessar através <strong>de</strong> registros e sinais do<br />

passado que chegam até ele".<br />

Assim, <strong>uma</strong> nova possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> investigação histórica surge como fazendo<br />

parte do número <strong>de</strong> mu<strong>da</strong>nças epistemológicas que acompanharam a emergência<br />

<strong>da</strong> Nova História Cultural. Isso significa o surgimento <strong>da</strong> Micro-História. Nessa é que<br />

muitos historiadores <strong>da</strong> Nova História Cultural, tiveram liber<strong>da</strong><strong>de</strong> para realizar suas<br />

pesquisas (como Ginzburg, já citado).<br />

Segundo Vainfas (2002, p. 68): o surgimento <strong>da</strong> Micro-História tem a ver com<br />

o <strong>de</strong>bate intelectual e historiográfico <strong>da</strong>s déca<strong>da</strong>s <strong>de</strong> 1970 e 1980. Tem a ver,<br />

também, com a questão <strong>da</strong> crise do paradigma marxista e <strong>de</strong> outros mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong><br />

história totalizante e com a solução <strong>da</strong>s mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s, que cedo se mostrou<br />

inconsistente no plano estritamente teórico-metodológico.<br />

Conforme Filho (2005), <strong>de</strong>ssa forma, as finali<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>da</strong> Micro-História movem-<br />

se no campo <strong>da</strong>s críticas à história <strong>da</strong>s mentali<strong>da</strong><strong>de</strong>s (vejam a coincidência com a<br />

Nova História Cultural), não se <strong>de</strong>ixando confundir com elas. Porém a questão <strong>de</strong><br />

maior fun<strong>da</strong>mentali<strong>da</strong><strong>de</strong> que <strong>de</strong>vemos fazer é: on<strong>de</strong> a Micro-História contribui com a<br />

Nova História Cultural? Do ponto <strong>de</strong> vista metodológico, a Micro-História avança nas<br />

pesquisas historiográficas por romper com a prática calca<strong>da</strong> na retórica e na<br />

estética.<br />

O trabalho <strong>da</strong> micro-história tem se focado na busca <strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>de</strong>scrição mais<br />

realista do comportamento h<strong>uma</strong>no, empregando um mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> ação que possa <strong>da</strong>r<br />

voz a personagens que, <strong>de</strong> outra maneira, ficariam no esquecimento.<br />

Segundo Levi (1992, p. 136), a micro-história possui, portanto, um papel muito<br />

específico <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> chama<strong>da</strong> Nova História Cultural: "refutar o relativismo, o<br />

irracionalismo e a redução do trabalho do historiador a <strong>uma</strong> ativi<strong>da</strong><strong>de</strong> puramente<br />

retórica que interprete os textos e não os próprios acontecimentos."<br />

Outro historiador que nos alerta para a importância <strong>da</strong> Micro-História,<br />

segundo Filho (2005), é Luís Reznick (2002, p. 3), on<strong>de</strong>: O espaço local, alçado em<br />

categoria central <strong>de</strong> análise, constitui <strong>uma</strong> nova possibili<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> estudo no quadro<br />

<strong>da</strong>s inter<strong>de</strong>pendências entre agentes e fatores <strong>de</strong>terminantes <strong>de</strong> experiências<br />

históricas eleitas pela lupa do historiador. Nessa nova concepção, ca<strong>da</strong> aparente<br />

71


<strong>de</strong>talhe, insignificante para um olhar apressado ou na busca exclusiva dos gran<strong>de</strong>s<br />

contornos, adquire valor e significado na re<strong>de</strong> <strong>de</strong> relações plurais <strong>de</strong> seus múltiplos<br />

elementos constitutivos.<br />

Com isso, o historiador <strong>de</strong> orientação micro-histórica, aliado pelos conceitos<br />

<strong>da</strong> Nova História Cultural, po<strong>de</strong> "enxergar" acontecimentos, fatos que a historiografia<br />

tradicional não "enxerga" e trazer à tona <strong>da</strong>dos que estavam adormecidos. Portanto,<br />

sua análise é mais criteriosa, justa e <strong>de</strong>mocrática, conforme Filho (2005).<br />

Ain<strong>da</strong> segundo o pensamento <strong>de</strong> Reznick (2002, p. 3): Ao eleger o local como<br />

circunscrição <strong>de</strong> análise, como escala própria <strong>de</strong> observação, não abandona as<br />

margens (...), as normas, que, regra geral, ultrapassa o espaço local ou<br />

circunscrições reduzi<strong>da</strong>s. A escrita <strong>da</strong> história local costura ambientes intelectuais,<br />

ações políticas, processos econômicos que envolvem comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s regionais,<br />

nacionais e globais.<br />

Desse modo, Filho (2005) diz que o exercício historiográfico inci<strong>de</strong> na<br />

<strong>de</strong>scrição dos mecanismos <strong>de</strong> apropriação — a<strong>da</strong>ptação, resposta e criação — às<br />

normas que ultrapassam as comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s locais.<br />

Dessa forma, é possível afirmar, conforme Levi (1992, p. 139), que "o<br />

princípio unificador <strong>de</strong> to<strong>da</strong> pesquisa micro-histórica é a crença em que a<br />

observação microscópica revelará fatores previamente não observados", o que não<br />

aconteceria n<strong>uma</strong> abor<strong>da</strong>gem tradicional.<br />

Assim a micro-história tem como finali<strong>da</strong><strong>de</strong> o registro <strong>de</strong> vários<br />

acontecimentos ou fatos marcantes que, <strong>de</strong> outra forma, não teriam percepções e<br />

que, entretanto, po<strong>de</strong>m ser entendidos por sua introdução num contexto mais<br />

abrangente, ou seja, na trama do discurso cultural.<br />

3.2 Estudos <strong>de</strong> caso<br />

A seguir, serão <strong>de</strong>scritos ca<strong>da</strong> um dos quatro trabalhos que <strong>da</strong>rão base para<br />

a analise <strong>da</strong> cultura do medo nos <strong>investimento</strong>s no Brasil. Fazem parte <strong>de</strong>ssa<br />

análise os trabalhos dos também alunos <strong>da</strong> Universi<strong>da</strong><strong>de</strong> Tecnológica Fe<strong>de</strong>ral do<br />

Paraná – UTFPr: Eduardo <strong>da</strong> Cunha Pilatti e Luiz Fernando Salvi Deise <strong>da</strong> Silva<br />

Barcelos, Maurílio Ribeiro do Valle e Sandro Lambach, com seus respectivos temas<br />

<strong>de</strong> pesquisa: “Estudo comparativo <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s na construção civil em Curitiba<br />

72


(Pr) e no mercado financeiro”, “Previdência priva<strong>da</strong>, sonho e produto: <strong>uma</strong> análise<br />

do negócio dos “sonhos” no Brasil”, “O comportamento <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong><br />

em <strong>investimento</strong>s financeiros”, “Estudo comparativo <strong>de</strong> rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> entre ca<strong>de</strong>rneta<br />

<strong>de</strong> poupança e clubes <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>”.<br />

Após a <strong>de</strong>scrição inicial <strong>de</strong> ca<strong>da</strong> trabalho acadêmico será feita a ligação entre<br />

o referencial teórico e os estudos <strong>de</strong> casos apresentados. Procura-se i<strong>de</strong>ntificar<br />

através dos quatro trabalhos acadêmicos apresentados evi<strong>de</strong>ncias e sinais <strong>da</strong><br />

cultura do medo nos <strong>investimento</strong>s no Brasil.<br />

3.2.1. O comportamento <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> em <strong>investimento</strong>s<br />

financeiros<br />

O objetivo geral do trabalho <strong>de</strong> Maurílio Ribeiro Vale (2006) é analisar o<br />

comportamento <strong>da</strong>s famílias <strong>brasileira</strong>s <strong>de</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> na forma como elas fazem<br />

seus <strong>investimento</strong>s.<br />

Seus objetivos específicos são i<strong>de</strong>ntificar quais as aplicações financeiras mais<br />

utiliza<strong>da</strong>s por estas famílias e <strong>de</strong>screver o comportamento do investidor <strong>de</strong> <strong>classe</strong><br />

<strong>média</strong> diante <strong>da</strong>s varias opções <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s disponíveis no mercado.<br />

As conclusões <strong>de</strong> Maurílio em seu trabalho acadêmico é a i<strong>de</strong>ntificação <strong>de</strong><br />

como a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> investe seus recursos exce<strong>de</strong>ntes.<br />

3.2.1.1 Evidências <strong>de</strong> contexto cultural<br />

I<strong>de</strong>ntifica-se evi<strong>de</strong>ncias <strong>de</strong> contexto cultural <strong>de</strong>vido à i<strong>de</strong>ntificação do<br />

comportamento <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s <strong>da</strong>s famílias <strong>de</strong> <strong>classe</strong> media <strong>brasileira</strong>. Todo e<br />

qualquer estudo relacionado a comportamento, tem gran<strong>de</strong> ligação com o estudo e<br />

conceito <strong>de</strong> cultura.<br />

Afinal, a cultura está inseri<strong>da</strong> no contexto <strong>de</strong> costume, do comum, do dia-a-dia<br />

<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado povo, <strong>classe</strong> social ou grupo <strong>de</strong> pessoas. Ligado ao que comumente<br />

se faz e ao que é passado <strong>de</strong> geração a geração.<br />

E este comportamento que estu<strong>da</strong> Maurílio, evi<strong>de</strong>ncia maneiras e perfis, que,<br />

passam <strong>de</strong> geração para geração <strong>de</strong>ntro <strong>da</strong> <strong>classe</strong> media.<br />

73


Um dos costumes que passa pelas gerações, e que está i<strong>de</strong>ntificado é<br />

acreditar que aplicar na ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança é ain<strong>da</strong> o melhor <strong>investimento</strong> do<br />

mercado, por ser <strong>uma</strong> aplicação segura, com rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> conheci<strong>da</strong>, e, sobretudo,<br />

por ser conheci<strong>da</strong> pela gran<strong>de</strong> maioria <strong>da</strong> população.<br />

Sendo assim, a aplicação <strong>da</strong> <strong>classe</strong> media na ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança, no<br />

Brasil, já passa a ter um <strong>perfil</strong> cultural adotado pelo costume (por ser normal se<br />

aplicar na poupança, sem, muitas vezes, as pessoas procurarem outros tipos <strong>de</strong><br />

<strong>investimento</strong>s possíveis e existentes) e talvez imposta – através <strong>de</strong> facili<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

financeiras –, há anos, pelos governos.<br />

3.2.1.2 Evidências e sinais <strong>da</strong> cultura do medo<br />

Fica claro que para a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> a cultura do medo se apresenta quando<br />

abortamos o tema, on<strong>de</strong> investir, como investir e qual dinheiro aplicar.<br />

Segundo Maurílio, “o melhor <strong>investimento</strong> é o que permite ao pequeno<br />

investidor dormir tranqüilo. É aquele que não coloca em risco a saú<strong>de</strong> financeira e<br />

aquele que vai financiar os objetivos planejados”. Suas palavras <strong>de</strong>ixam claro que a<br />

<strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>de</strong>ve investir somente com segurança, sem correr riscos.<br />

Para que o valor aplicado, não <strong>de</strong>ixe as pessoas preocupa<strong>da</strong>s, sem<br />

“dormirem tranqüilas” as pessoas <strong>de</strong>vem investir somente o exce<strong>de</strong>nte, não<br />

colocando em risco um montante que será necessário para financiar a saú<strong>de</strong> ou<br />

outras <strong>de</strong>spesas importantes. Fica assim, visto que a cultura do medo, esta sim<br />

imposta quando o tema são <strong>investimento</strong>s para a <strong>classe</strong> <strong>média</strong>.<br />

Devido ao medo <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r algum dinheiro que possa vir a ser importante,<br />

com medo dos riscos que um <strong>investimento</strong> possa trazer a <strong>uma</strong> <strong>classe</strong> que sempre<br />

passou por dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s durante to<strong>da</strong> a historia do país, sente-se necessária muita<br />

cautela e planejamento antes <strong>de</strong> qualquer tipo <strong>de</strong> aplicação em mercados<br />

financeiros.<br />

3.2.2 Previdência priva<strong>da</strong>, sonho e produto: <strong>uma</strong> análise do negócio dos<br />

“sonhos” no Brasil.<br />

74


O objetivo geral do estudo <strong>de</strong> Deise <strong>da</strong> Silva Barcelos (2005) é verificar o<br />

comportamento dos brasileiros perante o produto previdência priva<strong>da</strong>, bem como o<br />

comportamento <strong>da</strong>s instituições financeiras diante <strong>de</strong>sse tipo <strong>de</strong> produto para com<br />

os consumidores.<br />

Seus objetivos específicos são:<br />

• Levantar o estado <strong>da</strong> arte <strong>da</strong> provi<strong>de</strong>ncia social a nível mundial;<br />

• Demonstrar as questões sociais <strong>da</strong> previdência social no mundo:<br />

previdência publica x previdência priva<strong>da</strong>; envelhecimento <strong>da</strong>s pessoas; robotização;<br />

a relação <strong>da</strong> previdência priva<strong>da</strong> e o estado; a normalização <strong>da</strong> previdência priva<strong>da</strong><br />

pelo estado; previdência priva<strong>da</strong> e sua relação com o crescimento econômico <strong>de</strong> um<br />

país;<br />

• Previdência social no Brasil: breve histórico e questões atuais;<br />

• Bancos, seguradoras e a previdência priva<strong>da</strong> no Brasil: breve histórico <strong>da</strong><br />

previdência priva<strong>da</strong> e questões atuais;<br />

• Previdência priva<strong>da</strong> e o resultado financeiro dos bancos/seguradoras.<br />

Deise em seu trabalho acadêmico conclui falta ain<strong>da</strong> a popularização do<br />

produto previdência complementar e <strong>uma</strong> melhor informação por parte <strong>da</strong> mídia dos<br />

acontecimentos no mundo. Ou seja, é preciso que as instituições mostrem a<br />

ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira finali<strong>da</strong><strong>de</strong> do produto, apesar <strong>da</strong> flexibili<strong>da</strong><strong>de</strong>, pois ain<strong>da</strong> há a<br />

<strong>de</strong>sconfiança <strong>da</strong> previdência complementar aberta, mesmo com to<strong>da</strong> a crise que a<br />

previdência pública gera. Afinal o público tem medo do “<strong>de</strong>sconhecido”.<br />

3.2.1.1 Evidências <strong>de</strong> contexto cultural<br />

O objetivo do trabalho acadêmico <strong>de</strong> Deise é analisar o comportamento dos<br />

brasileiros perante o produto previdência priva<strong>da</strong>. Por analisar o comportamento <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>terminado grupo, já se <strong>de</strong>termina que esteja se falando <strong>de</strong> algo corriqueiro na vi<strong>da</strong><br />

<strong>da</strong>s pessoas <strong>de</strong> certo grupo, sendo assim, já se <strong>de</strong>termina a presença <strong>de</strong> <strong>uma</strong><br />

cultura, <strong>de</strong> costumes que este <strong>de</strong>terminado grupo está acost<strong>uma</strong>do a ter e as<br />

<strong>de</strong>cisões que comumente toma.<br />

Como <strong>uma</strong> questão cultural, nota-se no trabalho que existem alg<strong>uma</strong>s<br />

conclusões <strong>de</strong>scritas pela autora que nos fazem focar no conceito cultural do grupo<br />

estu<strong>da</strong>do, como, por exemplo, on<strong>de</strong> a autora cita que a previdência surgiu <strong>da</strong><br />

75


necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> proteção as pessoas quanto a incerteza e insegurança em relação<br />

ao futuro.<br />

Mas, afinal, quem po<strong>de</strong> dizer que o futuro é incerto mediante ao fato <strong>de</strong> que o<br />

governo paga a aposentadoria, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente dos valores recebidos, para<br />

seus aposentados e àqueles que têm este direito? Talvez, dizer que o futuro é<br />

incerto já seja costume para os brasileiros.<br />

Da mesma maneira, percebe-se <strong>uma</strong> evi<strong>de</strong>ncia cultural quando Deise cita que<br />

os li<strong>de</strong>res do mercado <strong>de</strong> previdência priva<strong>da</strong> são empresas <strong>de</strong> nomes tradicionais,<br />

e são li<strong>de</strong>res por <strong>uma</strong> questão <strong>de</strong> confiança, <strong>uma</strong> questão <strong>de</strong> cultura. Como a<br />

própria autora cita os nomes <strong>da</strong>s empresas em quem as pessoas po<strong>de</strong>m confiar e<br />

entregar seu futuro financeiro já está inserido na socie<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Poucas vezes, e provavelmente na gran<strong>de</strong> minoria <strong>da</strong>s vezes, as pessoas<br />

que vão “comprar” o produto previdência priva<strong>da</strong> <strong>de</strong>vem ter o costume <strong>de</strong> fazer<br />

pesquisas <strong>de</strong> mercado para obterem informações <strong>da</strong>s empresas. Utilizam a<br />

empresa, por esta ser conheci<strong>da</strong> ou porque alg<strong>uma</strong>s pessoas já fizeram uso <strong>da</strong><br />

mesma e isso, é cultura.<br />

Outra citação que evi<strong>de</strong>ncia a presença <strong>de</strong> cultura no trabalho acadêmico <strong>de</strong><br />

Deise é o fato <strong>de</strong> que o <strong>perfil</strong> cultural (como a própria autora escreve) do individuo<br />

que adquire a previdência priva<strong>da</strong> são aqueles <strong>de</strong> ren<strong>da</strong> <strong>de</strong> <strong>de</strong>z salários mínimos e<br />

bem escolarizado e informado.<br />

O motivo pelo qual isto ocorre vem <strong>de</strong> um costume <strong>de</strong> anos, que pessoas<br />

<strong>de</strong>ste grupo <strong>de</strong> pessoas normalmente utilizam <strong>de</strong>ste produto para facilitar suas vi<strong>da</strong>s<br />

após aposenta<strong>da</strong>s.<br />

A falta <strong>de</strong> cultura também esta presente no trabalho, on<strong>de</strong> <strong>uma</strong> <strong>da</strong>s questões<br />

<strong>de</strong> sua pesquisa respon<strong>de</strong> que os consultores/gerentes <strong>de</strong> bancos têm dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s<br />

<strong>de</strong> ven<strong>de</strong>r certos tipos <strong>de</strong> produtos aos seus clientes <strong>de</strong>vido a falta <strong>de</strong> cultura.<br />

Isto <strong>de</strong>ve ocorrer nos casos <strong>de</strong> produtos menos conhecidos e divulgados, e<br />

<strong>de</strong>vido ao <strong>de</strong>sinteresse <strong>da</strong>s pessoas on<strong>de</strong>, se a população e o público alvo não o<br />

conhecem e não tem o interesse <strong>de</strong> conhecer <strong>de</strong>terminado produto, não terão<br />

coragem <strong>de</strong> “arriscar” suas finanças ou parte <strong>de</strong>las.<br />

76


3.2.2.1 Evidências e sinais <strong>da</strong> cultura do medo<br />

Analisando a cultura do medo <strong>de</strong>scrita neste trabalho, conseguimos analisar<br />

que existem pontos on<strong>de</strong> po<strong>de</strong>mos encontrá-la no trabalho <strong>de</strong> Deise.<br />

Diz-se que os li<strong>de</strong>res do mercado <strong>de</strong> previdência, em geral, são empresas<br />

tradicionais no segmento financeiro e que suas marcas gozam <strong>de</strong> vários atributos,<br />

valores e cultura como, por exemplo, a confiança, e alem disso, são vistas como<br />

marcas extremamente fortes. Mostra-se nessas poucas palavras que as pessoas<br />

acreditam no que é tradicional, no que já é imposto historicamente, nas empresas<br />

que já são corriqueiras nas vi<strong>da</strong>s <strong>da</strong>s pessoas.<br />

A crise <strong>da</strong> previdência pública, <strong>de</strong>monstra<strong>da</strong> pela mídia vem ocasionando a<br />

<strong>de</strong>sconfiança e a incerteza no sistema público previ<strong>de</strong>nciário e <strong>de</strong>vido ao medo <strong>de</strong><br />

um futuro incerto, as pessoas <strong>de</strong> <strong>classe</strong> media começam a procurar a participação<br />

nas previdências priva<strong>da</strong>s como <strong>uma</strong> maneira <strong>de</strong> fortalecer as reservas para o<br />

futuro. Esta alternativa, também passa a ser, <strong>uma</strong>s <strong>da</strong>s melhores formas dos<br />

trabalhadores informais ou autônomos garantirem um futuro menos incerto, pois com<br />

a previdência priva<strong>da</strong> conseguem fazer <strong>uma</strong> “aposentadoria” mais real e concreta.<br />

Porem, <strong>de</strong>vido ao fato <strong>de</strong> muitas instituições que trabalham com os planos <strong>de</strong><br />

previdência priva<strong>da</strong> já terem tido problemas no passado, como necessi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

fechar sem po<strong>de</strong>r remunerar seus aplicadores, os aposentados entrevistados por<br />

Deise ain<strong>da</strong> não têm certeza quanto ao futuro <strong>de</strong>ssas instituições e por isso ain<strong>da</strong><br />

<strong>de</strong>sconfiam e têm medo <strong>de</strong> colocar seu dinheiro neste tipo <strong>de</strong> empresa.<br />

As dificul<strong>da</strong><strong>de</strong>s que os gerentes/consultores têm <strong>de</strong> atingirem suas metas <strong>de</strong><br />

ven<strong>da</strong>s <strong>de</strong>sse produto <strong>de</strong>monstra a falta <strong>de</strong> cultura <strong>da</strong> população <strong>brasileira</strong> em<br />

relação aos produtos <strong>da</strong> previdência priva<strong>da</strong> que não dá gran<strong>de</strong> valor a <strong>uma</strong><br />

alternativa viável para um futuro mais seguro.<br />

A falta <strong>de</strong> popularização <strong>de</strong>ste produto e <strong>uma</strong> melhor informação através <strong>da</strong><br />

mídia dos acontecimentos no mundo, talvez inserissem, através <strong>da</strong> cultura do medo,<br />

a reali<strong>da</strong><strong>de</strong> do que hoje acontece com a previdência <strong>de</strong> paises <strong>de</strong>senvolvidos e faria<br />

com que as pessoas <strong>de</strong>ixassem <strong>de</strong> ter “medo” dos produtos privados, pois com a<br />

participação <strong>da</strong> mídia, esses <strong>de</strong>ixariam, facilmente, <strong>de</strong> serem produtos<br />

<strong>de</strong>sconhecidos à população <strong>brasileira</strong>.<br />

77


3.2.3 Estudo comparativo <strong>de</strong> rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> entre ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança e<br />

clubes <strong>de</strong> <strong>investimento</strong><br />

O principal objetivo do estudo <strong>de</strong> Sandro Lambach (2005) é conhecer a<br />

estrutura <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s, e através <strong>da</strong> análise <strong>da</strong>s series históricas com o calor<br />

<strong>da</strong>s cotas dos clubes Rio e Mercosul <strong>da</strong> corretora Prime S.A, verificar a capaci<strong>da</strong><strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> retorno <strong>de</strong>stes clubes <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s e, qual o risco que estes clubes oferecem<br />

e verificam através dos índices Sharpe e Treynor qual dos dois é a melhor opção <strong>de</strong><br />

<strong>investimento</strong>.<br />

Uma <strong>da</strong>s conclusões do trabalho <strong>de</strong> Sandro é consi<strong>de</strong>rar que os clubes <strong>de</strong><br />

<strong>investimento</strong>s analisados po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>rados, até o presente momento, boas<br />

alternativas <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s. Pois os retornos apresentados por estes clubes no<br />

período do estudo superam e muito os retornos dos <strong>investimento</strong>s tradicionais como<br />

a ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança.<br />

3.2.3.1 Evidências <strong>de</strong> contexto cultural<br />

Existem no estudo <strong>de</strong> Sandro evi<strong>de</strong>ncias claras do conceito <strong>de</strong> cultura. Po<strong>de</strong>-<br />

se iniciar observando on<strong>de</strong> o autor relaciona os índices <strong>de</strong> risco e retorno que estão<br />

atrelados aos <strong>investimento</strong>s e o comportamento <strong>de</strong> investidor em relação a estes<br />

índices.<br />

Segundo Sandro, e os índices utilizados em seu estudo, o comportamento do<br />

investidor em relação a estes dois índices <strong>de</strong>veria estar mais ligado ao retorno<br />

histórico <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado produto e menos ao risco ou algum índice <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenho.<br />

Mas isto não é ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.<br />

Culturalmente, a <strong>classe</strong> media opta pela segurança, mesmo que a opção seja<br />

a menos rentável, por <strong>uma</strong> questão <strong>de</strong> costume e medo do incerto. Sandro ain<strong>da</strong><br />

salienta que a ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança ain<strong>da</strong> é o <strong>investimento</strong> mais popular do Brasil,<br />

não somente pelos incentivos fiscais, mas por ser atrativa <strong>de</strong>vido à alta liqui<strong>de</strong>z e<br />

seu baixíssimo risco.<br />

78


3.2.3.2 Evidências e sinais <strong>da</strong> cultura do medo<br />

Este estudo comparativo conclui que, no período estu<strong>da</strong>do, os clubes <strong>de</strong><br />

<strong>investimento</strong>s foram ótimas alternativas <strong>de</strong> <strong>investimento</strong> para pequenos investidores.<br />

Já, a ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança não foi um <strong>investimento</strong> satisfatório neste período, por<br />

seu índice <strong>de</strong> rendimento ter ficado bem abaixo do índice do IGP-M no mesmo<br />

período.<br />

Porem, <strong>de</strong>vido à cultura e ao apelo <strong>da</strong> mídia que incentiva e direciona o<br />

pequeno investidor, a população <strong>brasileira</strong> ain<strong>da</strong> migra e investe muito na poupança,<br />

in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> seus rendimentos. Esse fato também ocorre <strong>de</strong>vido ao baixíssimo<br />

fator <strong>de</strong> risco <strong>da</strong> poupança. Risco que muitas vezes os investidores pensam estar<br />

passando no mercado dos fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s, quando, em curto prazo po<strong>de</strong><br />

ocorrer que<strong>da</strong> na rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> do fundo.<br />

No <strong>de</strong>sespero e no medo <strong>de</strong> per<strong>da</strong> <strong>de</strong> capital, muitas vezes os investidores<br />

tiram seu dinheiro mesmo na baixa dos fundos, esquecendo <strong>de</strong> verificar que, no<br />

longo prazo, os fundos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s são produtos muito rentáveis (como<br />

comprovou Sandro em seu trabalho). Isso ocorre também, alem <strong>da</strong> visão <strong>de</strong> longo<br />

prazo, <strong>de</strong>vido à inexperiência dos investidores brasileiro em atuar no mercado <strong>de</strong><br />

capitais. Evi<strong>de</strong>ncias claras <strong>da</strong> cultura do medo.<br />

3.2.4 Estudo comparativo <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s na construção civil em Curitiba (Pr)<br />

e no mercado financeiro<br />

O objetivo do estudo <strong>de</strong> Eduardo <strong>da</strong> Cunha Pilatti e Luiz Fernando Salvi<br />

<strong>de</strong>nominado é verificar se os <strong>investimento</strong>s no setor <strong>da</strong> construção civil em Curitiba<br />

– Pr são um bom negócio.<br />

O estudo conclui que o empreendimento mais presente no mercado<br />

imobiliário curitibano são os apartamentos <strong>de</strong> três quartos.<br />

3.2.4.1 Evidências <strong>de</strong> contexto cultural<br />

A cultura apresenta gran<strong>de</strong> papel no <strong>perfil</strong> dos investidores em apartamentos<br />

<strong>de</strong> três quartos. Pois investir em imóveis é tradicionalmente um “gran<strong>de</strong> negocio”.<br />

79


Quem nunca ouviu <strong>de</strong> seus pais a frase: “compre imóveis que é um <strong>investimento</strong><br />

garantido”?<br />

Talvez seja mesmo garantido, pois dificilmente se per<strong>de</strong> um imóvel e<br />

dificilmente o mesmo per<strong>de</strong> seu valor, porem, se a idéia <strong>de</strong> comprar um imóvel for<br />

para que se tenham lucros com ele – no caso <strong>de</strong> aluguel – estudos comprovam que,<br />

mesmo com esta intenção, muitas vezes o <strong>investimento</strong> não vale a pena. Comprar<br />

imóvel, in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do objetivo <strong>de</strong> utilizá-lo, <strong>de</strong>ve ser sempre <strong>uma</strong> atitu<strong>de</strong> muito<br />

bem pensa<strong>da</strong> e estu<strong>da</strong><strong>da</strong>.<br />

3.2.4.1 Evidências e sinais <strong>da</strong> cultura do medo<br />

Este estudo comparativo mostra que <strong>uma</strong> boa oportuni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s<br />

no Brasil é a construção civil. Os <strong>investimento</strong>s em construção civil no Brasil já são<br />

<strong>uma</strong> questão cultural.<br />

Contrastando com a Bolsa <strong>de</strong> Valores – e com a cultura norte-americana <strong>de</strong><br />

<strong>investimento</strong>s –, os brasileiros acreditam que investir em imóveis é <strong>de</strong> fato um<br />

gran<strong>de</strong> negócio, isso porque os imóveis mostram-se mais estáveis ao longo do<br />

tempo – apesar <strong>da</strong> pouca rentabili<strong>da</strong><strong>de</strong> e baixa liqui<strong>de</strong>z – e ain<strong>da</strong> têm a vantagem <strong>de</strong><br />

serem um bem físico, o que faz as pessoas acreditar na “reali<strong>da</strong><strong>de</strong>” do <strong>investimento</strong>,<br />

pois esses são visíveis e palpáveis, mostrando que a cultura do medo, po<strong>de</strong> ser<br />

leva<strong>da</strong> ao extremo, neste caso, pois o investidor não tem duvi<strong>da</strong>s pois está vendo<br />

on<strong>de</strong> está sendo investido seu dinheiro.<br />

Alem <strong>de</strong> culturalmente serem consi<strong>de</strong>rados um dos melhores <strong>investimento</strong>s<br />

financeiros, junto com a poupança, o governo brasileiro está incentivando a<br />

construção civil no país.<br />

De acordo com isso, a mídia dá apoio e mostra em seus veículos <strong>de</strong><br />

comunicação novos empreendimentos e lançamentos no mercado, convencendo<br />

que, <strong>de</strong> fato, o <strong>investimento</strong> em imóveis po<strong>de</strong> ser realmente muito lucrativo. E com<br />

isso, a atenção po<strong>de</strong> estar sendo <strong>de</strong>svia<strong>da</strong> dos <strong>de</strong>mais <strong>investimento</strong>s que, po<strong>de</strong>m<br />

ser, muito mais lucrativos que os imóveis.<br />

Esta interferência <strong>da</strong> mídia e do governo fe<strong>de</strong>ral faz com que a duvi<strong>da</strong> em<br />

on<strong>de</strong> investir e a crença que os imóveis são, com certeza, <strong>investimento</strong>s certos<br />

diminua a incidência e evi<strong>de</strong>ncia <strong>da</strong> cultura do medo quando falamos <strong>de</strong> investir em<br />

imóveis no Brasil.<br />

80


4 Consi<strong>de</strong>rações Finais<br />

O mercado financeiro brasileiro tem se <strong>de</strong>senvolvido intensamente nos<br />

últimos anos. As alternativas <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s têm aumentado muito, focando,<br />

principalmente a diversi<strong>da</strong><strong>de</strong>, tentando abranger, ca<strong>da</strong> vez mais, todos os níveis <strong>da</strong><br />

socie<strong>da</strong><strong>de</strong>. A intenção <strong>da</strong>s empresas do mercado <strong>de</strong> capitais é facilitar ao investidor,<br />

e principalmente os pequenos investidores e aqueles com pouca experiência, as<br />

aplicações <strong>de</strong> suas reservas, prestando, muitas vezes, serviços <strong>de</strong> “consultoria” às<br />

pessoas interessa<strong>da</strong>s, <strong>da</strong>ndo-lhes dicas e ven<strong>de</strong>ndo produtos aos interessados em<br />

planejar <strong>uma</strong> maior ren<strong>da</strong> ou futuro financeiro.<br />

Estudos sobre a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> têm provado que esta já possui<br />

alg<strong>uma</strong>s preferências <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s. Entre eles, po<strong>de</strong>-se citar a ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong><br />

poupança, os produtos <strong>de</strong> previdência priva<strong>da</strong> e os imóveis.<br />

O significado <strong>de</strong> cultura é <strong>de</strong> s<strong>uma</strong> importância para enten<strong>de</strong>rmos porque os<br />

investidores <strong>de</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> formam um <strong>perfil</strong> especifico, e quase previsível <strong>de</strong><br />

<strong>investimento</strong>s financeiros. Não po<strong>de</strong>mos esquecer que cultura está diretamente<br />

liga<strong>da</strong> ao costume, à tradição que normalmente e instintivamente é passa<strong>da</strong> <strong>de</strong><br />

geração para geração <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado grupo. Muitas vezes, estes costumes,<br />

a forma <strong>de</strong> tomar <strong>de</strong>termina<strong>da</strong> ação ou <strong>de</strong>cisão, o pensamento formado <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>terminado assunto, já está imposto no individuo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o inicio <strong>de</strong> sua formação,<br />

sem muitas vezes as pessoas pensarem no porque <strong>da</strong>s coisas serem como são,<br />

passando, muitas vezes, a vi<strong>da</strong> inteira, simplesmente aceitando que as coisas são<br />

como são, isto é cultura. Algo que é normal, tradicional, corriqueiro, costume em<br />

<strong>de</strong>terminado grupo ou <strong>classe</strong> <strong>de</strong> pessoas.<br />

Diante <strong>da</strong> conclusão do que é cultura, po<strong>de</strong>mos observar este contexto nos<br />

tipos <strong>de</strong> <strong>investimento</strong>s citados acima. Po<strong>de</strong>mos perceber agora, o porquê <strong>da</strong> <strong>classe</strong><br />

81


<strong>média</strong> investir, por exemplo, na ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong> poupança. Investir na ca<strong>de</strong>rneta <strong>de</strong><br />

poupança vem sendo corriqueiro para a <strong>classe</strong> media <strong>brasileira</strong> há anos, um<br />

<strong>investimento</strong> <strong>de</strong> baixíssimo retorno porem <strong>de</strong> baixo risco e alta liqui<strong>de</strong>z, além <strong>de</strong>stas<br />

características o governo incentiva o <strong>de</strong>posito financeiro neste produto há muito<br />

tempo, através <strong>de</strong> incentivos fiscais e facili<strong>da</strong><strong>de</strong>s nas movimentações financeiras.<br />

Mas, porque afinal a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> aplica tanto neste produto, se ele traz tão pouco<br />

retorno? Será que a resposta a esta pergunta não é muito mais profun<strong>da</strong> do que<br />

simplesmente por este <strong>investimento</strong> ser um simples costume <strong>de</strong> gran<strong>de</strong><br />

conhecimento para as pessoas <strong>de</strong>sta <strong>classe</strong>? Será que os incentivos do governo,<br />

durante tantos anos já não mascaram <strong>uma</strong> imposição, através dos incentivos<br />

concedidos, que já se tornou <strong>uma</strong> forma <strong>de</strong> cultura popular?<br />

A comum busca por aquisição <strong>de</strong> imóveis é <strong>uma</strong> presença cultural evi<strong>de</strong>nte<br />

no Brasil. A cultura <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> é <strong>de</strong> priorizar a compra <strong>da</strong> tão<br />

sonha<strong>da</strong> casa própria. Muitas vezes, as pessoas não fazem os <strong>de</strong>vidos cálculos<br />

antes <strong>de</strong> adquirir um imóvel, sendo o objetivo <strong>da</strong> compra a moradia própria ou aluga-<br />

lo a terceiros, sem perceber que muitas vezes o retorno sobre o <strong>investimento</strong> não se<br />

justifica. Mais <strong>uma</strong> vez, <strong>uma</strong> questão cultural. A mídia e os veículos <strong>de</strong> comunicação<br />

reforçam o conceito <strong>de</strong>sta cultura, reforça<strong>da</strong> ain<strong>da</strong> por programas <strong>de</strong> governo e <strong>de</strong><br />

instituições financeiras.<br />

Os <strong>investimento</strong>s em previdência priva<strong>da</strong>, também são normalmente<br />

adquiridos pela <strong>classe</strong> <strong>média</strong>. Diferente do que se po<strong>de</strong> pensar, muito dificilmente<br />

este produto é vendido a um aposentado. O aposentado não tem costume <strong>de</strong><br />

comprar este tipo <strong>de</strong> produto, mas a <strong>classe</strong> <strong>média</strong> sim. A <strong>classe</strong> media tem, por<br />

cultura, a certeza <strong>de</strong> um futuro incerto e <strong>de</strong>vido a isso, acredita que investir em um<br />

plano <strong>de</strong> previdência priva<strong>da</strong> é <strong>uma</strong> boa maneira <strong>de</strong> garantir um futuro mais sólido.<br />

82


Alem <strong>de</strong> pensar no futuro, muitos investidores acreditam que a previdência priva<strong>da</strong><br />

po<strong>de</strong> ser <strong>uma</strong> boa alternativa <strong>de</strong> aplicação financeira, mesmo que em curto prazo, o<br />

que não é a intenção <strong>de</strong>ste produto.<br />

Outro fator que influencia no <strong>perfil</strong> do <strong>investimento</strong> <strong>da</strong> <strong>classe</strong> media, é a<br />

“cultura do medo”. Observamos que a cultura do medo chega à população,<br />

principalmente, através <strong>da</strong> mídia e dos veículos <strong>de</strong> comunicação em geral<br />

abrangendo principalmente assuntos <strong>de</strong> interesse públicos, e muitas vezes<br />

acobertando assuntos graves <strong>de</strong> difícil solução por parte dos governos ou <strong>de</strong> difícil<br />

acesso por parte <strong>da</strong> mídia. A “cultura do medo” muitas vezes impõe para as pessoas<br />

situações exagera<strong>da</strong>s e, por diversas vezes, transmite ao povo um assunto por <strong>uma</strong><br />

visão que po<strong>de</strong> amedrontar as pessoas <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminado local.<br />

A cultura do medo se observa também no contexto dos <strong>investimento</strong>s <strong>da</strong><br />

<strong>classe</strong> media. Os investidores <strong>de</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong>, normalmente, não possuem gran<strong>de</strong><br />

lastro e gran<strong>de</strong>s recursos para investir, o que o torna mais cauteloso e com medo <strong>de</strong><br />

per<strong>de</strong>r o pouco recurso, muitas vezes conseguido com muito esforço, que tem para<br />

investir. Alem <strong>de</strong>sta cautela pessoal, que é culturalmente normal para a <strong>classe</strong><br />

<strong>média</strong> <strong>brasileira</strong>, os veículos <strong>de</strong> comunicações po<strong>de</strong>m fazer com que os investidores<br />

se afastem <strong>de</strong> novi<strong>da</strong><strong>de</strong>s ou <strong>de</strong> produtos mais arrojados existentes no mercado<br />

financeiro. Como exemplo, a <strong>de</strong>monstração constante dos índices <strong>da</strong>s Bolsas <strong>de</strong><br />

Valores e dos rendimentos <strong>de</strong> aplicações nos veículos <strong>de</strong> comunicação. Para um<br />

leigo, ouvir que o índice <strong>da</strong> bolsa <strong>de</strong> valores “caiu”, po<strong>de</strong> soar assustador e afasta -lo<br />

<strong>de</strong> <strong>uma</strong> possível futura compra <strong>de</strong> ações <strong>de</strong>vido ao medo <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r dinheiro, mesmo<br />

que para o experts neste assunto, é sabido que, em longo prazo, muito dificilmente<br />

se per<strong>de</strong> dinheiro na bolsa <strong>de</strong> valores, principalmente se o dinheiro for aplicado em<br />

empresas confiáveis e estáveis.<br />

83


Diante <strong>de</strong>stas conclusões, vemos que, muitas vezes, a pouca diversificação<br />

nos <strong>investimento</strong>s pela <strong>classe</strong> media, assim como a aposta tradicional nos mesmos<br />

produtos, tem mesmo muita relação com a cultura popular <strong>de</strong>sta <strong>classe</strong> social. Po<strong>de</strong>-<br />

se também fazer ligação com a cultura do medo, medo <strong>de</strong> diversificar, medo do<br />

novo, <strong>da</strong> mu<strong>da</strong>nça e consequentemente <strong>de</strong> novos riscos. Não esquecendo do papel<br />

<strong>da</strong> mídia, dos veículos <strong>de</strong> comunicação e do governo que ain<strong>da</strong> <strong>de</strong>ixam a duvi<strong>da</strong>:<br />

será que alguns costumes <strong>da</strong> <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong> não acabaram por serem<br />

impostos por estas instituições tão influentes e <strong>de</strong> tão fácil acesso?<br />

Um estudo que po<strong>de</strong>ria ser realizado para garantir e obter novos <strong>da</strong>dos em<br />

relação ao <strong>de</strong>senvolvimento do <strong>perfil</strong> <strong>de</strong> <strong>investimento</strong> para a <strong>classe</strong> media <strong>brasileira</strong>,<br />

seria um levantamento, através <strong>de</strong> questionário com pessoas pertencentes a <strong>classe</strong><br />

media, sobre a porcentagem <strong>de</strong> valores que estão sendo investi ndo, on<strong>de</strong> as<br />

pessoas estão investindo e são quais os objetivos <strong>de</strong>sses <strong>investimento</strong>. Assim como<br />

analisar os investidores po<strong>de</strong>ria ser analisado o <strong>de</strong>senvolvimento dos produtos<br />

direcionados a esta <strong>classe</strong> <strong>média</strong> <strong>brasileira</strong>.<br />

Com este estudo po<strong>de</strong>riam ser retirados <strong>da</strong>dos do <strong>de</strong>senvolvimento e<br />

credibili<strong>da</strong><strong>de</strong> dos produtos existentes no mercado, bem como a análise do<br />

crescimento ou <strong>de</strong>crescimento <strong>da</strong> “cultura do medo” em relação às aplicações<br />

financeiras dos investidores <strong>de</strong>sta <strong>classe</strong> social. Comparando-as com as análises do<br />

presente trabalho seria possível observar o <strong>de</strong>senvolvimento, por parte dos<br />

<strong>investimento</strong>s, <strong>de</strong>sta <strong>classe</strong> social tão importante para o país.<br />

84


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