Lição inaugural 2010 CM - Universidade de Évora
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A Política Agrícola e <strong>de</strong> Desenvolvimento Rural:<br />
O Contributo Conceptual da Gestão Económica,<br />
com apartes<br />
Carlos Alberto Falcão Marques ∗<br />
<strong>Lição</strong> Inaugural do Dia da <strong>Universida<strong>de</strong></strong>, Ano lectivo <strong>de</strong> <strong>2010</strong>-2011, Sala dos<br />
Actos da <strong>Universida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Évora</strong>, 1 <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> <strong>2010</strong>.<br />
∗ Professor catedrático
Magnífico Reitor da <strong>Universida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Évora</strong><br />
Senhor Presi<strong>de</strong>nte do Conselho Geral<br />
Senhora Governadora Civil do Distrito <strong>de</strong> <strong>Évora</strong><br />
Excelência Reverendíssima<br />
Senhor Presi<strong>de</strong>nte do CRUP<br />
Senhores Deputados<br />
Senhores Presi<strong>de</strong>ntes das Câmaras Municipais <strong>de</strong><br />
<strong>Évora</strong> e <strong>de</strong> outros concelhos do Alentejo<br />
Demais digníssimas entida<strong>de</strong>s Civis, Militares e<br />
Religiosas<br />
Senhor Presi<strong>de</strong>nte da Associação <strong>de</strong> Estudantes<br />
Caros Estudantes,<br />
Prezados Colegas Professores,<br />
Estimados Funcionários<br />
Minhas Senhoras e Meus Senhores<br />
1
Confrontei-me com a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> vir, um dia, a apresentar a<br />
lição <strong>inaugural</strong>, no Dia da <strong>Universida<strong>de</strong></strong>, na sessão <strong>de</strong><br />
Abertura Solene das Aulas, muito antes <strong>de</strong> ter sido<br />
convidado para o fazer. As razões para tal são <strong>de</strong> diversa<br />
natureza.<br />
Primeiro, o facto <strong>de</strong> estar no topo da carreira profissional,<br />
quase há uma <strong>de</strong>zena <strong>de</strong> anos, faz, naturalmente, com que<br />
me sinta corresponsável pela afirmação, sucesso e<br />
dignida<strong>de</strong> da instituição. Depois, pela ligação académica e<br />
profissional que tenho à nossa <strong>Universida<strong>de</strong></strong>. Assisti e<br />
participei na sua reinstalação e <strong>de</strong>senvolvimento, como um<br />
dos seus primeiros alunos, no seu segundo ano <strong>de</strong><br />
funcionamento, e, posteriormente, como seu trabalhador,<br />
tenho tido a oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> lhe dar o meu contributo<br />
profissional. Mas também por me sentir orgulhoso <strong>de</strong><br />
alguns factos que, simultaneamente, o fado me reservou,<br />
por exemplo, <strong>de</strong> ser o primeiro licenciado da <strong>Universida<strong>de</strong></strong><br />
<strong>de</strong> <strong>Évora</strong> a obter o grau <strong>de</strong> doutor. Também por ter uma<br />
ligação afectiva duradoura com este Colégio do Espírito<br />
Santo que usufruo, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> criança <strong>de</strong> 10 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>,<br />
quando entrei para o Liceu Nacional <strong>de</strong> <strong>Évora</strong> pois também<br />
aqui, nas mesmas salas <strong>de</strong>ste claustro, fiz o meu curso dos<br />
liceus.<br />
Em seguida, por na participação regular na celebração<br />
<strong>de</strong>sta cerimónia me imaginar, esporadicamente, no lugar<br />
dos professores da <strong>Universida<strong>de</strong></strong> que o fizeram ao longo<br />
dos anos, que nesta oportunida<strong>de</strong> gostaria <strong>de</strong> aproveitar<br />
para lembrar e honrar, simbolicamente nas pessoas dos<br />
seus antigos e actual reitores, Professores Àrio <strong>de</strong><br />
Azevedo, Santos Júnior, Jorge Araújo (em 1990), Manuel<br />
Patrício (em 1997) e Carlos Braumann (em 1995).<br />
Quando fui indicado pelo Conselho Científico, por proposta<br />
do seu presi<strong>de</strong>nte e Reitor, para o fazer nesta sessão,<br />
2
apercebi-me que essa hora tinha chegado. Quero começar<br />
por agra<strong>de</strong>cer a indicação que consi<strong>de</strong>ro uma honra, mas<br />
também um prazer e uma oportunida<strong>de</strong> para comunicar e<br />
testemunhar às autorida<strong>de</strong>s civis, militares e religiosas que<br />
hoje nos acompanham, e através <strong>de</strong>las à comunida<strong>de</strong>, bem<br />
como internamente à <strong>Universida<strong>de</strong></strong>, aos alunos,<br />
funcionários e professores, o que escolhi transmitir-lhes. É<br />
também um privilégio po<strong>de</strong>r falar sobre um tema à nossa<br />
escolha.<br />
Esse é necessariamente o próximo passo, isto é, <strong>de</strong>finir o<br />
que consi<strong>de</strong>ramos oportuno transmitir. Ou seja, a seguinte<br />
questão com que nos confrontamos neste processo é a<br />
escolha do tema e, posteriormente, do título que queremos<br />
ou <strong>de</strong>cidimos dar a esta lição. Pensei em diversas opções e<br />
acabei por escolher, também, por diversas razões, o que<br />
vos apresento, “A Política Agrícola e <strong>de</strong><br />
Desenvolvimento Rural: O Contributo Conceptual da<br />
Gestão Económica, com apartes”.<br />
Primeiro, porque penso ter tomado em boa conta o<br />
conselho <strong>de</strong> um dos meus mestres <strong>de</strong> que a oportunida<strong>de</strong><br />
e a audiência a que nos dirigimos <strong>de</strong>vem <strong>de</strong>terminar o<br />
conteúdo e a forma da mensagem que queremos transmitir.<br />
Trata-se <strong>de</strong> um tema actual com a preparação da reforma<br />
da Política Agrícola Comum (PAC) pós-2013, cuja<br />
aplicação consi<strong>de</strong>ro <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> relevância para Portugal e<br />
para o Alentejo. Ou seja, quero transmitir uma mensagem<br />
com utilida<strong>de</strong> para a nossa circunstância <strong>de</strong> Portugueses e<br />
Alentejanos. Também, porque sou professor, <strong>de</strong>vo<br />
transmitir-vos essa mensagem <strong>de</strong> forma apropriada e<br />
pedagógica, espicaçar a vossa curiosida<strong>de</strong> e ganhar a<br />
vossa atenção.<br />
Segundo, obviamente, porque respeita à minha área <strong>de</strong><br />
Gestão e Economia e âmbito da minha activida<strong>de</strong><br />
3
pedagógica e científica e do meu trajecto profissional,<br />
também ligado às estatísticas oficiais e às políticas<br />
regionais, predominantemente aplicadas à agricultura.<br />
Por fim, porque há muita iliteracia económica e, também,<br />
pouco esforço pedagógico e preocupação da parte dos<br />
gestores e economistas para explicar aos cidadãos o<br />
contributo da Gestão e Economia para a formulação e<br />
resolução <strong>de</strong> questões sociais. Tenho-me confrontado, ao<br />
longo <strong>de</strong> muitos anos, com uma tão errada e persistente<br />
percepção e interpretação dos conhecimentos da minha<br />
profissão, inclusive, por parte <strong>de</strong> amigos, que entendi ser<br />
oportuno abordar o tema, publicamente.<br />
Esta lição começa, na introdução, por abordar esse ponto.<br />
A organização da lição inclui, em seguida, por contraponto,<br />
a óptica da análise da gestão económica da eficiência e a<br />
explicação da análise custo-benefício como método da<br />
avaliação da relevância da afectação <strong>de</strong> recursos a<br />
projectos alternativos. A generalização <strong>de</strong>ssa análise para<br />
o mo<strong>de</strong>lo científico da gestão económica e das suas<br />
componentes chave, os recursos, os objectivos e a<br />
<strong>de</strong>cisão, são <strong>de</strong>pois analisadas do ponto <strong>de</strong> vista teórico e<br />
ilustradas através da sua aplicação à agricultura. As falhas<br />
<strong>de</strong> mercado, pelas externalida<strong>de</strong>s e características dos<br />
bens públicos, constituem a próxima secção, para suportar<br />
a importância <strong>de</strong> complementar a competitivida<strong>de</strong> dos<br />
mercados com políticas públicas, aplicando ao caso da a<br />
política agrícola e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento rural. Termina com<br />
uma brevíssima conclusão. Finalmente, pareceu-me muito<br />
importante, dada a audiência generalista que tenho na lição<br />
do dia <strong>de</strong> hoje, ao longo da exposição elucidar e ilustrar as<br />
minhas opiniões com aplicações dos conceitos a casos da<br />
actualida<strong>de</strong>, a que chamei apartes. Num texto pedagógico<br />
constituiriam “caixas”.<br />
4
Introdução<br />
Parecerá paradoxal, para quem me esteja a ouvir, que<br />
alguém que se <strong>de</strong>dica ao ensino <strong>de</strong>stas áreas, como é o<br />
meu caso, diga que o tema que, originalmente, lhe serviu<br />
<strong>de</strong> inspiração para esta lição foi o <strong>de</strong> “como não falar <strong>de</strong><br />
Gestão e Economia”. Mas, naturalmente, nem tudo o que<br />
parece é.<br />
Tenho ouvido homens e mulheres da política, da cultura, <strong>de</strong><br />
todos os sectores, incluindo até gestores e economistas,<br />
usar expressões relacionadas com a Gestão e Economia,<br />
para transmitir a i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> que se trata apenas <strong>de</strong> uma<br />
visão, uma perspectiva ou uma abordagem limitada,<br />
incompleta, restrita, ressaltando inclusive nessas<br />
afirmações, por vezes, uma i<strong>de</strong>ia <strong>de</strong>preciativa e <strong>de</strong><br />
tacanhez da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> formulação e <strong>de</strong> avaliação <strong>de</strong><br />
planos, políticas, propostas ou acções (conjunto <strong>de</strong><br />
respostas para a resolução <strong>de</strong> problemas sociais que<br />
passarei a <strong>de</strong>signar durante esta lição apenas por<br />
projectos), confundindo-a, geralmente, com questões<br />
exclusivamente financeiras ou <strong>de</strong> financiamento.<br />
A título <strong>de</strong> exemplo, refiro algumas ocorrências e os seus<br />
sujeitos. Mário Soares, numa entrevista recente sobre o<br />
futuro da Europa, referia-se aos “critérios economicistas”<br />
dos lí<strong>de</strong>res europeus. Na SIC, no dia 25/08, no Jornal das<br />
Nove, um escultor, Francisco Simões, divulgando uma<br />
exposição sua patente nos jardins do Casino do Estoril,<br />
queixava-se <strong>de</strong> uma “visão economicista”. Num programa<br />
da manhã, um dos colaboradores para assuntos criminais,<br />
no espaço habitual no pico das audiências, quase à hora<br />
<strong>de</strong> almoço, referia-se à não utilização da prisão preventiva<br />
e aplicação <strong>de</strong> outras medidas <strong>de</strong> coação, como a prisão<br />
domiciliária, termo <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e residência, como<br />
“medidas economicistas” <strong>de</strong>stinadas fundamentalmente a<br />
5
conter custos com as ca<strong>de</strong>ias. Lembro, também como<br />
exemplo, mas para contrastar, a frase paradigmática <strong>de</strong><br />
Jorge Sampaio “Há vida para além do <strong>de</strong>ficit” já muito mais<br />
rigorosa, situando a questão em causa <strong>de</strong> uma forma muito<br />
mais apropriada face aos objectivos pretendidos. Foi daqui<br />
que parti.<br />
Tendo-me <strong>de</strong>dicado ao longo da carreira docente<br />
especificamente aos aspectos da Gestão e Economia,<br />
particularmente analisando e estudando a aplicação <strong>de</strong><br />
políticas agrícolas, entendi ser pertinente elucidar através<br />
<strong>de</strong>sse caso os aspectos fundamentais que vou apresentar<br />
para, <strong>de</strong> forma benevolente, contrariar essas afirmações.<br />
Quando “se “<strong>de</strong>bruçam” sobre a realida<strong>de</strong>, também os<br />
gestores e economistas tentam olhá-la como um todo,<br />
trazendo para a análise e avaliação todas as componentes<br />
relevantes, tal como, com certeza, partindo da sua óptica<br />
<strong>de</strong> análise o tentam fazer todas e cada uma das outras<br />
ciências ou profissões.<br />
A gestão científica e a ciência económica não olham para a<br />
realida<strong>de</strong> social duma maneira “atamancada”, com palas ou<br />
baias, ou num termo em inglês “shortsi<strong>de</strong>d”, ou seja, com<br />
visão curta. O mo<strong>de</strong>lo conceptual da Gestão Económica<br />
olha para essa realida<strong>de</strong> através dos múltiplos e amplos<br />
aspectos da finalida<strong>de</strong> da realização da vida.<br />
Como em todas as ciências, as representações dos<br />
mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão incluem os aspectos fundamentais da<br />
realida<strong>de</strong>, com <strong>de</strong>sejada e procurada simplicida<strong>de</strong>, para<br />
garantir a sua utilida<strong>de</strong> na investigação científica através da<br />
formulação <strong>de</strong> hipóteses e construção das teses que lhes<br />
estão associadas. Esses mo<strong>de</strong>los são, também,<br />
particularmente simplificados quando têm um objectivo<br />
6
fundamentalmente pedagógico. Mas, mesmo assim, há<br />
muito que esses mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong>ixaram <strong>de</strong> incluir apenas<br />
agentes, variáveis e fluxos económicos e empresariais<br />
como as Famílias e as Empresas, para referir os mais<br />
simples, mais o Estado e o Exterior, para um maior<br />
realismo, e os respectivos fluxos entre eles, o Trabalho, os<br />
Salários, a Produção e o Consumo, os Impostos e os<br />
Gastos Públicos, as Importações e as Exportações. O<br />
<strong>de</strong>senvolvimento das ciências, em geral, tem promovido a<br />
sua interdisciplinarida<strong>de</strong> e transdisciplinarida<strong>de</strong> e, à medida<br />
que o corpo <strong>de</strong> conhecimentos científicos se expan<strong>de</strong>, os<br />
mo<strong>de</strong>los científicos vão, sucessivamente, integrando<br />
agentes, variáveis e fluxos <strong>de</strong> diferentes naturezas.<br />
Por exemplo, na representação da <strong>de</strong>cisão na economia<br />
ambiental e dos recursos naturais (ver figura 1) são<br />
incluídos como inputs a energia, que alimenta o processo<br />
<strong>de</strong> produção que transforma as matérias-primas em<br />
produtos para o consumidor, o ar, a água e um conjunto <strong>de</strong><br />
amenida<strong>de</strong>s, como por exemplo a paisagem, e como<br />
ouputs a poluição do ar, resíduos sólidos, perdas <strong>de</strong> calor e<br />
poluição da água.<br />
Com base neste mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão, e este é o primeiro<br />
aparte, como é que po<strong>de</strong>ríamos avaliar os custos da<br />
recente fuga do poço <strong>de</strong> petróleo da BP? Será que alguém<br />
pensaria que um gestor ou economista os avaliaria pelo<br />
valor das reparações necessárias para retomar a<br />
exploração? Ou também, apenas contabilizando<br />
adicionalmente o petróleo perdido? E os custos <strong>de</strong><br />
limpeza? E os custos <strong>de</strong> compensação pelos prejuízos<br />
causados? E os custos <strong>de</strong> reparação? E o custo <strong>de</strong> opção<br />
ou uso alternativo dos recursos? E o custo <strong>de</strong> não uso ou<br />
<strong>de</strong> preservação dos recursos ambientais afectados?<br />
7
Figura 1: Mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão Da Economia Ambiental<br />
FONTE: TIETENBERG, P17.<br />
Eficiência e alternativas<br />
Conceptualmente, é bem conhecida a abordagem<br />
normativa dos gestores e economistas para avaliar a<br />
<strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> realização ou não <strong>de</strong> um projecto. O critério em<br />
que se baseia o processo <strong>de</strong> tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão é a<br />
análise custo-benefício (Cost-Benefit analysis). Os<br />
benefícios líquidos (o exce<strong>de</strong>nte social) resultantes da<br />
diferença entre os benefícios dados pela disponibilida<strong>de</strong><br />
para pagar dos consumidores, representada pela procura,<br />
e dos custos dados pela valorização do uso dos recursos<br />
ao custo <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong>, representada pela oferta, são a<br />
estrutura teórica básica da ciência económica e o suporte<br />
quantitativo dos métodos da ciência da gestão (Winston<br />
and Albright, p.2).<br />
Avaliar benefícios e custos significa primeiro analisar e<br />
quantificar efeitos físicos e, posteriormente, dar-lhes um<br />
valor. Po<strong>de</strong>mos ter que valorizar stocks e fluxos <strong>de</strong><br />
recursos e as componentes <strong>de</strong> valor <strong>de</strong> uso, valor <strong>de</strong> opção<br />
8
e valor <strong>de</strong> não uso. Sabemos que algumas <strong>de</strong>stas<br />
componentes são menos tangíveis quando há valores<br />
individuais envolvidos e mais tangíveis, aqueles a que po<strong>de</strong><br />
razoavelmente ser afecto um valor monetário, quando são<br />
transaccionáveis. Os intangíveis, os que não se po<strong>de</strong>m<br />
valorizar monetariamente, por indisponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
informação ou porque não é claro como po<strong>de</strong>m ser<br />
medidos, <strong>de</strong>vem ser quantificados e a sensibilida<strong>de</strong> da<br />
avaliação <strong>de</strong>ve ser analisada para intervalos <strong>de</strong> variação<br />
<strong>de</strong>sses benefícios ou custos para conhecer a sua influência<br />
na robustez da solução que suporta a <strong>de</strong>cisão.<br />
Este é também o tratamento da variável risco quando não<br />
são conhecidas as distribuições das probabilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
ocorrência <strong>de</strong> diversos cenários <strong>de</strong> variáveis relevantes e<br />
resultados do projecto.<br />
A importância da variável tempo na avaliação impõe a<br />
necessida<strong>de</strong> da valorização na actualida<strong>de</strong> (o benefício<br />
líquido actual ou net present value) dos custos e dos<br />
benefícios incorporando a forma como se realizam na vida<br />
útil em que afectam o nosso futuro. O factor <strong>de</strong><br />
actualização é o custo <strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> do capital e inclui o<br />
custo do capital e o prémio <strong>de</strong> risco. Este custo é um valor<br />
<strong>de</strong>terminante da afectação <strong>de</strong> recursos entre gerações.<br />
Mesmo quando outros critérios são invocados para a<br />
tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão, especialmente os políticos, a a<strong>de</strong>quada<br />
aplicação da análise custo-benefício permite avaliar e<br />
quantificar esses custos. Numa socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong>mocrática é<br />
<strong>de</strong>sejável conhecer o custo das <strong>de</strong>cisões políticas cabendo<br />
aos eleitores, conscientes das alternativas e dos seus<br />
custos, validar ou não em se<strong>de</strong> apropriada, as eleições, as<br />
<strong>de</strong>cisões tomadas.<br />
9
O segundo aparte é sobre a avaliação e realização <strong>de</strong><br />
projectos em parcerias público-privadas, (PPPs), como<br />
constantemente se ouve referir a elas na comunicação<br />
social. Como o nome indica, são estabelecidas entre o<br />
Estado e empresas privadas, para levar por diante os<br />
investimentos e a exploração <strong>de</strong> infra-estruturas,<br />
nomeadamente <strong>de</strong> transporte rodoviário e ferroviário. Estas<br />
PPPs são contratos em que o financiamento dos<br />
investimentos se faz por conta das receitas futuras do<br />
próprio investimento e, complementarmente, <strong>de</strong><br />
pagamentos <strong>de</strong> rendas futuras a acordar com o Estado,<br />
para garantir uma <strong>de</strong>terminada rentabilida<strong>de</strong> do projecto<br />
que, por um lado, garanta o seu financiamento e, por outro,<br />
a retribuição da participação e envolvimento dos privados.<br />
Estas rendas futuras vão, obviamente, onerar os<br />
orçamentos do Estado dos próximos anos pelo que estes<br />
compromissos <strong>de</strong>vem ser planeados e controlados pois<br />
são, realmente, investimentos e não custos anuais sem<br />
implicações futuras. Adicionalmente, o risco inerente ao<br />
projecto não <strong>de</strong>ve ser exclusivamente suportado pelo<br />
Estado mas participado em função da parceria acordada. A<br />
sublinhar é, também, a vantagem <strong>de</strong>, em muitos casos, se<br />
conseguirem co-financiamentos comunitários a fundo<br />
perdido, logo <strong>de</strong> por essa via ser possível levar a cabo os<br />
projectos. Por outro lado, sendo o financiamento do<br />
investimento calculado em função da taxa <strong>de</strong> juro que o<br />
Estado consegue obter, normalmente mais baixa do que os<br />
privados, a parceria consegue obter vantagens <strong>de</strong><br />
financiamento do projecto. O problema que se po<strong>de</strong> por é o<br />
<strong>de</strong> o Estado para promover o financiamento do projecto<br />
diminuir a liqui<strong>de</strong>z do mercado, o que ten<strong>de</strong> a aumentar as<br />
taxas <strong>de</strong> juro. Pior ainda, como no caso presente, é<br />
financiar o projecto em tempo <strong>de</strong> taxas <strong>de</strong> juro muito<br />
elevadas que reflectem o risco da dívida soberana do<br />
próprio Estado. Também, como tem sido referido, ao levar<br />
por diante o projecto nestas circunstâncias estamos a<br />
empurrar para um horizonte temporal cada mais afastado o<br />
payback total do projecto, isto é, o prazo <strong>de</strong> tempo em que<br />
10
se vai pagar e, realmente, a afectar recursos futuros que<br />
comprometerão níveis <strong>de</strong> bem-estar <strong>de</strong> gerações<br />
vindouras.<br />
O passo seguinte que a gestão económica utiliza para<br />
avaliar projectos é alargar a avaliação custo-benefício <strong>de</strong><br />
uma escolha específica para a avaliação <strong>de</strong> escolhas<br />
alternativas para, entre elas, seleccionar a “melhor”. Utilizei<br />
aspas para simbolizar que utilizei a <strong>de</strong>signação <strong>de</strong> “a<br />
melhor” sem ter necessariamente que implicar que seja a<br />
óptima, mas uma a<strong>de</strong>quada no sentido da teoria <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão<br />
dos comportamentos racionais <strong>de</strong> Simon e March, que <strong>de</strong>u<br />
um prémio Nobel ao primeiro, pela qual os indivíduos e as<br />
organizações escolhem as soluções examinando um série<br />
limitada <strong>de</strong> alternativas e baseando-se nas regras e<br />
experiências que dispõem (Teixeira, pp.15 e 16).<br />
Os recursos são por natureza escassos e a eficiência da<br />
sua utilização para além <strong>de</strong> exigir um benefício líquido, ou<br />
seja, um benefício maior do que o seu custo, requer,<br />
adicionalmente, escolhendo o indicador sugerido por<br />
Henrique <strong>de</strong> Barros (Barros, p. 62), que a rendabilida<strong>de</strong><br />
global dos factores seja a mais elevada, para não dizer a<br />
óptima, termo que menciono para, naturalmente, me referir<br />
ao método científico da optimização a que dá origem. A<br />
regra <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão simples que garante a optimização da<br />
afectação <strong>de</strong> recursos ao projecto <strong>de</strong>signada eficiência <strong>de</strong><br />
Pareto, é a <strong>de</strong> só se conseguirem benefícios adicionais<br />
<strong>de</strong>ixando alguém pior.<br />
Ao formular <strong>de</strong>sta forma o problema <strong>de</strong> avaliação dos<br />
projectos alternativos, implicitamente seleccionei como<br />
objectivo a maximização do benefício líquido e consi<strong>de</strong>rei<br />
inerentes as limitações da disponibilida<strong>de</strong> dos recursos.<br />
11
O verda<strong>de</strong>iro “busilus” da gestão económica começa aí.<br />
Que objectivos individuais e colectivos nos guiam para,<br />
alternativamente, afectar os recursos escassos <strong>de</strong> que<br />
dispomos como indivíduos e como socieda<strong>de</strong> a projectos<br />
alternativos? E como valorizamos os atributos que<br />
caracterizam esses objectivos?<br />
O mo<strong>de</strong>lo geral da Gestão Económica e as suas<br />
componentes chave<br />
As matérias que vos apresentei até aqui, po<strong>de</strong>m e <strong>de</strong>vem<br />
ter um enquadramento teórico mais genérico. É chegada a<br />
altura <strong>de</strong> o apresentar para respon<strong>de</strong>r a estas questões. Os<br />
recursos <strong>de</strong> que falei, os objectivos a que me referi e o<br />
método da avaliação custo-benefício que sucintamente<br />
caracterizei, aplicados aos breves exemplos que <strong>de</strong>i,<br />
constituem as componentes chave da Gestão (Marques, p.<br />
80). Essas componentes ressaltam da <strong>de</strong>finição mais<br />
elementar e, por isso, generalizadamente utilizada <strong>de</strong><br />
Gestão como “o processo <strong>de</strong> tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão <strong>de</strong> como<br />
afectar recursos limitados entre usos alternativos <strong>de</strong> modo<br />
a optimizar <strong>de</strong>terminados objectivos” (Kay, p.4).<br />
Depois <strong>de</strong> ter i<strong>de</strong>ntificado nesta <strong>de</strong>finição geral essas<br />
palavras críticas, ou seja, as <strong>de</strong>terminantes chave da<br />
Gestão, sublinhando-as, <strong>de</strong> recursos, objectivos e processo<br />
<strong>de</strong> tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão, vou passar a analisar e caracterizar<br />
essas componentes globalmente, em relação à Gestão e<br />
Economia, e particularmente, no que toca à agricultura ou<br />
ao sector agro-alimentar. Muitas das particularida<strong>de</strong>s e<br />
especificida<strong>de</strong>s da agricultura, a que mais à frente me<br />
<strong>de</strong>dicarei, <strong>de</strong>rivam <strong>de</strong>stas componentes. A elipse central da<br />
figura 2 apresenta essas componentes e ilustra os pontos<br />
que seguirei ao longo da sua caracterização.<br />
12
Figura 2: As componentes chave da Gestão<br />
FONTE: MARQUES, 1993.
Permitam-me que, antes <strong>de</strong> o fazer, refira apenas que o<br />
nível <strong>de</strong> análise a utilizar <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do <strong>de</strong>cisor e do projecto<br />
em causa. Po<strong>de</strong> ser, predominantemente, o microeconómico,<br />
referindo-nos ao agente individual,<br />
fundamentalmente ao empresário ou ao agricultor no caso<br />
da agricultura. Nesse nível a análise po<strong>de</strong> ser alargada aos<br />
agentes a montante e a jusante da empresa agrícola, ou<br />
seja, fornecedores e clientes das ca<strong>de</strong>ias e do sector agroalimentar.<br />
Mas, também po<strong>de</strong>mos analisar as questões <strong>de</strong><br />
gestão económica <strong>de</strong> forma mais agregada ao nível meso e<br />
macro-económico, para uma região ou para o país, em que<br />
o projecto é do interesse público e colectivo e a <strong>de</strong>cisão é<br />
política. Por outras palavras, o objecto e as <strong>de</strong>terminantes<br />
da gestão po<strong>de</strong>m ser analisados ao nível individual dos<br />
agentes económicos, das empresas pelos empresários, ou<br />
ao nível colectivo da socieda<strong>de</strong>, das organizações e<br />
instituições do Estado pelos governantes e dirigentes<br />
públicos.<br />
Há um outro aspecto que quero referir e que é fundamental<br />
quando a análise tem objectivos a nível colectivo. É a<br />
caracterização objectiva da realida<strong>de</strong> socio-económica em<br />
observação. O serviço <strong>de</strong> estatísticas oficiais <strong>de</strong>ve<br />
respon<strong>de</strong>r, genericamente, a esse <strong>de</strong>sígnio. Por outro lado,<br />
o utilizador tem a responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> utilizar a informação<br />
disponível <strong>de</strong> forma a<strong>de</strong>quada aos objectivos em vista.<br />
Vem este terceiro aparte, a que a partir <strong>de</strong>ste ponto<br />
comecei a <strong>de</strong>dicar-me, a propósito do tema que escolhi<br />
relacionado com o <strong>de</strong>senvolvimento rural. Designei-o <strong>de</strong><br />
“como não fazer e utilizar estatísticas”.<br />
Há alguns meses, colaborarei com uma colega num artigo<br />
sobre “ o papel futuro da agricultura no <strong>de</strong>senvolvimento<br />
rural multifuncional” em Portugal. Tratava-se da<br />
contribuição portuguesa para um estudo comparativo dos<br />
14
diversos países europeus, da sua situação e das<br />
perspectivas da sua evolução nestas matérias. Quando<br />
actualizava os indicadores estatísticos nacionais e<br />
regionais, tendo como fonte o Relatório Anual <strong>de</strong><br />
Desenvolvimento Rural da Comissão Europeia, confronteime<br />
com dois gráficos interessantíssimos. Resolvi, hoje,<br />
mostrar-vos esses gráficos para <strong>de</strong>les retirarmos as<br />
<strong>de</strong>vidas conclusões.<br />
Trata-se da <strong>de</strong>finição e i<strong>de</strong>ntificação geográfica das áreas<br />
rurais em Portugal, que tem por base a classificação<br />
proposta da OCDE <strong>de</strong>ssas áreas (ver figura 3). É um bom<br />
exemplo <strong>de</strong> o que não se <strong>de</strong>ve fazer para <strong>de</strong>finir e apurar<br />
informação estatística.<br />
A OCDE classifica as áreas em predominantemente<br />
urbanas, intermédias e predominantemente rurais. Não é<br />
relevante para o nosso objecto a explicitação dos critérios<br />
que utiliza para o efeito pelo que me irei abster <strong>de</strong> os<br />
apresentar. Segundo este mapa, todo o território<br />
continental português é classificado na classe intermédia (a<br />
amarelo na figura) com excepção do Alentejo caracterizado<br />
como predominantemente rural (a ver<strong>de</strong> na figura) e Lisboa<br />
como predominantemente urbana (uma pequena área a<br />
vermelho no gráfico). Nada mais errado.<br />
Como sabemos, todas as NUTS II portuguesas incluem<br />
uma área litoral e uma área interior <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> dimensão.<br />
Há um contraste muito nítido <strong>de</strong>stas áreas. Todas as áreas<br />
litorais são predominantemente urbanas (ver na figura 4<br />
das NUTS III). Vejam-se as diferenças quando os dados<br />
são tratados ao nível das NUTS III. Por isso, os dados<br />
tratados ao nível das NUTS II são médias que distorcem<br />
completamente qualquer análise e conclusões a retirar.<br />
Utilizar este nível <strong>de</strong> agregação para caracterizar as áreas<br />
15
Figura 3: Áreas rurais europeias, ao nível das NUTS 2, <strong>de</strong><br />
acordo com a metodologia da OCDE<br />
\<br />
FONTE: RURAL DEVELOPMENT IN THE EUROPEAN UNION –<br />
STATISTICAL AND ECONOMIC INFORMATION – REPORT 2009<br />
16
Figura 4: Áreas rurais europeias, ao nível das NUTS 3, <strong>de</strong><br />
acordo com a metodologia da OCDE<br />
FONTE: RURAL DEVELOPMENT IN THE EUROPEAN UNION –<br />
STATISTICAL AND ECONOMIC INFORMATION – REPORT 2009<br />
17
urais portuguesas seria totalmente inapropriado e sem<br />
sentido.<br />
A conclusão ou recomendação é a <strong>de</strong> que o tratamento e<br />
apresentação estatística <strong>de</strong> dados é uma condição<br />
necessária mas não é condição suficiente para a<br />
caracterização objectiva da realida<strong>de</strong> socio-económica <strong>de</strong><br />
uma área pois requer um conhecimento empírico da<br />
situação em análise que fundamente um nível a<strong>de</strong>quado <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sagregação <strong>de</strong> dados.<br />
Os recursos<br />
Os recursos são por <strong>de</strong>finição limitados. O grau <strong>de</strong> acesso<br />
a esses recursos, habitualmente agrupados nas<br />
<strong>de</strong>signações agregadas <strong>de</strong> terra, trabalho, e capital, varia<br />
entre produtores ou empresários e entre regiões e países<br />
(ver elipse da direita da figura 2). A sua disponibilida<strong>de</strong><br />
po<strong>de</strong> mudar do curto para médio e longo prazo, mas regra<br />
geral tem sempre um limite. A forma e as proporções<br />
quantitativas e qualitativas em que se combinam estes<br />
tipos <strong>de</strong> recursos constituem a tecnologia disponível. É<br />
através <strong>de</strong>ssa tecnologia, "o estado da arte", que<br />
caracteriza o grau <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> uma economia<br />
ou <strong>de</strong> uma agricultura, que esses recursos são afectados a<br />
usos alternativos gerando riqueza, i.e., acrescentando valor<br />
aos recursos usados no processo adoptado. A combinação<br />
quantitativa e qualitativa dos recursos para gerar riqueza,<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> três gran<strong>de</strong>s tipos <strong>de</strong> factores: Os naturais, os<br />
técnicos e institucionais, e os económicos (C.I.H.E.A.M. p.<br />
4).<br />
Os factores naturais dizem respeito aos recursos naturais<br />
em sentido lato, à posição geográfica, ao património natural<br />
e ambiental, aos recursos <strong>de</strong> base ou endógenos <strong>de</strong><br />
agricultor, uma região e <strong>de</strong> um país. Na agricultura<br />
constituem os climas (nomeadamente a temperatura e a<br />
18
precipitação que os caracteriza), a relativa disponibilida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> terra, dos tipos <strong>de</strong> solos, e do seu potencial uso<br />
alternativo e à sua influência nas leis biológicas a que a<br />
agricultura está naturalmente condicionada, em especial as<br />
relacionadas com as condições necessárias ao<br />
crescimento das plantas e dos animais. Numa interpretação<br />
ampla do termo estes factores englobam-se na <strong>de</strong>signação<br />
tradicional <strong>de</strong> “terra”. Estes factores estão relacionados<br />
com a eficiência da produção dos países, das regiões, dos<br />
empresários, em geral, e da agricultura e dos agricultores,<br />
em particular.<br />
São conhecidos os efeitos <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> factores nos<br />
padrões <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento e <strong>de</strong> comércio dos diferentes<br />
países, nomeadamente à sua especialização ou não na<br />
produção <strong>de</strong> bens em que têm vantagem comparativa ou<br />
em que são relativamente mais abundantes,<br />
nomeadamente os mo<strong>de</strong>los e teorias <strong>de</strong> Ricardo a<br />
Hecsher-Ohlin-Samuelson (Ethier, Cap. 1 e 3).<br />
Os factores técnicos e institucionais são os relativos aos<br />
efeitos estruturais e operacionais das políticas gerais e<br />
agrícolas <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento. Traduzem-se na existência<br />
e sistemas <strong>de</strong> funcionamento <strong>de</strong> infra-estrutras e serviços<br />
das mais diversas áreas, nomeadamente as<br />
acessibilida<strong>de</strong>s e transportes, o saneamento básico, água e<br />
electricida<strong>de</strong>, comunicações, alojamento e habitação,<br />
saú<strong>de</strong>, educação, cultura e lazer, administração pública e<br />
serviços especializados, entre outras. A da ciência e<br />
tecnologia e <strong>de</strong> ensino superior diz particularmente respeito<br />
às <strong>Universida<strong>de</strong></strong>s. Na agricultura, reflectem-se numa<br />
<strong>de</strong>terminada estrutura agrária <strong>de</strong>terminada por essas<br />
políticas estruturais, que se caracteriza pela estrutura<br />
fundiária, pelo capital humano do sector e pela infraestrutura<br />
rural que o serve, nomeadamente os sistemas <strong>de</strong><br />
aprovisionamento e distribuição dos factores, (como<br />
sementes, fertilizantes e crédito), os canais <strong>de</strong><br />
19
armazenamento e <strong>de</strong> comercialização dos produtos, e a<br />
infra-estrutura institucional pública nacional e<br />
<strong>de</strong>sconcentrada <strong>de</strong> apoio à educação, à pesquisa científica,<br />
ao <strong>de</strong>senvolvimento tecnológico e ao seu aproveitamento,<br />
através da adopção <strong>de</strong> novas ou melhores tecnologias, e à<br />
extensão e apoio ao <strong>de</strong>senvolvimento rural. Estes factores<br />
estão relacionados com a eficiência da produção agrícola e<br />
do sistema <strong>de</strong> aprovisionamento, armazenamento,<br />
transporte e venda <strong>de</strong> factores e/ou produtos.<br />
A estes factores correspon<strong>de</strong>m as <strong>de</strong>signações tradicionais<br />
<strong>de</strong> trabalho e capital, que numa terminologia mais mo<strong>de</strong>rna<br />
po<strong>de</strong>m assumir apenas o ultimo <strong>de</strong>stes termos, englobando<br />
simultaneamente o capital humano, representando a<br />
formação e conhecimento que está incorporado na sua<br />
utilização, e outras formas <strong>de</strong> capital, ou conhecimento<br />
incorporado na evolução das tecnologias e dos factores,<br />
como bens <strong>de</strong> capital físico acumulado.<br />
A vantagem comparativa dos países, regiões e<br />
empresários agrícolas, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> dois primeiros tipos <strong>de</strong><br />
factores. Também na agricultura, estes dois tipos <strong>de</strong><br />
factores, o último subdividido em factores <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna<br />
tecnologia (fertilizantes e maquinaria) e capital humano<br />
(educação geral e profissional), são consi<strong>de</strong>rados os<br />
factores explicativos da diferença da produtivida<strong>de</strong> do<br />
trabalho em agriculturas <strong>de</strong> países em <strong>de</strong>senvolvimento e<br />
<strong>de</strong> países <strong>de</strong>senvolvidos (Hayami e Ruttan, p. 139).<br />
O meu próximo aparte tem a ver com o capital humano da<br />
nossa agricultura. Que recursos humanos temos para<br />
enfrentar os <strong>de</strong>safios da inovação tecnológica na<br />
agricultura que enfrentamos nos nossos dias (ver figura 5).<br />
Em termos gerais po<strong>de</strong>mos concluir que há diferenças<br />
claras dos países da Europa do Sul, naturalmente em que<br />
20
Figura 5: Percentagem <strong>de</strong> agricultores com formação<br />
agrícola, ao nível das NUTS III<br />
FONTE: RURAL DEVELOPMENT IN THE EUROPEAN UNION –<br />
STATISTICAL AND ECONOMIC INFORMATION – REPORT 2009.<br />
21
nos incluímos, relativamente aos do Norte e centro da<br />
Europa.<br />
Mas, curiosamente, quero sublinhar a particularida<strong>de</strong> da<br />
NUTS III, Alentejo central, a única portuguesa que atinge o<br />
terceiro escalão, pois tem, com certeza, a ver com impacto<br />
da <strong>Universida<strong>de</strong></strong> <strong>de</strong> <strong>Évora</strong> na formação na área agrícola.<br />
Os factores económicos dizem respeito às políticas gerais<br />
macroeconómicas (fiscal, monetária e cambial) e às<br />
políticas sectoriais que são seguidas e respectivos efeitos<br />
no investimento e rendimentos das empresas e dos<br />
consumidores. No caso da agricultura é, obviamente,<br />
indispensável sublinhar a importância e os efeitos das<br />
políticas agrícolas nos preços dos produtos alimentares e<br />
nos rendimentos dos agricultores e empresários agrícolas,<br />
i.e., na retribuição dos seus factores próprios. É claro que<br />
neste âmbito, nos nossos dias, pela magnitu<strong>de</strong> dos<br />
impactos no rendimento temos em primeiro lugar que referir<br />
a PAC. Mas, não <strong>de</strong>vem ser <strong>de</strong>scuradas outras políticas<br />
nomeadamente a fiscal (lembro o aumento do IVA) e a<br />
salarial (cortes na retribuição do regime <strong>de</strong> trabalho em<br />
funções públicas). De particular importância, e resultante<br />
<strong>de</strong>stas medidas, é o nível abertura e <strong>de</strong> protecção da<br />
agricultura dado ou suportado pelas diferentes políticas<br />
gerais e sectoriais adoptadas.<br />
A competitivida<strong>de</strong> dos países, das regiões e dos<br />
empresários <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>, para além dos anteriores dois tipos,<br />
<strong>de</strong>stes factores económicos.<br />
Outra forma <strong>de</strong> agrupar os diferentes tipos <strong>de</strong> factores que<br />
<strong>de</strong>terminam a competitivida<strong>de</strong>, numa óptica mais mo<strong>de</strong>rna<br />
da Economia da inovação ou da Gestão estratégica e<br />
aceleradores da inovação (que tem como percursor<br />
22
Michael Porter da Harvard Business School), sublinha as<br />
diferenças da competitivida<strong>de</strong> baseada em vantagens<br />
competitivas pelos custos dos factores pelo custo que<br />
suporta uma estratégia <strong>de</strong> concorrência pelo preço, e pela<br />
diferenciação, através da qualida<strong>de</strong>, suportada pelo<br />
aproveitamento do potencial da ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> valor da indústria<br />
(p. 67, Teixeira, 2005).<br />
A figura 6, que em seguida se apresenta, enquadra e<br />
agrupa um conjunto <strong>de</strong> quase três <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> factores<br />
<strong>de</strong>terminantes da competitivida<strong>de</strong> nas duas componentes<br />
<strong>de</strong> custo e valor. Realce para os factores no lado esquerdo<br />
da figura que permitem aproveitar a ca<strong>de</strong>ia da oferta<br />
(supply chain) ou ca<strong>de</strong>ia <strong>de</strong> valor através <strong>de</strong> conjuntos <strong>de</strong><br />
activida<strong>de</strong>s no processo <strong>de</strong> produção e distribuição e a<br />
estrutura <strong>de</strong> elos <strong>de</strong>ssas activida<strong>de</strong>s e processos<br />
(Boehdge, p. 1032).<br />
Não se pense, no entanto, que a terminologia <strong>de</strong><br />
aceleradores, que atrás usei, seja ela própria inovadora.<br />
Para referir o caso da agricultura, a educação, o crédito e o<br />
associativismo, são incluídos nos já <strong>de</strong>signados<br />
aceleradores do <strong>de</strong>senvolvimento agrícola por Mosher<br />
(1966).<br />
Os Objectivos<br />
A segunda palavra-chave da <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> gestão, que<br />
referimos e sublinhámos anteriormente, e que neste ponto<br />
nos propomos analisar são os objectivos (ver elipse da<br />
esquerda na figura 2).<br />
Quer em termos colectivos, ou seja da socieda<strong>de</strong> como um<br />
todo, ou em termos individuais, isto é, dos diferentes<br />
23
Figura 6: As gran<strong>de</strong>s <strong>de</strong>terminantes da competitivida<strong>de</strong><br />
Fonte: Mateus, p. 61.<br />
24
agentes, por exemplo os empresários ou os agricultores, é<br />
consensual admitir que o objectivo agregado é a realização<br />
da vida humana com o respeito pelas outras espécies o<br />
que, obviamente, obriga à preservação do ambiente ou do<br />
capital natural. Esta é praticamente a <strong>de</strong>finição <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento sustentável. De sublinhar que<br />
implicitamente na <strong>de</strong>finição há a consi<strong>de</strong>ração <strong>de</strong> aspecto<br />
não unicamente antropocêntricos e também <strong>de</strong> objectivos<br />
das gerações futuras.<br />
A <strong>de</strong>signação mais generalizadamente utilizada para<br />
representar este objectivo é a <strong>de</strong> bem-estar. Numa anterior<br />
lição o colega da minha Escola professor Carlos Zorrinho<br />
referiu-se à “felicida<strong>de</strong>”. Na formulação teórica e<br />
matemática é substituída pela <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong>. O termo<br />
satisfação também é frequentemente utilizado.<br />
Do ponto <strong>de</strong> vista individual e no caso da agricultura, os<br />
objectivos <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>m fundamentalmente do tipo <strong>de</strong><br />
produtor agrícola e da fase do ciclo <strong>de</strong> vida da empresafamília<br />
(estabelecimento, consolidação ou saída) em que<br />
ela se encontra.<br />
Os objectivos dos produtores agrícolas variam, consoante<br />
os recursos disponíveis. Em empresas e agriculturas muito<br />
pouco <strong>de</strong>senvolvidas, obter um nível mínimo <strong>de</strong> produção<br />
para auto-consumo da família, ou seja, para subsistir<br />
fisicamente, é o objectivo primordial. Só <strong>de</strong>pois <strong>de</strong><br />
assegurado um nível <strong>de</strong> auto-consumo o produtor tem em<br />
consi<strong>de</strong>ração, ou respon<strong>de</strong>, a variáveis económicas,<br />
nomeadamente preços (marketed surplus and household<br />
mo<strong>de</strong>ls). A maximização do lucro ou do património, i.e., da<br />
riqueza, é um dos objectivos dos empresários cujas<br />
empresas estão viradas para o mercado, consolidadas<br />
económica e financeiramente. Entre estes objectivos<br />
extremos, e simultaneamente, os empresários agrícolas<br />
25
têm geralmente outros objectivos, tais como: a<br />
sobrevivência económica, em que o empresário quer<br />
assegurar um rendimento, ou retorno mínimo, que não<br />
ponha em perigo a situação financeira da empresa<br />
agrícola; a estabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> rendimentos em que a relação<br />
benefício-custo entre o máximo do lucro e a variabilida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>sse lucro <strong>de</strong> um empresário é valorizada<br />
subjectivamente pelo seu grau <strong>de</strong> aversão ao risco; a<br />
conservação do recurso base, que se traduz no <strong>de</strong>sejo <strong>de</strong><br />
manter a capacida<strong>de</strong> produtiva dos factores naturais que<br />
<strong>de</strong>têm e <strong>de</strong> conservar o ambiente que os ro<strong>de</strong>ia; e o bemestar<br />
e o laser, que traduzem a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> dispor <strong>de</strong><br />
tempo para outras activida<strong>de</strong>s familiares e sociais, <strong>de</strong><br />
acordo com as suas motivações e preferências.<br />
Estes objectivos são também particularmente influenciados<br />
pelo facto dos empresários agrícolas se constituírem, na<br />
gran<strong>de</strong> maioria das empresas que formam o sector, em<br />
empresários individuais. Essa característica tem um<br />
conjunto <strong>de</strong> implicações que se relacionam com o facto da<br />
vida da empresa e da vida da família se confundirem,<br />
nomeadamente em termos <strong>de</strong> recursos e objectivos. A<br />
empresa tem um ciclo <strong>de</strong> vida que correspon<strong>de</strong> às etapas<br />
da vida do agricultor empresário. Ambos, o agricultor e a<br />
sua empresa, passam normalmente pelas três fases <strong>de</strong><br />
estabelecimento, expansão e consolidação e <strong>de</strong> retirada<br />
que, obviamente, <strong>de</strong>terminam objectivos particulares em<br />
cada uma <strong>de</strong>ssas fases.<br />
Mas em termos colectivos também há objectivos globais,<br />
específicos ou não da agricultura, particularmente<br />
relevantes. Por exemplo, a constituição <strong>de</strong> uma re<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
segurança contra a pobreza e a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> acesso a<br />
serviços <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> e <strong>de</strong> ensino in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da<br />
disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> rendimento das famílias e dos cidadãos<br />
são objectivos fundamentais do nosso sistema político, que<br />
26
inclusive constam dos direitos fundamentais na nossa lei<br />
fundamental. Também há objectivos colectivos para a<br />
agricultura como por exemplo a garantia do abastecimento<br />
público <strong>de</strong> bens e da segurança em termos <strong>de</strong> saú<strong>de</strong><br />
pública dos bens alimentares à disposição dos cidadãos.<br />
O processo <strong>de</strong> tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão<br />
A última das componentes chave a que nos queremos<br />
referir da <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> gestão é o processo <strong>de</strong> tomada <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>cisão (ver elipse em baixo na figura 2).<br />
Os passos do processo <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão po<strong>de</strong>m ser agrupados<br />
em três funções da gestão que são o planeamento, a<br />
implantação e o controlo.<br />
Para a tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão, o empresário planeia,<br />
i<strong>de</strong>ntificando e <strong>de</strong>finindo o problema que está sujeito a uma<br />
<strong>de</strong>cisão, recolhe a informação relevante, analisa soluções<br />
alternativas, e toma a <strong>de</strong>cisão. Estes passos do processo<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão constituem o planeamento, que constitui a base<br />
<strong>de</strong> avaliação que justifica o ajustamento empresarial a<br />
mudanças ou modificações do ambiente natural, técnico e<br />
institucional, e económico.<br />
Em seguida, o empresário implanta a <strong>de</strong>cisão tomada,<br />
programando, organizando, executando e coor<strong>de</strong>nando as<br />
acções necessárias<br />
Finalmente, proce<strong>de</strong> ao controlo avaliando os resultados,<br />
das activida<strong>de</strong>s e da exploração, que lhe fornecem, quando<br />
comparados com os resultados planeados, <strong>de</strong>svios cuja<br />
análise po<strong>de</strong> confirmar a <strong>de</strong>cisão ou indicar a necessida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> ajustar ou rever a <strong>de</strong>cisão que tomou.<br />
27
Os métodos <strong>de</strong> implantação das <strong>de</strong>cisões analisam as<br />
formas possíveis para organizar a empresa e avaliam a<br />
eficiência no uso dos seus recursos.<br />
Os métodos <strong>de</strong> controlo têm por base a elaboração, e<br />
análise e comparação <strong>de</strong> indicadores e rácios baseados<br />
nos registos técnicos e contabilísticos obtidos para<br />
avaliação das componentes financeira, económica, <strong>de</strong><br />
estrutura, <strong>de</strong> eficiência e das activida<strong>de</strong>s da empresa<br />
agrícola.<br />
Os métodos <strong>de</strong> planeamento, ou <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>lação do<br />
processo <strong>de</strong> tomada <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão incorporam, mais ou<br />
menos elaboradamente, implícita ou explicitamente, os<br />
objectivos dos empresários, tendo em conta os recursos<br />
que os condicionam e mo<strong>de</strong>lam as diferentes <strong>de</strong>cisões<br />
alternativas e seus ajustamentos face a alterações <strong>de</strong><br />
factores naturais, técnicos e institucionais e económicos. A<br />
base metodológica <strong>de</strong>stes métodos são os princípios<br />
económicos da teoria da produção e da teoria dos<br />
mercados, que através da estática comparada permitem<br />
avaliar as <strong>de</strong>slocações na (s) ou da (s) curvas da procura<br />
<strong>de</strong> factores e oferta <strong>de</strong> produtos. Esses princípios e, por<br />
conseguinte, os métodos <strong>de</strong> planeamento baseiam-se,<br />
directa ou indirectamente, nas funções <strong>de</strong> produção e no<br />
funcionamento dos mercados dos factores e dos produtos.<br />
Menos ou mais elaborados do ponto <strong>de</strong> vista <strong>de</strong> formulação<br />
e exigência <strong>de</strong> dados, os métodos <strong>de</strong> planeamento da<br />
empresa agrícola incluem: os orçamentos (com uma óptica<br />
privada e/ou social) parciais <strong>de</strong> activida<strong>de</strong> ou <strong>de</strong><br />
substituição, e globais económicos ou financeiros, que se<br />
caracterizam por serem estáticos e baseados em preços<br />
absolutos; os projectos <strong>de</strong> investimento e a análise custobenefício,<br />
que incorporam a variável tempo, e por<br />
conseguinte, captam os efeitos do valor temporal do<br />
capital; os mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> simulação que, embora sem<br />
po<strong>de</strong>rem contar com um suporte teórico, permitem analisar<br />
28
tendências e projectar cenários <strong>de</strong> evolução, como por<br />
exemplo avaliar efeitos ambientais <strong>de</strong> longo prazo das<br />
tecnologias nos recursos, tais como <strong>de</strong> poluição e <strong>de</strong><br />
erosão dos solos; os mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> programação matemática<br />
ou <strong>de</strong> optimização condicionada, em que é explicitamente<br />
mo<strong>de</strong>lada uma função que expressa o objectivo do<br />
empresário que é sujeita ao conjunto <strong>de</strong> restrições <strong>de</strong><br />
diversa natureza que a condicionam; lineares para<br />
geralmente representar o objectivo da maximização do<br />
lucro ou com formas funcionais alternativas (quadrática,<br />
potência, exponencial, logarítmica ou translogarítmica) para<br />
incorporar múltiplos objectivos, incluindo o risco,<br />
representados pela função <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> e por forma a<br />
satisfazer os pressupostos teóricos, incluindo o do<br />
comportamento <strong>de</strong> aversão ao risco.<br />
Esses métodos são também os disponíveis para ajudar os<br />
agentes políticos ou os fazedores <strong>de</strong> políticas do termo<br />
policymakers nas suas <strong>de</strong>cisões. Em termos da socieda<strong>de</strong>,<br />
também po<strong>de</strong>mos consi<strong>de</strong>rar e construir funções <strong>de</strong><br />
utilida<strong>de</strong> agregadas como forma <strong>de</strong> contemplar e mo<strong>de</strong>lar o<br />
conjunto dos objectivos comuns da nossa socieda<strong>de</strong> que<br />
atrás referi <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento sustentável, <strong>de</strong> bem-estar<br />
ou <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong>. Naturalmente, que para a avaliação ou<br />
procura da eficiência das <strong>de</strong>cisões dos projectos nas<br />
diversas áreas sectoriais para além da economia e<br />
finanças, esta formulação simplificada baseada na função<br />
<strong>de</strong> utilida<strong>de</strong>, po<strong>de</strong> ser utilizada para a saú<strong>de</strong>, o emprego e<br />
a segurança social, a educação, a ciência tecnologia e<br />
ensino superior, a cultura, a administração interna, os<br />
negócios estrangeiros, a economia e inovação e, também<br />
para a agricultura. Basta em cada área sectorial <strong>de</strong>finir e<br />
mo<strong>de</strong>lar os objectivos e os recursos que os condicionam.<br />
Dito <strong>de</strong> forma mais científica, se <strong>de</strong>finirmos uma função <strong>de</strong><br />
utilida<strong>de</strong> como objectivo, que po<strong>de</strong> ter múltiplos atributos,<br />
consi<strong>de</strong>rando a relação <strong>de</strong>sses atributos com os recursos,<br />
po<strong>de</strong>mos escolher os projectos com maior eficiência.<br />
29
Tal como para a <strong>de</strong>cisão individual, os recursos a incluir<br />
nestes métodos não são necessária e unicamente o capital<br />
financeiro. Por exemplo, o capital científico po<strong>de</strong> ser visto<br />
como uma das barreiras à inovação & <strong>de</strong>senvolvimento. As<br />
infra-estruturas <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>de</strong>terminam uma capacida<strong>de</strong><br />
instalada que não po<strong>de</strong> ser excedida. Todas as limitações<br />
ou estrangulamentos que consi<strong>de</strong>rarmos relevantes à<br />
realização do bem-estar potencial po<strong>de</strong>m ser mo<strong>de</strong>ladas<br />
com o objectivo <strong>de</strong> analisarmos e apurarmos as que mais<br />
condicionam o nosso bem-estar. Por exemplo, nível cultural<br />
e educacional, recursos naturais físicos, administração<br />
pública e organização social e governance.<br />
A questão crucial a que temos que respon<strong>de</strong>r é, por<br />
conseguinte, como socieda<strong>de</strong> que atributos queremos<br />
incluídos e valorizados na nossa função <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong><br />
agregada ou social, ou seja, o que consi<strong>de</strong>ramos “bemestar”?<br />
Por outras palavras, quais são os nossos <strong>de</strong>sígnios<br />
e o que preten<strong>de</strong>mos para nós próprios e para os nossos<br />
semelhantes, como povo e como parte da humanida<strong>de</strong>? O<br />
que nos move como parte <strong>de</strong> uma civilização? Como<br />
valorizamos na nossa função <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> o direito<br />
internacional, em particular os direitos humanos<br />
(nomeadamente, a violência, a fome ou a pobreza), o<br />
ambiente (naturalmente a poluição, a biodiversida<strong>de</strong>), a<br />
saú<strong>de</strong> (por exemplo a mortalida<strong>de</strong> infantil e o apoio aos<br />
idosos), a educação e o conhecimento científico (a história,<br />
o património, a ciência), a cultura e as artes (a música, a<br />
pintura, o cinema e o teatro), o <strong>de</strong>sporto (em particular o<br />
futebol), e por aí adiante. É claro que as respostas a estas<br />
questões radicam na essência dos princípios e dos valores<br />
que comungamos, ou dito <strong>de</strong> outra forma, o que queremos<br />
que a socieda<strong>de</strong> valorize. Respostas a estas questões<br />
explicitam os atributos da nossa função <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> mas<br />
nem a Gestão Científica nem qualquer outra ciência<br />
humana e social os <strong>de</strong>termina. No máximo, po<strong>de</strong>mos dizer<br />
30
que a evolução do potencial humano <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> as<br />
influencia, <strong>de</strong>terminadamente, no longo prazo.<br />
A afectação dos recursos vai ter lugar em função dos<br />
atributos e indicadores escolhidos. Sempre que os atributos<br />
e indicadores escolhidos não coincidam com os <strong>de</strong>sejados<br />
pela socieda<strong>de</strong> como um todo, há quebras potenciais <strong>de</strong><br />
bem-estar pois o uso efectivo dos recursos diverge do uso<br />
colectivo que garantiria a eficiência.<br />
Por que falei da importância do capital humano, é altura<br />
para mais um aparte, <strong>de</strong>sta vez um relacionado com a<br />
socieda<strong>de</strong> em geral. A sua relevância vem a propósito da<br />
<strong>de</strong>finição e prossecução da função <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> social. Mas,<br />
em verda<strong>de</strong>, lembrei-me <strong>de</strong> o fazer por me parecer<br />
particularmente útil no contexto da reflexão que se fez,<br />
recentemente, por ocasião das celebrações do centenário<br />
da república. O analfabetismo <strong>de</strong> quase oitenta por cento<br />
da população foi referido como um dos aspectos<br />
fundamentais caracterizadores da população portuguesa e<br />
a alteração <strong>de</strong>ssa situação como um objectivos do novo<br />
regime político.<br />
Obviamente, que a situação do nosso país nos nossos dias<br />
é incomparavelmente diferente no que toca à alfabetização.<br />
Mas, passado um século, importa, fundamentalmente,<br />
analisar a situação em termos evolutivos, ou seja, fixando<br />
como patamares <strong>de</strong> análise níveis <strong>de</strong> formação mais<br />
elevados, e em termos relativos, isto é, comparando os<br />
nossos resultados com os dos outros países.<br />
Também para a colaboração no estudo sobre<br />
<strong>de</strong>senvolvimento rural que atrás referi, tive a oportunida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> apreciar alguns dos nossos indicadores. A figura que,<br />
em seguida apresento (ver na próxima página) é, também,<br />
31
Figura 7: Percentagem <strong>de</strong> adultos (25 a 64 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>)<br />
com formação secundária e superior, ao nível das NUTS 2.<br />
FONTE: RURAL DEVELOPMENT IN THE EUROPEAN UNION –<br />
STATISTICAL AND ECONOMIC INFORMATION – REPORT 2009<br />
32
Tabela 1: Percentagem <strong>de</strong> adultos (25 a 64 anos <strong>de</strong> ida<strong>de</strong>)<br />
com formação secundária e superior ao nível das NUTS 2.<br />
FONTE: RURAL DEVELOPMENT IN THE EUROPEAN UNION –<br />
STATISTICAL AND ECONOMIC INFORMATION – REPORT 2009<br />
33
em termos globais, particularmente reveladora do atraso<br />
dos países da Europa do Sul, em que nos incluímos,<br />
relativamente aos do Norte da Europa.<br />
Fiquei curioso em relação à posição no intervalo<br />
apresentado. Quando verificamos na tabela 1 a nossa<br />
posição relativa nos países do Sul ficamos mais<br />
constrangidos.Em primeiro lugar, sendo apenas<br />
apresentados resultados agregados ao nível das NUTS 2,<br />
sabemos que os resultados das áreas predominantemente<br />
rurais dizem respeito exclusivamente ao Alentejo e os das<br />
zonas intermédias às outras NUTS 2 (excluindo a zona<br />
urbana referida na NUTS 2 <strong>de</strong> Lisboa e Vale do Tejo) pelo<br />
que, como já enunciamos, não faz qualquer sentido<br />
analisar este indicar para diferentes zonas, nomeadamente<br />
para as predominantemente rurais, como seria <strong>de</strong>sejável.<br />
Analisemos, por conseguinte, apenas as médias para os<br />
países.<br />
Em Portugal, cerca <strong>de</strong> 28,2 por cento dos adultos têm<br />
educação secundária e superior. Apenas Malta, apresenta<br />
um valor mais baixo, 27,5 por cento, sendo essa<br />
percentagem para os restantes países europeus do Sul<br />
dada por 51 % na Espanha, 53,3 % na Itália e 61,1 % na<br />
Grécia. A média comunitária varia entre os 66,7 e os 78,8<br />
%, consoante o grupo <strong>de</strong> países comunitários<br />
consi<strong>de</strong>rados.<br />
Foram recentemente publicados os indicadores da OCDE<br />
relativos à educação. Alguns, recordo-me por exemplo do<br />
relativo ao investimento na educação, mereceram ampla<br />
divulgação na comunicação social. Tendo como universo<br />
os países da OCDE, esse relatório também é claro (ver<br />
figura 8). Em 2008, a percentagem da população adulta<br />
(25-64 anos) com educação secundária indicada para<br />
Portugal também é <strong>de</strong> 28 %, a menor entre todos os<br />
34
países. É naturalmente maior nos jovens adultos (47% no<br />
escalão etário dos 25-34 anos apenas superior à do México<br />
e Turquia) e menor nos escalões etários mais elevados<br />
(13% no escalão dos 55-64 anos, a mais baixa <strong>de</strong> todos os<br />
países da OCDE). Registe-se que a média dos países da<br />
OCDE é <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 71%. e <strong>de</strong> 72% na EU 19, para<br />
salientar o gap educacional com que nos <strong>de</strong>paramos.<br />
Figura 8: Percentagem <strong>de</strong> adultos (25-34 e 55-64 anos <strong>de</strong><br />
ida<strong>de</strong>) com formação secundária e superior, por país da<br />
OCDE (2008).<br />
FONTE: EDUCATION AT A GLANCE, OECD INDICATORS, <strong>2010</strong>.<br />
Apesar do esforço <strong>de</strong> investimento na educação, na última<br />
década apenas conseguimos manter o pior score entre os<br />
países da OCDE. Quem sabe, se não teria sido esta a<br />
razão da necessida<strong>de</strong> da “paixão pela educação” <strong>de</strong> um<br />
recente primeiro-ministro português, das “novas<br />
35
oportunida<strong>de</strong>s” do actual governo ou do contrato <strong>de</strong><br />
confiança do actual ministro da Ciência & Tecnologia e<br />
Ensino Superior. Mas, em minha opinião, o mais importante<br />
é que esses esforços em termos reais ou efectivos<br />
qualifiquem e aumentem o capital humano dos<br />
portugueses.<br />
Que custo representa este atraso estrutural para Portugal e<br />
como nos coloca relativamente aos outros países em<br />
termos <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento humano é algo em que temos<br />
<strong>de</strong> analisar e avaliar em termos <strong>de</strong> consequências e<br />
políticas, fundamentalmente, para as futuras gerações.<br />
Os preços, as falhas <strong>de</strong> mercado e os bens públicos<br />
Mas, há ainda outra questão crucial a que é necessário<br />
respon<strong>de</strong>r: Como valorizamos os atributos que queremos<br />
incluídos na nossa função <strong>de</strong> utilida<strong>de</strong> social ou agregada?<br />
E que valor atribuímos ao contributo relativo dos diferentes<br />
atributos e qual a sua própria escala, em termos absolutos?<br />
Talvez uma escala do conhecimento do nosso mundo, ou<br />
melhor, do nosso universo, da eterna caverna <strong>de</strong> Platão,<br />
com que o Prof. Leite Vi<strong>de</strong>ira nos <strong>de</strong>slumbrou na sua lição<br />
<strong>inaugural</strong> no dia 1 <strong>de</strong> Novembro <strong>de</strong> 1999, fosse a escala<br />
i<strong>de</strong>al. Como a po<strong>de</strong>ríamos construir? Como valorizaríamos<br />
o “magnífico casal <strong>de</strong> bisontes” que há catorze mil anos<br />
atrás homens como nós ali esculpiram? E como<br />
relacionaríamos essa escala com a nossa escala <strong>de</strong><br />
realização da nossa vida?<br />
Para cada tipo <strong>de</strong> benefícios e custos em cada área <strong>de</strong><br />
aplicação a gestão económica <strong>de</strong>senvolveu métodos e<br />
técnicas <strong>de</strong> avaliação dos custos e dos benefícios<br />
específicos a consi<strong>de</strong>rar. No entanto, a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um<br />
<strong>de</strong>nominador comum, traduz-se num equivalente cardinal,<br />
36
com interpretação específica, ou apenas num ordinal, para<br />
indicar a preferência à luz dos atributos ou critérios<br />
<strong>de</strong>finidos.<br />
É preciso uma valorização monetária ou em moeda? A<br />
resposta é não necessariamente. Mas é <strong>de</strong>sejável que haja<br />
um padrão <strong>de</strong> valor. O equivalente cardinal mais <strong>de</strong>sejável<br />
em termos <strong>de</strong> valor é, naturalmente, a moeda. Permite a<br />
expressão do valor dos benefícios e custos pelo valor <strong>de</strong><br />
troca. A sua avaliação é, por isso, para os bens<br />
transaccionáveis obtida com facilida<strong>de</strong> através do preço <strong>de</strong><br />
mercado. Os preços, ou seja a valorização dada pelos<br />
mercados aos bens transaccionáveis, permitem uma<br />
valorização monetária imediata. Para a fazer basta<br />
conhecer os preços e quantida<strong>de</strong>s dos bens e serviços, a<br />
valorização dos recursos utilizados ou inputs e dos<br />
produtos produzidos ou outputs.<br />
Os preços traduzem a competitivida<strong>de</strong> dos países, das<br />
regiões e dos agentes individuais, seja dos empresários,<br />
através da retribuição da gestão e do risco, seja dos<br />
trabalhadores, a competitivida<strong>de</strong> dos salários. Dito <strong>de</strong> outra<br />
forma, os preços reflectem as diferenças <strong>de</strong> recursos,<br />
tecnologias, condições infraestruturais e socio-económicas<br />
<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento e políticas pois, verificadas<br />
<strong>de</strong>terminadas condições (equilíbrio <strong>de</strong> mercado e<br />
rendimentos constantes à escala), o valor dos bens<br />
representa a soma das retribuições dos factores utilizados<br />
(Euler´s theorem).<br />
Por isso, supostamente, <strong>de</strong>vemos apostar em bens e<br />
serviços em que tenhamos vantagens competitivas que<br />
consigamos produzir com menor custo ou com mais<br />
qualida<strong>de</strong> incorporada, ou seja, com menor preço ou com<br />
mais valor que outras empresas, outras regiões ou outros<br />
países, como já vimos. Com um <strong>de</strong>terminado potencial <strong>de</strong><br />
37
possibilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> produção e <strong>de</strong> transformação,<br />
promovendo a abertura económica e trocando com outros,<br />
po<strong>de</strong>mos obter ganhos do comércio e conseguir mais bemestar,<br />
ou seja, um nível utilida<strong>de</strong> mais elevado do que o<br />
conseguido numa economia fechada. Eis que cheguei à<br />
justificação económica para a globalização, ou à<br />
necessida<strong>de</strong> da inter<strong>de</strong>pendência, que não seria diferente<br />
se invocasse outras razões, por exemplo, as ambientais,<br />
pois a argumentação seria comparável e, também,<br />
baseada na inter<strong>de</strong>pendência.<br />
Os preços internacionais não <strong>de</strong>vem, por isso, estar<br />
distorcidos e as políticas que influenciam artificialmente os<br />
preços <strong>de</strong> mercado <strong>de</strong>vem ser controladas. Essa é a razão<br />
para a negociação internacional, em rounds primeiro e,<br />
posteriormente, para a organização mundial do comércio,<br />
em se procuram <strong>de</strong>finir regras e níveis <strong>de</strong> protecção<br />
“toleráveis”. Importa conhecer os efeitos nesses preços do<br />
aumento da procura e do bem-estar das populações dos<br />
países emergentes, a China e a Índia, do que po<strong>de</strong>m<br />
significar a distorção <strong>de</strong> preços por razões socioeconómicas,<br />
nomeadamente por políticas salariais e <strong>de</strong><br />
direitos sociais. É claro que a necessária abertura e a<br />
participação <strong>de</strong>sses povos nos fóruns mundiais também vai<br />
criando efeitos políticos, nomeadamente as relacionadas<br />
com os direitos humanos, que são <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> relevância<br />
humanitária e que, a prazo, também trazem efeitos<br />
económicos.<br />
Os preços também resultam da confiança dos agentes <strong>de</strong><br />
mercado. Todos os preços, inclusivé o do dinheiro, a taxa<br />
<strong>de</strong> juro, têm influência na valorização dos custos e dos<br />
benefícios. O aumento da taxa <strong>de</strong> juro <strong>de</strong> um País<br />
endividado e cuja expectativa <strong>de</strong> solvabilida<strong>de</strong> é ameaçada<br />
influência <strong>de</strong>finitivamente os resultados dos projectos.<br />
38
Os objectivos sociais com <strong>de</strong>terminados bens comportam<br />
diferentes naturezas e tipos <strong>de</strong> custos e benefícios que<br />
<strong>de</strong>vem ser incorporados nos seus mo<strong>de</strong>los <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão cuja<br />
valorização monetária é complexa. Para bens e serviços<br />
não transaccionáveis a tradução financeira ou monetária<br />
dos custos e ganhos futuros é, muitas vezes, difícil <strong>de</strong> se<br />
conseguir. O mesmo se passa com as variáveis tempo e<br />
risco. Então, a análise <strong>de</strong>ve referir se são ou não<br />
consi<strong>de</strong>rados, se são ou não relevantes, e se <strong>de</strong>vem ou<br />
não ser incluídos.<br />
Os métodos <strong>de</strong> <strong>de</strong>cisão também incluem técnicas para lidar<br />
com estas dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> valorização. Nesses casos, é<br />
possível, por exemplo, aplicar a Análise <strong>de</strong> Custos Efectiva.<br />
Trata-se <strong>de</strong>, quando não é possível realizar ou garantir com<br />
o mínimo <strong>de</strong> rigor e segurança da avaliação, fixar metas ou<br />
limites inferiores e superiores e margens <strong>de</strong> segurança<br />
para indicadores do projecto consi<strong>de</strong>rados fundamentais e,<br />
seguidamente, avaliar custos das formas alternativas que<br />
os permitem atingir. A análise <strong>de</strong> sensibilida<strong>de</strong> é,<br />
complementarmente, outra técnica potencial a utilizar em<br />
que através da simulação <strong>de</strong> diferentes cenários <strong>de</strong><br />
estados <strong>de</strong> natureza e probabilida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> ocorrência, por<br />
exemplo das taxas <strong>de</strong> <strong>de</strong>sconto social e dos níveis <strong>de</strong> risco,<br />
melhorar a robustez da <strong>de</strong>cisão relativamente ao projecto.<br />
Esse é sempre o trabalho do investigador que perante uma<br />
hipótese tem que construir o mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> análise,<br />
quantitativo ou não, <strong>de</strong>finindo o que <strong>de</strong>ve fazer parte <strong>de</strong>sse<br />
mo<strong>de</strong>lo. O técnico que faz assessoria ao <strong>de</strong>cisor político<br />
tem a obrigação <strong>de</strong> lhe colocar os cenários possíveis, as<br />
potenciais alternativas e a sua influência na <strong>de</strong>cisão. Só<br />
maus gestores e economistas não relevam o que fica <strong>de</strong><br />
fora da análise e com que pressupostos a analisam em<br />
cada caso em que apresentam as suas conclusões.<br />
39
Mas, a valorização <strong>de</strong> bens e serviços com características<br />
especiais não po<strong>de</strong> ser dada pelo mercado pois o preço <strong>de</strong><br />
mercado não constitui o valor a<strong>de</strong>quado da transacção do<br />
bem ou serviço. Incluem-se neste último ponto todos os<br />
casos que resultam nas chamadas falhas <strong>de</strong> mercado<br />
(market failure). Dessas quero falar-vos, dado o tema que<br />
pretendo focar da política agrícola e <strong>de</strong>senvolvimento rural,<br />
em particular <strong>de</strong> falhas <strong>de</strong> mercado por existência <strong>de</strong><br />
externalida<strong>de</strong>s e por se tratarem <strong>de</strong> bens públicos.<br />
Nestes casos levantam-se questões particularmente<br />
relevantes <strong>de</strong> avaliação <strong>de</strong> alguns dos atributos dada a sua<br />
natureza. Nesses bens e serviços os interesses individuais<br />
ou <strong>de</strong> grupos divergem dos interesses colectivos da<br />
socieda<strong>de</strong>. Por isso, o preço <strong>de</strong> mercado, só por si, não<br />
gera uma afectação <strong>de</strong> recursos eficiente que garanta um<br />
nível <strong>de</strong> oferta <strong>de</strong> bens e serviços a<strong>de</strong>quada.<br />
A existência do mercado <strong>de</strong> um bem ou serviço tem três<br />
pressupostos fundamentais relacionados com as<br />
características ou os direitos <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> do bem e<br />
serviço em consi<strong>de</strong>ração. Esses pressupostos base são a<br />
exclusivida<strong>de</strong>, a transferibilida<strong>de</strong> e a segurança. Pela<br />
exclusivida<strong>de</strong> todos os benefícios e os custos que resultam<br />
da utilização do bem e serviço são apenas do <strong>de</strong>tentor dos<br />
direitos ou <strong>de</strong> terceiros por venda <strong>de</strong>sses direitos. Os<br />
direitos serem transferíveis significa que po<strong>de</strong>m ser<br />
negociados ou trocados voluntariamente. Finalmente, os<br />
direitos <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong> não po<strong>de</strong>m ser contestados ou<br />
postos em causa por terceiros.<br />
Estes pressupostos garantem que a troca, ou seja, a<br />
compra e venda, promove a eficiência. Os preços<br />
equilibram o mercado promovendo a eficiência dada pelo<br />
exce<strong>de</strong>nte social que resulta das componentes dos<br />
exce<strong>de</strong>ntes do consumidor, o comprador, e do produtor, o<br />
40
ven<strong>de</strong>dor. O sistema <strong>de</strong> preços induz os comportamentos<br />
dos consumidores e produtores eficientes do ponto <strong>de</strong> vista<br />
da socieda<strong>de</strong>.<br />
Na realida<strong>de</strong>, a característica da exclusivida<strong>de</strong> não é<br />
garantida na generalida<strong>de</strong> dos bens e serviços. Quando um<br />
agente não suporta as consequências totais das suas<br />
acções não se produz uma afectação eficiente. Neste caso<br />
produz-se uma externalida<strong>de</strong> positiva ou negativa<br />
consoante o agente não paga o custo total das suas<br />
acções ou é penalizado pelos custos da acção <strong>de</strong> outro<br />
agente. O efeito da poluição atmosférica <strong>de</strong> uma fábrica<br />
numa pequena cida<strong>de</strong> é uma externalida<strong>de</strong> negativa pois é<br />
a população que sofre as consequências ou custos sociais<br />
que <strong>de</strong>veriam ser suportados pelo proprietário da fábrica. A<br />
preservação da paisagem é uma externalida<strong>de</strong> positiva<br />
para quem por ela passa e a aprecia pois recebe os efeitos<br />
positivos da sua fruição sem suportar os custos das<br />
operações culturais que são necessários para a manter.<br />
Em ambos os casos o custo social dado pelo custo<br />
marginal <strong>de</strong> produção incluindo a externalida<strong>de</strong> não é o<br />
custo privado dado pelo custo marginal <strong>de</strong> produção sem o<br />
custo da externalida<strong>de</strong>. O bem-estar da população<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> não apenas das suas activida<strong>de</strong>s mas também<br />
das activida<strong>de</strong>s controladas ou geridas pelo proprietário da<br />
fábrica. A poluição é imposta como um custo externo à<br />
população. O bem-estar dos viajantes <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> não apenas<br />
das suas activida<strong>de</strong>s mas também das activida<strong>de</strong>s<br />
controladas ou geridas pelo agricultor da exploração<br />
agrícola. A beleza da paisagem constitui um benefício<br />
externo dos viajantes.<br />
Se não houver uma compensação exterior, a socieda<strong>de</strong><br />
impõe esse custo externo aos agricultores pois esse custo<br />
não é reflectido nos preços dos produtos. Os preços dos<br />
41
ens produzidos pelo agricultor são mais altos do que o<br />
nível eficiente e o nível <strong>de</strong> oferta do bem é inferior ao<br />
<strong>de</strong>sejado ou ao eficiente do ponto <strong>de</strong> vista da socieda<strong>de</strong>.<br />
Numa externalida<strong>de</strong> negativa passa-se exactamente o<br />
contrário. Se não houver um controlo exterior da poluição a<br />
oferta da fábrica é superior ao nível eficiente e os preços<br />
dos bens produzidos são mais baixos do que o nível<br />
eficiente. A socieda<strong>de</strong> suporta o custo externo da poluição.<br />
Os efeitos externos po<strong>de</strong>m ser positivos ou negativos<br />
(economias e <strong>de</strong>seconomias externas). Um exemplo <strong>de</strong><br />
economia externa que é interessante referir é o dos<br />
clusters. As economias externas são a fonte <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento <strong>de</strong> clusters que são consi<strong>de</strong>rados a<br />
característica base <strong>de</strong> economias regionais e nacionais<br />
com importante influência da inovação, competitivida<strong>de</strong> e<br />
performance económica. Os clusters são uma<br />
concentração geográfica próxima <strong>de</strong> companhias,<br />
fornecedores, serviços e instituições associadas num<br />
<strong>de</strong>termino ramo interligadas por externalida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> vários<br />
tipos (Porter, p. 562).<br />
Estes efeitos <strong>de</strong> equilíbrio parcial dos mercados <strong>de</strong>stes<br />
bens e serviços não <strong>de</strong>ixam <strong>de</strong> se propagar em termos <strong>de</strong><br />
equilíbrio geral. Acabam por afectar a procura <strong>de</strong> matériasprimas,<br />
consumos intermédios, trabalho, os níveis <strong>de</strong><br />
preços respectivos e a economia no seu todo.<br />
As características que referi também não são globalmente<br />
garantidas pelos mercados num tipo particular <strong>de</strong> bens que<br />
importa caracterizar pois são <strong>de</strong> especial importância para<br />
o nosso tema. Como já indiquei são os bens públicos.<br />
Estes bens exibem a característica da indivisibilida<strong>de</strong>, isto<br />
é, o consumo do bem por um utilizador não diminui a<br />
42
quantida<strong>de</strong> disponível para os restantes. A consequência<br />
<strong>de</strong>sta característica é que o bem é fornecido ao utilizador<br />
mesmo que ele não pague pelo benefício da sua utilização<br />
(free ri<strong>de</strong>r).<br />
A biodiversida<strong>de</strong>, a paisagem, a protecção <strong>de</strong> incêndios ou<br />
o ar puro são exemplos <strong>de</strong>stes bens. Todos po<strong>de</strong>mos<br />
beneficiar simultaneamente qualquer que seja o nível<br />
oferecido <strong>de</strong>stes bens. A principal questão que se põe à<br />
socieda<strong>de</strong> neste tipo <strong>de</strong> bens é saber se o mercado, ou<br />
seja, se os agentes que fornecem estes bens o fazem a um<br />
nível eficiente.<br />
Há mais um aparte que, hoje, tenho que fazer pelas razões<br />
óbvias. Tenho que sublinhar as características <strong>de</strong> bem<br />
público da formação superior. O capital intelectual<br />
acumulado por qualquer humano por via da sua formação é<br />
<strong>de</strong>tido por ele próprio ou é sua “proprieda<strong>de</strong>”. Os resultados<br />
da aplicação <strong>de</strong>sse capital resultam numa retribuição<br />
pessoal da sua utilização, o seu salário. Mas, a socieda<strong>de</strong><br />
também é beneficiada colectivamente com esse contributo.<br />
Há externalida<strong>de</strong>s positivas da aplicação do capital humano<br />
que resultam em mais <strong>de</strong>senvolvimento e bem-estar social.<br />
Por isso, se <strong>de</strong>ixássemos exclusivamente ao mercado o<br />
fornecimento <strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> bens não teríamos uma<br />
afectação <strong>de</strong> recursos eficiente, ou seja, o nível <strong>de</strong><br />
formação superior seria menor do que o <strong>de</strong>sejado em<br />
termos da socieda<strong>de</strong>. Este fundamento aplica-se à<br />
investigação científica, à formação cultural, bem como à<br />
organização política dos cidadãos para combater grupos<br />
que procuram extracção <strong>de</strong> rendas ou mesmo à própria<br />
participação da socieda<strong>de</strong> civil numa <strong>de</strong>mocracia<br />
(Tietenberg, p.76).<br />
Os mercados também falham do ponto <strong>de</strong> vista da<br />
eficiência social por outras razões também ligadas à não<br />
verificação dos pressupostos que referi. A existência <strong>de</strong><br />
43
mercados imperfeitos, em que a troca dos direitos <strong>de</strong><br />
proprieda<strong>de</strong> é influenciada por um participante com po<strong>de</strong>r<br />
<strong>de</strong> mercado, resulta em afectações eficientes individual<br />
mas ineficientes colectivamente. È o que se verifica se as<br />
políticas <strong>de</strong> gestão da oferta <strong>de</strong> recursos forem dominadas<br />
por cartéis ou se verificarem acordos entre empresas para<br />
controlo dos mercados. Trata-se <strong>de</strong> práticas que violam a<br />
livre concorrência. As socieda<strong>de</strong>s tentam contrariar e<br />
<strong>de</strong>sincentivar estas actuações tratando-as como “crimes”<br />
económicos, impondo pesadas multas, por entida<strong>de</strong>s para<br />
a livre concorrência, quando as mesmas são provadas ou<br />
actuando através <strong>de</strong> entida<strong>de</strong>s reguladoras <strong>de</strong>sses<br />
mercados constituídas para controlar esses efeitos.<br />
As falhas <strong>de</strong> governo também são fontes <strong>de</strong> ineficiência. As<br />
activida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> rent seeking bem sucedidas traduzem-se<br />
em medidas políticas <strong>de</strong> protecção <strong>de</strong> interesses<br />
específicos em prejuízo do bem comum. Alguns exemplos<br />
na agricultura são a protecção por cotas <strong>de</strong> importação,<br />
fixação <strong>de</strong> preços para suportar rendimento, subsídios ao<br />
consumo para <strong>de</strong>terminados produtos.<br />
A política agrícola e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento rural<br />
A Comissão Europeia divulgou um “discussion paper” (EC,<br />
Dezembro 2009) em que sintetiza os aspectos que<br />
consi<strong>de</strong>ra fundamentais relativamente à necessida<strong>de</strong> da<br />
PAC. O título do documento é mesmo “Porque precisamos<br />
<strong>de</strong> uma PAC”. Esse é também o título do segundo subponto.<br />
O que está em causa é, obviamente, o futuro da<br />
PAC pós-2013.<br />
Muito recentemente, ao nível nacional, um documento<br />
elaborado pelo Grupo <strong>de</strong> Peritos criado por Despacho do<br />
Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das<br />
44
Pescas (Avillez e outros), titulado “A agricultura portuguesa<br />
e o futuro da PAC pós-2013”, analisa a mesma temática<br />
numa óptica prospectiva <strong>de</strong> áreas <strong>de</strong> intervenção,<br />
priorida<strong>de</strong>s, objectivos e instrumentos e <strong>de</strong> pressupostos<br />
base para análise do futuro da PAC pós-2013.<br />
O meu propósito foi, também, o <strong>de</strong> dar um contributo<br />
teórico-conceptual para essa discussão.<br />
Os pontos anteriores das <strong>de</strong>terminantes da competitivida<strong>de</strong><br />
e das falhas <strong>de</strong> mercado fornecem a estrutura conceptual<br />
para analisar os fundamentos da existência <strong>de</strong> uma política<br />
agrícola e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento rural e as funções que <strong>de</strong>ve<br />
<strong>de</strong>sempenhar.<br />
Adoptando, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> logo, a nossa estrutura conceptual<br />
teórica da gestão económica, queremos que para a<br />
agricultura o mercado produza uma afectação <strong>de</strong> recursos<br />
eficiente. Para tal, como vimos, preten<strong>de</strong>-se que o sector<br />
agro-alimentar seja competitivo no mercado global. A<br />
agricultura tem que ter uma orientação para o mercado<br />
aberto em que vivemos. Essa é a forma <strong>de</strong> a socieda<strong>de</strong>, ou<br />
seja, todos nós consumidores, dispor <strong>de</strong> produtos<br />
alimentares ao melhor preço. O mesmo é dizer que esses<br />
produtos têm o melhor custo. Os produtores têm que se<br />
reestruturar e inovar adaptando-se a contínuas mudanças<br />
das tecnologias e dos mercados.<br />
Esta é a orientação que a agricultura europeia seguiu nas<br />
últimas duas décadas por força do contexto <strong>de</strong> globalização<br />
mundial em que está envolvida e, consequentemente, das<br />
sucessivas reformas da PAC, adoptadas para esse efeito.<br />
45
Mas na avaliação dos custos e benefícios, ou seja, do<br />
aumento da eficiência promovida por esta orientação, há<br />
alguns aspectos fundamentais a consi<strong>de</strong>rar. Em primeiro<br />
lugar é fundamental garantir um sistema internacional<br />
fiável. Depois, mesmo com um sistema <strong>de</strong> comércio<br />
internacional estável, o aumento dos níveis <strong>de</strong> trocas<br />
internacionais traz um aumento <strong>de</strong> variabilida<strong>de</strong> dos preços<br />
ou <strong>de</strong> volatilida<strong>de</strong> dos mercados.<br />
Estes dois aspectos têm a ver com a função fundamental<br />
que a socieda<strong>de</strong> pe<strong>de</strong> à agricultura e ao sistema agroalimentar<br />
<strong>de</strong> garantir o abastecimento <strong>de</strong> bens alimentares<br />
às populações a preços justos. No fundo, para além <strong>de</strong> um<br />
conjunto <strong>de</strong> outras questões relacionadas com a agronomia<br />
dos sistemas <strong>de</strong> produtos alimentares que justificam a<br />
intervenção dos governos na agricultura (Goldberg, p. 3), a<br />
segurança <strong>de</strong> abastecimento alimentar (food security) e a<br />
volatilida<strong>de</strong> dos mercados do sistema alimentar são<br />
fundamentos para a existência <strong>de</strong> medidas <strong>de</strong> política<br />
agrícola que controlem estes aspectos em níveis<br />
a<strong>de</strong>quados.<br />
As questões relativas à segurança alimentar e volatilida<strong>de</strong><br />
dos preços são particularmente relevantes assim que há<br />
retoma na economia mundial, pois o crescimento aumenta<br />
a procura e o preço do petróleo, o que traz associado o<br />
aumento dos preços dos bens alimentares e das matériasprimas<br />
agrícolas. Adicionalmente, o crescimento<br />
económico e as mudanças <strong>de</strong> hábitos alimentares dos<br />
países emergentes têm provocado um constante aumento<br />
da procura e, consequentemente, dos preços dos alimentos<br />
(Marti, p.5). Estes efeitos continuarão a fazer-se sentir no<br />
futuro.<br />
O tema da segurança do abastecimento alimentar tem<br />
também importância por razões <strong>de</strong> natureza ambiental por<br />
46
várias razões, entre as quais são <strong>de</strong>stacadas as mudanças<br />
climáticas e o aumento da escassez <strong>de</strong> água.<br />
Um dos principais <strong>de</strong>safios da humanida<strong>de</strong> para as<br />
próximas décadas é o <strong>de</strong> ser capaz <strong>de</strong> conciliar segurança<br />
do abastecimento alimentar e sustentabilida<strong>de</strong> ambiental<br />
(Avillez e outros). O grupo <strong>de</strong> peritos criado pelo MADRP<br />
refere que as mais recentes previsões apontam para a<br />
necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um aumento <strong>de</strong> cerca <strong>de</strong> 70% da produção<br />
vegetal e animal até 2050. Simultaneamente, é necessário<br />
assegurar uma gestão sustentável dos recursos naturais e<br />
a coesão económica e social das áreas rurais.<br />
A PAC pós-2013 vai revisitar o seu primeiro <strong>de</strong>sígnio, o<br />
objectivo inicial, <strong>de</strong> assegurar a oferta <strong>de</strong> produtos<br />
alimentares: “the first and foremost role of European<br />
agriculture is to supply food”, refere o documento. A<br />
segurança do abastecimento alimentar é assumida como<br />
um objectivo estratégico. A prossecução <strong>de</strong>ste objectivo<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> do funcionamento do sector agrícola, da<br />
manutenção da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produção e <strong>de</strong> um sistema<br />
estável <strong>de</strong> relações comerciais. Os agricultores têm que<br />
produzir a preços competitivos produtos <strong>de</strong> qualida<strong>de</strong>,<br />
seguros, utilizando tecnologias <strong>de</strong> produção amigas do<br />
ambiente e do bem-estar animal.<br />
Assim, em primeiro lugar há que <strong>de</strong>finir o âmbito espacial<br />
para o fazer. A nossa produção nacional tem baixado para<br />
níveis sucessivos <strong>de</strong> auto-suficiência. Mas, <strong>de</strong>vemos<br />
questionarmo-nos sobre a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma segurança<br />
alimentar em termos nacionais. Por outras palavras, no<br />
caso <strong>de</strong> Portugal, <strong>de</strong>ve ser feito ao nível nacional ou<br />
supranacional, no caso, comunitário europeu? Depois é<br />
necessário <strong>de</strong>finir o nível a<strong>de</strong>quado e ter políticas que<br />
mantenham em condições <strong>de</strong> funcionamento a exploração<br />
agrícola que garanta o nível <strong>de</strong>finido?<br />
47
Quanto à primeira questão os dias que vivemos são bem<br />
<strong>de</strong>monstrativos dos riscos, mesmo em termos <strong>de</strong> soberania<br />
económica, quanto mais do ponto <strong>de</strong> vista alimentar,<br />
Estamos numa união europeia com políticas económicas,<br />
nomeadamente financeiras e monetárias, com uma moeda<br />
única, e políticas alimentares comuns, pelo que estamos<br />
interligados e a procura <strong>de</strong> soluções para a nossa<br />
agricultura nos garantir a segurança <strong>de</strong> abastecimento<br />
alimentar ter que ser enquadrada nesse âmbito.<br />
Quanto à segunda, para manter uma agricultura, operante,<br />
em funcionamento, é necessário manter o potencial <strong>de</strong><br />
produção <strong>de</strong>sejado. Para tal temos que avaliar o potencial<br />
<strong>de</strong> produção que temos em termos relativos. Em mercado<br />
aberto apenas uma parte da nossa agricultura tem a<br />
capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> produzir a preços competitivos, <strong>de</strong><br />
respon<strong>de</strong>r a oportunida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> novas tecnologias e novos<br />
mercados, <strong>de</strong> inovar nos <strong>de</strong>safios da qualida<strong>de</strong>, da<br />
segurança alimentar, da eficiência ambiental e bem-estar<br />
animal das activida<strong>de</strong>s agro-pecuárias.<br />
Uma política <strong>de</strong> armazenamento para um período <strong>de</strong> tempo<br />
suficiente para garantir o retomar da produção seria uma<br />
alternativa principalmente para controlar a volatilida<strong>de</strong> dos<br />
preços mas, menos apropriada para a garantia duradoura<br />
ou permanente <strong>de</strong> abastecimento alimentar.<br />
Realmente, a intervenção do estado para assegurar o<br />
abastecimento alimentar e controlar a variabilida<strong>de</strong><br />
excessiva <strong>de</strong> preços apresenta, em sentido genérico, as<br />
características dos serviços ou bens públicos. Esses<br />
serviços constituem, simultaneamente, um benefício para<br />
todos os consumidores. Qualquer consumidor beneficia<br />
<strong>de</strong>ste tipo <strong>de</strong> bens, não este ou aquele consumidor por<br />
48
azões <strong>de</strong>terminadas, e o facto <strong>de</strong> um ou mais<br />
consumidores beneficiarem <strong>de</strong>ssa intervenção ou serviço<br />
não diminui a garantia para os restantes. Ou seja, para<br />
estes bens, em termos latos, não há exclusivida<strong>de</strong> nem<br />
divisibilida<strong>de</strong> no consumo.<br />
Os agricultores produzem, geralmente, efeitos positivos. A<br />
socieda<strong>de</strong> é afectada positivamente pelos seus serviços.<br />
Nesse caso, o mercado forneceria bens em quantida<strong>de</strong>s<br />
menores do que o nível eficiente pois os preços não se<br />
ajustariam para os compensar do ponto <strong>de</strong> vista social por<br />
esses serviços. A política agrícola e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />
rural internaliza esse custo realizando essa compensação<br />
ao agricultor e promovendo a sua oferta ao nível eficiente.<br />
Dessa forma a política agrícola e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento rural<br />
regula a oferta, ou seja o abastecimento alimentar para<br />
níveis a<strong>de</strong>quados, maiores do que <strong>de</strong> os existentes sem<br />
intervenção pública, e a menores níveis <strong>de</strong> preços, do que<br />
<strong>de</strong> outra forma teriam os preços bens alimentares, para<br />
benefício do consumidor e da socieda<strong>de</strong> em termos<br />
colectivos.<br />
Mas há, também, um conjunto diverso <strong>de</strong> bens públicos <strong>de</strong><br />
natureza social, para além da segurança alimentar,<br />
relacionados com a viabilida<strong>de</strong> das áreas rurais, o<br />
<strong>de</strong>spovoamento e a saú<strong>de</strong> e bem-estar animal.<br />
As activida<strong>de</strong>s e operações agrícolas envolvem a<br />
prestação <strong>de</strong>sses serviços e bens públicos à socieda<strong>de</strong>.<br />
Como vimos atrás, a prestação <strong>de</strong>stes bens públicos exige<br />
uma intervenção, se tivermos como objectivo uma<br />
afectação <strong>de</strong> recursos eficiente, o mesmo é dizer, se<br />
preten<strong>de</strong>rmos alcançar mais bem-estar. A oferta <strong>de</strong>stes<br />
bens teria níveis inferiores aos que a socieda<strong>de</strong> precisa e<br />
que, cada vez mais, valoriza. Essa é, também, uma razão<br />
fundamental e uma priorida<strong>de</strong> para a existência <strong>de</strong> uma<br />
49
política pública para a agricultura e <strong>de</strong>senvolvimento rural,<br />
ou seja, da PAC.<br />
Os bens públicos fornecidos pela agricultura estão,<br />
também, pelas características específicas das activida<strong>de</strong>s<br />
<strong>de</strong> produção vegetal e animal muito ligados ao ambiente.<br />
Incluem as paisagens agrícolas e rurais, a biodiversida<strong>de</strong><br />
das terras agrícolas e a funcionalida<strong>de</strong> dos solos, a<br />
qualida<strong>de</strong> e disponibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> água, a qualida<strong>de</strong> do ar, a<br />
estabilida<strong>de</strong> climática, a resistência a fogos e inundações e<br />
a <strong>de</strong>sertificação (Coopere et al., p. 2).<br />
Alguns <strong>de</strong>stes bens são fornecidos por serem produtos<br />
secundários e sub-produtos das activida<strong>de</strong>s e operações<br />
agrícolas. Outros, são fornecidos com esforços adicionais<br />
fruto das próprias preferências dos agricultores mas<br />
também comuns às da socieda<strong>de</strong> como um todo.<br />
Há evidência e preocupação pública pelo ambiente,<br />
nomeadamente pela perda <strong>de</strong> biodiversida<strong>de</strong>, alterações<br />
climáticas, poluição da água e do solo e <strong>de</strong>gradação <strong>de</strong><br />
recursos naturais. A procura e o acesso da socieda<strong>de</strong> pelo<br />
campo e por áreas protegidas para visitar e mesmo para<br />
viver tem aumentado e as preferências sociais incluindo <strong>de</strong><br />
não-uso com preocupação fundamental <strong>de</strong> preservação,<br />
mesmo não sendo <strong>de</strong> utilizadores directos, têm-se<br />
modificado.<br />
O mercado, só por si, não é capaz <strong>de</strong> garantir este conjunto<br />
<strong>de</strong> funções sociais e ambientais. Também não é possível<br />
equacionar a oferta <strong>de</strong>stes bens e serviços públicos <strong>de</strong><br />
forma <strong>de</strong>sligada da agricultura. Essa alternativa traria<br />
maiores custos à socieda<strong>de</strong> e alguns <strong>de</strong>sses bens<br />
dificilmente po<strong>de</strong>riam ser oferecidos. Por exemplo, a<br />
viabilida<strong>de</strong> socio-económica das áreas rurais baseia-se na<br />
50
agricultura. O potencial dos recursos naturais em muitas<br />
áreas a<strong>de</strong>qua-se a uma exploração que não é competitiva<br />
em termos económicos e exige uma utilização para a sua<br />
própria preservação. Logo, os bens e serviços públicos que<br />
a socieda<strong>de</strong> quer que agricultura <strong>de</strong>sempenhe e forneça<br />
são uma razão para <strong>de</strong>vem ser objecto <strong>de</strong> acções<br />
suportam uma política pública <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento rural.<br />
As funções que a socieda<strong>de</strong> quer ver garantidas <strong>de</strong><br />
segurança do abastecimento alimentar, <strong>de</strong> gestão<br />
sustentável da terra e <strong>de</strong> contribuição para novos <strong>de</strong>safios<br />
ambientais, e <strong>de</strong> viabilida<strong>de</strong> socio-económica das áreas<br />
rurais têm todas a ver com a prestação <strong>de</strong> bens públicos<br />
que o mercado não valoriza, que não presta à socieda<strong>de</strong> e<br />
que por isso a agricultura é chamada pela socieda<strong>de</strong> a<br />
<strong>de</strong>sempenhar através <strong>de</strong> uma política agrícola e <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento rural.<br />
Concluindo, uma política pública para a agricultura e<br />
<strong>de</strong>senvolvimento rural tem como fundamento garantir o<br />
fornecimento <strong>de</strong> bens públicos sociais e ambientais que a<br />
socieda<strong>de</strong> precisa e que os mercados do sistema alimentar<br />
não conseguem fornecer. O fornecimento <strong>de</strong>sses bens<br />
públicos através <strong>de</strong> política agrícola e <strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento<br />
rural visa em termos globais garantir a segurança alimentar<br />
e manter o património do ambiente rural.<br />
Conclusão<br />
Não quero <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> dizer, antes <strong>de</strong> terminar, que penso ter<br />
conseguido <strong>de</strong>monstrar, ilustrando com a aplicação à<br />
agricultura e <strong>de</strong>senvolvimento rural, que a abordagem da<br />
realida<strong>de</strong> pela Gestão ou pela Economia não merece o<br />
tratamento especial das expressões usadas por muitos<br />
cidadãos da cultura, da tecnologia ou da política, a que me<br />
51
eferi no início. Mas, naturalmente, compreendo que o<br />
façam numa forma simplista, empírica ou prática <strong>de</strong> olhar<br />
essa realida<strong>de</strong>, da mesma forma que os gestores e<br />
economistas como cidadãos vêm e analisam as obras e as<br />
realizações da cultura, da técnica ou da política, isto é, aos<br />
“olhos” do conhecimento geral e específico que<br />
acumularam na vida e por que a “vêm”.<br />
52
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