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a Semântica do Lixo eo Trabalho dos Catadores do Rio de ... - Anpad

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Significa<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>Lixo</strong> e Ação Econômica – a <strong>Semântica</strong> <strong>do</strong> <strong>Lixo</strong> e o <strong>Trabalho</strong> <strong>do</strong>s<br />

Cata<strong>do</strong>res <strong>do</strong> <strong>Rio</strong> <strong>de</strong> Janeiro<br />

Autoria: Maria Scarlet <strong>do</strong> Carmo, José Antonio Puppim <strong>de</strong> Oliveira, Carmen Pires Migueles<br />

Resumo<br />

O mo<strong>de</strong>lo <strong>de</strong> cooperativas <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res tem se mostra<strong>do</strong> como uma alternativa<br />

viável para a inclusão social e para a resolução <strong>de</strong> problemas relativos ao acúmulo <strong>de</strong><br />

rejeitos. Ao se pensar nesta ativida<strong>de</strong>, <strong>de</strong>ve ser levada em conta a relação <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res<br />

com este trabalho e como esta relação afeta a maneira <strong>de</strong> os indivíduos se organizarem<br />

para buscar melhores condições sociais e econômicas e, conseqüentemente, melhor<br />

qualida<strong>de</strong> ambiental para a socieda<strong>de</strong>. Com o objetivo <strong>de</strong> estudar tal relação e <strong>de</strong><br />

apontar alternativas para o <strong>de</strong>senvolvimento e ampliação <strong>de</strong>sta possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> trabalho<br />

é que se realizou a presente pesquisa: uma investigação sobre a semântica <strong>do</strong> lixo e a<br />

ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>r na cida<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>Rio</strong> <strong>de</strong> Janeiro. Até o momento, constatou-se que a<br />

semântica <strong>do</strong> lixo ten<strong>de</strong> a afetar a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res, que acabam por não se<br />

organizar e se envolver diretamente em questões relativas à gestão e organização <strong>do</strong><br />

trabalho, relegan<strong>do</strong> essa ação a terceiros, que julgam mais aptos. Esta falta <strong>de</strong> capital<br />

social não só ten<strong>de</strong> a reduzir o estímulo à reciclagem pelas classes mais ricas, que acaba<br />

por empurrá-la para os grupos excluí<strong>do</strong>s, assim como inibe uma ação pró-ativa <strong>de</strong><br />

transformação da catação em projeto <strong>de</strong> inserção social.<br />

Introdução<br />

O presente trabalho é um esforço para compreen<strong>de</strong>r a relação entre<br />

<strong>de</strong>senvolvimento sócio-econômico, formação <strong>de</strong> capital social, trabalho, cultura e<br />

significa<strong>do</strong> em organizações com ativida<strong>de</strong>s ligadas à gestão <strong>de</strong> resíduos, usan<strong>do</strong> o caso<br />

das cooperativas <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res. É sabi<strong>do</strong> que questões relativas à promoção <strong>do</strong><br />

<strong>de</strong>senvolvimento econômico com melhorias ambientais e sociais são muitas e <strong>de</strong><br />

enorme complexida<strong>de</strong>. Historicamente, a administração e a economia têm busca<strong>do</strong>,<br />

através <strong>de</strong> abordagens racionais e instrumentais, compreen<strong>de</strong>r a lógica e a dinâmica<br />

<strong>de</strong>ste processo. Atualmente, questões como cultura e instituições têm cada vez mais<br />

ocupa<strong>do</strong> lugar <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque nesses <strong>de</strong>bates (Putnam, 1996; Barbosa, 1999). Falta, no<br />

entanto, enten<strong>de</strong>r <strong>de</strong> maneira empírica como estas questões se relacionam com aspectos<br />

<strong>de</strong> gestão <strong>de</strong> organizações, <strong>de</strong>senvolvimento econômico e social e gestão ambiental.<br />

Tentaremos, aqui, estabelecer algumas relações sobre estas questões a partir <strong>do</strong><br />

estu<strong>do</strong> <strong>de</strong> caso das cooperativas <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res <strong>de</strong> material reciclável da cida<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>Rio</strong> <strong>de</strong><br />

Janeiro, procuran<strong>do</strong> compreen<strong>de</strong>r a relação entre, por um la<strong>do</strong>, a gestão <strong>de</strong> organizações<br />

e, por outro, o significa<strong>do</strong> e a forma como as pessoas se relacionam com a reciclagem e<br />

a imagem <strong>do</strong> cata<strong>do</strong>r. Ao falarmos <strong>de</strong> imagem aqui estamos nos referin<strong>do</strong> a <strong>do</strong>is<br />

processos mutuamente <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes: a imagem social <strong>do</strong> lixo e da ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />

reciclagem e a forma como esta imagem relaciona-se ao trabalho <strong>de</strong> catação e é<br />

apropriada pelos cata<strong>do</strong>res na constituição da sua i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> profissional e autoimagem.<br />

Mediante observação preliminar, através <strong>de</strong> uma pesquisa exploratória baseada em<br />

observação participante e entrevistas semi-estruturadas, percebemos que parte das<br />

adversida<strong>de</strong>s <strong>do</strong> trabalho <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res é <strong>de</strong>vida à dificulda<strong>de</strong> da sua organização em<br />

cooperativas, à falta <strong>de</strong> confiança entre eles, ao significa<strong>do</strong> <strong>do</strong> lixo e <strong>de</strong> como este<br />

1


significa<strong>do</strong> é transferi<strong>do</strong> para o cata<strong>do</strong>r. Estas dificulda<strong>de</strong>s impe<strong>de</strong>m que outras sejam<br />

resolvidas, como a melhora na gestão, o acúmulo <strong>de</strong> recursos que permitam<br />

reinvestimento e expansão das áreas <strong>de</strong> armazenamento, e a criação <strong>de</strong> estratégias <strong>de</strong><br />

logística reversa, que levem o lixo <strong>de</strong> volta ao ciclo <strong>de</strong> produção <strong>de</strong> forma<br />

economicamente viável.<br />

1) Desenvolvimento, Cultura e <strong>Lixo</strong><br />

A existência <strong>de</strong> uma inter-relação entre natureza das instituições, cultura e<br />

capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> geração <strong>de</strong> riquezas em uma socieda<strong>de</strong> não é novida<strong>de</strong>: Adam Smith<br />

(1985), já reconhecia a interação entre o processo <strong>de</strong> enriquecimento e as mudanças<br />

políticas e sociais; David Ricar<strong>do</strong> (1982), por sua vez, apontava para a importância <strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>senvolver nos trabalha<strong>do</strong>res um gosto pelo conforto e pelo luxo como forma <strong>de</strong><br />

incentivo; já Malthus acreditava que aumentos <strong>de</strong> salário e educação pública <strong>de</strong><br />

qualida<strong>de</strong> levariam à redução das taxas <strong>de</strong> natalida<strong>de</strong>, diminuin<strong>do</strong>, assim, a pressão pela<br />

produção <strong>de</strong> alimentos. Muitos autores contemporân<strong>eo</strong>s remetem tal discussão à<br />

natureza das instituições <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong>, especialmente ao impacto das instituições<br />

no funcionamento da economia (North, 1990; Alford apud Powel e Dimaggio, 1991).<br />

Ao propor uma alternativa às análises, pesadamente marcadas pelo exemplo<br />

histórico oci<strong>de</strong>ntal, Sen (1999) procura associar a noção <strong>de</strong> liberda<strong>de</strong> à <strong>de</strong> busca <strong>de</strong><br />

recursos materiais e políticos, e, ao fazê-lo, parece reconhecer que o ser humano existe<br />

imerso em teias <strong>de</strong> relações sociais não contratuais. Estes autor parece compreen<strong>de</strong>r as<br />

pessoas como construídas socialmente por diferentes lógicas culturais, presas a<br />

circunstâncias das quais não <strong>de</strong>sejam necessariamente livrar-se, mas sobre as quais<br />

precisam influir positivamente. Neste senti<strong>do</strong>, ter po<strong>de</strong>r é ter acesso a recursos materiais<br />

e políticos (Gid<strong>de</strong>ns et. al., 1995) que permitam ao sujeito renegociar, constantemente,<br />

suas formas <strong>de</strong> inserção e seus limites <strong>de</strong> restrição aos direitos que a vida coletiva<br />

impõe.<br />

Uma das maiores dificulda<strong>de</strong>s das camadas mais pobres em países como o Brasil<br />

é, precisamente, a inclusão em organizações que dêem acesso a tais recursos materiais e<br />

políticos. Precisamos refletir, no entanto, se inclusão social é, ou precisa ser, construída<br />

a partir <strong>do</strong> emprego formal, em empresas já estabelecidas, ou se haveria outras<br />

alternativas <strong>de</strong> pertencimento, como as cooperativas <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res. Mas isso não<br />

significa, necessariamente, emprego (Castel, 1998) e talvez nem mesmo proprieda<strong>de</strong>.<br />

Pensar a questão da cultura em relação ao <strong>de</strong>senvolvimento econômico <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>, em<br />

larga medida, da capacida<strong>de</strong> <strong>de</strong> relacionar a lógica da ação social à lógica <strong>de</strong> produção<br />

<strong>de</strong> riquezas econômicas, ou a construção <strong>de</strong> re<strong>de</strong>s sociais <strong>de</strong> proteção para o sujeito. A<br />

relação entre <strong>de</strong>senvolvimento econômico e cultura foi estabelecida, originalmente, por<br />

Max Weber (1997), através <strong>de</strong> uma relação entre a lógica da imanência, o<br />

individualismo, e a motivação para o trabalho e a poupança como alguns <strong>do</strong>s pilares<br />

para que uma socieda<strong>de</strong> se <strong>de</strong>senvolva no capitalismo. Propõe este autor que olhemos<br />

para os seres humanos como animais teci<strong>do</strong>s em teias <strong>de</strong> significa<strong>do</strong>s que eles mesmos<br />

teceram (Geertz, 1989).<br />

Estu<strong>do</strong>s das socieda<strong>de</strong>s contemporâneas mostram que as instituições estão<br />

ancoradas em processos simbólicos profun<strong>do</strong>s, e que <strong>de</strong>les <strong>de</strong>rivam a sua lógica<br />

estrutural (Lipovetsky, 1987; McCracken, 1990; Slater, 1997; Miller, 1998; Douglas,<br />

1998; Slater e Tonkiss, 2001). Várias questões, que vão <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a construção social da<br />

i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> estratégias narrativas <strong>do</strong> eu até a construção <strong>de</strong> laços <strong>de</strong> sociabilida<strong>de</strong> e<br />

estratégias <strong>de</strong> competição social, são construídas por esta lógica simbólica. A cultura<br />

material também é or<strong>de</strong>nada por este processo simbólico.<br />

2


A forma como nos relacionamos com o mun<strong>do</strong> material é carrega<strong>do</strong> <strong>de</strong><br />

significa<strong>do</strong>s. Estes significa<strong>do</strong>s estão, por sua vez, relaciona<strong>do</strong>s à forma como os<br />

objetos são inseri<strong>do</strong>s nas relações sociais. A dificulda<strong>de</strong> que as correntes <strong>de</strong> pensamento<br />

liberais têm com esta questão refere-se ao fato <strong>de</strong>, nestas, o ser humano ser percebi<strong>do</strong><br />

como sen<strong>do</strong> composto, apenas, por uma realida<strong>de</strong> psíquica e outra moral (Slater, 1997;<br />

Parekh, 2000), percepção esta que impe<strong>de</strong> que se compreenda a<strong>de</strong>quadamente o ser<br />

humano como um ser social e <strong>de</strong> cultura, e, portanto, traspassa<strong>do</strong> pelos significa<strong>do</strong>s<br />

sociais em sua percepção <strong>de</strong> mun<strong>do</strong>.<br />

O entendimento <strong>de</strong>sta relação é fundamental para que se perceba como o<br />

significa<strong>do</strong> social <strong>do</strong> lixo po<strong>de</strong> afetar os processos <strong>de</strong> formação da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, e a<br />

motivação <strong>do</strong>s sujeitos para lidarem com ele. Observações preliminares apontam para o<br />

fato da reciclagem ser percebida socialmente como uma ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong>gradante, e estar,<br />

por esta razão, restrita às pessoas <strong>de</strong> mais baixa renda, que a executam como forma <strong>de</strong><br />

complementação <strong>de</strong> rendimentos (Engenher, 2003).<br />

As conseqüências disto são duas: um não envolvimento com a reciclagem <strong>de</strong><br />

forma direta, por parte das classes mais ricas, produtoras <strong>de</strong> lixo mais nobre, o que piora<br />

a qualida<strong>de</strong> <strong>do</strong> lixo produzi<strong>do</strong> (pela contaminação <strong>do</strong>s resíduos mistura<strong>do</strong>s na fonte); e<br />

uma imagem social negativa <strong>do</strong> lixo, que “transborda” para o trabalho <strong>de</strong> catação,<br />

associan<strong>do</strong> este à idéia <strong>de</strong> nojo e <strong>de</strong>gradação social. Uma vez “contaminada”<br />

simbolicamente a imagem <strong>do</strong> trabalho <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>r, esta afeta negativamente a formação<br />

<strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> profissional e a conseqüente constituição <strong>de</strong> subjetivida<strong>de</strong>s pró-ativas<br />

por parte <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s nesta tarefa. Construir carreira ou inserção social através da<br />

catação não é percebi<strong>do</strong> como um projeto <strong>de</strong> vida pela maioria <strong>do</strong>s envolvi<strong>do</strong>s neste<br />

trabalho, dificultan<strong>do</strong> a organização viável <strong>de</strong> cooperativas (Gonçalves, 2003).<br />

Para estes agentes, a inserção social e o sucesso profissional não se dão através da<br />

catação, mas da capacida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s sujeitos <strong>de</strong> encontrarem outras ativida<strong>de</strong>s econômicas.<br />

Isto impe<strong>de</strong> tanto os cata<strong>do</strong>res <strong>de</strong> se beneficiarem, como po<strong>de</strong>riam, das oportunida<strong>de</strong>s<br />

econômicas da reciclagem bem como o sucesso da gestão das cooperativas. Há,<br />

portanto, nos parece, uma relação entre o significa<strong>do</strong> social <strong>do</strong> lixo e a não utilização<br />

plena <strong>do</strong> potencial neste setor.<br />

Tentaremos <strong>de</strong>monstrar, <strong>de</strong> forma exploratória, neste artigo, que o significa<strong>do</strong><br />

social <strong>do</strong> lixo afeta a forma como os sujeitos relacionam-se economicamente com ele.<br />

Acreditamos que uma atribuição <strong>de</strong> novos significa<strong>do</strong>s ao lixo teria efeitos positivos<br />

tanto para o meio ambiente quanto para a geração <strong>de</strong> emprego e renda. Isto se daria pela<br />

construção <strong>de</strong> capital social nas cooperativas <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res através da melhoria <strong>de</strong> autoestima<br />

<strong>do</strong>s coopera<strong>do</strong>s e criação <strong>de</strong> um ambiente <strong>de</strong> confiança entre eles. A associação<br />

da reciclagem e da coleta com o meio ambiente e a ação cidadã em amplas campanhas<br />

educacionais po<strong>de</strong>m ser a fonte <strong>de</strong>stes novos significa<strong>do</strong>s sociais positivos, incluin<strong>do</strong> o<br />

cata<strong>do</strong>r não apenas econômica, mas, fundamentalmente, social e simbolicamente.<br />

2) Uma Breve Perspectiva Histórica <strong>do</strong> <strong>Lixo</strong> e da Catação:<br />

A ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>r <strong>de</strong> material reciclável no Brasil apesar <strong>de</strong> existir há mais <strong>de</strong><br />

50 anos, só na última década é que vem ganhan<strong>do</strong> <strong>de</strong>staque. Embora tenha sempre si<strong>do</strong><br />

realizada informalmente, tal como a <strong>de</strong> ven<strong>de</strong><strong>do</strong>r ambulante, recentemente os cata<strong>do</strong>res<br />

começam a se organizar, seja na formação <strong>de</strong> cooperativas, seja na luta para o<br />

reconhecimento <strong>de</strong>sta ativida<strong>de</strong> como profissão (Cata<strong>do</strong>res <strong>de</strong> Vida, 2002). Chama a<br />

atenção, no entanto, o fato <strong>de</strong>ste movimento <strong>de</strong> organização não partir <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res, ou<br />

<strong>do</strong>s diretamente interessa<strong>do</strong>s na ativida<strong>de</strong> econômica da catação, mas da ação da própria<br />

COMLURB (Companhia Municipal <strong>de</strong> Limpeza Urbana), no caso da cida<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>Rio</strong> <strong>de</strong><br />

3


Janeiro e <strong>de</strong> ONGs (organizações não governamentais), como o IBISS (Instituto<br />

Brasileiro <strong>de</strong> Inovações em Saú<strong>de</strong> Social) e a Caritas, que procuram dar apoio seja<br />

mediante a tentativa <strong>de</strong> organização <strong>de</strong>sses cata<strong>do</strong>res, seja auxilian<strong>do</strong> na reforma <strong>de</strong><br />

instalações, seja dan<strong>do</strong> suporte em relação à saú<strong>de</strong> e prevenção.<br />

Porém, <strong>de</strong>staca-se nesse processo <strong>de</strong> consolidação das cooperativas a dificulda<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong>stas se tornarem viáveis economicamente, auto-sustentáveis e auto-geridas. Existe<br />

uma tendência permanente <strong>de</strong> receberem apoio das organizações supra citadas ou <strong>de</strong><br />

serem <strong>do</strong>minadas ora por um grupo específico <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res, ora por sucateiros e<br />

atravessa<strong>do</strong>res em geral.<br />

Embora o lixo fosse uma questão pr<strong>eo</strong>cupante <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a Ida<strong>de</strong> Média, segun<strong>do</strong><br />

Rodrigues (1995), a primeira vez em que se ouviu falar <strong>de</strong> “expulsão” <strong>de</strong>ste <strong>do</strong>s centros<br />

urbanos data <strong>de</strong> 1779 - caracteriza<strong>do</strong> por ser ainda praticamente orgânico. Somente no<br />

século XIX que o trabalho como “lixeiro” surge na França, mas é só em 1846 que o lixo<br />

passou a ser consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> como algo que <strong>de</strong>mandasse orçamento e cuida<strong>do</strong>s próprios.<br />

Apesar <strong>de</strong> haver regulamentações a respeito <strong>do</strong> lixo muito antes <strong>do</strong> século XIX,<br />

conforme Lewis (apud Burke, 2001), somente com o aumento da <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong><br />

populacional que ele começa a ser leva<strong>do</strong> mais a sério. Assim, o lixo foi sen<strong>do</strong> afasta<strong>do</strong><br />

<strong>do</strong>s gran<strong>de</strong>s centros concomitante às ativida<strong>de</strong>s consi<strong>de</strong>radas sujas e rui<strong>do</strong>sas, tal como<br />

açougueiros e ferreiros, <strong>de</strong>ntre outros (I<strong>de</strong>m).<br />

É com a Revolução Industrial que o lixo <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser produzi<strong>do</strong> em pequena<br />

quantida<strong>de</strong> pelas famílias (como as sobras <strong>de</strong> alimentos) e seu acúmulo começa a gerar<br />

uma gran<strong>de</strong> soma <strong>de</strong> resíduos nas áreas urbanas. Neste momento instaura-se a “era <strong>do</strong>s<br />

<strong>de</strong>scartáveis”, em que a produção <strong>de</strong> <strong>de</strong>jetos vai se dar com tamanha rapi<strong>de</strong>z, levan<strong>do</strong> a<br />

uma escassez <strong>de</strong> locais para o seu armazenamento. A era <strong>do</strong>s <strong>de</strong>scartáveis marca o início<br />

da produção <strong>de</strong> lixo inorgânico, proveniente da produção <strong>de</strong> objetos <strong>de</strong> consumo em<br />

larga escala e <strong>do</strong> aumento da <strong>de</strong>nsida<strong>de</strong> populacional (Rodrigues e Gravinatto, 2002).<br />

Apesar da reciclagem, ou reaproveitamento, ter surgi<strong>do</strong> como resposta<br />

economicamente viável ao problema <strong>do</strong> lixo acumula<strong>do</strong> (principalmente embalagens),<br />

tal prática não é recente. Ela já havia si<strong>do</strong> implantada por empresários no século XVIII<br />

em Roma, que lucravam não só ao garantirem a limpeza das ruas, como também ao<br />

ven<strong>de</strong>rem os <strong>de</strong>jetos humanos e animais como adubo (Burke, 2001).<br />

A ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>r tem permiti<strong>do</strong> que uma consi<strong>de</strong>rável parcela da população<br />

brasileira se veja inserida no merca<strong>do</strong>, mesmo que ainda informalmente(1). No Brasil,<br />

segun<strong>do</strong> Freire (2002), um terço <strong>do</strong>s mora<strong>do</strong>res <strong>de</strong> rua <strong>de</strong> São Paulo sobrevivem da<br />

catação. O CEMPRE (Boletim <strong>do</strong> Cempre, 2000) estima que cerca <strong>de</strong> 150 mil pessoas<br />

no Brasil sobrevivam da catação <strong>de</strong> latas <strong>de</strong> alumínio e um tanto ainda maior da <strong>de</strong><br />

papel e papelão, com rendimentos que po<strong>de</strong>m chegar a 978,00 por mês. Da<strong>do</strong>s <strong>do</strong> I<strong>de</strong>c<br />

(I<strong>de</strong>c em Ação, 2003) dão conta <strong>de</strong> que no Brasil são recolhi<strong>do</strong>s cerca <strong>de</strong> 230 mil<br />

toneladas diárias <strong>de</strong> lixo urbano. Na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo a quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> lixo produzida<br />

chega a cerca <strong>de</strong> 15 mil toneladas diárias, em que 73% provém <strong>de</strong> residências –<br />

varian<strong>do</strong> <strong>de</strong> 800 gramas a 1,3 quilo por pessoa, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a classe social, chegan<strong>do</strong><br />

a 2 quilos no caso das classes mais altas. Desse montante produzi<strong>do</strong>, meta<strong>de</strong> trata-se <strong>de</strong><br />

lixo orgânico, sen<strong>do</strong> que o restante é quase praticamente composto <strong>de</strong> materiais<br />

recicláveis (I<strong>de</strong>m).<br />

Poucos são, entretanto, os municípios brasileiros que possuem um programa <strong>de</strong><br />

coleta seletiva. São Paulo é o esta<strong>do</strong> com maior número <strong>de</strong> programas <strong>de</strong> coleta seletiva<br />

(n=57), segui<strong>do</strong> pelo <strong>Rio</strong> Gran<strong>de</strong> <strong>do</strong> Sul (n=42), Santa Catarina (n=22), Minas Gerais e<br />

Paraná (n=18) e o <strong>Rio</strong> <strong>de</strong> Janeiro (n=9). Sen<strong>do</strong> o Brasil um país composto <strong>de</strong> 5.561<br />

municípios, percebe-se que somente 3,5% <strong>de</strong>sse universo possui programas <strong>de</strong> coleta<br />

seletiva (I<strong>de</strong>c em Ação, 2003).<br />

4


Na cida<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>Rio</strong> <strong>de</strong> Janeiro há cerca <strong>de</strong> 430 pequenos e médios produtores <strong>de</strong><br />

recicla<strong>do</strong>s (cooperativas, pequenos <strong>de</strong>pósitos e sucateiros), 12 gran<strong>de</strong>s intermediários<br />

que compram recicla<strong>do</strong>s e cerca <strong>de</strong> 18 indústrias. Há também três usinas: a <strong>de</strong><br />

Gramacho; a <strong>de</strong> Irajá e a <strong>do</strong> Caju. Pesquisa realizada quan<strong>do</strong> <strong>do</strong> início <strong>do</strong> programa das<br />

cooperativas <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res avaliou que existe cerca <strong>de</strong> 10 mil pessoas viven<strong>do</strong> entre o<br />

lixão e a rua no <strong>Rio</strong> <strong>de</strong> Janeiro. Em contrapartida, haveria cerca <strong>de</strong> 2.500 pessoas<br />

organizadas em cooperativas, sen<strong>do</strong> que, por tipos, ou áreas <strong>de</strong> trabalho, os cata<strong>do</strong>res<br />

estariam assim distribuí<strong>do</strong>s: Cooperativas (46%); Aterros (40%); Usinas (14%) (Brito,<br />

2001). Levantamento realiza<strong>do</strong> em <strong>de</strong>zembro <strong>de</strong> 2000 mostra que o ganho <strong>de</strong><br />

produtivida<strong>de</strong> por cata<strong>do</strong>r, em todas as cooperativas, varia <strong>de</strong> R$312,00 a R$4.999,00.<br />

Sen<strong>do</strong> que o salário <strong>do</strong>s enfarda<strong>do</strong>res é fixo: <strong>de</strong> R$ 670,00 a R$ 700,00, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com<br />

a pessoa e o local <strong>de</strong> trabalho (I<strong>de</strong>m).<br />

Em suma, a ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> catação <strong>de</strong> recicláveis e reutilizáveis já tem uma longa<br />

história em vários países e também po<strong>de</strong> ser uma fonte importante <strong>de</strong> renda. Enten<strong>de</strong>r<br />

como viabilizar organizações <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res que sejam economicamente viáveis,<br />

socialmente justas e auto-gestionáveis ajudaria a apoiar mais efetivamente estas<br />

organizações contribuin<strong>do</strong> para o <strong>de</strong>senvolvimento sócio-econômico e a melhoria da<br />

qualida<strong>de</strong> ambiental.<br />

3) Meto<strong>do</strong>logia<br />

O méto<strong>do</strong> emprega<strong>do</strong> na pesquisa <strong>de</strong> campo foi o etnográfico, basea<strong>do</strong> em<br />

observação não participante, complementa<strong>do</strong> por entrevistas em profundida<strong>de</strong> e<br />

questionários semi-estrutura<strong>do</strong>s. A observação direta foi realizada na Cooperativa <strong>de</strong><br />

Cata<strong>do</strong>res da Zona Sul (Coopersul), por um perío<strong>do</strong> <strong>de</strong> <strong>do</strong>is meses (<strong>de</strong> junho a agosto <strong>de</strong><br />

2002). O objetivo geral foi a compreensão das categorias <strong>do</strong>s próprios sujeitos a respeito<br />

das suas práticas. Os comportamentos observa<strong>do</strong>s foram sistematicamente anota<strong>do</strong>s,<br />

assim como trechos <strong>de</strong> diálogos que relacionavam-se com o interesse da pesquisa. Os<br />

da<strong>do</strong>s foram categoriza<strong>do</strong>s e trata<strong>do</strong>s qualitativamente, através <strong>de</strong> uma perspectiva<br />

semiótica, em um esforço interpretativo, para compreen<strong>de</strong>r as conotações em seu<br />

contexto simbólico (ver Eco, 1976 e 1997; Geertz, 1989). Concomitante a esta<br />

observação também foram realizadas entrevistas em profundida<strong>de</strong> com pessoal direta ou<br />

indiretamente envolvi<strong>do</strong> nesta tarefa, com o objetivo <strong>de</strong> ampliar o entendimento das<br />

categorias <strong>de</strong> percepção e <strong>do</strong>s comportamentos observa<strong>do</strong>s a partir da perspectiva <strong>do</strong>s<br />

informantes seleciona<strong>do</strong>s.<br />

As entrevistas em profundida<strong>de</strong> foram realizadas junto a alguns cata<strong>do</strong>res (n=3);<br />

além <strong>de</strong> pessoal liga<strong>do</strong> à área administrativa da cooperativa em questão (n=1); à<br />

COMLURB (n=5) e a uma ONG <strong>de</strong> suporte aos cata<strong>do</strong>res (n=2). O propósito <strong>de</strong> tais<br />

entrevistas foi o <strong>de</strong> ampliar o entendimento das categorias <strong>de</strong> percepção e <strong>do</strong>s<br />

comportamentos anota<strong>do</strong>s a partir da perspectiva <strong>do</strong>s informantes seleciona<strong>do</strong>s. Além<br />

<strong>de</strong>stas, foram realizadas também entrevistas semi-estruturadas (n=17), neste caso,<br />

somente em alguns cata<strong>do</strong>res daquele núcl<strong>eo</strong>. Como o objetivo da pesquisa foi<br />

compreen<strong>de</strong>r os significa<strong>do</strong>s atribuí<strong>do</strong>s ao trabalho, méto<strong>do</strong>s qualitativos foram<br />

preferi<strong>do</strong>s, uma vez que os quantitativos não produzem o entendimento espera<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />

fenômeno. Como o méto<strong>do</strong> etnográfico é indutivo, a sua valida<strong>de</strong> é direta, na medida<br />

em que não se propõe a comprovar hipóteses e sim compreen<strong>de</strong>r e interpretar a<br />

realida<strong>de</strong> observada<br />

4) Resulta<strong>do</strong>s: A Dinâmica <strong>de</strong> <strong>Trabalho</strong>, a Rotina <strong>do</strong>s Cata<strong>do</strong>res e o Significa<strong>do</strong><br />

Social <strong>do</strong> <strong>Lixo</strong><br />

5


4.1. Organização das Cooperativas:<br />

Para facilitar a organização das cooperativas, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a permitir uma maior<br />

autonomia e condição <strong>de</strong> trabalho por parte <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res, a Prefeitura da cida<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>Rio</strong><br />

<strong>de</strong> Janeiro apoiou a formação <strong>do</strong> Programa <strong>de</strong> Cooperativas <strong>de</strong> Cata<strong>do</strong>res, pela<br />

COMLURB no final <strong>de</strong> 1993, ce<strong>de</strong>n<strong>do</strong> além <strong>do</strong> espaço, sob forma <strong>de</strong> comodato(3) com<br />

prazo <strong>de</strong> <strong>do</strong>is anos renováveis, instalação elétrica, sanitários feminino e masculino,<br />

refeitório e uma sala para escritório(4). Quanto aos equipamentos, necessários para o<br />

processo <strong>de</strong> armazenamento (prensa, balança etc.), estes até o momento têm si<strong>do</strong><br />

forneci<strong>do</strong>s pelos intermediários ou responsáveis pela compra <strong>do</strong> material, ou sucateiros.<br />

O propósito da formação <strong>de</strong> cooperativas é o <strong>de</strong> permitir que, ao material coleta<strong>do</strong><br />

pelos cata<strong>do</strong>res, seja agrega<strong>do</strong> um valor, mediante o acúmulo, o que torna o transporte<br />

economicamente viável. A escala é um elemento fundamental <strong>de</strong> viabilização e as<br />

cooperativas mais organizadas progri<strong>de</strong>m na direção <strong>de</strong> tornarem-se pontos <strong>de</strong> recepção<br />

<strong>do</strong> material coleta<strong>do</strong> tanto por cooperativa<strong>do</strong>s quanto por não cooperativa<strong>do</strong>s. Embora a<br />

COMLURB forneça a infra-estrutura básica e o apoio técnico na organização das<br />

cooperativas, ela não interfere nas questões relativas à gestão interna.<br />

Para que um cata<strong>do</strong>r se torne um cooperativa<strong>do</strong> ele <strong>de</strong>ve aceitar as normas e os<br />

princípios da cooperativa, que seriam: a<strong>de</strong>são voluntária e livre; gestão <strong>de</strong>mocrática;<br />

participação econômica <strong>do</strong>s membros; autonomia e in<strong>de</strong>pendência; educação, formação<br />

e informação; intercooperação (5); e interesse pela comunida<strong>de</strong> (Brito, 2001).<br />

Na primeira fase <strong>do</strong>s esforços <strong>de</strong> implementação <strong>de</strong>stas cooperativas e como parte<br />

<strong>do</strong> empenho para fazer com que <strong>de</strong>colassem, houve um excesso <strong>de</strong> centralização e<br />

controle por parte da COMLURB que parece ter si<strong>do</strong> a causa <strong>do</strong> afastamento <strong>de</strong> muitos<br />

cata<strong>do</strong>res <strong>de</strong>ste projeto. O reconhecimento da ameaça <strong>de</strong>sta forma <strong>de</strong> gestão inicial<br />

levou a COMLURB a redirecionar a gestão <strong>do</strong> programa com a divisão por áreas e<br />

criação <strong>de</strong> núcl<strong>eo</strong>s autônomos, que no entanto vêm apresenta<strong>do</strong> dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />

autogestão. Cada área ficou sob responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> uma li<strong>de</strong>rança específica, o que<br />

provavelmente vem dificultan<strong>do</strong> o aprimoramento <strong>do</strong> mo<strong>de</strong>lo bem como a comparação<br />

entre os vários núcl<strong>eo</strong>s. O resulta<strong>do</strong> é que o número <strong>de</strong> coopera<strong>do</strong>s varia muito <strong>de</strong><br />

acor<strong>do</strong> com a região, fruto das características idiossincráticas das li<strong>de</strong>ranças locais.<br />

No que diz respeito à forma <strong>de</strong> organização, a cooperativa <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res trata-se <strong>de</strong><br />

um projeto que se preten<strong>de</strong> auto-sustentável. Entretanto, nesse processo <strong>de</strong> consolidação<br />

ela ainda necessita conquistar autonomia como a criação <strong>de</strong> centrais para recebimento<br />

<strong>do</strong>s materiais recicláveis e um trabalho <strong>de</strong> estímulo à população <strong>de</strong>dicada a esta tarefa.<br />

“Hoje você vê uma média <strong>de</strong> 480 cata<strong>do</strong>res na rua, catan<strong>do</strong> papel. Setenta a<br />

80% <strong>de</strong>les já passaram por cooperativas e não querem voltar. Porque antes <strong>de</strong><br />

entrar para uma cooperativa, ele tirava, vamos supor, em média 150,00 por<br />

semana, <strong>de</strong>pois (...) começou a tirar 50,00 ou 60,00. Via que não tinha<br />

vantagem. (...) a COMLURB tem um controle <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o lixo urbano (...) <strong>de</strong>s<strong>de</strong><br />

o momento que sai da tua casa ou prédio comercial. Então o cata<strong>do</strong>r tá junto<br />

com a COMLURB (...) e <strong>de</strong> repente não tá cadastra<strong>do</strong> hoje numa cooperativa<br />

não porque é difícil, é porque não quer.” (ex-cata<strong>do</strong>r)<br />

As cooperativas foram divididas, então, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a localização g<strong>eo</strong>gráfica da<br />

cida<strong>de</strong> em: Cooperativas (Sul, Norte, Centro, Zona Oeste, Vargem Pequena, Gramacho,<br />

etc.) ou áreas <strong>de</strong> planejamento (AP-1, AP-2, AP-3, AP-4 e AP-5 respectivamente). Com<br />

esta divisão, cada área <strong>de</strong> planejamento ficou sob responsabilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um lí<strong>de</strong>r local,<br />

consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> pelos seus pares como o mais apto ou responsável <strong>de</strong>ntre os <strong>de</strong>mais. O lí<strong>de</strong>r<br />

é também o representante <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res junto ao Conselho <strong>de</strong> Administração e Fiscal da<br />

6


cooperativa. Uma vez distribuídas por áreas <strong>de</strong> planejamento estas cooperativas foram<br />

subdivididas em núcl<strong>eo</strong>s que se localizam em diferentes bairros da cida<strong>de</strong>, os quais são<br />

administra<strong>do</strong>s por um responsável, seja ele um ex cata<strong>do</strong>r ou pessoa <strong>de</strong> confiança <strong>do</strong><br />

lí<strong>de</strong>r regional. Estas cooperativas pagam to<strong>do</strong>s os tributos exigi<strong>do</strong>s e são 100%<br />

legalizadas, com alvará da prefeitura, CNPJ (Cadastro Nacional <strong>de</strong> Pessoa Jurídica),<br />

Inscrição Municipal e Estadual, Corpo <strong>de</strong> Bombeiro, Junta Comercial e OCERJ<br />

(Organização das Cooperativas <strong>do</strong> Esta<strong>do</strong> <strong>do</strong> <strong>Rio</strong> <strong>de</strong> Janeiro) (Brito, 2001).<br />

4.2. Grupos <strong>de</strong> Cata<strong>do</strong>res Envolvi<strong>do</strong>s:<br />

Encontramos <strong>do</strong>is grupos <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res: os coopera<strong>do</strong>s, i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong>s pelo fato <strong>de</strong><br />

usarem uniforme ver<strong>de</strong>, que se divi<strong>de</strong>m entre enfarda<strong>do</strong>res e cata<strong>do</strong>res, e os não<br />

coopera<strong>do</strong>s. Na cooperativa em que a etnografia foi realizada, o enfarda<strong>do</strong>r trabalha no<br />

interior da cooperativa compactan<strong>do</strong> o material recolhi<strong>do</strong> pelos cata<strong>do</strong>res e chega a<br />

produzir cerca <strong>de</strong> <strong>de</strong>z far<strong>do</strong>s diários (seja <strong>de</strong> papel, papelão ou latinhas). Estes far<strong>do</strong>s,<br />

com cerca <strong>de</strong> 300Kg cada, são transporta<strong>do</strong>s e armazena<strong>do</strong>s até serem leva<strong>do</strong>s pelo<br />

caminhão (que recolhe duas vezes por semana) para a pessoa que compra a merca<strong>do</strong>ria.<br />

Entre os cata<strong>do</strong>res coopera<strong>do</strong>s encontram-se <strong>de</strong>s<strong>de</strong> aqueles que trabalham to<strong>do</strong>s os<br />

dias, com o “burro sem rabo” e que costumam dar <strong>de</strong> três a quatro viagens diárias para<br />

pegar material, como aqueles que trabalham apenas quan<strong>do</strong> estão “mais dispostos”.<br />

Entre os não coopera<strong>do</strong>s por sua vez, existem aqueles que costumam trazer material<br />

to<strong>do</strong>s os dias, mas que preferem não se associarem às Cooperativas, e aqueles que<br />

trazem material esporadicamente. Um exemplo típico <strong>de</strong>ste último grupo são os<br />

mora<strong>do</strong>res <strong>de</strong> rua, que apesar <strong>de</strong> representarem uma parcela significativa <strong>do</strong>s<br />

fornece<strong>do</strong>res das Cooperativas, aparecem esporadicamente com algo para ven<strong>de</strong>r (não<br />

muita coisa), geralmente sujos, e quan<strong>do</strong> indaga<strong>do</strong>s não falam muito sobre esta<br />

ativida<strong>de</strong>, outros já dizem não se importarem com o que fazem. Outro grupo<br />

significativo <strong>do</strong>s não coopera<strong>do</strong>s são os mora<strong>do</strong>res da região. Entre estes estão aqueles<br />

que aparecem esporadicamente quan<strong>do</strong> estão in<strong>do</strong> para o trabalho para <strong>de</strong>ixar material<br />

acumula<strong>do</strong> ao longo <strong>de</strong> <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> perío<strong>do</strong>, e aqueles que levam material recolhi<strong>do</strong> em<br />

con<strong>do</strong>mínios ou bares e que, muitas vezes com o objetivo <strong>de</strong> aten<strong>de</strong>r suas necessida<strong>de</strong>s<br />

imediatas. Já os biscateiros(6), aparecem quase toda semana, uns <strong>de</strong> uniforme <strong>de</strong><br />

trabalho, outros bem vesti<strong>do</strong>s, outros não, sen<strong>do</strong> que costumam justificar sua inserção<br />

também nessa ativida<strong>de</strong> como forma <strong>de</strong> complementar a renda familiar. Os cata<strong>do</strong>res<br />

caracterizam-se por possuírem, geralmente, um baixo índice <strong>de</strong> escolarida<strong>de</strong>, sen<strong>do</strong> que<br />

muitos são analfabetos (Adametes, 1999). Na cida<strong>de</strong> <strong>do</strong> <strong>Rio</strong> <strong>de</strong> Janeiro haveria quatro<br />

tipos <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res, segun<strong>do</strong> Brito diretor da COMLURB zona oeste e mentor <strong>do</strong> projeto<br />

da cooperativa <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res(7): Cata<strong>do</strong>r <strong>de</strong> usina ou aterro sanitário(8): pega o lixo,<br />

proveniente da coleta urbana que, por esta razão apresenta-se mistura<strong>do</strong>; Cata<strong>do</strong>r <strong>de</strong><br />

rua ou predatório <strong>de</strong> rua: antecipam-se à coleta <strong>do</strong> caminhão compacta<strong>do</strong>r, rasgam os<br />

sacos <strong>de</strong> lixo a fim <strong>de</strong> pegar o que interessa, <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> o restante espalha<strong>do</strong>; Cata<strong>do</strong>r<br />

(coopera<strong>do</strong> ou não): muitos possuem referência familiar, costumam ser mais<br />

disciplina<strong>do</strong>s e organiza<strong>do</strong>s; Carroceiro - muito comum na zona oeste da cida<strong>de</strong>: além<br />

<strong>de</strong> entregarem material <strong>de</strong> construção, entulho, frete etc. catam recicláveis para ven<strong>de</strong>r.<br />

Além <strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> gestão interna, as cooperativas encontram outros<br />

conjuntos <strong>de</strong> dificulda<strong>de</strong>s que, acreditamos, po<strong>de</strong>m ser solucionadas se a primeira for<br />

revertida. São elas: assaltos constantes; dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> logística reversa, <strong>de</strong> produção <strong>de</strong><br />

capital <strong>de</strong> giro, pois a indústria tem por hábito pagar com fatura <strong>de</strong> 30 dias a 40 dias;<br />

<strong>de</strong>pendência <strong>de</strong> atravessa<strong>do</strong>res, <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> a falta <strong>de</strong> escala; alcoolismo e <strong>de</strong>sagregação<br />

social na qual vive imersa boa parte da população, pois estar coopera<strong>do</strong> não exclui o<br />

7


cata<strong>do</strong>r <strong>de</strong>stes problemas, nem <strong>do</strong> estigma <strong>do</strong>s significa<strong>do</strong>s sociais <strong>de</strong>ste trabalho. A<br />

<strong>de</strong>cisão por filiar-se ou não a uma cooperativa, no entanto, parece <strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r da<br />

confiança na instituição mais <strong>do</strong> que em qualquer outra coisa. Maiores estu<strong>do</strong>s se fazem<br />

necessários para comprovar esta percepção inicial.<br />

A dificulda<strong>de</strong> interna <strong>de</strong> gestão e as questões relativas a confiança dificulta a<br />

possibilida<strong>de</strong> que estes cata<strong>do</strong>res acumulem capital para trabalhar sobre os outros<br />

problemas que impe<strong>de</strong>m uma maior lucrativida<strong>de</strong> das cooperativas. As observações<br />

<strong>de</strong>monstraram que a visão <strong>de</strong> retorno <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res ten<strong>de</strong> a ser <strong>de</strong> curtíssimo prazo e que<br />

muito <strong>do</strong> ritmo <strong>de</strong> trabalho, especialmente <strong>do</strong>s não coopera<strong>do</strong>s, é <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> pelas suas<br />

necessida<strong>de</strong>s imediatas <strong>de</strong> dinheiro. Discutiremos, abaixo, a causa provável <strong>de</strong>ste<br />

comportamento, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> como nossas observações<br />

4.3. Dinâmica <strong>de</strong> <strong>Trabalho</strong>, Organização das Ativida<strong>de</strong>s e Grupos Envolvi<strong>do</strong>s:<br />

O trabalho <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res tem peculiarida<strong>de</strong>s que serão tratadas abaixo para que<br />

se conheça melhor a sua dinâmica. Estas peculiarida<strong>de</strong>s influenciam a forma como os<br />

cata<strong>do</strong>res se organizam para produzir, afetam o retorno que po<strong>de</strong> ser obti<strong>do</strong> pelo<br />

trabalho e as suas estratégias <strong>de</strong> organização e não são in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntes <strong>do</strong>s significa<strong>do</strong>s<br />

<strong>do</strong> lixo e da ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> catação, com exploraremos a seguir.<br />

4.3.1. Distância e a falta <strong>de</strong> residência: a primeira dificulda<strong>de</strong><br />

No núcl<strong>eo</strong> observa<strong>do</strong>, na zona sul, constatou-se que a maioria das pessoas que lá<br />

trabalham moram em local distante (Vigário Geral, Nova Iguaçu, etc.), ao contrário <strong>do</strong><br />

que ocorre na zona oeste, em que as moradias das mesmas seriam próximas aos locais<br />

em que realizam a catação. Uma das justificativas para que pessoas venham <strong>de</strong> tão longe<br />

para catar lixo na zona sul, é o fato <strong>de</strong> haver um consumo intenso por parte da<br />

população local e conseqüente <strong>de</strong>scarte <strong>de</strong> material com eleva<strong>do</strong> índice <strong>de</strong><br />

aproveitamento. Pelo fato <strong>de</strong> virem <strong>de</strong> tão longe muitos preferem pernoitar nos<br />

arre<strong>do</strong>res das cooperativas sob a alegação <strong>de</strong> que per<strong>de</strong>riam muito tempo se retornassem<br />

para casa to<strong>do</strong>s os dias e <strong>de</strong> que o custo da passagem é alto, o que tornaria esta ativida<strong>de</strong><br />

menos rentável.<br />

“É que eu gasto 10,00 pra ir pra minha casa. Eu moro em Miguel Couto [Nova<br />

Iguaçu]. Durmo na rua, antes <strong>do</strong>rmia aqui <strong>de</strong>ntro[da cooperativa], agora durmo<br />

ali fora, <strong>de</strong>baixo <strong>do</strong>s carrinhos. Daqui <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro só eu que durmo ali, mas tem<br />

um monte <strong>de</strong> gente aí fora que faz isso.” (cata<strong>do</strong>r)<br />

Numa segunda-feira este mesmo homem comenta: “Levantei hoje 3 da<br />

madrugada, não durmo direito. Eu sou o primeiro a chegar no ponto <strong>de</strong> ônibus. No<br />

ônibus eu durmo [faz uma careta], mas não durmo direito.” Entretanto, outra razão que<br />

justificaria este hábito é o fato <strong>de</strong> que à noite há um maior <strong>de</strong>scarte <strong>de</strong> papel nas ruas por<br />

parte <strong>do</strong> comércio. Isso faz com que eles tenham <strong>de</strong> permanecer nos arre<strong>do</strong>res a fim <strong>de</strong><br />

se anteciparem ao caminhão da coletora oficial da cida<strong>de</strong> que passa para recolher o lixo.<br />

Depois <strong>de</strong>sta tarefa eles estacionam o “burro sem rabo” (2) nas imediações da<br />

cooperativa até o amanhecer, quan<strong>do</strong> esta é reaberta e o que ele recolheu será pesa<strong>do</strong>.<br />

O fato <strong>de</strong> morarem próximo ou distante da catação po<strong>de</strong>, como conseqüência,<br />

gerar não só cata<strong>do</strong>res com perfis diferencia<strong>do</strong>s como também distintas formas <strong>de</strong><br />

organização e divisão <strong>do</strong> trabalho. Quanto à região oeste, a coleta, por ser <strong>do</strong>miciliar,<br />

leva a que o cata<strong>do</strong>r an<strong>de</strong> mais a fim <strong>de</strong> obter uma quantida<strong>de</strong> vendável <strong>de</strong> material.<br />

8


Cabe salientar que a relação entre volume <strong>de</strong> material e distância <strong>do</strong> local para venda<br />

<strong>de</strong>ve ser feita a fim <strong>de</strong> analisar se os reais ganhos são compensa<strong>do</strong>res.<br />

A produção <strong>do</strong> cata<strong>do</strong>r está atrelada às ativida<strong>de</strong>s locais e tem uma dinâmica<br />

sazonal influenciada pela oscilação <strong>do</strong> consumo da população. Nas épocas <strong>do</strong> ano<br />

marcadas por um comércio mais intenso ocorre um aumento na sua produção e o<br />

inverso nas épocas <strong>de</strong> menor ativida<strong>de</strong> comercial.<br />

4.3.2. Estrutura familiar e disciplina laboral<br />

Segun<strong>do</strong> os entrevista<strong>do</strong>s, os cata<strong>do</strong>res que possuem estrutura familiar são<br />

geralmente mais acessíveis aos projetos propostos pela COMLURB volta<strong>do</strong>s para<br />

implementação das cooperativas, uma vez que costumam ser mais assíduos nesta tarefa<br />

e seguem mais <strong>de</strong> perto as normas estabelecidas.<br />

“Os que têm mais consciência são o pessoal que já tem casa, porque ele tem a<br />

família agregada, ele sabe que tem que dar condições para uma família. (...) O<br />

pessoal que já tem a casa, não fica <strong>do</strong>rmin<strong>do</strong> na cooperativa.” (ex-cata<strong>do</strong>r)<br />

De acor<strong>do</strong> com nossas observações parece haver uma relação íntima entre<br />

organização familiar e referências sociais e a disponibilida<strong>de</strong> subjetiva <strong>do</strong>s sujeitos para<br />

o trabalho mais or<strong>de</strong>na<strong>do</strong> e sistemático. Disciplina e compromisso com a ativida<strong>de</strong> são<br />

fatores fundamentais para o sucesso da organização e <strong>de</strong>terminam a maior<br />

inclusão/exclusão no âmbito das cooperativas e o melhor resulta<strong>do</strong> econômico <strong>de</strong>sta<br />

tarefa. A família parece ser o elemento fundamental motiva<strong>do</strong>r <strong>de</strong>sta disciplina, pois<br />

fornece um significa<strong>do</strong> maior para este trabalho consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong> <strong>de</strong>gradante por boa parte<br />

<strong>do</strong>s entrevista<strong>do</strong>s. A região da zona sul e <strong>do</strong> centro por apresentarem vantagens em<br />

relação aos aterros e zona oeste, atraem cata<strong>do</strong>res dispostos a disputar espaço e enfrentar<br />

as adversida<strong>de</strong>s da vida na rua. Estes cata<strong>do</strong>res, no entanto, segun<strong>do</strong> alguns<br />

Coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>res <strong>do</strong> Programa <strong>de</strong> Cooperativas da COMLURB, em geral não têm família<br />

estruturada e parecem mais propensos ao alcoolismo e à violência.<br />

Segun<strong>do</strong> Dejours (1987), a família seria uma autorida<strong>de</strong> importante no processo<br />

<strong>de</strong> disciplina <strong>do</strong> operário. Um <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res entrevista<strong>do</strong>s alega que a existência <strong>de</strong><br />

“uma família sempre os chama à responsabilida<strong>de</strong>”. Ou seja, da mesma forma que este<br />

cuida para que nada falte em casa, a família se encarrega <strong>de</strong> lhe garantir bem estar. Por<br />

exemplo, muitos, apesar da ativida<strong>de</strong> que exercem, se apresentam calça<strong>do</strong>s, com roupas<br />

limpas, além <strong>de</strong> levarem almoço. O sustento da família aparece para estes como o<br />

significa<strong>do</strong> e a razão maior que os motiva para o trabalho, estan<strong>do</strong> a natureza da<br />

ativida<strong>de</strong> e a sua percepção social subordinada e este valor maior. Já os cata<strong>do</strong>res sem<br />

família relacionariam-se com a catação apenas em seu significa<strong>do</strong> negativo, como única<br />

alternativa <strong>de</strong> sobrevivência, não relacionada a nenhum outro significa<strong>do</strong> maior.<br />

Portanto, os <strong>do</strong>is fatores acima (distância moradia/trabalho e família) fazem com<br />

que muitos cata<strong>do</strong>res tenham um ambiente social pouco a<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>, ou seja, moram na<br />

rua e sem família estruturada, expon<strong>do</strong>-os a várias adversida<strong>de</strong>s, levan<strong>do</strong> a que isto se<br />

reflita no seu ambiente <strong>de</strong> trabalho, dificultan<strong>do</strong> a criação <strong>de</strong> laços <strong>de</strong> confiança para<br />

geração <strong>de</strong> capital social em muitas cooperativas.<br />

4.4. A catação, o lixo e o olhar <strong>do</strong> outro<br />

A<strong>de</strong>mais <strong>do</strong>s fatores estruturais como família e moradia, a maneira como o<br />

cata<strong>do</strong>r percebe sua ativida<strong>de</strong> e posição social afeta suas relações no trabalho. Muito da<br />

9


questão da relação entre o significa<strong>do</strong> <strong>do</strong> seu trabalho, sua auto-imagem e o alcoolismo<br />

foi percebida por ONGs que auxiliam estes grupos. No encontro estadual <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res<br />

<strong>de</strong> São Paulo, em 2001, a ONG Caritas, organiza<strong>do</strong>ra <strong>do</strong> evento, trazia este tema à tona<br />

com freqüência nas discussões, em um esforço constante por aumentar a auto-estima <strong>do</strong><br />

cata<strong>do</strong>r apelan<strong>do</strong> para a idéia <strong>de</strong> que este seria um sujeito humil<strong>de</strong> mas honesto, que<br />

prefere este trabalho ao roubo, ao tráfico e à mendicância. Embora este esforço seja<br />

positivo, ao associar o trabalho na catação à única alternativa <strong>de</strong>stes grupos ao crime ou<br />

à esmola, reforça, sem querer, seu significa<strong>do</strong> <strong>de</strong> miséria e exclusão e, também a autoimagem<br />

<strong>de</strong>stas pessoas como não ten<strong>do</strong> alternativas a não ser viver <strong>do</strong> lixo. O próprio<br />

fato <strong>de</strong> se utilizar a catação como um indica<strong>do</strong>r <strong>de</strong> pobreza <strong>de</strong>nota o tom como o assunto<br />

é trata<strong>do</strong>, inclusive pela mídia (Gaspari, 2003; Coutinho, 2003). Desta forma,<br />

acreditamos que a atribuição <strong>de</strong> novos significa<strong>do</strong>s ao lixo implicaria na valorização <strong>do</strong><br />

trabalho <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res e <strong>de</strong> sua função social, e que esta <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>do</strong> envolvimento<br />

direto <strong>de</strong> diferentes segmentos da socieda<strong>de</strong>.<br />

4.4.1. A catação segun<strong>do</strong> os próprios cata<strong>do</strong>res e seus impactos na ativida<strong>de</strong><br />

Em diversos momentos durante a observação participante e as entrevistas, foi<br />

possível colher da<strong>do</strong>s que permitem afirmar a existência <strong>de</strong> uma relação entre<br />

significa<strong>do</strong> social negativo <strong>de</strong>ste trabalho e ausência <strong>de</strong> uma motivação para realizá-lo<br />

como projeto profissional. Por causa <strong>de</strong>stes significa<strong>do</strong>s negativos, o trabalho na catação<br />

é percebi<strong>do</strong> como temporário e como executa<strong>do</strong> por força das circunstâncias <strong>de</strong> miséria<br />

e exclusão, contribuin<strong>do</strong> para a consolidação <strong>de</strong> atitu<strong>de</strong>s <strong>de</strong> curtíssimo prazo que lhes<br />

roubam a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> aumento significativo <strong>do</strong>s ganhos a médio e longo prazos.<br />

Em alguns casos, no entanto, estes significa<strong>do</strong>s aparecem matiza<strong>do</strong>s e associa<strong>do</strong>s a<br />

outras conotações mais positivas, quan<strong>do</strong> associa<strong>do</strong>s a formas socialmente organizadas<br />

<strong>de</strong> execução, conforme po<strong>de</strong>mos constatar nos dizeres abaixo:<br />

“Eu voltei para esse trabalho, apesar <strong>de</strong> ser um trabalho meio assim...”<br />

‘Assim como?’<br />

“Que trabalha com o lixo.”<br />

‘As pessoas falam? Você já ouviu algo sobre isso?’<br />

“Antigamente, mais <strong>do</strong> que hoje. Agora mu<strong>do</strong>u um pouco com a cooperativa.”<br />

(assistente <strong>de</strong> administra<strong>do</strong>r)<br />

O <strong>de</strong>poimento acima não resume a opinião <strong>de</strong> to<strong>do</strong>s os cata<strong>do</strong>res, mas aponta para<br />

a relação estabelecida com esta tarefa, uma vez que este informante largou o emprego<br />

em uma multinacional para vir trabalhar na cooperativa, por ser mais rentável. No<br />

entanto, o mesmo ao mencionar a palavra multinacional, <strong>de</strong>u impressão ao observa<strong>do</strong>r<br />

<strong>de</strong> que esta possuía um status que a tarefa atual não podia lhe dar. Não foi uma única<br />

vez que o observa<strong>do</strong>r constatou este tipo <strong>de</strong> <strong>de</strong>poimento, porém não po<strong>de</strong>ria extrapolá-lo<br />

para a maioria.<br />

Outro fato que chamou a atenção foi o <strong>de</strong> que as mulheres, que, segun<strong>do</strong> o diretor<br />

da COMLURB zona oeste, representariam cerca <strong>de</strong> 45% <strong>de</strong>sta população, em geral<br />

trazem apenas latinhas.<br />

“Tu não vê uma amiga que traz uma outra amiga, ou um amigo que traz uma<br />

amiga, ela não tá disposta a encarar ‘eu não, catar lixo, quê isso, tá maluco’.<br />

Então, a maior quantida<strong>de</strong> que tá vin<strong>do</strong> é <strong>de</strong> homens, então tá aumentan<strong>do</strong> o<br />

fluxo <strong>de</strong> homens (...) Mas, tu vê muita mulher catan<strong>do</strong>, <strong>de</strong>ntro da cooperativa <strong>do</strong><br />

Castelo o que tem mais é mulher.” (ex-cata<strong>do</strong>r)<br />

10


Os homens em geral diziam-se pessoas que não tinham vergonha <strong>de</strong> <strong>de</strong>sempenhar<br />

aquela ativida<strong>de</strong>, já as mulheres mostravam sentir um certo incômo<strong>do</strong> em relação às<br />

opiniões que ouviam <strong>do</strong>s outros (amigos, familiares) pelo fato <strong>de</strong> lidarem com “lixo”, ou<br />

seja, tomavam <strong>de</strong> empréstimo a fala <strong>do</strong>s outros em vez <strong>de</strong> assumirem um discurso<br />

próprio. A palavra lixo foi grifada, para <strong>de</strong>notar que era o termo mais freqüente <strong>de</strong> ser<br />

ouvi<strong>do</strong> por pessoas que pareciam apresentar dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> falar no assunto. Na opinião<br />

<strong>de</strong> um ex-cata<strong>do</strong>r:<br />

“Eu faço questão <strong>de</strong> falar, em qualquer lugar que eu vá, que eu sou ex-cata<strong>do</strong>r,<br />

ex-mora<strong>do</strong>r <strong>de</strong> rua. (...) Porque, assim, é bom que a pessoa saiba com quem tá<br />

lidan<strong>do</strong> (...) Amanhã ela fica saben<strong>do</strong> que eu sou cata<strong>do</strong>r, que eu fui cata<strong>do</strong>r,<br />

que eu fui mora<strong>do</strong>r <strong>de</strong> rua, (...) que eu fiz isso e aquilo e <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser meu amigo<br />

(...) simplesmente me exclui, enten<strong>de</strong>u?” (ex-cata<strong>do</strong>r)<br />

Vê-se, assim, que o significa<strong>do</strong> positivo <strong>de</strong>sta tarefa é algo ainda por se construir,<br />

apesar <strong>do</strong>s avanços no âmbito <strong>de</strong>ssa profissão(9). Pensar na atribuição <strong>de</strong> outros<br />

significa<strong>do</strong>s ao lixo <strong>de</strong>ve levar em conta a semântica que os mais diversos segmentos<br />

sociais dão a ele. Esta exigência se faz mediante o fato <strong>de</strong> que versões distintas sobre a<br />

catação <strong>de</strong> lixo emerge <strong>de</strong> posições sociais também distintas. Um cata<strong>do</strong>r <strong>de</strong>clara que a<br />

visão que eles têm <strong>de</strong> si <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> muito <strong>de</strong>les próprios:<br />

“Tem uns que se sentem rejeita<strong>do</strong>s, tem outros que não se sentem é o trabalho<br />

<strong>de</strong>les, (...) têm que fazer aquilo! E ele po<strong>de</strong> ter pessoas olhan<strong>do</strong> pra ele <strong>de</strong> mal<br />

jeito, mas ele <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> daquilo. Então ele nunca vai se sentir rejeita<strong>do</strong>. Os que<br />

se sentem rejeita<strong>do</strong>s é porque já é tendência mesmo <strong>de</strong>les.” (ex-cata<strong>do</strong>r)<br />

“O próprio cata<strong>do</strong>r, até mesmo quem já é cata<strong>do</strong>r há muito tempo, tem<br />

vergonha. (...) Geralmente as pessoas <strong>de</strong> on<strong>de</strong> ele mora não sabem que ele é<br />

cata<strong>do</strong>r. Geralmente não dizem. (...) Maioria, nem to<strong>do</strong>s. Alguns falam,<br />

conversam, mas alguns têm vergonha. (...) Agora em relação aos outros que<br />

chegam agora, esses já tem menos vergonha.” (cata<strong>do</strong>r)<br />

4.4.2. A catação segun<strong>do</strong> pessoas que recorrem às cooperativas por uma renda extra<br />

Em se tratan<strong>do</strong> <strong>de</strong> pessoas que juntam material reciclável para ven<strong>de</strong>r<br />

esporadicamente, a impressão que se tem é que há uma dicotomia: se por uma la<strong>do</strong><br />

vêem nessa ativida<strong>de</strong> uma fonte <strong>de</strong> dinheiro, por outro ficam paralisa<strong>do</strong>s mediante o<br />

estigma que ela <strong>de</strong>nota. Talvez daí a freqüência com que justificassem que era melhor<br />

fazer aquilo “<strong>do</strong> que roubar”, ou “Tô nem aí”, ou diziam que ven<strong>de</strong>m para ajudar um<br />

membro da família que encontra-se <strong>do</strong>ente. Neste caso não estamos tratan<strong>do</strong> <strong>do</strong>s<br />

biscateiros. Grupo a parte e que, pelo fato <strong>de</strong> se utilizarem da catação como<br />

complemento da renda advinda <strong>de</strong> outro ofício, a este chamam <strong>de</strong> trabalho ou emprego,<br />

àquele não dão <strong>de</strong>nominação. Quan<strong>do</strong> um <strong>de</strong>les foi indaga<strong>do</strong> <strong>do</strong> por que não chamar a<br />

catação <strong>de</strong> trabalho este não enten<strong>de</strong>ra a questão <strong>do</strong> observa<strong>do</strong>r.<br />

Os mora<strong>do</strong>res <strong>de</strong> rua, que po<strong>de</strong>mos colocar entre aqueles que também vêm atrás<br />

da catação em busca <strong>de</strong> um extra, muitas vezes consi<strong>de</strong>ravam os cata<strong>do</strong>res assíduos e<br />

administra<strong>do</strong>res como pessoas ricas: “Eu não tiro dinheiro daqui não, mas eles tiram<br />

sim”. Apesar <strong>de</strong> notarmos uma classificação mediada pelo fato <strong>de</strong> que alguns tiram mais<br />

dinheiro da catação <strong>do</strong> que outros, nos chama a atenção que não lhes ocorre que o<br />

mesmo po<strong>de</strong>ria ser alcança<strong>do</strong> por eles se assumissem aquela tarefa como meio <strong>de</strong><br />

11


subsistência. Já as pessoas <strong>de</strong> classe média, não tinham a menor dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong> darem<br />

seus <strong>de</strong>poimentos, a maioria apresentava-se imbuída <strong>de</strong> incentivos à catação e ao meio<br />

ambiente, sem fazer nenhuma relação com questões econômicas.<br />

4.4.3. O olhar da socieda<strong>de</strong> sobre a catação a partir da visão <strong>do</strong> cata<strong>do</strong>r<br />

Aos cata<strong>do</strong>res, quan<strong>do</strong> indaga<strong>do</strong>s sobre o que as pessoas nas ruas diziam sobre o<br />

fato <strong>de</strong> eles trabalharem com recicláveis, respondiam que tais pessoas não costumavam<br />

falar, mas olhavam. Interessa aqui saber qual o significa<strong>do</strong> que os cata<strong>do</strong>res dão ao olhar<br />

que supõem receber quan<strong>do</strong> no exercício <strong>de</strong> sua função. A questão <strong>do</strong> olhar <strong>do</strong> outro não<br />

é <strong>de</strong> forma alguma livre <strong>de</strong> implicações para o processo <strong>de</strong> construção da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>. A<br />

formação <strong>do</strong> eu no olhar <strong>do</strong> Outro, <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com Lacan, inicia a relação da criança<br />

com os sistemas simbólicos fora <strong>de</strong>la mesma, e é, assim, o momento da sua entrada nos<br />

vários sistemas <strong>de</strong> representação (Hall, 2001). A questão <strong>do</strong> olhar <strong>do</strong> outro é<br />

fundamental para o processo <strong>de</strong> construção da dialética das intersubjetivida<strong>de</strong>s, através<br />

<strong>do</strong> qual o mun<strong>do</strong> social passa a ter peso <strong>de</strong> realida<strong>de</strong> para os sujeitos que <strong>de</strong>le<br />

participam.<br />

“Tem pessoas que olham, tem pessoas que não querem nem olhar, enten<strong>de</strong>u?<br />

Tem pessoas que fogem, se vê você vin<strong>do</strong> saem <strong>de</strong> perto, passam por uma outra<br />

rua. Acho que a socieda<strong>de</strong> tem que começar a ver assim, porque pra você fazer<br />

um trabalho bem extensivo, com coleta seletiva, que é o que se fala no<br />

momento, a socieda<strong>de</strong> tem que apren<strong>de</strong>r, tem que entrar <strong>de</strong>ntro duma escola,<br />

tem que ver que o cata<strong>do</strong>r é parceiro.” (cata<strong>do</strong>r)<br />

Nas respostas recebidas quanto à impressão que a socieda<strong>de</strong> tinha <strong>do</strong> fato <strong>de</strong>les<br />

lidarem com material <strong>de</strong>scarta<strong>do</strong>, era comum afirmativas que apontassem a necessida<strong>de</strong><br />

<strong>de</strong> conscientização da população como forma <strong>de</strong> valorização <strong>do</strong> cata<strong>do</strong>r e <strong>de</strong><br />

incorporação <strong>do</strong> mesmo à paisagem:<br />

“Ah, o trabalho específico com o cata<strong>do</strong>r eu acho importante, para valorizar o<br />

que ele faz. Mas, importantíssimo mesmo, é a conscientização <strong>do</strong>s mora<strong>do</strong>res,<br />

da população.” (ex-cata<strong>do</strong>r)<br />

“Eu acho que a população tem um certo receio com o cata<strong>do</strong>r e é assim com<br />

to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, no mun<strong>do</strong> em que a gente vive hoje, né? Hoje até o carteiro bate<br />

na porta e não é bem aceito, (...) mas acho até que tá mudan<strong>do</strong> um pouco isso,<br />

as pessoas já tão começan<strong>do</strong> a enxergar com outros olhos.” (coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>r)<br />

Compreen<strong>de</strong>r o peso <strong>do</strong>s significa<strong>do</strong>s sociais sobre o trabalho e a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> é<br />

fundamental, pois - “o po<strong>de</strong>r está no olhar <strong>do</strong> observa<strong>do</strong>r” (Lasch, 1983: 72) – o olhar<br />

<strong>de</strong> que o cata<strong>do</strong>r julga ser o objeto (estar submeti<strong>do</strong> a) também po<strong>de</strong> ter influência na<br />

sua percepção <strong>de</strong> si e <strong>do</strong> seu ofício, ao assumir conotações distintas, não interessan<strong>do</strong>,<br />

neste caso, quem olha ou por que. Assim, os cata<strong>do</strong>res, além <strong>do</strong>s fatores estruturais<br />

como falta <strong>de</strong> apoio familiar e moradia, têm contra si a impressão <strong>de</strong> uma percepção<br />

negativa <strong>de</strong> sua ativida<strong>de</strong> econômica por parte <strong>do</strong>s <strong>de</strong>mais atores sociais. Isto leva a que<br />

não confiem não só na socieda<strong>de</strong>, como também em seus colegas <strong>de</strong> catação (“já que ele<br />

é um cata<strong>do</strong>r”), dificultan<strong>do</strong> a criação <strong>de</strong> capital social que po<strong>de</strong>ria ajudar na gestão das<br />

cooperativas levan<strong>do</strong> a melhorias econômicas, sociais e ambientais. A mudança <strong>de</strong>sta<br />

percepção po<strong>de</strong> facilitar a organização <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res e a gestão <strong>de</strong> cooperativas.<br />

12


5) A Importância da Atribuição <strong>de</strong> Significa<strong>do</strong>s Positivos à Catação - o Discurso <strong>do</strong><br />

Meio Ambiente como Forma <strong>de</strong> Valorização da Ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Catação<br />

As respostas <strong>do</strong>s <strong>do</strong>is segmentos (cata<strong>do</strong>res e pessoal liga<strong>do</strong> à administração) são<br />

diferentes quan<strong>do</strong> indaga<strong>do</strong>s sobre a relação entre este trabalho e a questão ambiental. O<br />

presi<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>ssas cooperativas, filho <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> ce<strong>do</strong> envolvi<strong>do</strong> neste<br />

contexto, po<strong>de</strong> ter ajuda<strong>do</strong> a respon<strong>de</strong>r esta questão ao explicar que:<br />

“A pessoa que vai fazer uma faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> ambientalismo, vai fazer porque<br />

gosta <strong>do</strong> meio ambiente, quer trabalhar com aquilo. A gente não, a gente vai<br />

trabalhar com lixo, porque tá atrás <strong>do</strong> dinheiro. Aquela noção <strong>de</strong> ‘ah tô<br />

protegen<strong>do</strong> o meio ambiente’ é bem pouquinho.”<br />

Já um coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>r <strong>do</strong> programa <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res acredita que o preconceito <strong>de</strong><br />

quem trabalha com lixo está sen<strong>do</strong> diluí<strong>do</strong> em função da valorização <strong>do</strong>s recicla<strong>do</strong>s:<br />

“As pessoas vêem com olhos diferentes o cata<strong>do</strong>r quan<strong>do</strong>, sobretu<strong>do</strong>, ele usa os<br />

equipamentos, luva, máscara e tenta seguir técnicas <strong>de</strong> operação e normas<br />

ambientais que a gente inculca na cabeça <strong>de</strong>les para não ter risco <strong>de</strong> aci<strong>de</strong>nte, <strong>de</strong><br />

contaminação, não provocar aci<strong>de</strong>ntes.”<br />

No <strong>de</strong>poimento acima é importante esclarecer que é tamanho o envolvimento<br />

<strong>de</strong>ssas pessoas que torna-se óbvia a relação cata<strong>do</strong>r/meio ambiente. Contu<strong>do</strong>, o que<br />

emerge da fala <strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res como fator que os motiva a <strong>de</strong>sempenhar esta tarefa<br />

geralmente é o dinheiro. Como se estivessem a lutar, primeiramente, pela<br />

“sobrevivência”, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que o discurso sobre a questão ambiental fica em segun<strong>do</strong> ou<br />

terceiro plano. Neste caso é o mesmo coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>r que traz a resposta:<br />

“Que valor tem uma árvore (...) o interesse <strong>de</strong>le, material, a sobrevivência, tá<br />

em primeiro lugar. (...) Então alguns <strong>de</strong>les tem essa consciência, os <strong>de</strong>mais a<br />

gente tem que estimular e levantar essa auto-estima para que eles se valorizem e<br />

valorizem o próprio trabalho.” (coor<strong>de</strong>na<strong>do</strong>r)<br />

A importância da associação <strong>de</strong>ste trabalho com significa<strong>do</strong>s sociais positivos<br />

po<strong>de</strong> também ser observada no seguinte <strong>de</strong>poimento em que um ex cata<strong>do</strong>r, e atual lí<strong>de</strong>r<br />

sindical, expressa a necessida<strong>de</strong> política <strong>de</strong> valorização <strong>de</strong>sta ativida<strong>de</strong>, através <strong>de</strong> uma<br />

re<strong>de</strong>finição <strong>do</strong>s conceitos emprega<strong>do</strong>s para retratá-la:<br />

“O cata<strong>do</strong>r sabe que ele é parceiro da socieda<strong>de</strong>. A socieda<strong>de</strong> é que não tem<br />

uma educação ambiental. Tem que mostrar para a socieda<strong>de</strong> quem é o parceiro<br />

(...). Tirar essa visão <strong>de</strong> que cata<strong>do</strong>r é lixeiro, é mendigo, é população <strong>de</strong> rua.<br />

Ele é um presta<strong>do</strong>r <strong>de</strong> serviço para a socieda<strong>de</strong>!” (ex-cata<strong>do</strong>r)<br />

“Na verda<strong>de</strong> o cata<strong>do</strong>r não cata lixo. Cata material reciclável. Se o cata<strong>do</strong>r se vê<br />

como um agente da própria natureza que tá fazen<strong>do</strong> um trabalho pro próprio<br />

meio ambiente, ele não vai ter vergonha. Mas tem pessoas que geralmente não<br />

vêem. O cata<strong>do</strong>r <strong>de</strong> repente po<strong>de</strong> ter essa visão, mas <strong>de</strong> repente você que não<br />

tem. (...) Eu não sou cata<strong>do</strong>r <strong>de</strong> lixo, primeiro eu não vivo <strong>do</strong> lixo, eu vivo <strong>do</strong><br />

material reciclável e eu não vivo no lixo, eu posso viver <strong>do</strong> lixo.” (ex-cata<strong>do</strong>r)<br />

É possível perceber aqui que o foco da luta <strong>de</strong>ve ser no reconhecimento<br />

simbólico, na valorização da ativida<strong>de</strong> <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>r a partir da a<strong>do</strong>ção <strong>de</strong> novos<br />

13


significa<strong>do</strong>s para esta tarefa. A fim <strong>de</strong> que esta possa ser consi<strong>de</strong>rada como uma <strong>de</strong>ntre<br />

as <strong>de</strong>mais exercidas pela socieda<strong>de</strong>.<br />

6) Conclusão<br />

Se o lixo, segun<strong>do</strong> Rodrigues (1995), é algo incômo<strong>do</strong> <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> à sua característica<br />

amorfa, atribuir-lhe novos significa<strong>do</strong>s implicaria em dar novas configurações ao<br />

mesmo, uma vez que valor sempre lhe foi conferi<strong>do</strong>. Da mesma maneira, um trabalho,<br />

sem significa<strong>do</strong> social positivo, torna-se, para os sujeitos com ele envolvi<strong>do</strong>s,<br />

impossível <strong>de</strong> possuir uma reputação e, sen<strong>do</strong> assim, muito menos auto-estima. Deste<br />

mo<strong>do</strong>, o discurso <strong>de</strong> valorização <strong>do</strong> meio ambiente po<strong>de</strong> ser a base para uma atribuição<br />

<strong>de</strong> novos significa<strong>do</strong>s ao lixo e à catação. Uma vez confirmada a relação simbólica entre<br />

lixo e exclusão, ter-se-á bases para afirmar a necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> um programa <strong>de</strong> educação<br />

ambiental (<strong>do</strong>s cata<strong>do</strong>res e <strong>de</strong>mais coletivos sociais) como complementar ao resgate da<br />

cidadania <strong>de</strong>stas populações.<br />

Para que a socieda<strong>de</strong> perceba o cata<strong>do</strong>r como um “trabalha<strong>do</strong>r como outro<br />

qualquer”, conforme a fala <strong>de</strong> um <strong>de</strong>les, é preciso associar o trabalho <strong>de</strong> catação a<br />

significa<strong>do</strong>s sociais positivos. Há um aspecto <strong>de</strong> positivida<strong>de</strong> e produtivida<strong>de</strong> associa<strong>do</strong><br />

ao trabalho que remete diretamente ao mo<strong>do</strong> como uma <strong>de</strong>terminada socieda<strong>de</strong> o<br />

percebe enquanto ativida<strong>de</strong> produtora <strong>de</strong> valores socialmente reconheci<strong>do</strong>s.<br />

Acreditamos que a atribuição <strong>de</strong> significa<strong>do</strong>s positivos ao trabalho com o lixo, através<br />

<strong>de</strong> um discurso <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa <strong>do</strong> meio ambiente, parece ser uma pré-condição para a<br />

inclusão simbólica <strong>de</strong>stes trabalha<strong>do</strong>res. Pré-condição esta que apontaria para um<br />

processo positivo <strong>de</strong> construção social da i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e <strong>de</strong> resgate da auto-estima.<br />

Embora os cata<strong>do</strong>res não consigam revelar <strong>de</strong> forma assertiva o peso <strong>do</strong> estigma <strong>de</strong>sta<br />

profissão, é através <strong>do</strong> reconhecimento simbólico da ativida<strong>de</strong> que exercem que virá o<br />

“Um trabalha<strong>do</strong>r como outro qualquer” <strong>de</strong> fato.<br />

Notas<br />

1. Um bom exemplo é o que tem aconteci<strong>do</strong> na Argentina, em que estimativas mostram não só,<br />

por um la<strong>do</strong>, a diminuição <strong>do</strong> consumo pela classe média, e conseqüente diminuição <strong>do</strong> lixo<br />

produzi<strong>do</strong>, como, por outro la<strong>do</strong>, um aumento <strong>do</strong> número <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res, fazen<strong>do</strong> com que menos<br />

lixo chegue aos aterros. (Valor/A14, 04/09, tira<strong>do</strong> <strong>do</strong> site: www.portalga.ea.ufrgs.br). Da<strong>do</strong>s <strong>de</strong><br />

órgãos oficiais <strong>de</strong> estatística estimam que haja 155 mil cada<strong>do</strong>res na Argentina, ao que eles<br />

chamam <strong>de</strong> cartoneros, sen<strong>do</strong> que, na cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Buenos Aires eles seriam cerca <strong>de</strong> 40 mil,<br />

tiran<strong>do</strong> por volta <strong>de</strong> R$ 10,00 por noite. (Billi, 2002).<br />

2. Nome que eles dão ao carrinho através <strong>do</strong> qual carregam o papel.<br />

3. “Empréstimo gratuito <strong>de</strong> coisa não fungível, que <strong>de</strong>ve ser restituída no tempo convenciona<strong>do</strong><br />

pelas partes” (Houaiss, 2001).<br />

4. Nem todas as cooperativas utilizam espaços cedi<strong>do</strong>s pela prefeitura, algumas se instalaram<br />

em espaços <strong>do</strong> governo <strong>do</strong> esta<strong>do</strong>, como é o caso da cooperativa <strong>do</strong> Castelo. Porém funciona<br />

segun<strong>do</strong> os mesmos preceitos das <strong>de</strong>mais, a partir <strong>do</strong> proposto pela COMLURB.<br />

5. <strong>Trabalho</strong> em conjunto por parte das estruturas locais, regionais, nacionais e internacionais.<br />

6. O termo cata<strong>do</strong>r é da<strong>do</strong> aquele que vive exclusivamente <strong>de</strong>sta tarefa. Os biscateiros foram<br />

aqui menciona<strong>do</strong>s <strong>de</strong>vi<strong>do</strong> à freqüência com que aparecera durante a observação <strong>de</strong> campo num<br />

<strong>do</strong>s núcl<strong>eo</strong>s das cooperativas.<br />

7. Em entrevista realizada em setembro <strong>de</strong> 2002 na Diretoria da Zona Oeste – Campo Gran<strong>de</strong>,<br />

<strong>Rio</strong> <strong>de</strong> Janeiro, RJ<br />

14


8. Neste local haveria <strong>do</strong>is tipos <strong>de</strong> cata<strong>do</strong>res: o coopera<strong>do</strong> ou “pessoas <strong>de</strong> baixo” - que recebe<br />

cerca <strong>de</strong> <strong>do</strong>is salários mínimos, possui direito à aposenta<strong>do</strong>ria, plano <strong>de</strong> saú<strong>de</strong>, e usa<br />

equipamento <strong>de</strong> proteção trabalhan<strong>do</strong> em área coberta - e os não-coopera<strong>do</strong>s ou “pessoas <strong>de</strong><br />

cima” – que não tem renda fixa, esta varian<strong>do</strong> <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com o que encontram e ven<strong>de</strong>m para os<br />

sucateiros, são <strong>de</strong>samparadas <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista <strong>do</strong> trabalho que realizam e <strong>do</strong> ponto <strong>de</strong> vista<br />

legal. (Feichas, 2001)<br />

9. Os cata<strong>do</strong>res, no Brasil, são consi<strong>de</strong>ra<strong>do</strong>s como os maiores responsáveis pelos altos índices<br />

<strong>de</strong> reciclagem <strong>de</strong> alguns materiais - latas <strong>de</strong> alumínio (73%) e papelão (71%) – colocan<strong>do</strong> o pais<br />

em posição <strong>de</strong> <strong>de</strong>staque no cenário mundial, sen<strong>do</strong> que as cooperativas vêm se transforman<strong>do</strong><br />

em empreendimentos cada vez mais rentáveis. (Cempre Informa, 2002)<br />

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