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JE590DEZ09 - Exército

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26<br />

O peacekeeping tornou-se o remédio miraculoso<br />

para resolver os conflitos que proliferaram na Guerrafria,<br />

pela simples razão de que os Estados e as<br />

organizações internacionais não conseguiam<br />

encontrar outro remédio. Escudados pelos princípios<br />

sagrados que os deveriam nortear (a “trindade sagrada”:<br />

consentimento, imparcialidade e o uso da<br />

força) 9 , os peacekeepers foram enviados para todo o<br />

tipo de missões, até para as mais inverosímeis, como<br />

o Congo, o Líbano e a Somália.<br />

Se o peacekeeping é desempenhado por militares,<br />

em última instância ele remete-nos para a possibilidade<br />

de estes usarem da sua prerrogativa natural:<br />

a aplicação da força. Na realidade, o peacekeeping<br />

assenta, como afirma Findlay, sobre um elemento<br />

(implícito e indefinido) de bluff: a de que os capacetes<br />

azuis, se confrontados com situações extremas, usarão<br />

a força. Este bluff é produtivo se tiver um efeito<br />

dissuasor sobre potenciais opositores, isto é, se a<br />

parte antagonista se convencer de que tem algo a<br />

perder se não respeitar os compromissos que<br />

assumiu. Contudo, a capacidade das NU deterem as<br />

forças hostis só existe se: se tiver comunicado de<br />

forma clara à parte adversária o objectivo da missão,<br />

bem como a ameaça da aplicação da força, no caso de<br />

incumprimento ou obstrução por parte dos<br />

“spoilers” 10 ; se a força de peacekeeping demonstrar<br />

a capacidade e a intenção de usar a força.<br />

A realidade é que o peacekeeping nunca foi, como<br />

idealmente se projectou, uma prática inteiramente<br />

pacífica: na UNEF I, a força foi usada logo nos<br />

primeiros dias da operação e, no total, a missão<br />

registou 89 vítimas 11 . A questão do consentimento<br />

das partes também não tem sido uniforme: embora o<br />

Egipto e Israel tivessem aceite a presença da UNEF I<br />

e II, tiveram de ser persuadidos a tal. A ONUC<br />

(Opération des Nations Unies au Congo, entre 1960<br />

e 1964), foi enviada sem o consentimento das<br />

autoridades da província secessionista do Katanga e<br />

a Bélgica, potência colonial em retirada, deu o seu<br />

consentimento com relutância. A UNIFIL (United<br />

Nations Interim Force in Lebanon) trabalha no Líbano<br />

desde 1978 com a aquiescência deste país, mas foi<br />

frequentemente hostilizada e atingida durante<br />

incursões e ataques militares dos israelitas no sul do<br />

Líbano. Os Khmers Vermelhos aceitaram com mávontade<br />

a entrada da UNTAC (United Nations<br />

Transitional Authority in Cambodia) no Cambodja.<br />

O mesmo aconteceu com as facções somalis em relação<br />

à UNOSOM I e II (UN Operation in Somalia). A<br />

Indonésia aceitou a presença da INTERFET<br />

(International Force for East Timor) e da UNTAET<br />

(UN Transition Authority in East Timor) após fortes<br />

pressões da comunidade internacional, inclusive dos<br />

EUA.<br />

Fonte: UN.org<br />

A experiência veio a demonstrar a necessidade de permitir<br />

aos capacetes azuis usar a força.<br />

O uso da força no peacekeeping, para além da<br />

auto-defesa, é viável se a operação for enquadrada<br />

no Capítulo VII da Carta, uma vez que este capítulo<br />

trata de medidas que o Conselho de Segurança pode<br />

impor, como as sanções ou o uso da força militar. Este<br />

entendimento foi confirmado por uma sentença do<br />

Tribunal Internacional de Justiça, em 1962, que<br />

afirmava que as NU têm a capacidade inerente de criar<br />

e assumir o comando de forças militares. Contudo, a<br />

sentença estabelece que estas só podem usar de<br />

“direitos beligerantes” quando autorizadas para tal<br />

pelo Conselho de Segurança, ao abrigo do Capítulo<br />

VII 12 .<br />

O uso da força em auto-defesa é legitimado por<br />

várias fontes. O filósofo holandês Hugo Grotius (1583-<br />

1645) defendeu a auto-preservação como um direito<br />

inerente e natural do indivíduo que nenhuma lei<br />

poderia limitar ou ab-rogar. Também afirmou o direito<br />

dos Estados à auto-defesa, um conceito que está<br />

consagrado na lei internacional através do artigo 51.º<br />

da Carta das NU. Uma vez que as forças armadas são<br />

as principais defensoras do Estado, tem-se deduzido<br />

que o seu direito de auto-defesa colectiva é um<br />

prolongamento do direito dos Estados de assegurarem<br />

a sua auto-defesa. Tem-se partido do princípio de que<br />

os militares desfrutam daquele direito, mesmo quando<br />

operam sob comando das NU. Alguns autores<br />

defendem que a ONU, tal como os Estados, goza do<br />

direito de defesa própria e que o seu pessoal, por<br />

extensão, goza do direito de defesa individual e<br />

colectiva 13 .<br />

Inicialmente, auto-defesa significava a defesa da<br />

pessoa do peacekeeper através das suas armas.<br />

Contudo, a experiência veio a demonstrar a necessidade<br />

de alargar este entendimento de forma a permi-

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