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ALÉM DA ENXADA, A UTOPIA: - Repositórios Digitais da UFSC

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No relato acima, os tempos se entrelaçam: eu caía, era inverno, eu tinha me<br />

machucado, são exemplos de verbos que indicam ações ou estados do passado. Por outro<br />

lado, o falecido pai disse, eu disse, podem fazer o que querem, esse ano não vou montar<br />

nos cavalos pra arar são expressões usa<strong>da</strong>s no tempo presente, isto é, indicam que a<br />

memória transporta até a infância essas pessoas cuja aparência denuncia a i<strong>da</strong>de. Esse<br />

período é revivido e recriado ao ser recor<strong>da</strong>do, por isso o tempo presente e o passado<br />

muitas vezes se confundem e interagem.<br />

As palavras <strong>da</strong> senhora Amélia Fasolo trazem consigo várias imagens, e talvez a<br />

mais marcante <strong>da</strong> infância seja a do trabalho constante e cansativo ao lado dos adultos.<br />

Tudo tinha início na mais tenra i<strong>da</strong>de, quando aos pequeninos eram designa<strong>da</strong>s as primeiras<br />

responsabili<strong>da</strong>des domésticas, como colher frutas no pomar, buscar verduras e legumes na<br />

horta, cui<strong>da</strong>r dos irmãos menores, preparar os gravetos e a lenha para o fogo, varrer o chão<br />

e lavar a louça. Antes disso, praticamente cresciam em meio às roças, levados pelos pais ou<br />

responsáveis que não dispunham de alguém para cuidá-los. Assim, ao irem para a roça era<br />

comum deixarem “as crianças na caixinha*, sempre os levava atrás, porque tinha medo dos<br />

bichos 6 ”. Esse cui<strong>da</strong>do demonstra a grande preocupação dos pais para com os filhos,<br />

principalmente quando bebês. É também o caso <strong>da</strong> senhora Rosa Ravadelli, que levava<br />

consigo o seu filho durante as li<strong>da</strong>s diárias e “botava ele sentado no chão com um guar<strong>da</strong>-<br />

chuva, ou embaixo duma árvore. Ia pra casa sozinha, o falecido trabalhava na estra<strong>da</strong>. Eu<br />

* Essa não era uma caixa qualquer. Pelo contrário, para fazê-la era escolhi<strong>da</strong> uma madeira de boa quali<strong>da</strong>de,<br />

sem rachaduras ou falhas. Bem pinta<strong>da</strong> e manti<strong>da</strong> sempre limpa, se possível forra<strong>da</strong> com uma espécie de<br />

colchão de palha de milho seca, era enfeita<strong>da</strong> com pequenos cordões que serviam para o entretenimento dos<br />

bebês, que ali permaneciam até a i<strong>da</strong>de aproxima<strong>da</strong> de um ano. A caixa de madeira era usa<strong>da</strong> principalmente<br />

na roça, para evitar a visita indeseja<strong>da</strong> de algum animal, ou quando a mãe não dispunha de muito tempo para<br />

dedicar-se ao filho. Assim, enquanto trabalhava, a criança estava sobre sob seus olhares, dentro <strong>da</strong> caixinha.<br />

6 “Quando que se ndea tea roça, i tozatéi in casseta, sempre portarli in drio, dentro, sempre de drio, parqué<br />

paúra dele béstie”. In: ZANANDRÉA, Gentile. Entrevista cita<strong>da</strong>, p. 03.<br />

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