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A Revolta da Chibata e seu centenário - Fundação Perseu Abramo

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egistros. Uma carta do cirurgião Carlos de Barros Raja Gabaglia ao senador<br />

Rui Barbosa nos mostra isso 16 . Como todo médico a bordo, tinha a responsabili<strong>da</strong>de<br />

também de verifi car se o castigado aguentaria mais panca<strong>da</strong>s na hora<br />

do castigo, e mesmo a possibili<strong>da</strong>de de restabelecimento do indivíduo após<br />

aquelas torturas. Carlos Gabaglia, como pude notar em sua caderneta, tivera<br />

extensa experiência nas uni<strong>da</strong>des <strong>da</strong> Arma<strong>da</strong>, convivendo com diversos ofi -<br />

ciais coman<strong>da</strong>ntes. Segundo o cirurgião,<br />

17<br />

Tão generalizado está o deprimente hábito que coman<strong>da</strong>ntes de merecimento<br />

não se envergonham de anotar nos livros de castigo sinais convencionais<br />

a fi m de – impunemente – iludir a lei; por exemplo – onde se lê 4 horas<br />

de golilha ou 6 horas de barra aplica-se certo número de chibata<strong>da</strong>s. [...]<br />

Presenciei o castigo de um foguista com oitocentas chibata<strong>da</strong>s, de uma só<br />

vez; – Sei que aprendiz marinheiro tem sido castigado com cento e vinte e<br />

cinco bolos, de uma feita.<br />

Nota-se que os marinheiros revoltados em 1910 reclamavam com razão<br />

dos ofi ciais rigorosos demais, e começamos a ver que faz sentido a reivindicação<br />

de retirá-los de bordo dos navios. Ofi ciais como esses eram um terror<br />

na vi<strong>da</strong> de qualquer marinheiro, mesmo aquele que fosse de bom comportamento<br />

e por qualquer erro, o mínimo que fosse, recebesse terríveis lanha<strong>da</strong>s<br />

de chibata. Em qualquer caso, aquele que sofrera o castigo não tinha a<br />

quem reclamar pelos excessos do superior, por ser o militarismo altamente<br />

hierárquico, produzindo um distanciamento entre as diferentes patentes, ao<br />

impedir que um marinheiro inconformado se dirigisse a um ofi cial superior<br />

àquele que o coman<strong>da</strong>va. Em minhas pesquisas só encontrei um caso de<br />

ofi cial processado, o capitão José Cândido Guillobel, por excessos de castigo,<br />

que foi denunciado pelo coman<strong>da</strong>nte <strong>da</strong> fragata que perguntara a razão<br />

<strong>da</strong>quela punição. Mesmo assim o ofi cial processado foi somente “advertido” e<br />

chegou aos mais altos cargos <strong>da</strong> marinha ao longo <strong>da</strong> sua carreira militar 17 .<br />

Os índices de deserção, obviamente, eram altíssimos. Havia casos de<br />

homens que desertavam por doze vezes. Não adiantava prendê-los novamente:<br />

na primeira oportuni<strong>da</strong>de, largavam a far<strong>da</strong> e se metiam em mais uma fuga<br />

<strong>da</strong>s Forças Arma<strong>da</strong>s. A situação era tão grave que as autori<strong>da</strong>des decidiram<br />

mu<strong>da</strong>r o código militar e aplicar castigos físicos, antes <strong>da</strong> prisão por meses,<br />

como ocorria anteriormente.<br />

Outra relação que podemos fazer entre o proposto pelos marinheiros<br />

revoltados em 1910, os testemunhos do médico Raja Gabaglia e do processo<br />

envolvendo o ofi cial José Cândido Guillobel é a mu<strong>da</strong>nça no Código Penal e<br />

Militar <strong>da</strong> Arma<strong>da</strong>. Este permitia o uso de castigos físicos passados 22 anos

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