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É NOITE, LÁ FORA ELES TE ESPERAM<br />
Alexandre Ribeiro<br />
— Não seja tão supersticiosa, não se esqueça que ele também<br />
tem o meu sangue.<br />
— Promete que será a última?<br />
— Eu não gostaria de prometer tal coisa, mas eu tenho certeza<br />
de que será.<br />
* * *<br />
O dia parecia normal e, no caminho, comemos os sanduíches<br />
que minha mãe preparou, porém, calados. Estávamos com um<br />
grande pesar no coração. Chegamos ao caminho que dava para<br />
a montanha. O céu se enegreceu em um instante. As árvores<br />
que circundavam o local pareciam terem sido varridas por um<br />
incêndio assolador, estavam esturricadas tanto como a terra que<br />
as abrigava; mortas.<br />
O vento soprou insistente, dando-nos uma sensação de um frio<br />
que cortava além da pele, na alma. Eu sei que só tinha sete anos,<br />
mas essas foram as sensações que eu senti ao chegar naquelas<br />
terras e a visão daquele lugar e das cenas que se seguiram jamais<br />
saíram de minha memória.<br />
Meu tio-avô Atanásio estava deitado na cama e, logo que<br />
entramos em seu quarto, ele ergueu a mão com esforço para tocar<br />
nas mãos de meu pai. Num breve sussurro disse:<br />
— Filho, obrigado por vir me visitar!<br />
— Tio, eu sinto muito! Não imaginava que estava neste estado.<br />
(Meu pai estava triste, dominado pela dor de ver o seu último<br />
parente vivo definhando num leito de morte).<br />
— Filho, tenho algo pra você.<br />
— Eu não quero nada, tio.<br />
— Aproxime-se, eu preciso lhe revelar o segredo, é seu, você<br />
precisa ouvi-lo.<br />
Naquela hora, eu comecei a tremer de medo ao ver aquela<br />
figura quase cadavérica, amortecida naquela cama fria, dominada<br />
por uma doença que eu não saberia precisar e nem tão pouco,<br />
neste momento, saberia descrever.<br />
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