Hannah Arendt: Legitimidade e Política - Programa de Pós ...
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de contar narizes e aderir a uma maioria, mas de ser e pensar em minha própria identidade onde efetivamente não me encontro. Quanto mais posições de pessoas eu tiver presente e minha mente ao ponderar um dado problema, e quanto melhor puder imaginar como eu sentiria e pensaria se estivesse em seu lugar, mais forte será minha capacidade de pensamento representativo e mais válidas minhas conclusões finais, minha opinião. ... O próprio processo da formação de opinião é determinado por aqueles em cujo lugar alguém pensar e utiliza sua própria mente, e a única condição para esse exercício da imaginação é o desinteresse, a liberação dos interesses privados pessoais.” 201 O modo de a opinião discursiva asseverar sua validade na interação política depende de livre acordo e assentimento. Para a autora, o móbil do processo de formação da vontade na interação política depende da forma como transcorre “de uma parte do mundo para outra, através de todas as espécies de concepções conflitantes, até, finalmente ascender dessas particularidades a alguma generalidade imparcial.” 202 A liberação dos interesses envolvidos assinala que Arendt diferencia o modo como a opinião se constitui, da forma como os interesses se manifestam no âmbito político. Os interesses, diz a autora, são “interesses de grupos... representados de tal modo que o seu caráter parcial esteja salvaguardado em todas as condições, mesmo que suceda que o interesse de um grupo seja o interesse da maioria.” 203 Na formação discursiva da opinião, se trata de que, posto que “Nenhuma opinião é auto-evidente” 204 , a asserção de uma opinião, o seu processo de formação, depende de um “campo aberto em que se pode mostrar de todos os lados, em todas as perspectivas possíveis, até ser inundado e trespassado pela luz plena da compreensão humana”. 205 O caráter de iniciativa e espontaneidade que Arendt confere a ação deve assim, através da opinião política, ser articulado com o contexto da interação onde as ações humanas tecem suas relações. Ademais, o caráter de iniciativa deflagrado por todo agir humano permanece associado não somente ao contexto da presença dos outros em que ocorre, mas é que as próprias ações necessitam dos seus consortes para ser instituída e para que os indivíduos concernidos na 201 Idem, Verdade e Política, In EPF, p. 299. Seria preciso investigar aqui a relação entre juízo e opinião. A este respeito, ODÍLIO A. A. Filosofia e Política no pensamento de Hannah Arendt, p. 92- 102. 202 Idem, Verdade e Política, In EPF, p. 200. 203 Idem, Verdade e Política, In EPF, p. 224. 204 Idem, Verdade e Política, In EPF, p. 300. 205 Idem, Verdade e Política, In EPF, p. 300.
ação tenham a oportunidade de agir. Na sua analítica da ação, Arendt ao tempo em que enfatiza o caráter de revelação do agente no agir e no falar, de outro lado, a autora enfatiza a textura intersubjetiva da qual faz parte a ação, onde “se movimenta sempre entre e em relação a outros seres atuantes,” 206 simultaneamente afetando e sendo afetada pela ação dos outros em que está relacionada. Que a ação afete e seja afetada, significa que a “reação” que a ação desperta na “teia” a que está ligada é sempre uma ação que também afeta os demais indivíduos. “Assim, a ação e a reação jamais se restringem, entre os homens, a um círculo fechado, e jamais podemos, com segurança, limitá-la a dois parceiros.” 207 Esta última questão, para Arendt, está ligada a um dos pontos singularidades que definem a produtividade da ação: a sua capacidade de estabelecer novas relações, de gerar novas coexistências a partir das iniciativas deflagradas e enunciadas. “A ilimitação da ação nada mais é senão o outro lado de sua tremenda capacidade de estabelecer relações, isto é, sua produtividade específica.” 208 A esta característica da ação, outra lhe permanece estreitamente relacionada: o caráter da imprevisibilidade. Para Arendt, a imprevisibilidade da ação tem dupla origem: “decorre ao mesmo tempo da ‘treva do coração humano’, ou seja, da inconfiabilidade fundamental dos homens, que jamais podem garantir hoje quem serão amanhã, e da impossibilidade de se prever as conseqüências de um ato numa comunidade de iguais, onde todos têm a capacidade de agir. ” 209 A imprevisibilidade da ação se relaciona ao fato da revelação do significado dos atos só surgir plenamente depois que eles acabaram, uma vez que é somente após ter transcorrido que o seu inerente caráter de iniciativa pode se revelar para o olhar retrospectivo do narrador. Na sua analítica da ação, Arendt vincula a imprevisibilidade da ação ao caráter da revelação do agente na ação e no 206 H. ARENDT, CHM, p. 248. [Trad. bras. p. 203]. Para a consideração de uma distinção entre dois modelos de espaço público decorrente da apreensão separada entre o aspecto da revelação e da deliberação no espaço público, ver, S. BENHABIBI, Models of Public Space: Hannah Arendt, the Liberal Tradition, and Jurgen Habermas, In Habermas and the Public Spher, Massachussets, CALHOUN, Craig. (Ed.), p. 78. 207 Idem, CHM, p. 248. [Trad. bras., 203] 208 Idem, CHM, p. 250. [Trad. bras., 204] 209 Idem, CHM, p. 310. [Trad. bras., 256]
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efetivamente não me encontro. Quanto mais posições <strong>de</strong> pessoas eu tiver presente e minha mente<br />
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válidas minhas conclusões finais, minha opinião. ... O próprio processo da formação <strong>de</strong> opinião é<br />
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pessoais.” 201<br />
O modo <strong>de</strong> a opinião discursiva asseverar sua valida<strong>de</strong> na interação política<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> livre acordo e assentimento. Para a autora, o móbil do processo <strong>de</strong><br />
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uma parte do mundo para outra, através <strong>de</strong> todas as espécies <strong>de</strong> concepções<br />
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<strong>Arendt</strong> diferencia o modo como a opinião se constitui, da forma como os<br />
interesses se manifestam no âmbito político. Os interesses, diz a autora, são<br />
“interesses <strong>de</strong> grupos... representados <strong>de</strong> tal modo que o seu caráter parcial<br />
esteja salvaguardado em todas as condições, mesmo que suceda que o interesse<br />
<strong>de</strong> um grupo seja o interesse da maioria.” 203 Na formação discursiva da opinião,<br />
se trata <strong>de</strong> que, posto que “Nenhuma opinião é auto-evi<strong>de</strong>nte” 204 , a asserção <strong>de</strong><br />
uma opinião, o seu processo <strong>de</strong> formação, <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> um “campo aberto em que<br />
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O caráter <strong>de</strong> iniciativa e espontaneida<strong>de</strong> que <strong>Arendt</strong> confere a ação <strong>de</strong>ve<br />
assim, através da opinião política, ser articulado com o contexto da interação on<strong>de</strong><br />
as ações humanas tecem suas relações. A<strong>de</strong>mais, o caráter <strong>de</strong> iniciativa<br />
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da presença dos outros em que ocorre, mas é que as próprias ações necessitam<br />
dos seus consortes para ser instituída e para que os indivíduos concernidos na<br />
201 I<strong>de</strong>m, Verda<strong>de</strong> e <strong>Política</strong>, In EPF, p. 299. Seria preciso investigar aqui a relação entre juízo e<br />
opinião. A este respeito, ODÍLIO A. A. Filosofia e <strong>Política</strong> no pensamento <strong>de</strong> <strong>Hannah</strong> <strong>Arendt</strong>, p. 92-<br />
102.<br />
202 I<strong>de</strong>m, Verda<strong>de</strong> e <strong>Política</strong>, In EPF, p. 200.<br />
203 I<strong>de</strong>m, Verda<strong>de</strong> e <strong>Política</strong>, In EPF, p. 224.<br />
204 I<strong>de</strong>m, Verda<strong>de</strong> e <strong>Política</strong>, In EPF, p. 300.<br />
205 I<strong>de</strong>m, Verda<strong>de</strong> e <strong>Política</strong>, In EPF, p. 300.