16.04.2013 Views

Hannah Arendt: Legitimidade e Política - Programa de Pós ...

Hannah Arendt: Legitimidade e Política - Programa de Pós ...

Hannah Arendt: Legitimidade e Política - Programa de Pós ...

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Para <strong>Arendt</strong>, o processo <strong>de</strong> secularização se esten<strong>de</strong> até a fé e as crenças religiosas.<br />

Este fato, para a filósofa, é caracterizado pelo remetimento da dúvida à crença, <strong>de</strong> maneira<br />

que o crente constantemente se resguar<strong>de</strong> contra a dúvida. Com a remissão da dúvida à<br />

crença, “na religião, não foi a crença na salvação ou numa vida eterna que se per<strong>de</strong>u<br />

imediatamente, mas a certitudo salutis – e isto aconteceu em todos os países protestantes<br />

nos quais a queda da Igreja Católica abolira a última instituição ligada à tradição e que,<br />

on<strong>de</strong> quer que a sua autorida<strong>de</strong> permanecesse inconteste, interpunha-se entre o impacto da<br />

mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong> e a multidão dos fiéis.” 102 Com a perda das evidências últimas da salvação<br />

eterna, as crenças religiosas são imbuídas <strong>de</strong> “um redobrado zelo em praticar boas ações<br />

durante a vida, como se esta fosse apenas um longo período <strong>de</strong> provação“ 103 .<br />

“Des<strong>de</strong> a radical crítica das crenças religiosas nos séculos XVII e XVIII, permaneceu como<br />

característica da época mo<strong>de</strong>rna o duvidar da verda<strong>de</strong> religiosa, e isso é igualmente verda<strong>de</strong>iro para crentes e<br />

não-crentes. Des<strong>de</strong> Pascal e, ainda mais marcadamente, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> Kierkegaard, a dúvida tem sido remetida à<br />

crença, e o crente mo<strong>de</strong>rno <strong>de</strong>ve constantemente resguardar suas crenças contra as dúvidas; (...) Contudo, essa<br />

perda da crença nos dogmas da religião institucional não precisa implicar, necessariamente, uma perda ou<br />

mesmo crise da fé, pois religião e fé, ou crença e fé, não são <strong>de</strong> modo algum o mesmo. Somente a crença, mas<br />

não a fé, possui uma inerente afinida<strong>de</strong> com a dúvida e é constantemente exposta a ela. Mas quem po<strong>de</strong> negar<br />

que também a fé, protegida durante tantos séculos pela religião, suas crenças e dogmas, foi gravemente<br />

ameaçada pelo que é na realida<strong>de</strong> apenas uma crise da religião institucional?” 104<br />

Foi Kierkegaard, segundo <strong>Arendt</strong>, quem traduziu a experiência do assujeitamento da<br />

crenças religiosas aos abalos da dúvida mo<strong>de</strong>rna 105 . Para <strong>Arendt</strong>, Kierkegaard traçou a<br />

incompatibilida<strong>de</strong> da fé tradicional com a dúvida mo<strong>de</strong>rna, ao expressar o conflito existente<br />

entre o espírito <strong>de</strong> dúvida e <strong>de</strong>sconfiança que somente po<strong>de</strong> acreditar naquilo que o espírito<br />

faz e a tradicional confiança no que foi dado e aparece aos sentidos e à razão em seu<br />

verda<strong>de</strong>iro ser. Este último traço é o que tornava o crente das religiões tradicionais apto a<br />

102 H. ARENDT, CHM, p. 349 [Trad. bras. p. 290].<br />

103 I<strong>de</strong>m, CHM, p. 349 [Trad. bras. p. 290].<br />

104 H. ARENDT, O que é Autorida<strong>de</strong> ?, In EPF, p. 131. Segundo <strong>Arendt</strong>, “A mo<strong>de</strong>rna crença religiosa<br />

distingue-se da pura fé por ser a ‘crença no saber’ <strong>de</strong> pessoas que duvidam da possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong> qualquer<br />

conhecimento.” Religião e <strong>Política</strong>, In CP, p. 261. Para estas discussões, cf. J. S. J. BERNAUER, Por uma<br />

política do Espírito – De Hei<strong>de</strong>gger a <strong>Arendt</strong> e Foucault, 66 (21) : 319-336.<br />

105 H. ARENDT, CHM, p. 346-347[ Trad. bras. p. 286-291]

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!