Hannah Arendt: Legitimidade e Política - Programa de Pós ...
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<strong>de</strong> atomização e superfluida<strong>de</strong> social das massas para o <strong>de</strong>sdobramento dos movimentos revela que são as<br />
massas “naturalizadas”, fora <strong>de</strong> qualquer estrutura política e vínculos sociais, que possibilitarão sua<br />
abnegação no pertencimento a uma raça – nazismo –, ou na sua integração em uma classe – socieda<strong>de</strong> sem<br />
classes do comunismo –, forjando aí uma igualda<strong>de</strong> <strong>de</strong> pertencimento aos movimentos totalitários por um<br />
dado pré-político ao qual já estavam naturalmente <strong>de</strong>terminadas.<br />
De outro lado, à medida que mobilizavam i<strong>de</strong>ologicamente as massas <strong>de</strong> indivíduos atomizados, os<br />
movimentos totalitários perpetravam uma <strong>de</strong>struição do status quo da socieda<strong>de</strong> não-totalitária e <strong>de</strong> suas<br />
instituições existentes, duplicando-as através <strong>de</strong> organizações totalitárias que suplantavam as instituições<br />
políticas da socieda<strong>de</strong>. O resultado <strong>de</strong>ssa duplicação foi que uma vez galgado o po<strong>de</strong>r, os governos totalitários<br />
já repousavam sobre o edifício <strong>de</strong> uma socieda<strong>de</strong> inteiramente totalitária, extremamente útil na tarefa <strong>de</strong><br />
minar a autorida<strong>de</strong> das instituições visíveis do Estado e na <strong>de</strong>composição do status quo em que as camadas<br />
sociais não-totalitárias estavam referenciadas. Para <strong>Hannah</strong> <strong>Arendt</strong>, este mecanismo organizacional era <strong>de</strong><br />
extrema relevância na disseminação <strong>de</strong> pólipos <strong>de</strong> dominação em todo o tecido social e no apoio garantido<br />
pelas organizações criadas que substituíam e modificavam a vida política <strong>de</strong> toda socieda<strong>de</strong>.<br />
Além disso, através <strong>de</strong> uma análise dos traços das organizações totalitárias, <strong>Hannah</strong> <strong>Arendt</strong> <strong>de</strong>monstra<br />
como a singularida<strong>de</strong> <strong>de</strong>sta instituição possibilitava a reinstituição do tecido social e político segundo a sua<br />
gradual totalitarização 30 . Conforme <strong>de</strong>monstra a autora, as organizações totalitárias se baseavam na criação <strong>de</strong><br />
organizações <strong>de</strong> vanguarda, na cisão entre membros do partido e simpatizantes políticos, e, no âmbito dos<br />
movimentos totalitários, entre membros do movimento e formações <strong>de</strong> elite. Conforme sua análise, o<br />
expediente organizacional do totalitarismo consistia em subsumir suas instâncias internas gradativamente no<br />
ímpeto da direção dos movimentos, on<strong>de</strong> cada camada inferior funcionava como mundo não-totalitário para o<br />
imediatamente superior, e inversamente, cada camada superior se mostrava como mais radicalmente<br />
totalitária que as camadas inferiores. Para <strong>Arendt</strong> a vantagem fundamental <strong>de</strong>sta estrutura organizacional,<br />
“é que ela neutraliza o impacto <strong>de</strong> um dos dogmas básicos do totalitarismo, que afirma ser o mundo<br />
dividido em dois gigantescos campos inimigos, um dos quais é o movimento, e que este po<strong>de</strong> e <strong>de</strong>ve lutar<br />
contra o resto do mundo – afirmação que abre o caminho para a indiscriminada agressivida<strong>de</strong> dos regimes<br />
totalitários. O choque da terrível e monstruosa dicotomia é neutralizado, e nunca totalmente percebido, graças<br />
a uma cuidadosa graduação da militância, na qual cada escalão reflete para o escalão imediatamente superior<br />
a imagem do mundo não-totalitário, porque é menos militantes e os seus membros são menos organizados.<br />
Esse tipo <strong>de</strong> organização evita que os seus membros jamais venham a encarar diretamente o mundo exterior,<br />
cuja hostilida<strong>de</strong> permanece para eles um simples pressuposto. Permanecem tão bem protegidos contra a<br />
realida<strong>de</strong> do mundo não-totalitário que subestimam constantemente os tremendos riscos da política<br />
totalitária.” 31<br />
Calcada nesta leitura da burocracia totalitária, <strong>Arendt</strong> afirma que quando os movimentos totalitários<br />
chegam ao po<strong>de</strong>r, eles se <strong>de</strong>frontam com a tarefa <strong>de</strong> transformar as estruturas do Estado e do seu aparato<br />
governamental por meio da realida<strong>de</strong> fictícia que presi<strong>de</strong> o impulso do movimento <strong>de</strong> massas. Para a autora, a<br />
30 Para a análise das organizações totalitárias, cf. Totalitarismo, In OT, p. 416-417; O que é<br />
Autorida<strong>de</strong>?, In EPF, p. 136-137.<br />
31 Totalitarismo, In OT, p. 417.