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Hannah Arendt: Legitimidade e Política - Programa de Pós ...

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proprieda<strong>de</strong>; a verda<strong>de</strong>ira situação daqueles a quem o século XX jogou fora do âmbito da lei mostra que<br />

esses são direitos cuja perda não leva à absoluta privação <strong>de</strong> direitos. (...) A calamida<strong>de</strong> dos que não têm<br />

direitos não <strong>de</strong>corre do fato <strong>de</strong> terem sido privados da vida, da liberda<strong>de</strong> ou da procura da felicida<strong>de</strong>, nem<br />

da igualda<strong>de</strong> perante a lei ou da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> opinião – fórmulas que se <strong>de</strong>stinavam a resolver problemas<br />

<strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> certas comunida<strong>de</strong>s – mas do fato <strong>de</strong> já não pertencerem a qualquer comunida<strong>de</strong>.” 315<br />

Desprovidas dos laços <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong> política, os displaced persons perdiam não somente a<br />

igualda<strong>de</strong> jurídica perante a lei, mas toda espécie <strong>de</strong> proteção legal, uma vez que não existiam leis nas quais<br />

pu<strong>de</strong>ssem se ancorar. Com efeito, tudo o que faziam ou pu<strong>de</strong>ssem fazer não tinha significação para as leis,<br />

posto que estavam <strong>de</strong>sprovidos <strong>de</strong> uma personalida<strong>de</strong> legal no qual suas ações pu<strong>de</strong>ssem fazer sentido para a<br />

comunida<strong>de</strong> que habitassem. Para <strong>Arendt</strong>, per<strong>de</strong>r os direitos civis ou os direitos sociais, por exemplo,<br />

representa uma agressão para uma comunida<strong>de</strong> política assentada na igualda<strong>de</strong> e na liberda<strong>de</strong>, e sua<br />

reinserção política <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> dos acordos <strong>de</strong>liberativos estabelecidos entre os homens. Mas é com a perda<br />

fundamental <strong>de</strong> um lugar no mundo que se manifesta primariamente a perda dos direitos humanos. Per<strong>de</strong> os<br />

direitos humanos, para autora, significa <strong>de</strong>negar no espaço político a possibilida<strong>de</strong> dos indivíduos inserirem-<br />

se enquanto cidadãos qualificados política e juridicamente.<br />

“Algo mais fundamental do que a liberda<strong>de</strong> e a justiça, que são os direitos do cidadão, está em jogo<br />

quando <strong>de</strong>ixa <strong>de</strong> ser natural que um homem pertença à comunida<strong>de</strong> em que nasceu, e quando o não pertencer<br />

a ela não é um ato da sua livre escolha, ou quando está numa situação em que, a não ser que cometa um<br />

crime, receberá um tratamento in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>nte do que ele faça ou <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong> fazer. Esse extremo, e nada mais, é a<br />

situação dos que são privados dos seus direitos humanos. São privados não do seu direito à liberda<strong>de</strong>, mas do<br />

direito à ação; não do direito <strong>de</strong> pensarem o que quiserem, mas do direito <strong>de</strong> opinarem. Privilégios (em alguns<br />

casos), injustiças (na maioria das vezes), bênçãos ou ruínas lhes serão dados ao sabor do acaso e sem qualquer<br />

relação com o que fazem, fizeram ou venham a fazer.” 316<br />

Para <strong>Hannah</strong> <strong>Arendt</strong>, os direitos humanos supõem a cidadania <strong>de</strong> que se preten<strong>de</strong>m <strong>de</strong>sligados. A<br />

concepção jusnaturalista dos direitos humanos na medida em que encerrava na natureza do Homem tais<br />

direitos, ancorando-os no indivíduo in<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>ntemente da sua interação política, pressupunha uma<br />

representação do político exterior a <strong>de</strong>terminação <strong>de</strong>stes direitos, cuja finalida<strong>de</strong> se traduzia na conservação<br />

dos direitos naturais que encontravam seu fim no Homem mesmo 317 . Ao contrário, para <strong>Arendt</strong>, os direitos<br />

humanos pressupõem a cidadania política como um fato fundamental para a asserção dos direitos no plano<br />

prático-político, e é através da cidadania política que os direitos humanos são concebíveis. 318<br />

Sem a proteção <strong>de</strong> uma comunida<strong>de</strong> política não resta nenhuma garantia para os direitos humanos:<br />

apátridas e minorias sabiam que a perda dos direitos nacionais <strong>de</strong>senca<strong>de</strong>ava a perda dos direitos humanos.<br />

315 I<strong>de</strong>m, O <strong>de</strong>clínio do Estado-nação e o fim dos direitos do homem, In OT, p. 329.<br />

316 I<strong>de</strong>m, O <strong>de</strong>clínio do Estado-nação e o fim dos direitos do homem., In OT, p. 330.<br />

317 Ver C. LEFORT. Lefort dirige uma crítica às formulações marxistas e liberais que não concebem<br />

os direitos humanos a não ser como direitos dos indivíduos. Direitos do homem e política, In A<br />

Invenção Democrática – Os limites do Totalitarismo, p. 40. I<strong>de</strong>m, Os direitos do homem e o Estadoprovidência,<br />

In Pensando o político – ensaios sobre <strong>de</strong>mocracia, revolução e liberda<strong>de</strong>, p. 37-47.<br />

318 R. LEGROS, <strong>Hannah</strong> <strong>Arendt</strong>: une compréhension phénoménologique <strong>de</strong>s droits <strong>de</strong> l’homme, In<br />

Étu<strong>de</strong>s Phénoménologiques, 2 : 32-33.

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