Todo Cristão É Teólogo Roger E. Olson Um influente cristão ...
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<strong>Todo</strong> <strong>Cristão</strong> <strong>É</strong> <strong>Teólogo</strong><br />
<strong>Roger</strong> E. <strong>Olson</strong><br />
<strong>Um</strong> <strong>influente</strong> <strong>cristão</strong>, professor de Bíblia e pregador de rádio, ironizou: “Feliz é o <strong>cristão</strong> que nunca se<br />
encontrou com um teólogo!”. Que ele quis dizer? Não são poucos os mal-entendidos, estereótipos, mitos e<br />
falsas impressões que cercam a teologia – até mesmo nas comunidades cristãs. Na realidade, parece haver<br />
um preconceito crescente contra a teologia e os teólogos em alguns círculos <strong>cristão</strong>s.<br />
<strong>Todo</strong> teólogo sabe disso e sente-se frustrado com essa concepção negativa. Numa manhã de domingo, eu<br />
(<strong>Roger</strong>) cheguei a uma igreja para falar a uma classe de escola dominical de adultos sobre o tópico<br />
“Teologia do século XX” e recebi uma carta anônima enviada ao endereço da igreja, mas dirigida a mim. O<br />
remetente vira o anúncio da série de palestras na coluna da igreja no jornal da cidade e escreveu duas<br />
páginas com fortíssimas objeções. Lançava imprecações contra a teologia, dando a entender que ela não<br />
passa de um substituto precário ao relacionamento pessoal com Deus!<br />
<strong>Teólogo</strong>s Anônimos<br />
A impressionante ironia das afirmações do professor de Bíblia e da diatribe do autor da carta é esta: ambos<br />
são teólogos – cada um à sua maneira! Teologia é qualquer reflexão sobre as questões essenciais da vida<br />
que aponte para Deus. Por conseqüência, tanto o professor quanto o missivista são teólogos. Nós os<br />
chamaremos “teólogos anônimos”, porque, como a maioria das pessoas, não se dão conta de que o são.<br />
Ninguém que reflita sobre as perguntas cruciais da vida escapa de fazer teologia. E qualquer um que reflita<br />
sobre as questões fundamentais da vida – incluindo perguntas sobre Deus e nossa relação com ele – é<br />
teólogo.<br />
<strong>Um</strong>a jovem, sentada em meu escritório, compartilhava seus sonhos e aspirações. Depois de alguns estudos<br />
bíblicos e cursos teológicos, interessara-se em explorar melhor as questões acerca de Deus, da salvação e da<br />
vida cristã. Numa guinada crucial da conversa, ela fitou-me com algum receio nos olhos e disse: “Sabe,<br />
acho que gostaria de ser teóloga – se conseguir chegar lá!”.<br />
Descobri por trás do medo uma concepção errônea, que faz do teólogo uma criatura temível, preocupada<br />
apenas em elaborar pensamentos profundos e perturbadores, incompreensíveis à maioria das pessoas.<br />
Minha resposta tentava aliviar aquela ansiedade. Disse-lhe: “Você já é uma teóloga!”. Expliquei-lhe que ela<br />
poderia ser chamada por Deus para fazer carreira por essa trilha da existência cristã – refletir sobre as<br />
questões cruciais da vida, inclusive sobre Deus –, mas que atender ou não a esse chamado não mudaria sua<br />
condição de teóloga.<br />
Cresce entre os <strong>cristão</strong>s a concepção errônea de que existe um grande abismo entre “<strong>cristão</strong>s comuns” e<br />
“teólogos”. Para alguns, a percepção desse abismo gera medo; para outros, suspeita e ressentimento. <strong>É</strong><br />
nosso propósito fechar o vão e mostrar que cada pessoa – especialmente o <strong>cristão</strong> – é um teólogo e que o<br />
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profissional da teologia é simplesmente o <strong>cristão</strong> vocacionado para fazer o que de certa maneira fazem os<br />
demais <strong>cristão</strong>s: pensar e ensinar acerca de Deus.<br />
Ao longo deste livro, portanto, tentaremos mostrar duas coisas. Primeira: a teologia é inevitável ao <strong>cristão</strong><br />
que pensa, e a diferença entre teólogos profissionais ou não é apenas de posição, não de qualidade.<br />
Segunda: profissionais ou não, os teólogos (todos os <strong>cristão</strong>s que pensam, independentemente da<br />
denominação) precisam uns dos outros. <strong>Teólogo</strong>s profissionais existem para servir à comunidade de fé, não<br />
para ditar-lhe as crenças ou para dominá-la intelectualmente. Os teólogos leigos precisam dos profissionais,<br />
pois estes fornecem àqueles as ferramentas para o estudo da Bíblia, a perspectiva histórica e a articulação<br />
sistemática, meios que lhes permitem aprimorar a prática da teologia.<br />
O termo “teologia” é formado pela combinação de duas palavras gregas: theos, que significa “Deus”,<br />
e logos, que significa “razão”, “sabedoria” ou “pensamento”. Portanto, “teologia” significa literalmente<br />
“pensamento de Deus” ou “raciocinar sobre Deus”. Alguns dicionários, de modo mais formal e específico,<br />
a definem como “a ciência de Deus”. Nessa acepção, porém, “ciência” significa simplesmente “reflexão<br />
sobre algo”. Logo, no nível mais básico, “teologia” é qualquer pensamento que reflita ou contemple a<br />
realidade de Deus – até mesmo o debate sobre ele.<br />
Deus está presente em todas as questões básicas da vida. Sempre e em todo lugar que alguém reflete sobre<br />
os grandes porquês da vida, há pelo menos uma reflexão indireta acerca de Deus ou direcionada a ele. Deus<br />
é o horizonte de toda indagação humana. Isso significa que, de forma surpreendente, até mesmo autores<br />
populares, compositores, novelistas, poetas e as mentes criativas da cultura popular atuam como teólogos.<br />
<strong>Um</strong> exemplo eminente é o famoso cineasta e ator Woody Allen. Alguns de seus filmes estão centrados na<br />
psicologia. Muitos deles, porém, dão o mesmo tratamento à teologia. Em Crimes e Pecados, Allen explora a<br />
grande pergunta, repetidas vezes levantada pelo salmista: “Por que os maus prosperam e os íntegros<br />
sofrem?”. Embora não ocorra com freqüência a pergunta explícita acerca de Deus nesse filme, o tema<br />
“Deus” está implícito na pergunta aflitiva “Por quê?”. Por quê? Obviamente porque, não existindo Deus, a<br />
pergunta deixa de ser aflitiva! Por que afligir-se com algo que pode ser simplesmente uma lei natural – a<br />
assim chamada sobrevivência dos mais aptos? “Por que os maus prosperam e os íntegros sofrem?” somente<br />
será uma pergunta aflitiva se Deus for o horizonte derradeiro da existência humana. Em última análise,<br />
portanto, a pergunta é uma indagação acerca de Deus: “Por que Deus permite que essas coisas<br />
aconteçam?”. Woody Allen e outros teólogos anônimos da cultura popular levantam a questão, muitas<br />
vezes de modo surpreendente e proveitoso.<br />
Teologia de Cosmovisão<br />
Em determinado momento da vida, toda pessoa tem de defrontar e debater-se com questões que apontam<br />
para a pergunta fundamental acerca de Deus. Reconheçamos que nem todos a formulam explicitamente.<br />
Não obstante, até mesmo onde é ignorado ou negado, Deus continua sendo o último horizonte – pano de<br />
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fundo e alvo – em relação ao qual surgem e para o qual apontam todas as perguntas fundamentais da vida.<br />
Nesse sentido, toda pessoa reflexiva é um teólogo.<br />
<strong>Um</strong> modo de o iniciante captar a universalidade da teologia, portanto, é vê-la como a indagação e a reflexão<br />
sobre as perguntas fundamentais da vida. Arthur Holmes, professor de filosofia da Universidade de<br />
Wheaton, rotula essa teologia mais elementar e universal “teologia de cosmovisão” (visão de mundo). Ou<br />
seja, desde tempos imemoriais, pessoas comuns, homens e mulheres nas ruas e no mercado, bem como<br />
pensadores profissionais em suas torres de marfim, refletem sobre certas perguntas permanentes da vida.<br />
Em momentos menos meditativos, tais perguntas talvez soem tolas para muitos de nós. Por exemplo, um<br />
filósofo moderno argumenta que a pergunta mais importante de todas é: “Por que existe algo, ao invés de<br />
não existir nada?”. Contudo, até mesmo essa pergunta aparentemente abstrata e irrespondível possui certa<br />
atração, por ser simplesmente a expressão maior da indagação mais comum, que todo ser reflexivo levanta<br />
vez por outra: “Por que estou aqui?”. Outras perguntas cruciais da vida são: “Que devo fazer com minha<br />
existência?”; “Que é verdadeiramente viver bem?”; “Será que existe algo após a morte?”.<br />
A mais importante dentre as perguntas fundamentais da vida é aquela acerca de Deus, porque para ela<br />
apontam as demais. Se existe Deus – o Criador “do céu e da terra” –, então todas as outras interrogações<br />
adquirem significado novo e obtêm eventuais respostas, que de outro modo conduziriam somente a becos<br />
sem saída.<br />
A teologia de cosmovisão (visão de mundo) é comum a todas as pessoas que pensam, porque indagar das<br />
questões fundamentais da vida faz parte da existência humana. Isso poderia ser em si mesmo um indicativo<br />
de que existe Alguém além de nós.<br />
Teologia Cristã<br />
Que diremos, porém, sobre a teologia cristã? Iria além da teologia de sentido vago e genérico mencionada<br />
acima? Ela de fato faz isso. Como definir, então, de forma apropriada, a teologia cristã? <strong>Um</strong>a definição de<br />
longa data é “fé em busca de entendimento”. A despeito das interpretações equivocadas, a teologia cristã<br />
não diz: “Entenda e depois creia”. Pelo contrário, procura entender com o intelecto o que o coração – o<br />
cerne do caráter de uma pessoa – já crê e com o qual está comprometido.<br />
Essa definição de teologia remonta no mínimo ao grande teólogo medieval Anselmo de Cantuária. Anselmo<br />
foi monge, teólogo, filósofo e arcebispo de Cantuária no século XII. Ele é famoso por formular o que<br />
muitos supõem ser a prova racional perfeita da existência de Deus – o chamado argumento ontológico, cuja<br />
intenção é demonstrar, acima de qualquer dúvida possível, que Deus precisa existir, com base na definição<br />
de Deus como “o Ser, maior que o qual ninguém pode ser concebido”.<br />
Por causa de seus escritos, Anselmo conquistou a reputação imerecida de ser um racionalista radical –<br />
alguém que se recusava a crer em qualquer coisa que não pudesse ser provada. Na realidade, Anselmo<br />
escreveu a maioria de suas grandes obras, incluindo as versões do argumento ontológico acerca da<br />
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existência de Deus, em forma de oração! Numa dessas orações, deixou absolutamente claro que não estava<br />
tentando provar a existência de Deus para crer, mas porque já tinha fé. Seu lema era: Credo ut intelligam –<br />
“Creio para poder entender”.<br />
A fé em busca de entendimento, portanto, é um modo diferente de expressar o cerne da teologia em<br />
Anselmo. Iniciamos com a fé, que em última análise é um misterioso presente da graça. No entanto, isso<br />
não significa que a pessoa não exerça nenhum papel. Mas a fé é mais que simplesmente optar por acreditar<br />
em algo e com certeza mais que um substituto precário a bons argumentos. Fé é ser cativado por alguém –<br />
Alguém! – que convoque e reivindique nossa vida.<br />
<strong>É</strong> deste modo que a vida cristã começa: com graça e fé, não com a razão. A razão pode exercer um papel e<br />
ser um instrumento no chamado de Deus, no entanto ninguém se tomará <strong>cristão</strong> simplesmente por chegar ao<br />
fim de uma corrente puramente humana de argumentos e concluir: “Bem, penso que se quero ser racional<br />
tenho de acreditar em Deus e em Jesus Cristo”. Não, a gênese do cristianismo autêntico pode conter um<br />
processo racional, mas não pode ser reduzida a isso. Fé é o elemento misterioso que implica convicção<br />
pessoal, discernimento a partir de outra posição e coração transformado, que se inclina para Deus de<br />
maneira nova.<br />
Ligando a Teologia de Cosmovisão à Teologia Cristã<br />
Como conectar esses dois tipos de teologia – a que é própria dos que pensam (ou teologia de visão de<br />
mundo) e a que é comum a todos os <strong>cristão</strong>s? Parece que as questões fundamentais da vida servem como<br />
sinais ou pistas de transcendência. Ou seja, apontam para cima, para algo ou alguém atrás da existência<br />
finita da criatura. Podemos denominar “a busca da humanidade por Deus” o processo e a prática de refletir<br />
sobre as perguntas mais importantes da vida. <strong>É</strong> uma procura universal que se mostrará sempre frustrada, a<br />
menos que essa busca se torne “Deus procurando pela humanidade”.<br />
Os <strong>cristão</strong>s acreditam que foi exatamente isso que aconteceu na história narrada pela Bíblia. Deus começou<br />
a enviar respostas às indagações humanas por intermédio de eventos históricos, grupos de pessoas, profetas,<br />
mensagens inspiradas e finalmente pela vinda de Deus em pessoa para conviver com os seres humanos. Os<br />
<strong>cristão</strong>s crêem que a narrativa bíblica responde às perguntas fundamentais da vida. Recebê-las e reconhecêlas<br />
como Palavra de Deus, todavia, são obras da graça de Deus e decorrência da fé. Por fim, reconhecer a<br />
Deus não é somente uma descoberta filosófica, embora a pessoa possa se abrir primeiro a Deus e à sua<br />
palavra, reconhecendo a correlação entre as respostas ali encontradas e as perguntas fundamentais e perenes<br />
da vida.<br />
Este é o motivo por que a teologia cristã é superior à teologia de cosmovisão: a primeira completa e<br />
consuma a segunda. O <strong>cristão</strong>, portanto, não é apenas um teólogo limitado à reflexão sobre as perguntas<br />
cruciais da vida, como Woody Allen, e sim alguém capaz de refletir sobre o significado da Palavra de Deus<br />
e sobre como ela ilumina a vida, conferindo sentido e propósito à existência.<br />
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A fé cristã autêntica leva-nos a gravitar em torno do entendimento desse Deus que reivindicou nossa vida<br />
para si. E, à medida que procura entender o significado da fé para responder às perguntas extremas da vida<br />
ou simplesmente às questões básicas sobre o relacionamento com Deus, o <strong>cristão</strong> já faz teologia.<br />
Logo, você é um teólogo <strong>cristão</strong>. Talvez nunca tenha pensado desse modo, por considerar a teologia<br />
misteriosa ou mesmo perigosa. Muitos <strong>cristão</strong>s julgam erroneamente que a teologia consiste em interrogar a<br />
Deus ou em questionar a autoridade da Bíblia e daí concluem que a teologia é uma ameaça à fé. Talvez<br />
você tenha sofrido com esse equívoco ou conheça alguém que sofreu. Talvez você tenha sido advertido por<br />
um <strong>cristão</strong> bem intencionado a tomar cuidado com o estudo da teologia “porque ela pode destruir sua fé”.<br />
As advertências desestimulantes partem da família e dos amigos. Alguns de nossos mentores espirituais<br />
tentaram nos dissuadir do estudo da teologia impelidos pelo preconceito profundamente arraigado que a<br />
considera substituto da fé. Estamos felizes por haver superado essas objeções, porque para nós a teologia<br />
foi e continua sendo o estudo libertador e enriquecedor que nos aproxima cada vez mais de Deus.<br />
Níveis de Teologia na Prática<br />
Até aqui afirmamos que todo ser humano é teólogo e que todo <strong>cristão</strong> é ou deveria ser teólogo <strong>cristão</strong>. A<br />
forma como definimos teologia, teólogo e teólogo <strong>cristão</strong> pode dar a entender que embaralhamos as cartas a<br />
favor de nosso argumento. Mas não manipulamos as palavras. Pelo contrário, tentamos mostrar que há<br />
níveis distintos de teologia. <strong>Todo</strong> <strong>cristão</strong> pode ser teólogo, mas nem por isso as teologias se tomam iguais.<br />
Analisaremos os diferentes tipos e níveis de teologia no próximo capítulo, mas por ora fará bem antecipar<br />
algo dessa discussão.<br />
Para esclarecer o pressuposto de que toda pessoa é teólogo, recorreremos a algumas analogias. Você<br />
acreditaria se disséssemos que todo cidadão é químico? Cientista político? Psicólogo? Matemático?<br />
Qualquer um que cozinhe utilizando receitas é, em certo sentido, químico. Sem conhecimento rudimentar –<br />
pelo menos intuitivo – de substâncias, medidas, combinações e efeitos de temperaturas, jamais<br />
conseguiríamos cozinhar nada.<br />
Cozinhar, portanto, é talvez a forma mais básica de química leiga. Imagine agora o cozinheiro amador que<br />
decida melhorar suas habilidades para satisfazer o paladar dos convidados com delícias da culinária. O<br />
caminho mais seguro e acertado é fazer um curso e ler alguns livros. O cozinheiro torna-se chefe de cozinha<br />
desenvolvendo suas habilidades e seu conhecimento de química. Obviamente isso ainda está muito distante<br />
da ciência química tal como é estudada e praticada nos laboratórios universitários! Não obstante, há certa<br />
continuidade entre a prática do cozinheiro nas artes culinárias e a ciência do químico.<br />
Qualquer cidadão que participe de uma assembleia da cidade, de uma reunião com a direção da escola ou<br />
da convenção de seu partido é cientista político. Suponhamos que o eleitor instruído decida candidatar-se<br />
ao conselho escolar. No processo, ele necessariamente afiará seu conhecimento e sua habilidade para a<br />
prática da ciência política. Talvez leia bons livros sobre teoria política e daí desenvolva a filosofia<br />
da polis (“comunidade”). Sem dúvida, isso está muito longe da disciplina altamente teórica e às vezes<br />
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especulativa tal como ensinada nas universidades. Não obstante, há continuidade real entre o envolvimento<br />
do participante informado acerca de política partidária e as teorias do cientista político.<br />
Analogias idênticas podem ser estabelecidas nas áreas da psicologia e da matemática. De algum modo, cada<br />
um de nós é psicólogo amador. Mas sempre que alguém decide ir além da interpretação intuitiva de sonhos<br />
e investigar o funcionamento do subconsciente, ele caminha em direção à ciência da psicologia. Controlar<br />
um talão de cheques constitui-se uma forma rudimentar de matemática, embora haja obviamente águas bem<br />
mais profundas a serem atravessadas por quem optar por ela.<br />
Suponha que você ouviu um cozinheiro amador queixar-se da ciência formal da química por não ser<br />
possível praticá-la exaustivamente na cozinha, por demandar ferramentas especializadas, vocabulário e<br />
conceitos em geral encontrados apenas em laboratórios bem equipados e bibliotecas: “Feliz é o cozinheiro<br />
que nunca se encontrou com um químico!”. Absurdo? Sem dúvida.<br />
Imagine que você escutou o delegado de uma convenção política do bairro queixar-se dos cientistas<br />
políticos pelo fato de suas teorias serem difíceis de entender e “tirarem a vitalidade da política”. Suponha<br />
que o intérprete leigo de sonhos reclame dos psicólogos por serem tão intelectuais, ou imagine o caixa de<br />
banco criticando a matemática por ser abstrata. <strong>Todo</strong>s esses absurdos podem acontecer – e talvez<br />
aconteçam! Mas a maioria das pessoas franziria a testa e diria algo como: “Sabe, você poderia ser um<br />
cozinheiro melhor se conhecesse um pouco mais de química e equipasse melhor sua cozinha” ou: “Lidar<br />
com dinheiro pode ser mais divertido que a matemática, mas sem ela você prejudicará os clientes ou o<br />
banco”.<br />
Nosso argumento é óbvio: “Pelo fato de crerem em Deus e acreditarem que ele se relaciona com eles de<br />
diversas maneiras (pela Palavra, pela graça, pela fé, pela oração etc.), os <strong>cristão</strong>s fariam bem em<br />
aprofundar-se no significado de Deus e em tentar conhecê-lo da forma mais completa possível, com todas<br />
as forças de seu ser – tanto com a mente quanto com o coração. Deveriam reconhecer que são teólogos<br />
leigos e valorizar a ajuda recebida da teologia formal. <strong>É</strong> óbvio que, como teólogos profissionais, admitimos<br />
que o verdadeiro motivo de nossa profissão é ajudar <strong>cristão</strong>s ordenados ou não a aumentar sua compreensão<br />
acerca de Deus. A continuidade e a correlação deveriam substituir a hostilidade, o medo ou a suspeita entre<br />
teólogos leigos e profissionais. Na descoberta da verdade acerca de Deus e de seu relacionamento conosco<br />
eles são interdependentes e trazem benefícios um ao outro.<br />
O título deste livro é uma pergunta: Quem precisa de teologia? A resposta que elaboramos de ponta a ponta<br />
é semelhante à que poderia aparecer num livro análogo intitulado Quem precisa de química?, direcionado a<br />
cozinheiros e donas de casa. Podemos imaginar outro livro, Quem precisa de psicologia?, destinado a<br />
pessoas que buscam compreender a si mesmas.Quem precisa de matemática? poderia ser um bom livro para<br />
caixas de banco, escriturários e contadores. A resposta à pergunta expressa no título de cada livro seria a<br />
mesma: todo o mundo!<br />
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Cada uma dessas obras provavelmente salientaria que todo leitor já é químico ou psicólogo ou matemático<br />
– em algum nível. E é provável que os leitores respondessem com entusiasmo a essa declaração.<br />
Nossa esperança é que você responda entusiasticamente à declaração de que já é teólogo – e que até mesmo<br />
ela o atinja como um choque. Obviamente, não pretendemos afirmar que você já é ou será um teólogo<br />
profissional – nem todos devem sê-lo. <strong>É</strong> nosso desejo, porém, que, ao perceber que é teólogo, você resista<br />
às alegações, mesmo as provenientes de <strong>cristão</strong>s devotos, que tentam convencê-lo de que a teologia é<br />
nociva ou simplesmente um devaneio ou ainda uma ameaça à verdadeira fé.<br />
Agora, porém, transportamo-nos da teologia em sentido mais geral para a teologia em “sua melhor forma”.<br />
O que se pretende ao discorrer sobre diferentes tipos e níveis de teologia e sustentar que nem todas as<br />
teologias são iguais? Essas são as questões sobre as quais nos debruçaremos em seguida.<br />
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