o uso do princípio dos interesses coincidentes na motivação ... - UFV
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FABRÍCIO EDUARDO JACOB<br />
O USO DO PRINCÍPIO DOS INTERESSES COINCIDENTES NA<br />
MOTIVAÇÃO DE TRABALHADORES DE TELEMARKETING – UMA<br />
ABORDAGEM BEHAVIORISTA<br />
Trabalho apresenta<strong>do</strong> ao Departamento de<br />
Engenharia Elétrica e de Produção da<br />
Universidade Federal de Viçosa como parte<br />
das exigências para a conclusão <strong>do</strong> curso de<br />
Engenharia de Produção.<br />
Orienta<strong>do</strong>r<br />
Prof. Eduar<strong>do</strong> Simonini Lopes<br />
VIÇOSA<br />
MINAS GERAIS - BRASIL<br />
2006
Sumário<br />
Sumário..............................................................................................................................1<br />
2. Revisão de Literatura.....................................................................................................4<br />
2.1 O estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> comportamento................................................................................... 4<br />
2.1.2 A modelagem <strong>do</strong> comportamento.................................................................... 6<br />
2.1.3 Limitações <strong>do</strong> Behaviorismo........................................................................... 7<br />
2.2 O <strong>princípio</strong> <strong>do</strong>s <strong>interesses</strong> <strong>coincidentes</strong>.................................................................. 8<br />
3. Meto<strong>do</strong>logia...................................................................................................................9<br />
3.1 Embasamento meto<strong>do</strong>lógico .................................................................................. 9<br />
3.2 Execução meto<strong>do</strong>lógica........................................................................................ 10<br />
3.2.1 Entrevista<strong>do</strong>s ................................................................................................. 11<br />
4. Resulta<strong>do</strong>s....................................................................................................................11<br />
4.1 Ganho ................................................................................................................... 11<br />
4.2 Sistema de premiação e punições:........................................................................ 12<br />
4.2.1 Informações gerais......................................................................................... 12<br />
4.2.2 Sistemas de pagamento da empresa .............................................................. 12<br />
4.2.3 Sistema atual.................................................................................................. 13<br />
4.2.3.1 Premiação ................................................................................................... 13<br />
4.2.3.2 Pagamento .................................................................................................. 14<br />
4.2.3.2 Punições...................................................................................................... 15<br />
4.2.4 Outros ............................................................................................................ 17<br />
4.2.5 Dan<strong>do</strong> voz às entrevistadas............................................................................ 18<br />
5. Discussão.....................................................................................................................20<br />
6. Conclusão ....................................................................................................................22<br />
7. Referências bibliográficas ...........................................................................................23
JACOB, Fabrício Eduar<strong>do</strong>. O <strong>uso</strong> <strong>do</strong> Princípio <strong>do</strong>s Interesses Coincidentes <strong>na</strong><br />
<strong>motivação</strong> de trabalha<strong>do</strong>res de Telemarketing – uma abordagem Behaviorista.<br />
2006, 23f.. Trabalho de Graduação (Curso de Engenharia de Produção) – Universidade<br />
Federal de Viçosa.<br />
Resumo<br />
Este trabalho teve como objetivo estudar o sistema de <strong>motivação</strong> de uma<br />
empresa no seu setor de telemarketing passivo, usan<strong>do</strong> como referencial teórico a<br />
psicologia Behaviorista e o <strong>princípio</strong> denomi<strong>na</strong><strong>do</strong> “Interesses Coincidentes”.<br />
Foram realizadas entrevistas com trabalha<strong>do</strong>ras desta empresa, com o objetivo<br />
de se estudar o seu sistema de premiações e punições, ao mesmo tempo que se estudava<br />
o seu impacto sobre o comportamento destas profissio<strong>na</strong>is.<br />
Concluiu-se que, apesar da empresa apresentar alguns aspectos positivos nos<br />
seus sistemas, esta necessita de um melhor embasamento teórico para a formulação<br />
destes, pois eles podem incentivar comportamentos não interessantes para a mesma.<br />
Além disso, mudanças <strong>na</strong>s regras com o objetivo de diminuir o nível de estresse <strong>do</strong><br />
ambiente de trabalho se apresentam urgentes para melhorar a qualidade de vida <strong>na</strong><br />
empresa e reduzir a rotatividade de pessoal.<br />
2
1. Introdução<br />
"Fator humano" é a expressão usada por engenheiros e projetistas pra desig<strong>na</strong>r o<br />
comportamento de pessoas no trabalho. É frequentemente invoca<strong>do</strong> <strong>na</strong>s análises de<br />
catastrofes e acidentes. Em geral, está associa<strong>do</strong> a idéia de erro. Prova disso, é a<br />
frequência com que ouvimos o termo “falha huma<strong>na</strong>” quan<strong>do</strong> algo não sai como<br />
deveria. Essa concepção muitas vezes leva a perpectivas de pensar o humano como<br />
sen<strong>do</strong> um incômo<strong>do</strong> que deveria ser substituí<strong>do</strong> pela atividade “precisa”das máqui<strong>na</strong>s.<br />
Porém, <strong>na</strong>da é mais fundamental <strong>na</strong> atividade produtiva <strong>do</strong> que o indivíduo, por mais<br />
tecnologicamente apurada que seja a atividade. Máqui<strong>na</strong>s são incapazes de improvisar e<br />
ter um comportamento criativo frente ao imprevisível. Infelizmente, ainda existe um<br />
grande número de empresas que não perceberam a importância <strong>do</strong> indivíduo para a<br />
realização <strong>do</strong>s objetivos da organização.<br />
Neste cenário, estu<strong>do</strong>s com o objetivo de auxiliar a implementação de méto<strong>do</strong>s<br />
gerenciais que tenham o indivíduo em foco podem ser de grande importância para o<br />
desenvolvimento das empresas. Muito mais que meras políticas de Recursos Humanos,<br />
a empresa necessita possuir regras e príncipios gerenciais que motivem o indivíduo a<br />
buscar dar o melhor de si no seu trabalho. Para tanto, é necessário muitas vezes que o<br />
trabalha<strong>do</strong>r, quan<strong>do</strong> busca fazer o melhor para si, também esteja buscan<strong>do</strong> o melhor<br />
para a empresa em que trabalha. Esta é a base de um <strong>princípio</strong> que aqui nomeamos de<br />
<strong>princípio</strong> <strong>do</strong>s intesses <strong>coincidentes</strong>. Baixa produtividade, custos eleva<strong>do</strong>s, falhas no<br />
controle de qualidade, muitas vezes são causadas por funcionários que por diversos<br />
motivos (raiva, frustração, baixa auto-estima, etc) não se sentem identifica<strong>do</strong>s com a<br />
empresa em que trabalham.<br />
Desta forma, é necessário conhecer as necessidades huma<strong>na</strong>s para melhor<br />
compreender o comportamento <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res, e assim, utilizar a <strong>motivação</strong> como<br />
poderoso meio para melhorar a eficiência das organizações. Do contrário, corre-se o<br />
risco de se criar ações que, ao invés de auxiliar <strong>na</strong> <strong>motivação</strong> <strong>do</strong> funcionário, premiam<br />
um comportamento que não é interessante para a empresa ou punem um que deveria ser<br />
incentiva<strong>do</strong>. Um exemplo disto é quan<strong>do</strong> aquele que se esforça é “puni<strong>do</strong>” com<br />
aumento de encargos em lugar de ser premia<strong>do</strong> com reconhecimento.Bem depressa, os<br />
trabalha<strong>do</strong>res daquela empresa poderão concluir que o esforço não compensa.<br />
O objetivo deste trabalho é a<strong>na</strong>lisar políticas de pessoal (bonificações,<br />
demissões, participação nos lucros, punições, elogios, atribuição de metas e outros<br />
3
afins) em uma empresa, ten<strong>do</strong> como principal referencial teórico o trabalho <strong>do</strong><br />
psicólogo americano B. F. Skinner, sobre reforçamento humano. A teoria de Skinner é<br />
conhecida como comportamentalismo ou Behaviorismo, e se dedica ao estu<strong>do</strong> <strong>do</strong><br />
comportamento observável, não o encaran<strong>do</strong> como uma ação isolada de um sujeito,<br />
mas, sim, como uma interação entre aquilo que o sujeito faz e o ambiente onde o seu<br />
“fazer” acontece. Portanto, o Behaviorismo dedica-se ao estu<strong>do</strong> das interações entre o<br />
indivíduo e o ambiente, estudan<strong>do</strong> as ações <strong>do</strong> indivíduo (suas respostas) a um ambiente<br />
reforça<strong>do</strong>r.<br />
Pretende-se ainda pesquisar formas de melhoria das políticas encontradas e<br />
estudar o efeito de tais modificações sobre o comportamento <strong>do</strong>s emprega<strong>do</strong>s e suas<br />
consequências sobre o desempenho da empresa.<br />
2. Revisão de Literatura<br />
2.1 O estu<strong>do</strong> <strong>do</strong> comportamento<br />
Muito antes de ser o psicólogo mais influente <strong>do</strong>s Esta<strong>do</strong>s Uni<strong>do</strong>s, Burrhus<br />
Frederic Skinner (1904 – 1990) decidiu ser escritor. Formou-se no Hamilton College em<br />
Inglês, e, após a formatura, passou um ano infeliz, tentan<strong>do</strong> imagi<strong>na</strong>r o que fazer de sua<br />
vida, enfrentan<strong>do</strong> uma crise de identidade. Descobriu, então, o behaviorismo, o qual<br />
relatou mais tarde em sua autobiografia:<br />
“O behaviorismo ofereceu-me outra saída: Não era eu, mas minha<br />
história que falhara... Aprendi a aceitar meus erros remeten<strong>do</strong>-os a<br />
uma história pessoal não criada por mim e que não poderia ser<br />
mudada”. (Skinner, 1983: 407)<br />
O que Skinner disse com essa afirmação foi que o ambiente interfere diretamente<br />
<strong>na</strong>s ações <strong>do</strong> indivíduo, ou seja, as suas ações não foram baseadas ape<strong>na</strong>s <strong>na</strong>s suas<br />
próprias decisões, como também <strong>na</strong> influência de to<strong>do</strong> o meio a sua volta.<br />
No cotidiano, não se nega a importância <strong>do</strong> mun<strong>do</strong> que nos cerca. Podemos<br />
discordar quanto à <strong>na</strong>tureza ou à extensão <strong>do</strong> controle que o ambiente mantém sobre<br />
nós, mas que existe algum controle, é evidente. Quan<strong>do</strong> numa situação corriqueira uma<br />
pessoa diz para outra: “-Fique quieto, aqui não é lugar disso”, está claramente evocan<strong>do</strong><br />
este pensamento.<br />
Ora, mas se realmente o ambiente condicio<strong>na</strong> o comportamento, então<br />
poderemos interferir no comportamento, através da ação sob o ambiente.<br />
4
Frequentemente, estamos mudan<strong>do</strong> o ambiente com o objetivo de alterar um<br />
determi<strong>na</strong><strong>do</strong> comportamento, como quan<strong>do</strong> desligamos a TV para a criança <strong>do</strong>rmir, ou<br />
quan<strong>do</strong> se proíbe o consumo de alcóol em determi<strong>na</strong><strong>do</strong>s ambientes para se evitar certos<br />
“desvios de conduta”. Todavia, essas ações se baseiam ape<strong>na</strong>s <strong>na</strong> experiência prévia e<br />
não possuem nenhum tipo de rigor científico. Mesmo a ciência as vezes ignora esse<br />
poder <strong>do</strong> ambiente sobre o comportamento:<br />
“Muitas teorias <strong>do</strong> comportamento humano, não obstante,<br />
menoscabam ou ignoram a ação <strong>do</strong> ambiente. O contato entre o<br />
organismo e o seu mun<strong>do</strong> fica totalmente despreza<strong>do</strong> ou, quan<strong>do</strong><br />
muito, descrito casualmente.” (SKINNER, 1994: 132).<br />
O Behaviorismo de Skinner tem influencia<strong>do</strong> muitos psicólogos americanos e de<br />
vários países onde a psicologia america<strong>na</strong> tem grande penetração, como o Brasil. A base<br />
desta corrente é o comportamento operante. Este e outros termos estão discrimi<strong>na</strong><strong>do</strong>s<br />
abaixo:<br />
Comportamento operante: é comportamento voluntário e abrange uma<br />
quantidade muito maior da atividade huma<strong>na</strong>. Desde os comportamentos <strong>do</strong><br />
bebê de balbuciar e agarrar objetos, até os comportamentos mais sofistica<strong>do</strong>s de<br />
um adulto. Inclui todas as ações de um organismo <strong>do</strong>s quais se possa dizer que<br />
têm um efeito sobre o mun<strong>do</strong> ao re<strong>do</strong>r.<br />
Estímulo: qualquer evento que atua sobre um organismo.<br />
Resposta: qualquer comportamento emiti<strong>do</strong> pelo organismo devi<strong>do</strong> a um<br />
estímulo.<br />
Comportamento reflexo: é o comportamento não voluntário e inclui as<br />
respostas que são eliciadas por modificações de estímulos <strong>do</strong> ambiente. Por<br />
exemplo, a contração das pupilas, quan<strong>do</strong> uma luz forte incide sobre os olhos; o<br />
arrepio da pele, quan<strong>do</strong> um ar frio nos atinge, etc.<br />
Extinção é a remoção <strong>do</strong> comportamento de um indivíduo. Ocorre <strong>na</strong> ausência<br />
<strong>do</strong> reforço adequa<strong>do</strong>. Exemplo cotidiano é quan<strong>do</strong> se deixa de telefo<strong>na</strong>r a<br />
alguém após várias chamadas, se o telefone não atende.<br />
Punição: consiste <strong>na</strong> aplicação de estímulos aversivos imediatamente após o<br />
comportamento indesejável. Eventualmente, a retirada <strong>do</strong> reforço positivo pode<br />
se constituir como punição.<br />
Fuga: diante de uma estimulação aversiva, o indivíduo tenta desligar-se da vida<br />
real, para não encarar tal estímulo.<br />
5
Esquiva: comportar-se de forma a evitar um estímulo aversivo, como obedecer<br />
a ordens para não ser castiga<strong>do</strong>.<br />
Reforço: Os comportamentos são fortaleci<strong>do</strong>s ou enfraqueci<strong>do</strong>s de mo<strong>do</strong> a<br />
aumentar ou diminuir a probabilidade de sua ocorrência. As conseqüências que<br />
fortaleceram o comportamento são chamadas reforço. O papel <strong>do</strong> reforço é<br />
tor<strong>na</strong>r freqüente uma resposta no comportamento <strong>do</strong> indivíduo, garantir a<br />
manutenção dessa resposta, ou evitar a extinção da mesma.<br />
O reforço é o aspecto mais importante <strong>na</strong> modelagem de comportamento, para<br />
usá-lo de forma eficiente, é necessário se trabalhar com questões como a quantidade de<br />
reforço para cada reação, o número de reforços, a demora <strong>do</strong> reforço, entre outros. Para<br />
um condicio<strong>na</strong>mento ideal, o reforço deve ocorrer imediatamente após as respostas.<br />
2.1.2 A modelagem <strong>do</strong> comportamento<br />
Através da manipulação de reforços, é possível modelar comportamentos. Longe<br />
de ser uma coisa distante da realidade, é algo que acontece em maior ou menor grau no<br />
dia a dia. Quan<strong>do</strong> se diz que uma criança é “muito mimada”, claramente se está<br />
afirman<strong>do</strong> uma modelagem de comportamento, neste caso devi<strong>do</strong> a uma educação com<br />
excessivo reforço positivo e pouca frustação. Com o <strong>uso</strong> de conhecimentos de<br />
psicologia, planejamento e objetivos claros é possível se conseguir no controle <strong>do</strong> <strong>uso</strong><br />
de reforços, resulta<strong>do</strong>s eficientes. Para Skinner:<br />
“O condicio<strong>na</strong>mento operante modela o comportamento como o<br />
escultor modela a argila. Ainda que algumas vezes o escultor pareça<br />
ter produzi<strong>do</strong> um objeto inteiramente novo, é sempre possível seguir o<br />
processo retroativamente até a massa origi<strong>na</strong>l indiferenciada e fazer<br />
que os estágios sucessivos, através <strong>do</strong>s quais retor<strong>na</strong>mos a essa<br />
condição sejam tão pequenos quanto quisermos. Em nenhum ponto<br />
emerge algo que seja muito diferente <strong>do</strong> que o precedeu. O produto<br />
fi<strong>na</strong>l parece ter uma especial unidade ou integridade de<br />
planejamento, mas não se pode encontrar o ponto em que ela<br />
repenti<strong>na</strong>mente apareça. No mesmo senti<strong>do</strong>, um operante não é algo<br />
que surja totalmente desenvolvi<strong>do</strong> no comportamento <strong>do</strong> organismo.<br />
É o resulta<strong>do</strong> de um contínuo processo de modelagem.” (SKINNER,<br />
1994:98).<br />
O processo de modelagem basicamente se constitui nos seguintes<br />
procedimentos:<br />
• Determi<strong>na</strong>r objetivamente o comportamento a ser condicio<strong>na</strong><strong>do</strong>.<br />
6
• Observar quantas vezes o comportamento a ser condicio<strong>na</strong><strong>do</strong> é emiti<strong>do</strong><br />
pelo indivíduo, em determi<strong>na</strong><strong>do</strong> espaço de tempo defini<strong>do</strong> pelo<br />
experimenta<strong>do</strong>r.<br />
• Escolher o tipo de reforço e os esquemas de reforços a serem utiliza<strong>do</strong>s<br />
<strong>na</strong> modelagem.<br />
• Verificar, após o processo de modelagem, se o comportamento desejável<br />
passou a ser ocorrer numa freqüência maior, se comparada a freqüência<br />
observada no início <strong>do</strong> condicio<strong>na</strong>mento.<br />
2.1.3 Limitações <strong>do</strong> Behaviorismo<br />
A teoria comportamentalista reflete uma concepção empírica <strong>do</strong> comportamento,<br />
uma vez que seu pressuposto básico é o de que forças exter<strong>na</strong>s ao indivíduo são os<br />
determi<strong>na</strong>ntes principais de seu comportamento, sen<strong>do</strong> este reduzi<strong>do</strong> ape<strong>na</strong>s aos seus<br />
aspectos observáveis. Nessa concepção, qualquer comportamento pode ser previsto,<br />
desde que se estabeleçam relações funcio<strong>na</strong>is com o meio. O ser humano seria fruto de<br />
uma modelagem, resultante de associações entre estímulos e respostas ocorridas ao<br />
longo de sua existência. Tais associações implementam comportamentos, geram<br />
atitudes, conceitos, preconceitos e valores. A teoria comportamentalista, não esclarece<br />
processos mais amplos, como a formação das funções psicológicas superiores <strong>do</strong><br />
homem, tampouco trabalha com qualquer aspecto <strong>do</strong> inconsciente humano. Todavia, se<br />
adapta perfeitamente aos objetivos deste trabalho, que tem como intuito trabalhar<br />
ape<strong>na</strong>s sobre o comportamento observável <strong>do</strong>s funcionários em seu ambiente de<br />
trabalho.<br />
Por outro la<strong>do</strong>, até que ponto é possível conseguir se modelar o comportamento?<br />
Evidentemente, é muito difícil conseguir efetuar grandes alterações no ambiente para se<br />
conseguir grandes mudanças <strong>do</strong> comportamento das pessoas. É isto que o governo tenta<br />
fazer, quan<strong>do</strong> cria uma nova lei para coibir ou incentivar uma certa prática da população<br />
ou de parte dela. Por exemplo, quan<strong>do</strong> aumenta os impostos sobre o Cigarro para<br />
diminuir o consumo <strong>do</strong> mesmo. Todavia, <strong>na</strong>s empresas tem-se um ambiente<br />
relativamente fecha<strong>do</strong>, onde se pode definir valores e regras próprias. Assim, pode-se<br />
lançar mão de diversos recursos para se obter um certo grau de controle sobre o<br />
ambiente e sobre o comportamento <strong>do</strong>s indivíduos inseri<strong>do</strong>s no mesmo.<br />
7
2.2 O <strong>princípio</strong> <strong>do</strong>s <strong>interesses</strong> <strong>coincidentes</strong><br />
Neste ponto, chegamos à seguinte questão: Como definir quais as ações a serem<br />
executadas sobre o ambiente? Chalegre esclarece que:<br />
Este ainda afirma:<br />
“Conduzir seres humanos significa dar a eles objetivos comuns.<br />
Desencorajar as lutas inter<strong>na</strong>s. Premiar as condutas adequadas,<br />
punir as prejudiciais aos objetivos”. Em outras palavras, devemos<br />
trabalhar com o <strong>princípio</strong> <strong>do</strong>s <strong>interesses</strong> <strong>coincidentes</strong>. Este é “um<br />
<strong>princípio</strong> <strong>do</strong> gerenciamento humano, que diz que as pessoas só agem<br />
<strong>na</strong> mesma direção se os seus interessem coincidem. Portanto,<br />
<strong>interesses</strong> divergentes geram comportamento conflitante. Interesses<br />
convergentes geram espírito de equipe, esforços foca<strong>do</strong>s, resulta<strong>do</strong>s<br />
muito melhores”. (CHALEGRE, 2001: 8)<br />
“Sua aplicação inteligente pode melhorar muito a rentabilidade da<br />
empresa e, com ela, a satisfação daqueles que ali se encontram.”<br />
(CHALEGRE, 2001: 9).<br />
Assim, antes de mais <strong>na</strong>da, o autor acima apresenta<strong>do</strong> defende que a empresa<br />
deve definir claramente quais são os seus objetivos (e assim definir os objetivos da<br />
modelagem, a primeira etapa para a execução desta). Em seguida, as políticas inter<strong>na</strong>s<br />
devem ser elaboradas de forma que não produza <strong>interesses</strong> divergentes entre entre ela e<br />
os trabalha<strong>do</strong>res (em outras palavras, escolher o tipo de reforço e os esquemas de<br />
reforços a serem usa<strong>do</strong>s). Apesar desta questão parecer relativamente simples, muitas<br />
empresas <strong>na</strong> prática não se encontram sensíveis a questão. O caso comenta<strong>do</strong> abaixo<br />
ilustra essa questão:<br />
“Em uma grande indústria, foi cria<strong>do</strong>, pela logística, um modelo<br />
econômico de entrega. Ele partia <strong>do</strong> <strong>princípio</strong> de que um lote único de<br />
merca<strong>do</strong>ria sain<strong>do</strong> diretamente da fábrica e desti<strong>na</strong><strong>do</strong> a um varejista,<br />
evitaria que fosse descarrega<strong>do</strong> em um depósito de filial. Se<br />
descarrega<strong>do</strong>, manipula<strong>do</strong> novamente e reembarca<strong>do</strong>, seriam<br />
acrescenta<strong>do</strong>s custos de operação e de armaze<strong>na</strong>gem. A entrega<br />
direta, ou com um único transbor<strong>do</strong> <strong>na</strong> <strong>do</strong>ca, sem adentrar ao<br />
estoque, significava poder cobrar um preço mais baixo <strong>do</strong> varejista.<br />
O conceito era <strong>do</strong> interesse de to<strong>do</strong>s. Entretanto, alguém teve a idéia<br />
de reduzir também os custos de venda. Assim, a comissão foi reduzida<br />
para 1/3 <strong>do</strong> normal sobre essas operações. Ocorreu que o pessoal de<br />
vendas, embora trei<strong>na</strong><strong>do</strong> e incentiva<strong>do</strong> verbalmente, passou<br />
imediatamente a evitar qualquer negócio desse tipo. Pre<strong>do</strong>minou a<br />
idéia de que se o pessoal vendesse parcela<strong>do</strong>, passan<strong>do</strong> pelo estoque,<br />
cobran<strong>do</strong> mais <strong>do</strong> cliente, ganharia três vezes mais. Como diria um<br />
deles:<br />
- Por que vou trabalhar contra mim mesmo? Minha família está<br />
esperan<strong>do</strong> em casa pelo dinheiro que eu ganho.” (CHALEGRE, 2001:<br />
29).<br />
8
Este é um típico caso onde o cria<strong>do</strong>r da regra de remuneração esquece-se <strong>do</strong><br />
<strong>princípio</strong> <strong>do</strong>s <strong>interesses</strong> <strong>coincidentes</strong>. O que ele criou foi um sistema sob medida para<br />
desestimular a venda que a logística havia concebi<strong>do</strong>. Estava tu<strong>do</strong> certo, menos a regra<br />
de pagamento para os responsáveis por fazer com que os negócios tivessem êxito.<br />
A<strong>na</strong>lisan<strong>do</strong> este caso sob a ótica behaviorista, percebemos que não houve uma<br />
modelagem adequada, ou seja, o comportamento reforça<strong>do</strong> era o prejudicial a empresa,<br />
onde o reforço era a comissão integral e o comportamento reforça<strong>do</strong> foi o de vender<br />
parcela<strong>do</strong>, justamente o que era menos vantajoso para a empresa.<br />
Para o estabelecimento de metas, é preciso que a empresa se faça algumas<br />
perguntas. O interesse da empresa é exatamente igual ao comportamento que será<br />
incentiva<strong>do</strong>? Outros departamentos da empresa têm metas que conflitam com essas que<br />
estão sen<strong>do</strong> criadas? Do contrário, pode-se provocar comportamentos de disputa, onde<br />
para um ganhar outro tem de perder. Serão criadas forças destrui<strong>do</strong>ras e conflitos<br />
internos infindáveis. Quan<strong>do</strong> isto acontece, a administração muitas vezes alega que são<br />
os funcionários que não pensam no bem último da empresa, mas <strong>na</strong> verdade, são eles, a<br />
administração, os cria<strong>do</strong>res das regras conflituosas os responsáveis pelo comportamento<br />
predatório.<br />
Basicamente, o que deve ser feito é buscar estratégias gerenciais que consigam<br />
gerar um esquema de reforço mútuo, e assim integrar funcionário e empresa <strong>na</strong>s ações<br />
<strong>do</strong> dia-a-dia. Vem daí o imperativo de se conhecer as necessidades huma<strong>na</strong>s para o bom<br />
gerenciamento das empresas. Como nos ensi<strong>na</strong> Skinner:<br />
3. Meto<strong>do</strong>logia<br />
3.1 Embasamento meto<strong>do</strong>lógico<br />
“Um esquema de reforço não só aumenta produtividade, mas também<br />
aumenta interesse, moral e bem-estar <strong>do</strong> trabalha<strong>do</strong>r. Qualquer<br />
decisão concernente a uma escolha de esquemas se complica por este<br />
fato. De qualquer mo<strong>do</strong> poderemos agir inteligentemente nesta área<br />
somente se possuirmos informação clara com relação à <strong>na</strong>tureza e ao<br />
efeito <strong>do</strong>s artifícios responsáveis pela manutenção <strong>do</strong><br />
comportamento.” (SKINNER, 1994: 112).<br />
A execução <strong>do</strong> trabalho foi realizada por meio de estu<strong>do</strong> de caso. A escolha<br />
desta estratégia de desenvolvimento de trabalho se deve ao fato de as características <strong>do</strong><br />
estu<strong>do</strong> de caso se encaixarem às características <strong>do</strong> objeto de pesquisa. Para Yin:<br />
9
“Estu<strong>do</strong> de caso é uma investigação empírica que investiga um<br />
fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto inseri<strong>do</strong> <strong>na</strong> vida<br />
real, especialmente quan<strong>do</strong> os limites entre os fenômenos e o contexto<br />
não são claramente defini<strong>do</strong>s.” (Yin, 1994:49).<br />
Na tentativa de se evitar os excessos da quantificação <strong>na</strong>s ciências huma<strong>na</strong>s,<br />
desenvolveu-se a perspectiva de pesquisa chamada de qualitativa. Tal perspectiva é a<br />
que será usa<strong>do</strong> neste trabalho. É importante salientar que o termo “pesquisa qualitativa”<br />
não possui um significa<strong>do</strong> único e não pode ser entendi<strong>do</strong>, de uma maneira simplista,<br />
como sen<strong>do</strong> o oposto de quantitativo. A investigação qualitativa se estrutura <strong>na</strong> forma<br />
de um diálogo entre o investiga<strong>do</strong>r e o sujeito.<br />
A análise qualitativa tende a ser descritiva, não reduzin<strong>do</strong> a símbolos numéricos<br />
as <strong>na</strong>rrativas que são produzidas no contexto investigativo. Para acompanhar tais<br />
processos, o investiga<strong>do</strong>r não estaria muni<strong>do</strong> de conclusões a priori a respeito <strong>do</strong><br />
observa<strong>do</strong>, necessitan<strong>do</strong> estar disponível para se envolver no imprevisível <strong>do</strong>s<br />
encontros. Para Bogdan & Biklen, <strong>na</strong> dinâmica da pesquisa qualitativa:<br />
“Não se trata de montar um quebra cabeças cuja forma fi<strong>na</strong>l<br />
conhecemos de antemão. Está-se a construir um quadro que vai<br />
ganhan<strong>do</strong> forma à medida que se recolhem e exami<strong>na</strong>m as partes. O<br />
processo de análise <strong>do</strong>s da<strong>do</strong>s é como um funil: as coisas estão<br />
abertas no início (ou no topo) e vão se tor<strong>na</strong>n<strong>do</strong> mais fechadas e<br />
específicas no extremo. O investiga<strong>do</strong>r qualitativo (...) não presume<br />
que sabe o suficiente para reconhecer as questões importantes antes<br />
de efetuar a investigação” (Bogdan & Biklen, 1994:50).<br />
Nessa perspectiva, a pesquisa qualitativa, privan<strong>do</strong>-se de oferecer uma visão<br />
unifica<strong>do</strong>ra e fi<strong>na</strong>l da dinâmica das relações estudadas, pretende construir questões que<br />
favoreçam o surgimento de outras formas de pensar não ape<strong>na</strong>s os indivíduos, mas a<br />
dinâmica das relações <strong>na</strong>s quais eles se engendram e se significam.<br />
3.2 Execução meto<strong>do</strong>lógica<br />
A empresa abordada trata-se de uma empresa que fabrica e vende seus produtos<br />
para to<strong>do</strong> o país, através principalmente <strong>do</strong> telemarketing. Sen<strong>do</strong> assim, foram<br />
a<strong>na</strong>lisa<strong>do</strong>s os méto<strong>do</strong>s de <strong>motivação</strong> <strong>do</strong> sistema de venda por telemarketing passivo da<br />
mesma, fundamental para a conquista de clientes. Inicialmente, foi estudada a estrutura<br />
funcio<strong>na</strong>l <strong>na</strong>s suas divisões organizacio<strong>na</strong>is e de funções. Esta análise englobou:<br />
- Organograma da empresa<br />
- Planos de carreira internos<br />
- Sistemas de pagamento (salários, bonificações, comissões, etc)<br />
- Sistemas de punição<br />
10
- Atribuições de metas<br />
- Regras e normas inter<strong>na</strong>s<br />
- Outros aspectos relevantes que surgiram no decorrer <strong>do</strong> trabalho<br />
Estas informações foram obtidas através das entrevistas, onde ao mesmo tempo<br />
que se perguntava sobre as regras, buscava-se perceber como estas impactavam no<br />
comportamento <strong>do</strong> entrevista<strong>do</strong> e <strong>do</strong>s demais funcionários.<br />
Por fim, todas as informações coletadas foram estudadas sob a luz da psicologia<br />
Behaviorista e comparada com os postula<strong>do</strong>s <strong>do</strong> príncipio <strong>do</strong>s <strong>interesses</strong> <strong>coincidentes</strong>,<br />
para se avaliar se os comportamentos incentiva<strong>do</strong>s são realmente os que interessam à<br />
empresa.<br />
3.2.1 Entrevista<strong>do</strong>s<br />
Além <strong>do</strong> gerente <strong>do</strong> setor, foram entrevistadas duas atendentes, cujos perfis<br />
seguem abaixo:<br />
Atendente (a): Possui mais de 10 anos de casa, viu a empresa crescer e se<br />
transformar. Não possui curso superior. Apresentou claros sintomas de stress físico e<br />
psicológico, chegan<strong>do</strong> a se queixar até mesmo de surdez de um ouvi<strong>do</strong>. Disse várias<br />
vezes, em entrevista, que o trabalho é extremamente estressante e muitas vezes se<br />
mostrou receosa de fornecer alguma informação. Pretende sair da empresa assim que<br />
puder.<br />
Atendente (b): Está <strong>na</strong> empresa há alguns meses, é alu<strong>na</strong> da <strong>UFV</strong> da área de<br />
huma<strong>na</strong>s. Forneceu todas as informações sem nenhum receio. Pretende sair depois que<br />
se formar.<br />
4. Resulta<strong>do</strong>s<br />
4.1 Ganho<br />
Para efeito de padronização, denomi<strong>na</strong>-se aqui por ganho o total fi<strong>na</strong>nceiro recebi<strong>do</strong><br />
por cada trabalha<strong>do</strong>ra ao término de cada mês. É pago um valor fixo e uma comissão<br />
porcentual fixa (1,5%) para cada produto vendi<strong>do</strong>. Além disso, existem diversos prêmios e<br />
punições, que serão discuti<strong>do</strong>s no decorrer <strong>do</strong> trabalho. Nos primeiros meses é pago <strong>na</strong>da<br />
mais que o salário de R$ 350,00, perío<strong>do</strong> considera<strong>do</strong> de experiência. Decorri<strong>do</strong> este tempo,<br />
o salário fixo cai para R$ 280,00, que passa a ser complementa<strong>do</strong> com as comissões e as<br />
bonificações provenientes das vendas.<br />
11
Como as comissões são recebidas ape<strong>na</strong>s com o pagamento da ultima parcela, o<br />
ganho mensal pode cair neste perío<strong>do</strong>. Além disso, alterações no valor <strong>do</strong> ganho mensal são<br />
comuns em função de férias, feria<strong>do</strong>s, etc.<br />
4.2 Sistema de premiação e punições:<br />
4.2.1 Informações gerais<br />
Os prêmios são distribuí<strong>do</strong>s em função <strong>do</strong> “gráfico de vendas”. Este se trata <strong>do</strong><br />
registro de todas as vendas dentro de determi<strong>na</strong><strong>do</strong> perío<strong>do</strong>. A atendente pode a qualquer<br />
momento entrar <strong>na</strong> intranet da empresa e ver o gráfico de vendas seu e das demais. No dia 19<br />
de cada mês fecha-se o gráfico daquele mês, e no dia 20 já se conta os pontos para o mês<br />
seguinte. Cada produto vale um ponto no gráfico.<br />
Existe um sistema de fila no atendimento, quan<strong>do</strong> um telefonema é recebi<strong>do</strong>, este vai<br />
para a primeira trabalha<strong>do</strong>ra da fila. Esta, após atender a ligação, automaticamente vai para o<br />
fim da fila.<br />
A diferença de preço entre os produtos é insignificante, tanto a entrevistada (a) quanto<br />
a entrevistada (b) não souberam afirmar se existe diferença significativa de lucratividade<br />
entre os produtos, mas o mais provável é que não haja, pois to<strong>do</strong>s os produtos seguem uma<br />
meto<strong>do</strong>logia semelhante de produção. Assim, to<strong>do</strong>s os critérios de premiação são em função<br />
<strong>do</strong> número de produtos, não em função <strong>do</strong> valor destes.<br />
4.2.2 Sistemas de pagamento da empresa<br />
É a gerente quem define to<strong>do</strong>s os sistemas de premiação, incluin<strong>do</strong> valores, reajustes,<br />
etc. As metas em geral são impostas, mas a gerente se diz sempre aberta a sugestões.<br />
Algumas vezes, uma nova regra é imposta. As funcionárias, mesmo saben<strong>do</strong> que a<br />
nova regra não irá funcio<strong>na</strong>r, não se manifestam, esperan<strong>do</strong> o resulta<strong>do</strong>. Segun<strong>do</strong> (a):<br />
“-Na empresa X, <strong>na</strong>da é negocia<strong>do</strong>.”<br />
Os sistemas de premiação são muda<strong>do</strong>s freqüentemente e essa alteração, segun<strong>do</strong> a<br />
entrevistada (a), causa cansaço, stress, etc. As mudanças são anunciadas com cerca de um<br />
mês de antecedência. Segun<strong>do</strong> ela, a chefia diz:<br />
“-Se você não é capaz de se adaptar as mudanças da empresa, você não serve para<br />
ela.” Ou segun<strong>do</strong> a própria (a):<br />
mudanças.”<br />
“- Não dizem que se a empresa não mudar, quebra? Então, temos que nos adaptar as<br />
12
O sistema de bonificação já se alterou de coletivo para individual, depois voltou para<br />
coletivo. Um <strong>do</strong>s problemas <strong>do</strong> coletivo era que umas vendiam muito mais <strong>do</strong> que as outras,<br />
o que provocava frustração e atritos. Ao voltar a ser coletivo, a rotatividade <strong>do</strong>s membros<br />
entre os grupos foi implantada para tentar se amenizar o problema.<br />
Não existem metas fixas em termo de produtividade, pois existe uma sazo<strong>na</strong>lidade<br />
muito grande da demanda, principalmente em função da época <strong>do</strong> ano. Antes havia prêmios<br />
para a atendente que mais vendeu <strong>na</strong> sema<strong>na</strong>, e até mesmo para a que mais vendeu no dia,<br />
mas tais prêmios foram retira<strong>do</strong>s porque eram sempre as mesmas que ganhavam. Segun<strong>do</strong> a<br />
entrevistada (a), o fator sorte interfere muito <strong>na</strong>s vendas, e um perío<strong>do</strong> tão pequeno de tempo<br />
pode provocar distorções. Todavia, quan<strong>do</strong> interrogada se só era uma questão de sorte,<br />
porque sempre as mesmas ganhavam, ela insistiu que era ape<strong>na</strong>s sorte, e que “falta de<br />
capacidade não era”.<br />
Havia também uma meta de que pelo menos 88% das ligações tinham que resultar em<br />
uma venda. Sen<strong>do</strong> alcança<strong>do</strong> este valor, era concedida uma premiação em dinheiro.<br />
Aparentemente, este número foi imposto. Essa premiação foi abolida porque a empresa tem<br />
investi<strong>do</strong> mais <strong>na</strong> venda ativa, e tem diminuí<strong>do</strong> os ganhos <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res da venda passiva<br />
para forçar a migração <strong>do</strong> pessoal para este setor.<br />
4.2.3 Sistema atual<br />
4.2.3.1 Premiação<br />
As atendentes foram divididas em três grupos distintos, cada um com<br />
aproximadamente cinco pessoas (este número já foi maior, mas atualmente está ocorren<strong>do</strong><br />
uma certa “migração” das trabalha<strong>do</strong>ras para o telemarketing ativo, por determi<strong>na</strong>ção da<br />
gerência). Os grupos competem entre si e cada um <strong>do</strong>s grupos possui uma líder, que além das<br />
funções normais, supervisio<strong>na</strong> as demais.<br />
A líder é escolhida pela gerente <strong>do</strong> setor. Em geral é alguém com muito tempo de<br />
serviço e que se destaca no trabalho. Segun<strong>do</strong> a entrevistada (b), as líderes têm si<strong>do</strong> sempre<br />
as três que mais vendem, alter<strong>na</strong>n<strong>do</strong>-se entre si de um mês para o outro, mas a entrevistada<br />
não soube informar se isso é coincidência ou não. Não há questio<strong>na</strong>mento aparente das<br />
demais quanto a seleção para esta função. Segun<strong>do</strong> a entrevistada (a), a líder ganha uma<br />
porcentagem maior <strong>do</strong> prêmio que as demais, todavia a entrevistada (b) não pôde confirmar,<br />
por nunca ter si<strong>do</strong> líder. A líder não tem nenhuma função a mais, além de ter de coorde<strong>na</strong>r as<br />
outras.<br />
13
Não existem metas impostas pela gerência para cada grupo, mas cada um deles define<br />
“informalmente” metas individuais e metas diárias e/ou sema<strong>na</strong>is. As líderes de cada grupo,<br />
por conta própria, freqüentemente dão pequenos prêmios (bombom, pirulitos e afins) para<br />
quem se destaca no grupo dentro de determi<strong>na</strong><strong>do</strong> perío<strong>do</strong>.<br />
O grupo que vence o mês geralmente obtém a marca de pouco mais de 300 pontos. A<br />
atendente que fica em primeiro lugar geralmente faz acima de 200 pontos, no geral. Há quem<br />
faça 50, 100, 80, etc. Este recebe uma soma em dinheiro de R$ 160,00 que é dividida entre os<br />
membros. Segun<strong>do</strong> a entrevistada (a), esse sistema é melhor que os anteriores por ser mais<br />
completo, dentro <strong>do</strong> que se precisa <strong>na</strong> empresa. Mas ela diz não saber avaliar se este é o<br />
melhor que poderia haver. De acor<strong>do</strong> com a entrevistada (b), existe muito questio<strong>na</strong>mento<br />
informal das atendentes quanto à divisão <strong>do</strong> bônus, pois elas acreditam que deveria ser mais<br />
“linear” a relação contribuição <strong>na</strong>s vendas /bonificação. Além disso, existem prêmios<br />
individuais, sen<strong>do</strong> que as cinco primeiras no gráfico de vendas ganham R$50,00 extras,<br />
independente de em que grupo estão.<br />
As atendentes que não ficam entre as cinco primeiras e não fazem parte <strong>do</strong> grupo<br />
vence<strong>do</strong>r, não recebem <strong>na</strong>da pelos pontos obti<strong>do</strong>s. A entrevistada (a) diz que isto é justo; já a<br />
entrevistada (b) acha que não.<br />
Quan<strong>do</strong> se trata de ligação de revende<strong>do</strong>res <strong>do</strong>s produtos (empresas que revendem os<br />
produtos da empresa), em geral não se ganha ponto no gráfico, mas se ganha a comissão<br />
(1,5% fixos) da mesma forma. As atendentes ficam felizes quan<strong>do</strong> atendem esses<br />
telefonemas, porque, em geral, são volumes maiores de venda, que, por sua vez, rendem uma<br />
boa comissão.<br />
4.2.3.2 Pagamento<br />
Todas as premiações são pagas junto com o salário, não existin<strong>do</strong> forma de ser<br />
realizada antes. Sen<strong>do</strong> que quan<strong>do</strong> o cliente compra parcela<strong>do</strong>, a atendente recebe a comissão<br />
ape<strong>na</strong>s quan<strong>do</strong> este quita a ultima parcela da compra. Estas têm autonomia para negociar o<br />
número de parcelas (o valor total não muda de acor<strong>do</strong> o parcelamento), todavia são<br />
orientadas ao valor mínimo das parcelas ser de R$40,00. Quan<strong>do</strong> o cliente deixa de quitar<br />
alguma parcela, não há o pagamento da comissão. A atendente pode saber que existem<br />
débitos verifican<strong>do</strong> o cadastro <strong>do</strong> cliente, mas em geral não há tempo para isso. A<br />
i<strong>na</strong>dimplência ocorre com certa freqüência. Evidentemente, os pontos no gráfico não são<br />
afeta<strong>do</strong>s pela i<strong>na</strong>dimplência <strong>do</strong>s clientes, visto que quan<strong>do</strong> ocorre a i<strong>na</strong>dimplência as<br />
premiações já foram distribuídas. Devi<strong>do</strong> a reclamações, tentou-se mudar este sistema, para<br />
14
que se recebesse a comissão em cima de cada parcela paga, mas segun<strong>do</strong> a entrevistada (a), a<br />
direção da empresa disse que “o programa de computa<strong>do</strong>r não aceitou”.<br />
As atendentes que obtêm uma melhor remuneração recebem aproximadamente<br />
R$800,00 por mês. A distribuição das remunerações segue apresentada <strong>na</strong> tabela 1.<br />
Tabela 1 – Distribuição <strong>do</strong> ganho mensal recebi<strong>do</strong> pelas atendentes que obtém melhor remuneração<br />
Fonte Valor Contribuição<br />
Salário fixo R$280,00 35%<br />
Bônus individual R$50,00 6%<br />
Bônus coletivo R$30,00 4%<br />
comissões R$440,00 55%<br />
Total R$800,00 100%<br />
4.2.3.2 Punições<br />
O sistema de punição prevê um grande número de erros, to<strong>do</strong>s passíveis de punição, e<br />
geralmente se baseia <strong>na</strong> retirada de pontos <strong>do</strong> gráfico de vendas, o pessoal ainda ganhan<strong>do</strong> as<br />
comissões (% fixa). Segun<strong>do</strong> a entrevistada (a), caso aconteça algo não previsto, a gerente se<br />
reúne com as demais e discutem qual a punição adequada à situação, mas a decisão fi<strong>na</strong>l cabe<br />
ape<strong>na</strong>s a esta. Segue abaixo alguns exemplos da lista.<br />
• Se uma atendente não fecha um pedi<strong>do</strong> por algum motivo, esta fica responsável de<br />
ligar para o cliente para pegar os da<strong>do</strong>s que faltam para fechar a venda. Caso ele ligue<br />
primeiro e outra pessoa o atenda, a comissão e os pontos vão para a primeira, desde<br />
que ainda não tenha venci<strong>do</strong> o perío<strong>do</strong> determi<strong>na</strong><strong>do</strong> para ela ligar (alguns dias) e que<br />
o pedi<strong>do</strong> já esteja pronto. Do contrario, quem atende receberá os pontos e a comissão.<br />
• Se tiver um pedi<strong>do</strong> em não autoriza<strong>do</strong> (pedi<strong>do</strong> não concluí<strong>do</strong>) ou orçamento<br />
(forneci<strong>do</strong> ao cliente, que ainda não fechou a compra), a atendente tem que entrar em<br />
contato num prazo máximo de 1 dia útil. Se a atendente não der nenhuma ligação para<br />
o cliente em <strong>do</strong>is dias e o cliente ligar no terceiro dia, ela perde um produto no gráfico<br />
de vendas. A partir de 3 dias a atendente perde 2 produtos no gráfico de vendas. Se o<br />
cliente nunca mais ligar, o caso é a<strong>na</strong>lisa<strong>do</strong> e pode ocorrer uma perda de pontos ainda<br />
maior. Basicamente, a atendente tem que resolver to<strong>do</strong>s os assuntos antes de sair de<br />
férias, ou deixar alguém responsável. Se a responsável não ligar a primeira perde a<br />
pontuação.<br />
• Se um cliente ligar dizen<strong>do</strong> que foi envia<strong>do</strong> produto erra<strong>do</strong> e o erro for da atendente,<br />
ela perde o produto que foi envia<strong>do</strong> erra<strong>do</strong> mais 5 produtos no gráfico de vendas. É<br />
15
obrigação da funcionária conferir com o cliente o que está sen<strong>do</strong> compra<strong>do</strong>, logo, se<br />
há falhas, a atendente nem se preocupa em se defender.<br />
• Se um cliente ligar reclaman<strong>do</strong> que foi boleto erra<strong>do</strong> ou desconto erra<strong>do</strong>, perde-se 3<br />
produtos.<br />
• Se uma atendente atender um cliente e não resolver o pedi<strong>do</strong>, e por esse motivo o<br />
mesmo não for envia<strong>do</strong>, perde-se perde 3 produtos no gráfico.<br />
• Se um pedi<strong>do</strong> já foi concretiza<strong>do</strong> e por algum motivo agarrou em cartão ou análise de<br />
crédito perde-se 5 produtos no gráfico.<br />
• Se por engano um pedi<strong>do</strong> contar para uma atendente num mês e a atendente ganhou<br />
prêmio devi<strong>do</strong> esses produtos, assim que detectar o erro, será tira<strong>do</strong> o mesmo número<br />
de produtos que foi conta<strong>do</strong> indevidamente e mais 10 pontos de punição, e o prêmio<br />
será devolvi<strong>do</strong> para a atendente que ganhou de fato. A única forma disto acontecer é<br />
se for realiza<strong>do</strong> um novo cadastro <strong>do</strong> mesmo cliente, a única pessoa a qual pode ser<br />
atribuída à culpa é a própria atendente.<br />
• Se a atendente tiver consulta<strong>do</strong> o cadastro <strong>do</strong> cliente no SPC e não registrar a consulta<br />
no cadastro da empresa, e por isso for feita uma nova consulta, a atendente perde 1<br />
produto no gráfico. Mesmo que seja pedi<strong>do</strong> para pagamento <strong>na</strong> retirada <strong>do</strong> correio. Se<br />
ela autorizar sem consultar ou se o cadastro não estiver ok e ela colocar ok, perde de 1<br />
a 5 produtos no gráfico. Todas as consultas ao SPC ficam registradas, só não se<br />
registra quem a fez, mas é possível se descobrir procuran<strong>do</strong> quem realizou a venda<br />
para o cliente que foi pesquisa<strong>do</strong>.<br />
• Quem der desconto em produtos de promoção ou que é revenda, perderá 5 produtos<br />
no gráfico de vendas. O grau de liberdade da atendente para dar descontos é sempre o<br />
mesmo, se trata <strong>do</strong>s descontos promocio<strong>na</strong>is que são anuncia<strong>do</strong>s desde o início, e<br />
estão sempre disponíveis a todas. Quan<strong>do</strong> o cliente deseja forçar uma negociação, a<br />
atendente passa o cliente para a gerente, que tem um poder maior.<br />
• As atendentes que chegarem primeiro à empresa tem que testar o telefone assim que<br />
chegar. Se não “cair <strong>na</strong> mensagem” (gravação informan<strong>do</strong> pra onde a pessoa ligou e o<br />
horário de funcio<strong>na</strong>mento, a última a sair deve ligá-la e a primeira a chegar desliga-<br />
la), perde ponto as atendentes <strong>do</strong> perío<strong>do</strong> anterior. Caso deixar para testar mais tarde<br />
(a partir de 10 minutos depois que chegar) e cair <strong>na</strong> mensagem, perdem ponto<br />
também as atendentes que chegaram e não testaram o telefone. Perderá 5 pontos cada<br />
atendente que trabalhou nos horários. Quan<strong>do</strong> isto acontece, o pessoal sempre se<br />
16
preocupa em saber quem é a responsável. Quan<strong>do</strong> as atendentes chegam e testam o<br />
telefone e há problemas, elas acabam sempre denuncian<strong>do</strong>, quer porque precisam de<br />
ajuda de alguém pra religar, ou porque se perde tempo, etc.<br />
• A atendente que cometer erro e causar prejuízo maior a empresa perde no mínimo 10<br />
produtos no gráfico ou não participará da premiação no mês que o erro for localiza<strong>do</strong>.<br />
• Se uma atendente não conseguir de forma alguma localizar um cadastro de cliente<br />
devi<strong>do</strong> nome, endereço estiver erra<strong>do</strong>, a atendente que fez o cadastro anteriormente<br />
perderá 2 produtos no gráfico.<br />
• A atendente que não marcar pedi<strong>do</strong> de revenda como tal (ou seja, não conta ponto no<br />
gráfico de vendas) perde 10 (dez) produtos no gráfico independente da justificativa.<br />
Essa medida foi a<strong>do</strong>tada para evitar que se aja de má fé, pois uma atendente que por<br />
sorte atenda um telefonema destes pode vender um grande volume de uma única vez,<br />
distorcen<strong>do</strong> o resulta<strong>do</strong> fi<strong>na</strong>l <strong>do</strong> gráfico de vendas.<br />
• Quem esquecer de bloquear o telefone no horário de café, perde um ponto no gráfico.<br />
O café não é obrigatório, mas raramente alguma deixa de ir. O tempo estabeleci<strong>do</strong> é<br />
de 10 min, vão sempre de três em três.<br />
• Se uma atendente ficar entre os três últimos lugares por três meses consecutivos ela<br />
recebe aviso prévio. Durante este mês, ela tem uma ultima chance de melhorar o<br />
desempenho, se não conseguir é demitida.<br />
4.2.4 Outros<br />
Existe um médico <strong>do</strong> trabalho que dá acompanhamento às atendentes. Ele sugere que<br />
elas façam 10 min de descanso a cada hora, mas em geral não param pela competição<br />
acirrada. É procedimento padrão de telemarketing, ao se afastar da cabine, desligar o telefone<br />
(orientação até da gerente). Todavia, quan<strong>do</strong> o telefone é desliga<strong>do</strong> automaticamente se vai<br />
para o fim da fila, então devi<strong>do</strong> ao me<strong>do</strong> de perder vendas elas não desligam, e tem atitudes<br />
como encher a garrafa d´água e voltar para o seu posto, esperar o telefone tocar para ir ao<br />
banheiro e voltar corren<strong>do</strong>, etc.<br />
Ocorre bastante rotatividade <strong>na</strong> empresa, mas cerca de 50% das atendentes estão no<br />
quadro de funcionários há muito tempo. Os motivos de demissão geralmente são o perfil da<br />
pessoa não agradar a empresa ou pelo baixo desempenho. Existem casos de profissio<strong>na</strong>is que<br />
trabalham ape<strong>na</strong>s uma manhã e nunca mais voltam.<br />
A empresa tem convênio com diversos pontos comerciais <strong>na</strong> cidade, onde o<br />
emprega<strong>do</strong> pode comprar para pagar com débito automático no salário.<br />
17
Não existem reuniões das profissio<strong>na</strong>is com a gerente para discutir o trabalho. O<br />
próprio ambiente estressante faz com que não se queira ficar <strong>na</strong> empresa mais que o<br />
necessário.<br />
Repassar ligações de <strong>na</strong>mora<strong>do</strong>, parentes, etc. são proibidas, a exceção das <strong>do</strong>s pais e<br />
<strong>do</strong>s filhos. O <strong>uso</strong> de celular é proibi<strong>do</strong>, o único tempo que elas têm para telefo<strong>na</strong>r é no<br />
horário <strong>do</strong> café, que não pode passar de 10 min, então segun<strong>do</strong> a entrevistada (a) “ou você<br />
telefo<strong>na</strong>, ou você toma café”.<br />
A gerente ameaçou que vai elaborar um “termo de responsabilidade” para as<br />
funcionárias assi<strong>na</strong>rem, se comprometen<strong>do</strong> a não deixar sair nenhuma informação sobre a<br />
empresa, e, caso isso acontecesse, elas seriam punidas.<br />
Os erros são repreendi<strong>do</strong>s não diretamente a quem os cometeu, mas ditos para to<strong>do</strong> o<br />
grupo, sem se indicar quem é o culpa<strong>do</strong>. Eventualmente, os grandes acertos são<br />
parabeniza<strong>do</strong>s em público, mas isso segun<strong>do</strong> a entrevistada (a) “depende da pessoa, <strong>do</strong> dia,<br />
etc”.<br />
experiência.<br />
O único trei<strong>na</strong>mento recebi<strong>do</strong> pelas novatas consiste em acompanhar as que têm mais<br />
4.2.5 Dan<strong>do</strong> voz às entrevistadas<br />
• As trabalha<strong>do</strong>ras não vêem uma chance de carreira no seu trabalho, pois não há<br />
possibilidade de ascensão hierárquica:<br />
“-Não tem como crescer, não enxergo como carreira, ninguém pretende ficar<br />
pra sempre.” (entrevistada a).<br />
• Também não há um sentimento de reciprocidade de <strong>interesses</strong> entre a empresa e os<br />
profissio<strong>na</strong>is, por parte <strong>do</strong>s últimos:<br />
“-A empresa (e as colegas de trabalho) presta atenção tanto nos esforços<br />
quanto nos erros das atendentes, pois to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong> observa to<strong>do</strong> mun<strong>do</strong>, e se<br />
uma ver a outra errar, conta para a gerente”. (entrevistada b).<br />
“- Você faz pra si”. (entrevistada a).<br />
• O estresse causa<strong>do</strong> pelo trabalho é uma constante:<br />
“-Trabalhar por produtividade é a coisa mais estressante que existe. As vezes<br />
preferia trabalhar por salário mínimo e ter um trabalho tranqüilo. Não<br />
adianta ganhar mais e gastar com médico e farmácia.” (entrevistada a).<br />
18
-> “-Se você entrevistar quem entrou agora, a pessoa vai estar muito mais<br />
motivada que eu. Depois de <strong>do</strong>is ou três anos se começa a cansar.”<br />
(entrevistada a).<br />
“-Existe rivalidade, uma já chegou a chamar a outra de lesma, mas em geral<br />
o clima é amistoso, a própria gerente pede isso.” (entrevistada a).<br />
“Tem noites que eu nem consigo <strong>do</strong>rmir, fico com o serviço <strong>na</strong> cabeça o<br />
tempo to<strong>do</strong>. A gente é punida por muitas coisas, mas são punições peque<strong>na</strong>s,<br />
e são coisas que causam transtorno ou prejuízo para a empresa. Tem que<br />
pensar que a gente vai vender bem e não vai errar <strong>na</strong>da.” (entrevistada a).<br />
“O que desmotiva é o estresse, não o prêmio.” (entrevistada b).<br />
“-A opinião geral é que o sistema de punição é injusto, pois o número de<br />
informações com o qual se trabalha é muito grande e erros acabam<br />
acontecen<strong>do</strong>”. (entrevistada b).<br />
“Você tem que conseguir vencer o cliente pelo cansaço, porque não sabe<br />
quan<strong>do</strong> vai atender outro telefonema.” (entrevistada b).<br />
• Quan<strong>do</strong> a entrevistada (a) foi perguntada a respeito <strong>do</strong> fato de o ambiente ter si<strong>do</strong><br />
menos estressante no passa<strong>do</strong>, inicialmente a resposta foi:<br />
“-Não, porque diminuíram o numero de funcionários no setor”.<br />
Mas logo em seguida:<br />
“-Tá bom, vou te falar, ficou muito mais estressante sim, ficou muito mais<br />
concorri<strong>do</strong> lá dentro.”<br />
• Outras observações interessantes foram:<br />
“-Dá certo status trabalhar nesta empresa, quan<strong>do</strong> você chega numa loja e<br />
diz que trabalha lá, te olham com outros olhos.” (entrevistada b).<br />
“-Quan<strong>do</strong> tinha prêmios diários era bom, teve uma vez que ganhei R$ 120,00<br />
em um dia e comprei uma bota que eu queria e que custava isso.”<br />
(entrevistada a).<br />
“-É, esta empresa é só nome mesmo... Quer dizer, não é não, lá é muito bom<br />
pra trabalhar sim.” (entrevistada a).<br />
19
5. Discussão<br />
Chalegre (2001) afirma que o sistema ideal deve ser basea<strong>do</strong> no trinômio fixo + metas<br />
+ prêmios, idéia similar ao encontra<strong>do</strong> <strong>na</strong> empresa atualmente. Também afirma que o<br />
pagamento por comissão é especialmente interessante para uma empresa no caso de<br />
opera<strong>do</strong>res de telemarketing, pois devi<strong>do</strong> as suas limitações de tempo e ao valor<br />
razoavelmente estável das vendas, podemos prever com razoável precisão o número de<br />
negócios que se pode fechar e saber a variação que as comissões podem atingir. Todavia, a<br />
parte que diz respeito às metas e aos prêmios poderiam ser reformuladas de forma a se<br />
alinharem mais ao <strong>princípio</strong> <strong>do</strong>s <strong>interesses</strong> <strong>coincidentes</strong>.<br />
A própria existência da extensa lista de erros e punições previstas demonstra que o<br />
foco da empresa é muito mais em cima da punição <strong>do</strong> que no reforço, estratégia não<br />
recomendada pelos Behavioristas. Enquanto a produtividade tem um teto de premiações, a<br />
improdutividade pode gerar a punição máxima, que é a demissão. Uma sugestão é que ao<br />
invés de se perder pontos no gráfico de vendas ao se cometer algum erro, as atendentes<br />
poderiam ganhar algum pequeno prêmio ou até mesmo pontos no gráfico, se não cometessem<br />
erros dentro de determi<strong>na</strong><strong>do</strong> perío<strong>do</strong>, como por exemplo, uma sema<strong>na</strong>. Essa mudança,<br />
aparentemente peque<strong>na</strong>, poderia diminuir muito o estresse psicológico associa<strong>do</strong> aos erros<br />
muitas vezes inevitáveis e acabar com o sentimento de perda de algo conquista<strong>do</strong>.<br />
O sistema atual de prêmios, que para um grupo (um terço das profissio<strong>na</strong>is) ganhar,<br />
outros <strong>do</strong>is grupos (ou seja, <strong>do</strong>is terços das trabalha<strong>do</strong>ras) tem que perder, gera um clima<br />
competitivo, aumentan<strong>do</strong> o clima de rivalidade entre os grupos, ao mesmo tempo em que<br />
potencializa os atritos internos, a medida que todas não produzirão igual. Além disso, o<br />
prêmio tem um valor fixo e imposto, não associa<strong>do</strong> à produtividade, e sim associa<strong>do</strong> à vitória<br />
sobre os outros grupos.<br />
Um sistema de metas devidamente negocia<strong>do</strong> (como, por exemplo, se o total das<br />
vendas ultrapassar certa marca definida <strong>na</strong> negociação <strong>do</strong>s grupos com a gerência, todas<br />
venham a ganhar um bônus) poderia ajudar a ca<strong>na</strong>lizar todas as energias <strong>na</strong>s vendas. Ao<br />
mesmo tempo, manten<strong>do</strong>-se o prêmio individual para as melhores vende<strong>do</strong>ras, poder-se-ia<br />
evitar que as estas se sentissem trabalhan<strong>do</strong> pelas demais.<br />
Um sistema mais complexo de diferentes premiações para diferentes metas<br />
alcançadas também poderia ser estuda<strong>do</strong>, como a matemática de pagar sobre a raiz quadrada<br />
de um determi<strong>na</strong><strong>do</strong> excedente de uma meta. Este méto<strong>do</strong> permite uma forte correção de<br />
proporcio<strong>na</strong>lidade entre o crescimento e os valores pagos em percentuais.<br />
20
Essas modificações também poderiam ter impacto positivo no trei<strong>na</strong>mento das<br />
novatas, pois certamente as vetera<strong>na</strong>s teriam mais interesse em passar as suas experiências a<br />
todas, (quer seja por trei<strong>na</strong>mento formal ou informalmente) e não ape<strong>na</strong>s para as que fazem<br />
parte <strong>do</strong> seu grupo, o que se tor<strong>na</strong>, evidentemente, um fator de igual interesse para a empresa.<br />
O próprio fato de sempre as mesmas ganharem o prêmio individual levanta a suspeita a<br />
respeito da possível existência de certas técnicas de venda desenvolvidas por algumas<br />
atendentes e não transmitidas às demais, ao mesmo tempo em que pode gerar des<strong>motivação</strong><br />
para as outras.<br />
A definição de metas não poderá ser de forma alguma empurrada pela gerência.<br />
Chalegre (2001) não ape<strong>na</strong>s afirma que isto jamais deve acontecer, como também lembra que<br />
as metas devem ser em função de algo controlável pelos trabalha<strong>do</strong>res envolvi<strong>do</strong>s. Num<br />
sistema de vendas, evidentemente, grande parte <strong>do</strong> poder de decisão vem <strong>do</strong> cliente,<br />
principalmente num sistema de venda passiva, mais um motivo, então, para as metas serem<br />
negociadas com atenção. As metas devem ter credibilidade e factibilidade, ou seja, terem um<br />
embasamento correto e ser alcançável. Além disso, é fundamental que as profissio<strong>na</strong>is<br />
possam saber <strong>do</strong>s seus resulta<strong>do</strong>s e das demais. Assim, o gráfico de vendas existente <strong>na</strong><br />
empresa é o que Chalegre (2001) chama de “esta<strong>do</strong> da arte” no campo de controle <strong>do</strong><br />
funcionário <strong>do</strong>s seus próprios resulta<strong>do</strong>s, sen<strong>do</strong> um aspecto muito positivo.<br />
As premiações diárias e sema<strong>na</strong>is, que foram tiradas por determi<strong>na</strong>ção da gerência,<br />
certamente são benéficas. Não ape<strong>na</strong>s Chalegre (2001) afirma que a premiação deve ocorrer<br />
o mais rápi<strong>do</strong> possível após a ação (ou o reforço ocorrer o mais rápi<strong>do</strong> possível após o<br />
comportamento operante a ser reforça<strong>do</strong> segun<strong>do</strong> os Behavioristas), como a própria criação<br />
de premiações deste tipo informalmente pelas líderes mostra essa carência.<br />
Ainda nesta questão <strong>do</strong> intervalo de tempo entre o comportamento e o prêmio, o<br />
sistema de comissio<strong>na</strong>mento em função da quitação da última parcela faz com que o prêmio<br />
seja mais distante no horizonte <strong>do</strong> tempo (vai receber ape<strong>na</strong>s dali a meses e ainda corren<strong>do</strong> o<br />
risco de nem chegar a receber) poden<strong>do</strong> fazer com que se diminua o interesse <strong>na</strong>s vendas, por<br />
parte das atendentes, em muitas parcelas, estratégia que para a empresa provavelmente é<br />
viável.<br />
Além disso, deve-se buscar um sistema estável de regras, em que as mudanças sejam<br />
implantadas levan<strong>do</strong> em consideração a solicitação <strong>do</strong>s próprios trabalha<strong>do</strong>res e avisadas<br />
com a máxima antecedência possível, sen<strong>do</strong> tanto as mudanças quanto a data destas<br />
negociadas.<br />
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A transparência da administração também deve ser buscada, e desculpas <strong>do</strong> tipo “o<br />
computa<strong>do</strong>r não aceitou” certamente podem provocar frustrações nos trabalha<strong>do</strong>res.<br />
Consideramos, também, que a remuneração psicológica, que trata <strong>do</strong> reconhecimento<br />
<strong>do</strong> esforço <strong>do</strong>s trabalha<strong>do</strong>res poderia ser melhor utilizada. Apesar <strong>do</strong> gráfico de vendas<br />
mostrar a to<strong>do</strong> o momento quem são as melhores, reforços positivos como o nome da melhor<br />
<strong>do</strong> mês numa placa, premiação em público, ou pequenos brindes para se levar para casa e<br />
mostrar para a família poderiam contribuir muito para o desempenho. Atualmente, o<br />
reconhecimento público aparenta ser subjetivo, pois segun<strong>do</strong> a entrevistada (a) “depende da<br />
pessoa, <strong>do</strong> dia, etc”.<br />
Um aspecto positivo da remuneração psicológica percebi<strong>do</strong> é que a empresa, sen<strong>do</strong><br />
tradicio<strong>na</strong>l e respeitada <strong>na</strong> cidade, faz com que as trabalha<strong>do</strong>ras se sintam importantes e<br />
diferenciadas. Para se participar de uma empresa eficiente, deve-se ser funcionária eficiente.<br />
A empresa oferece status, algo que tem grande potencial motiva<strong>do</strong>r.<br />
Mesmo com as mudanças sugeridas, o ambiente ainda seria estressante, visto que esta<br />
é uma característica inerente ao telemarketing e fator responsável pelo alto índice de<br />
rotatividade <strong>na</strong> empresa. Como as admissões e demissões implicam em custos, um pequeno<br />
bônus por tempo de contrato, poderia funcio<strong>na</strong>r como um reforço positivo sobre a<br />
permanência <strong>do</strong>s profissio<strong>na</strong>is <strong>na</strong> empresa.<br />
6. Conclusão<br />
A empresa apresenta um sistema de premiações e punições de grande complexidade,<br />
cujo resulta<strong>do</strong> indubitavelmente interfere no comportamento <strong>do</strong>s seus trabalha<strong>do</strong>res. Apesar<br />
de apresentar alguns pontos positivos, como o gráfico de vendas, premiações e comissões<br />
além de um fixo, dá pouca abertura a negociações, sen<strong>do</strong> os sistemas de pagamentos<br />
freqüentes muda<strong>do</strong>s pelo méto<strong>do</strong> de “tentativa e erro”. Percebe-se claramente que este se<br />
baseia muito mais <strong>na</strong>s punições <strong>do</strong> que em premiações (reforços), técnica desaconselhada por<br />
todas as referencias bibliográficas utilizadas neste trabalho.<br />
É de fundamental importância se trabalhar nos fatores causa<strong>do</strong>res de estresses destas<br />
profissio<strong>na</strong>is, pois, mesmo sen<strong>do</strong> inerente a tal atividade, deve se buscar mantê-lo em níveis<br />
controláveis. O próprio fato de o trabalho ser tão estressante dificultou o seu estu<strong>do</strong>, pois as<br />
atendentes preferem não falar <strong>do</strong> trabalho fora dele, às vezes não queren<strong>do</strong> aprofundar em<br />
alguns pontos. Este foi principalmente o comportamento de (a), possivelmente por estar a<br />
muitos anos <strong>na</strong> empresa.<br />
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Certamente alterações previamente estudadas, planejadas e discutidas com as<br />
trabalha<strong>do</strong>ras poderiam trazer benefícios para ambas as partes, como diminuição da<br />
rotatividade, <strong>do</strong> absenteísmo e aumento da produção, objetivo fi<strong>na</strong>l deste trabalho.<br />
7. Referências bibliográficas<br />
BOGDAN, R. & BIKLEN, S. – Investigação qualitativa em educação.<br />
Porto/Portugal: Porto Editora, 1994.<br />
SKINNER, B. F. - Ciência e comportamento humano. São Paulo: Martins<br />
Fontes, 1978.<br />
CHALEGRE, P. - O principio <strong>do</strong> <strong>interesses</strong> <strong>coincidentes</strong>. Livro virtual.<br />
(http://www.cesat.br/biblioteca/web/Administracao/livro.pdf, 2001), captura<strong>do</strong> em<br />
05/04/2004.<br />
YIN, R. K. - Estu<strong>do</strong> de caso, Planejamento e méto<strong>do</strong>s. 2 a ed. Porto Alegre:<br />
Bookman. 1994.<br />
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