Tese de doutorado - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações - UFF

1 97
refira-se às suas odes) uma arquitetura textual em diálogo com a linguagem pictórica.
A percepção romântica de Victor Hugo como gênio capaz de criar “do nada” um
universo literário é posteriormente apresentada nos próprios romances alencarinos, a se
desenharem em luz e sombra:
Vítor Hugo é o poeta da forma brilhante; quando leio
algumas páginas de suas odes, parece -me que me sinto de
repente sentado a um canto da oficina de Tintoretto, ou do
gabinete de Cellini, e que vejo o pintor e o escultor traçar
com o pincel ou com o buril um quadro ou um baixo relevo; a
luz cintila formando claros e escuros, a côr reflete os seus
raios cambiantes, tudo se anima, vive e surge do nada, ao
aceno do gênio criador.
(ALENCAR, 1966, p. 883)
Apesar da possibilidade de indicarmos estes pontos de intersecção entre o
pensamento de Alencar e a filosofia romântica, percebemos no romancista uma reflexão
muito mais intuitiva do que teórica.
Há em sua leitura sobre as linguagens artísticas, a percepção de uma tríade, formada
por pensamento, linguagem e forma, como demonstra ao esboçar um cânone nas cartas:
Homero, Miguel Ângelo e Rossini, é o mesmo homem, ora
poeta, ora escultor, ora músico; Virgílio, Donizeti e o
Ticiano, é a mesma trindade poética e artística; Shakespeare,
o Veronese e Meyerbeer são três transformações de um só
gênio; Píndaro, Rafael e Verdi, é o mesmo lirismo na poesia,
na pintura e na música [...] Eis como eu compreendo a poesia
e como a estudo num poema ou num livro de versos; quero
ver, sentir e ouvir o pensamento do poeta que fala por essa
tríplice frase da razão, do coração e dos sentimentos.
(ALENCAR, 1966, p. 884).
e relacionar a tríade música – pintura- poesia à razão-coração-sentimento: assim como as
artes são irmãs, a razão e a emoção comporiam a construção da visão de mundo do gênio.
Visão devidamente orientada não só pela razão e pelos sentidos, como pela imaginação,