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Tese de doutorado - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações - UFF

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1 87<br />

Esquecida por sua ave <strong>de</strong> estimação, a lembrança <strong>de</strong> Iracema sobrevive no filho Moacir,<br />

garantia lábil, já que este apaga-se na narrativa. A Martim resta a sombra <strong>de</strong> Iracema, ruína<br />

<strong>de</strong> uma lembrança <strong>de</strong>stinada . a morrer:<br />

A lufada intermitente traz da praia um eco vibrante, que<br />

ressoa entre o marulho das vagas:<br />

-Iracema!<br />

O moço guerreiro, encostado ao<br />

mastro, leva<br />

os olhos presos na sombra fugitiva da<br />

terra...<br />

(ALENCAR, p.<br />

12)<br />

Neste quadro, cabe ao narrador estabelecer a mediação entre os restos <strong>de</strong>ssa história<br />

e o leitor. Ao exumar a morta Iracema dos ecos da tradição oral 35 o narrador a legitima<br />

como “fonte importante da história, e às vezes a mais pura e verda<strong>de</strong>ira” (ALENCAR,<br />

1980, p. 13), pois percebida como resgardada em um núcleo protetor, criado pelo<br />

afastamento entre interior e metrópole e pela ingenuida<strong>de</strong>/genuida<strong>de</strong> resguardadas no<br />

anonimato das vozes transmissoras da lenda 36 . Assim como a jangada à <strong>de</strong>riva, na cena<br />

inicial, a lenda <strong>de</strong> Iracema paira, como promessa <strong>de</strong> um mistério a ser <strong>de</strong>cifrado, como<br />

ruína a ser exumada. A sua leitura perfaz-se como potência <strong>de</strong> enunciação <strong>de</strong> signos<br />

<strong>de</strong>rivados da imaginação criativa, a <strong>de</strong>cifrar o legado fragmentado <strong>de</strong> uma história possível.<br />

Se as notas revelam a erudição e a intenção autoral, a narrativa, por sua vez, simula<br />

o narrador como editor <strong>de</strong> um legado oral, <strong>de</strong>ixado por Martim, personagem fictício<br />

inspirado em Martim Soares Moreno, na visão do narrador mais do que “um dos excelentes<br />

35<br />

Por outro lado, a própria tradição oral era na maior parte das vezes acessada em compilações, em uma<br />

leitura filtrada pelo olhar da elite intelectual.<br />

36<br />

Entretanto, alguns anos mais tar<strong>de</strong>, em As minas <strong>de</strong> prata, a tradição é representada como passível <strong>de</strong> ser<br />

falsa, no diálogo entre Estácio e Vaz Caminha: “- Sei <strong>de</strong>la (da história sobre as minas <strong>de</strong> prata) o que me tem<br />

ensinado a tradição popular; contam que meu pai conhecia o segredo <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>s minas <strong>de</strong> prata, que recusou<br />

<strong>de</strong>scobrir por lhe haver El-Rei negado a recompensa que pedia.<br />

- A tradição mente, filho.” ( ALENCAR, 1977, p. 25)

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