Tese de doutorado - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações - UFF
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<strong>de</strong>ixava <strong>de</strong> ter passado e convertia -se em um projeto <strong>de</strong> futuro” 34 (PAZ, 2003, p. 127). O<br />
silêncio em torno <strong>de</strong> Moacir, o primeiro brasileiro, po<strong>de</strong> ser lido pela compreensão do<br />
<strong>de</strong>slocamento do americano, palavra que <strong>de</strong>signara durante mais <strong>de</strong> trezentos anos “um<br />
homem que não se <strong>de</strong>finia pelo que fizera e sim pelo que faria” (PAZ, 2003, p. 127). A<br />
i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> enigmática une-se à projeção <strong>de</strong> um futuro-mais-que-perfeito, inalcançável, o<br />
que torna o americano “um ser <strong>de</strong> pouca realid a<strong>de</strong>” (PAZ, 2003, p. 127), sem passado, não<br />
tendo “mais do que o futuro”: “Americanos: homens <strong>de</strong> pouca realida<strong>de</strong>, homens <strong>de</strong> pouco<br />
peso” (PAZ, 2003, p. 127).<br />
Moacir liga-se aos brasileiros <strong>de</strong> outras localida<strong>de</strong>s, através <strong>de</strong> sua história, pela<br />
mestiçagem. Ser cearense significa não ser: indígena ou colonizador. Moacir não pertence<br />
aos povos <strong>de</strong> Iracema e Martim, mas ao povo brasileiro, resultado do choque e do<br />
sofrimento. A diferença instaura a construção <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> terceira.<br />
Pensada como alegoria da nação, a personagem título é violada e esquecida, pois<br />
“Tudo passa sobre a terra”. A relação impossível com Martim, solucionada na narrativa<br />
com a sua morte, a faz caminhar rumo à catástrofe, tão mais perto quanto mais Iracema<br />
afasta-se do espaço selvagem, rumo ao litoral, local limítrofe <strong>de</strong> sua sobrevivência física e<br />
simbólica.<br />
Na tensão entre memória e esquecimento presente na narrativa, a possibilida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
sobrevivência da memória <strong>de</strong> Iracema é a <strong>de</strong> recuperação <strong>de</strong> pistas – ainda que imaginárias,<br />
para a construção <strong>de</strong> imagens alternativas do passado brasileiro, construída em intenso<br />
diálogo com os textos coloniais e historicistas, em um exercício <strong>de</strong> criação e reelaboração.<br />
34 O <strong>de</strong>senraizamento como condição do colono é metaforizado em As minas <strong>de</strong> prata e em Guerra dos<br />
Mascates, por exemplo, como mostraremos na próxima parte do trabalho.