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Tese de doutorado - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações - UFF

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romanesca. Assim, o romance é capaz do que Lukács chama <strong>de</strong> recordação criadora, que ao<br />

invés <strong>de</strong> cristalizar e fossilizar o objeto, o capta e o subverte.<br />

Isto torna possível a percepção da forma romanesca como expressão capaz <strong>de</strong> lidar<br />

com a mudança na me ntalida<strong>de</strong> oitocentista em relação ao significado da memória,<br />

compreendida como uma forma <strong>de</strong> subversão continuamente reelaborada em seu atrito com<br />

a percepção do tempo enquanto duração.<br />

Cabe apontar, porém, que as relações entre tempo e memória nos romances <strong>de</strong> José<br />

<strong>de</strong> Alencar ainda não se coadunam à perspectiva da durée, embora já compartilhem <strong>de</strong> uma<br />

abordagem diferente acerca da questão temporal em sua relação com a memória. Em A pata<br />

da gazela, por exemplo, o jovem Leopoldo, absorto em suas reminiscências, abstrai-se em<br />

relação ao ambiente que o cerca; a lembrança é representada, sobretudo, como um<br />

mergulho tão profundo na subjetivida<strong>de</strong> que pressupõe o abandono do mundo exterior:<br />

(...) Leopoldo, sentado à janela <strong>de</strong> peitoril <strong>de</strong> sua casa,<br />

fumava um charuto com os olhos engolfados no azul diáfano<br />

do céu, on<strong>de</strong> cintilava a primeira estrela. A seus pés<br />

<strong>de</strong>sdobrava-se a baía plácida e serena como um lago, com a<br />

sua graciosa cintura <strong>de</strong> montanhas, caprichosamente<br />

recortadas.<br />

O espírito do moço não se embebia <strong>de</strong>certo na perspectiva<br />

<strong>de</strong>ssa encantadora natureza, sempre admirada e sempre<br />

nova. Ao contrário, abandonava-se todo às recordações <strong>de</strong><br />

seu encontro pela manhã e aos enlevos que lhe <strong>de</strong>ixava a<br />

contemplação da linda moça. Passava e repassava em sua<br />

memória, como em um cadinho, todas as circunstâncias<br />

mínimas <strong>de</strong>ste gran<strong>de</strong> e importante acontecimento...<br />

(ALENCAR, 1995, p. 22).<br />

Da mesma forma, neste texto, a memória não pressupõe a verda<strong>de</strong>, não se assume<br />

como a reconstrução fiel do que foi vivido, mas, ao lado da imaginação, reconstrói a<br />

experiência subjetiva, projetando-se mais como o <strong>de</strong>sejo e o sonho, como a leitura <strong>de</strong>ste<br />

outro trecho <strong>de</strong> A pata da gazela nos permite inferir:

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