Tese de doutorado - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações - UFF
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Por isto, seria impossível <strong>de</strong>marcar a origem e o término <strong>de</strong> cada um <strong>de</strong>stes<br />
processos. Assim, Bergson rompe com a percepção da memória como meramente uma<br />
categoria <strong>de</strong> armazenamento e indica que<br />
o papel do corpo não é armazenar as lembranças, mas<br />
simplesmente escolher, para trazê-la à consciência distinta<br />
graças à eficácia real que lhe confere, a lembrança útil,<br />
aquela que completará e esclarecerá a situação presente em<br />
vista da ação final. É verda<strong>de</strong> que esta segunda seleção é bem<br />
menos rigorosa que a primeira, porque nossa experiência<br />
passada é uma experiência individual e não mais comum,<br />
porque temos sempre muitas lembranças diferentes, capazes<br />
<strong>de</strong> se ajustarem igualmente a uma mesma situação atual, e<br />
também porque a natureza não po<strong>de</strong> ter aqui, como no caso<br />
da percepção, uma regra inflexível para <strong>de</strong>limitar nossas<br />
representações. Uma certa margem é portanto<br />
necessariamente <strong>de</strong>ixada <strong>de</strong>sta vez à fantasia; e, se os<br />
animais não se aproveitam muito <strong>de</strong>la, cativos que são da<br />
necessida<strong>de</strong> material, parece que o espírito humano, ao<br />
contrário, lança -se a todo instante com a totalida<strong>de</strong> <strong>de</strong> sua<br />
memória <strong>de</strong> encontro à porta que o corpo lhe irá entreabrir:<br />
daí os jogos da fantasia e o trabalho da imaginação –<br />
liberda<strong>de</strong>s que o espírito toma com a natureza. (BERGSON;<br />
1999, 210).<br />
O tempo espacializado, o tempo da história, é confrontado na proposta bergsoniana<br />
ao tempo percebido como durée, como tempo da experiência interna, por ele consi<strong>de</strong>rado o<br />
da “verda<strong>de</strong>ira” memória, a perceber a temporalida<strong>de</strong> como um novelo no qual se enredam<br />
o passado e o futuro, alcançado pela intuição pura.<br />
A noção bergsoniana <strong>de</strong> imagem é central para a compreensão do cruzamento entre<br />
a memória e a percepção, realçando assim a ligação entre memória e espírito. Esta noção<br />
influenciou sobremaneira o discurso literário, principalmente o proustiano que, <strong>de</strong> uma<br />
forma inédita, propôs a articulação da tría<strong>de</strong> mito- história- romance, gerando uma nova<br />
concepção sobre as relações entre memória e forma romanesca.