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Tese de doutorado - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações - UFF

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A história do sertão é organizada na ficção em torno <strong>de</strong> Poti, guerreiro e guardião da<br />

memória <strong>de</strong> sua quase extinta tribo. Abre-se na fala da personagem uma segunda narração<br />

que simula o resgate da memória indígena, articulando paisagem e i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>:<br />

Antes que o pai <strong>de</strong> Jacaúna e Poti, o valente guerreiro<br />

Jatobá, mandasse sobre todos os guerreiros pitiguaras, o<br />

gran<strong>de</strong> tacape da nação estava na <strong>de</strong>stra <strong>de</strong> Batuireté, o<br />

maior chefe, pai <strong>de</strong> Jatobá. Foi ele que veio pelas praias do<br />

mar até o rio do jaguar, e expulsou os tabajaras para <strong>de</strong>ntro<br />

das terras, marcando a cada tribo seu lugar; <strong>de</strong>pois entrou<br />

pelo sertão até a serra que tomou seu nome...Quando suas<br />

estrelas eram muitas...Chamou então o guerreiro Jatobá e<br />

disse: - Filho, toma o tacape da nação pitiguara. Tupã não<br />

quer que Batuireté o leve mais à guerra, pois tirou a força <strong>de</strong><br />

seu corpo...Jatobá empunhou o tacape dos pitiguaras.<br />

Batuireté tomou o bordão <strong>de</strong> sua velhice e caminhou. Foi<br />

atravessando os vastos sertões, até os campos viçosos on<strong>de</strong><br />

correm as águas que vêm das bandas da noite. Quando o<br />

velho guerreiro arrastava o passo pelas margens e a sombra<br />

<strong>de</strong> seus olhos não lhe <strong>de</strong>ixava que visse mais os frutos nas<br />

árvores ou os pássaros no ar, ele diz em sua tristeza: - Ah!<br />

Meus tempos passados! A gente que o ouvia chorava a ruína<br />

do gran<strong>de</strong> chefe; e <strong>de</strong>s<strong>de</strong> então passando por aqueles lugares,<br />

repetia suas palavras; don<strong>de</strong> veio chamar-se o rio e os<br />

campos, Quixeramobim...Batuireté veio pelo caminho das<br />

garças até aquela serra que tu vês ao longe, e on<strong>de</strong> primeiro<br />

habitou...Seu filho já dorme embaixo da terra, e ele ainda na<br />

oura lua cismava na porta <strong>de</strong> sua cabana, esperando a noite<br />

que traz o gran<strong>de</strong> sono. Todos os chefes pitiguaras, quando<br />

acordam à voz da guerra, vão pedir ao velho que lhes ensine<br />

a vencer, porque nenhum outro guerreiro jamais soube como<br />

ele combater. Assim, as tribos não o chamam mais pelo nome,<br />

senão o gran<strong>de</strong> sabedor da guerra, Maranguab (ALENCAR,<br />

s.d., p. 61, fala <strong>de</strong> Poti).<br />

A invenção <strong>de</strong> uma narrativa indígena que historiciza e é historicizada pela<br />

paisagem ao mesmo tempo ganha foros <strong>de</strong> legitimida<strong>de</strong> pelas notas, que alu<strong>de</strong>m a<br />

historiadores, como Martius e às lendas e tradições indígenas. O artesanato da memória via<br />

ficção constrói-se na manipulação <strong>de</strong>ssas narrativas.

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