Tese de doutorado - Biblioteca Digital de Teses e Dissertações - UFF
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mobiliada, função que dialoga com a rejeição romântica ao consumo capitalista.<br />
O diálogo com as artes plásticas faz-se também presente na reivindicação da arte<br />
clássica como forma <strong>de</strong> relativizar a presença do erótico no romance, em um paralelo entre<br />
o classicismo e sua nu<strong>de</strong>z que não enrubesceria 47 no diálogo com a narratária do romance:<br />
Entretanto, se a senhora não conhece as O<strong>de</strong>s <strong>de</strong> Horácio e<br />
os amores <strong>de</strong> Ovídio, se nunca leu a <strong>de</strong>scrição da festa <strong>de</strong><br />
Baco e não tem notícia dos mistérios <strong>de</strong> Adônis ou do rito<br />
afrodísio das virgens <strong>de</strong> Pafos, que em comemoração ao<br />
nascimento da <strong>de</strong>usa iam certos dias do ano banhar-se na<br />
espuma do mar e oferecer as primícias do seu amor a quem<br />
mais cedo as cobiçava; se ignora tudo isto, rasgue estas<br />
folhas (...)<br />
(ALENCAR, 1966, p. 339).<br />
Relação retomada pelo narrador ao comentar a revolta <strong>de</strong> Paulo com a cena:<br />
Quando a mulher se <strong>de</strong>snuda para a arte, a inspiração a<br />
transporta para mundos i<strong>de</strong>ais, on<strong>de</strong> a matéria se <strong>de</strong>pura ao<br />
hálito <strong>de</strong> Deus; quando porém a mulher se <strong>de</strong>snuda para<br />
cevar, mesmo com a vista, mesmo com a concupiscência <strong>de</strong><br />
muitos, há nisto uma profanação da beleza e da criatura<br />
humana, que não tem nome.<br />
(ALENCAR, 1966, p. 352)<br />
Entretanto, como na obra <strong>de</strong> Manet, a figura nua escandaliza por aludir ao mundo<br />
coevo a Alencar; é a condição <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>rna que gera o interdito à “bacante” Lúcia.<br />
A cena do bacanal é <strong>de</strong>scrita segundo a dicção pictórica, como a aparição <strong>de</strong> Guida.<br />
Em chiaroscuro e tons <strong>de</strong> vermelho, cor índice da luxúria na narrativa, o cenário lascivo da<br />
casa <strong>de</strong> Sá é erguido em múltiplos espelhos, <strong>de</strong>svendando i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s não assumidas no<br />
espaço social em uma atmosfera propositalmente confusa, <strong>de</strong> aparências:<br />
A sala não é gran<strong>de</strong>, mas espaçosa; cobre as pare<strong>de</strong>s um<br />
papel aveludado <strong>de</strong> sombrio escarlate, sobre o qual se<br />
<strong>de</strong>stacam entre espelhos duas or<strong>de</strong>ns <strong>de</strong> quadros<br />
47 Po<strong>de</strong>mos aludir comparativamente à “Dejéuner sur l´herbe” <strong>de</strong> Eduard Manet e o escândalo produzido pela<br />
nu<strong>de</strong>z que, nas palavras poéticas <strong>de</strong> Drummond, “pela primeira vez nos provoca”: o nu escandaliza por ser<br />
contemporâneo e não uma alusão mítica.