A História Natural dos sertões do Ceará em "Notas de ... - anpuh
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Diante da presença <strong><strong>do</strong>s</strong> cearenses, Al<strong>em</strong>ão d<strong>em</strong>onstra um sentimento <strong>de</strong> estranheza.<br />
Ele percebia muitas diferenças com relação à socieda<strong>de</strong> <strong>do</strong> Rio <strong>de</strong> Janeiro, marcada pela<br />
gran<strong>de</strong> presença <strong>de</strong> negros e alguns brancos. Em suas observações sobre a gente <strong>do</strong> <strong>Ceará</strong><br />
escreve:<br />
Ainda não vi nesta gente urna mulher, n<strong>em</strong> um hom<strong>em</strong> d<strong>em</strong>asiadamente<br />
gor<strong><strong>do</strong>s</strong>. São to<strong><strong>do</strong>s</strong> mui inteligentes, <strong>de</strong>s<strong>em</strong>baraça<strong><strong>do</strong>s</strong>, e falam b<strong>em</strong> (...) e com<br />
termos e frases, às vezes pitorescas; a sua pronuncia é antes <strong>de</strong>scansada que<br />
apressada, corren<strong>do</strong> <strong>em</strong> umas e <strong>de</strong>scansan<strong>do</strong> <strong>em</strong> outras sílabas. Os homens<br />
são <strong>em</strong> geral imprevi<strong>de</strong>ntes, in<strong>do</strong>lentes, e pouco amigos <strong>do</strong> trabalho; pelo<br />
contrário as mulheres estão s<strong>em</strong>pre ocupadas (enquanto eles se balançam nas<br />
re<strong>de</strong>s) faz<strong>em</strong> obras mui mimosas <strong>de</strong> rendas, <strong>de</strong> crivos, e <strong>de</strong> teci<strong><strong>do</strong>s</strong>, etc. As<br />
mulheres são mui prolíficas (o que também acontece a respeito <strong><strong>do</strong>s</strong> brancos).<br />
(ALEMÃO. <strong>Notas</strong> sobre Fortaleza e Pacatuba. apud DAMASCENO e<br />
CUNHA, 1961:210-211.)<br />
Suas impressões aparentam construir uma imag<strong>em</strong> naturalizada das classes<br />
populares. Como l<strong>em</strong>bra Jacques Revel “a cultura das elites molda permanent<strong>em</strong>ente a<br />
cultura popular ao que lhe convém.” (REVEL, 1990: 47). Freire Al<strong>em</strong>ão segue uma<br />
tradição já estabelecida na Europa, nas Américas e na Literatura <strong>de</strong> viag<strong>em</strong>, <strong>de</strong> consi<strong>de</strong>rar<br />
o hom<strong>em</strong> como produto <strong>do</strong> meio - sua religião, linguag<strong>em</strong>, artefatos, festas, entre outros<br />
seriam como que produtos <strong>do</strong> solo e da paisag<strong>em</strong>.<br />
Em seus escritos Al<strong>em</strong>ão <strong>de</strong>staca-se <strong>de</strong> seus companheiros da Comissão <strong>em</strong> um<br />
aspecto: ao falar das secas e <strong><strong>do</strong>s</strong> invernos no <strong>Ceará</strong>. Enquanto os outros cientistas<br />
buscavam informações sobre as secas, Al<strong>em</strong>ão procurava saber das cheias, <strong><strong>do</strong>s</strong> t<strong>em</strong>pos<br />
invernosos. Capan<strong>em</strong>a, por ex<strong>em</strong>plo, tratará sobre esse t<strong>em</strong>a <strong>em</strong> seu Relatório apresenta<strong>do</strong><br />
ao IHGB e <strong>em</strong> vários artigos publica<strong><strong>do</strong>s</strong> a partir <strong>de</strong> 1862 como As secas <strong>do</strong> <strong>Ceará</strong>,<br />
Apontamentos sobre a seca <strong>do</strong> <strong>Ceará</strong> e A seca no Norte. Para o presi<strong>de</strong>nte da Comissão,<br />
as m<strong>em</strong>órias das quadras invernosas eram mais freqüentes nas conversas com os<br />
sertanejos, apesar <strong><strong>do</strong>s</strong> <strong>de</strong>sgastes e flagelos que as secas causavam, as cheias <strong><strong>do</strong>s</strong> rios e até<br />
mesmo os prejuízos causa<strong><strong>do</strong>s</strong> pela abundância das águas eram mais relata<strong><strong>do</strong>s</strong> pelo povo.<br />
Dedica muitas passagens <strong><strong>do</strong>s</strong> seus escritos para falar <strong><strong>do</strong>s</strong> invernos e das chuvas. Em seu<br />
Relatório <strong>de</strong>fine resumidamente o que era o inverno no <strong>Ceará</strong>:<br />
O verda<strong>de</strong>iro inverno, ou mais propriamente a estação das chuvas, começa <strong>em</strong><br />
fins <strong>de</strong> janeiro ou princípios <strong>de</strong> fevereiro, sua força é <strong>de</strong> março a abril e acaba<br />
<strong>em</strong> junho. Ele consiste <strong>em</strong> grossos chuveiros, quase diários, às vezes repeti<strong><strong>do</strong>s</strong>,<br />
mas <strong>de</strong>ixan<strong>do</strong> s<strong>em</strong>pre parte <strong>do</strong> dia livre para o trabalho: raro é o dia ou noite <strong>de</strong><br />
chuva constante no <strong>Ceará</strong>. (ALEMÃO, In: Trabalhos da Comissão Científica <strong>de</strong><br />
Exploração, 1862:313)<br />
E acrescenta, “Ao concurso <strong>de</strong>stas circunstancias e à composição e configuração <strong>de</strong><br />
seu solo <strong>de</strong>ve a Província a sua fertilida<strong>de</strong> e a bela vegetação que a cobre, ainda que não<br />
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