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A memória ao alcance das mãos

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Vestir o presente com a<br />

<strong>memória</strong> do passado<br />

Roupas, sapatos e acessórios podem significar muito mais do que<br />

objetos colecionáveis. Eles são farto material para análise histórica.<br />

Por Roberta Dezan<br />

O ato de colecionar é tão velho quanto o homem. Ele atende à sua necessidade de, através do inventário,<br />

do registro, arquivamento, catalogação e outras práticas análogas, ordenar a realidade excessivamente<br />

dispersa do mundo, e, no limite desse esforço ordenador, dar um sentido à própria existência.<br />

Frederico Morais, O Colecionismo no Sistema da Arte (Soraia Cals, 2003)<br />

A moda mantém relações diretas e distintas com a palavra “coleção”. O termo pode ser empregado para determinar<br />

o conjunto de peças de vestuário e acessórios acumulados no decorrer do tempo, com a intenção<br />

de preservar a história de uma época, deixar um legado para as gerações posteriores, ou até mesmo por<br />

razões unicamente afetivas, acaso, impulso repentino ou gosto pessoal. Alguns estudiosos do colecionismo<br />

chegam a falar em obsessão, ansiedade, sublimação, compensação autogratificante e coisas do gênero.<br />

Outra interseção entre os termos talvez soe mais interessante. Hoje, quando nos referimos <strong>ao</strong> conjunto de<br />

peças cria<strong>das</strong> por um designer para determinada estação, com variações de um mesmo tema, utilizamos a<br />

palavra “coleção” para designá-lo. Essa relação elucida a inserção de um modo coletivo de trajar e diz muito<br />

sobre a sociedade e os hábitos de consumo, como os conhecemos atualmente.<br />

56 Continuum Itaú Cultural<br />

reportagem<br />

Imagem da exposição Flávio de Carvalho Desveste a Moda Brasileira da Cabeça <strong>ao</strong>s Pés – MuBE | foto: Gustavo Zylbersztajn<br />

“As roupas dançam nos cabides e depois envolvem os corpos<br />

humanos num balé que aproxima, afasta e se recria todos<br />

os dias para embalar nosso modo de vida em direção <strong>ao</strong><br />

futuro.” (Carol Garcia e Ana Paula de Miranda)<br />

A coleção de moda é um fenômeno recente e surgiu<br />

somente com o estabelecimento dos costureiros em<br />

maisons. Com a chegada da máquina de costura, em<br />

1870, as casas puderam produzir mais rapidamente e<br />

oferecer uma “coleção de modelos” ainda inéditos. “A<br />

função do costureiro, em sua natureza, era apresentar<br />

algo à elite diferente do que havia caído no gosto<br />

popular. O objetivo era distinguir os privilegiados tradicionais<br />

daqueles novos ricos, emergentes. Hoje em<br />

dia a coisa é mais complexa, e há estilos cuja intenção<br />

é exatamente uniformizar. Sendo assim, analisar uma<br />

coleção de moda nos dá a ideia de conflitos de classes,<br />

de costumes. Falar de moda não é falar exclusivamente<br />

de roupas”, explica a especialista em autonomia da<br />

moda em espaços culturais Priscila Rezende.<br />

Instrumento de documentação<br />

Se a moda, como pensa o jornalista especializado no<br />

assunto Ricardo Oliveros, “é um dos mais importantes<br />

e confiáveis documentos para entender o espírito de<br />

cada tempo”, ilustrações, registros fotográficos, croquis,<br />

vídeos, catálogos e revistas e coleções de roupa<br />

e complemento desempenham a função fundamental<br />

de atuar como materiais históricos.<br />

Esses instrumentos documentais nos permitem analisar,<br />

refletir e entender melhor as rupturas sociais e<br />

estéticas que nos trouxeram até aqui. Dessa forma,<br />

podemos compreender com mais clareza e senso<br />

crítico o que passou, a realidade de hoje e o que<br />

ainda está por vir. “As roupas dançam nos cabides<br />

e depois envolvem os corpos humanos num balé<br />

que aproxima, afasta e se recria todos os dias para<br />

embalar nosso modo de vida em direção <strong>ao</strong> futuro”,<br />

observam Carol Garcia e Ana Paula de Miranda, em<br />

Moda É Comunicação: Experiências, Memórias, Vínculos<br />

(Anhembi Morumbi, 2005).<br />

Colecionismo x consumismo<br />

A consultora de moda Gloria Kalil reforça a importância<br />

de diferenciar colecionismo de consumismo.<br />

“Normalmente colecionadores de moda são profissionais<br />

da área, pois têm como intenção primordial<br />

conservar peças representativas, símbolos de vira<strong>das</strong><br />

históricas, de transições, como no caso dos<br />

tailleurs de jérsei de Coco Chanel e de peças de<br />

Yves Saint Laurent. Uma mulher que compra<br />

cem pares de sapatos numa única<br />

temporada está mais para<br />

Participe com suas ideias 57

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