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A memória ao alcance das mãos

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Vista do pátio do Reina Sofía | foto: Joaquín Cortés Visitantes observam obra exposta no Malba | foto: divulgação<br />

Antes de tudo isso, no entanto,<br />

há a aquisição da obra. Em 2004, a<br />

política de aquisições do Malba focou-se<br />

em fotografia contemporânea. Nos museus,<br />

porém, assim como na vida de qualquer um de<br />

nós, o orçamento disponível é critério fundamental.<br />

“Comprar obras de contemporâneos do Brasil ou<br />

da Colômbia está muito complicado no momento,<br />

pois esses artistas estão muito valorizados”, comenta<br />

Cintia. Já a Fundação Iberê Camargo dificilmente adquire<br />

obras. Há o setor de documentação e pesquisa,<br />

que faz a catalogação de trabalhos que não se encontram<br />

no acervo, mas o objetivo é apenas registrar seus<br />

atuais endereços e proprietários, não comprá-los.<br />

Vista interna da Fundação Iberê Camargo | foto: Mathias Cramer<br />

A informatização dos museus – processo buscado e<br />

recomendado pelo Ministério da Cultura através do<br />

Sistema Nacional de Museus –, quando aplicada no<br />

caso específico do acervo, não resolve a questão da<br />

falta de espaço. Pois quem jogaria fora um original de<br />

Picasso depois de ele ter sido digitalizado? Outro problema<br />

vem <strong>das</strong> novas instalações da arte contemporânea,<br />

que excedem os espaços tradicionais para guardar<br />

obras. “Recentemente chegou <strong>ao</strong> Malba uma obra<br />

de 2 metros de altura por 2 metros de largura”, relata<br />

Cintia. É um problema que não existe, por exemplo, na<br />

Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre. “O artista<br />

plástico Iberê Camargo pintou, gravou e desenhou<br />

num formato convencional”, comenta Fábio Coutinho,<br />

superintendente cultural da instituição. Em razão disso,<br />

apesar de o acervo contar com mais de 5 mil obras,<br />

uma pequena reserva técnica dá conta do recado.<br />

Como uma obra vai parar dentro do museu?<br />

O perfil de cada instituição revela-se no trabalho da<br />

curadoria – que tanto pode ser para uma exposição<br />

específica quanto para decidir que obras devem ser<br />

adquiri<strong>das</strong>. Um museu pode trabalhar apenas com<br />

gravuras e pinturas, ou esculturas (que já exigem um<br />

cuidado diferenciado para conservação e armazenamento),<br />

ou com a imprevisível arte contemporânea,<br />

ou, ainda, com arte eletrônica. Se uma instituição<br />

concentra-se na obra de determinado artista ou estilo,<br />

diminui o problema da superlotação da reserva<br />

técnica, e a instituição tende a centrar suas atividades<br />

em esforços de pesquisa e catalogação, além de<br />

formas de exposição e interação com o público. Esse<br />

último caso é o que acontece na Fundação Iberê<br />

Camargo, que não é exatamente um museu, mas<br />

uma instituição que pesquisa, cataloga, armazena e<br />

expõe a obra do artista.<br />

O trabalho da mediação com os visitantes também<br />

é fundamental. Os museus contemporâneos têm<br />

um cuidado com a pluralidade do público, propondo<br />

mediações que satisfaçam tanto leigos quanto<br />

especialistas. Algumas exposições prezam mais o<br />

lúdico e a interatividade, como é o caso <strong>das</strong> realiza<strong>das</strong><br />

nos museus científicos. Outras instituições<br />

se preocupam mais com o trabalho<br />

formativo, desenvolvendo programas<br />

de arte-educação.<br />

Quem escreve o texto <strong>das</strong> etiquetas?<br />

Antes e depois de cada exposição, acontece muito<br />

mais coisa do que se imagina. A jornalista Luísa<br />

Fedrizzi diz que, às vezes, se um dos três andares de<br />

exposição da Fundação Iberê Camargo estiver fechado,<br />

há pessoas que reclamam, mandando e-mails do<br />

tipo: “Por que não montam as exposições na segunda,<br />

quando o museu não abre <strong>ao</strong> público?”.<br />

Quando uma exposição chega, as obras precisam ficar<br />

em quarentena para não haver nenhum problema<br />

com mudanças bruscas de temperatura e umidade.<br />

Depois, as caixas de transporte são abertas e tudo é<br />

fotografado e catalogado. Só então vem a montagem,<br />

que muitas vezes tem desafios à parte. Depois<br />

de passar pelo MoMA e pelo Reina Sofía, a obra On<strong>das</strong><br />

Para<strong>das</strong> de Probabilidade, de Mira Schendel, chegou à<br />

Fundação Iberê Camargo. A peça tem 27.500 fios de<br />

náilon, que pendem do teto. Ok, mas pendem como?<br />

Aí é que está o problema. Para montar o trabalho, a<br />

equipe de produção teve de conseguir 27.500 pequenos<br />

ganchos. Depois de arranjar um fornecedor, que<br />

não honrou o compromisso da entrega, o material<br />

foi comprado às pressas direto do fabricante. No fim,<br />

após cinco dias de montagem, a obra ficou pronta.<br />

E então a exposição acaba. A exposição, não o trabalho.<br />

Fedrizzi conta que “sempre depois de uma<br />

exposição vem uma equipe que repara o espaço,<br />

deixando-o zerado para o próximo curador”. Em se<br />

tratando de arte contemporânea, nem sempre são<br />

reparos simples. Em novembro de 2010, por exemplo,<br />

a obra Ixodidae, do artista plástico Cadu, furava sem<br />

cessar uma <strong>das</strong> paredes da Fundação como componente<br />

do processo artístico.<br />

Mesmo em obras convencionais, há de se perguntar:<br />

quem fornece as molduras? Quem escreve o texto <strong>das</strong><br />

etiquetas? “Em geral, achamos que as obras nasceram<br />

com as etiquetas”, comenta Ana Carvalho, citada no<br />

início desta reportagem. “O que se vê, quando se visita<br />

uma exposição, é a ponta do iceberg”, diz ela. É como<br />

os estudantes da UFRGS, cujo trabalho de montar a<br />

exposição, na chuvosa Porto Alegre de 9 de novembro<br />

de 2010, não ficou aparente dois dias depois. Ou<br />

como o trabalho do jornalista, cujos sapatos, molhados<br />

no processo de fazer a reportagem, dificilmente<br />

aparecem no texto final.<br />

18 Continuum Itaú Cultural Participe com suas ideias 19

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