15.04.2013 Views

Sem título-10 - Arquivo Nacional

Sem título-10 - Arquivo Nacional

Sem título-10 - Arquivo Nacional

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

R V O<br />

opções e atividades dos segmentos subalternos<br />

e, com efeito, dos artesãos.<br />

Em meio ao mercado interno colonial,<br />

não auto-regulado e distante da<br />

impessoalidade das transações, é possível<br />

apreciar exemplos da participação<br />

dos artesãos; exemplos que, entendidos<br />

como práticas recorrentes entre os oficiais<br />

mecânicos, devem ilustrar suas possibilidades<br />

de acumulação, demonstrando<br />

a inserção dos mesmos nas redes<br />

mercantis da cidade. Não se trata apenas<br />

de indicar a presença deste ou daquele<br />

artífice nos negócios registrados<br />

nas escrituras públicas, nem de compor<br />

um quadro das operações em que eles<br />

se envolvem. Antes, o que se espera extrair<br />

dos casos em questão é uma medida<br />

das oportunidades e das expectativas<br />

dos indivíduos, para proporcionar uma<br />

maior visibilidade da sua participação<br />

nos negócios mercantis e nas transações<br />

urbanas: a parte que lhe toca na produção<br />

da riqueza social e o lugar em que<br />

se desenvolve a sua atuação.<br />

Nesse sentido, um interessante exemplo<br />

é fornecido por quatro registros de empréstimos<br />

que falam tanto do mercado<br />

de crédito quanto dos vínculos sociais<br />

nele presentes.<br />

Em 1727, Antônio Antunes, mestre sapateiro,<br />

registra uma confissão de dívida<br />

de 298$000 contraída ao homem de<br />

negócio João Luís Sol. Antunes comprara<br />

a este, em junho daquele ano, 38,5<br />

dúzias de córdovas (couro de cabra curtido,<br />

para calçados), para pagamento em<br />

abril de 1728. 16<br />

Trata-se de operação típica, envolvendo<br />

uma compra a prazo de matéria-prima<br />

por parte do produtor ao negociante. O<br />

termo “confissão de dívida”, instrumento<br />

legal da época, sugere ter-se realizado<br />

a aquisição do couro anteriormente<br />

ao registro da escritura, uma forma de<br />

confirmar o compromisso já assumido<br />

entre as partes. Pode ser também<br />

indicativo de vínculos pessoais sólidos<br />

o bastante para que houvesse confiança<br />

da parte do credor sobre a intenção de<br />

saldar a dívida do lado do devedor. Observe-se,<br />

ainda, a quantidade e a qualidade<br />

do material adquirido pelo mestre<br />

sapateiro: são 462 córdovas, peles já<br />

curtidas para a produção de sapatos.<br />

Sendo comprado às dúzias, cada<br />

cordovão parece ser a medida de um par<br />

de sapatos. Seguindo um tal raciocínio,<br />

pode-se dizer que nosso artesão pretendia<br />

produzir 231 pares de sapatos. E sapatos<br />

de superior qualidade, caso se<br />

atente para o fato de ser o couro de cabra<br />

menos comum na produção dos<br />

curtumes – em detrimento do couro bovino<br />

– e, de fato, menos popular e mais<br />

relacionado ao consumo de elite.<br />

Mestre Antunes possui dez meses para<br />

saldar a dívida. E, se for admitido que<br />

sua lógica é a de um produtor de mercadorias<br />

com boa saída (afinal são sapatos,<br />

bens essenciais) num mercado interno<br />

local – e, talvez, regional – em expansão,<br />

pode-se dizer que se encontra<br />

em condições de satisfazer o credor no<br />

Acervo, Rio de Janeiro, v. 15, nº 2, p. 69-86, jul/dez 2002 - pág.73

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!