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Edição 39 - Memorial da América Latina

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Ilhéu de Guanahani, 19 de outubro do ano 1492 de Nosso Senhor Jesus Cristo<br />

Carmencita queri<strong>da</strong>,<br />

finalmente chegamos a algum lugar. Já não aguentava mais o balanço do navio. Vomitei<br />

feito uma mulher peja<strong>da</strong> por to<strong>da</strong> a viagem. Quando deixamos Palos de la Frontera, no dia 3 de<br />

agosto, não pensei que ficaria mais de dois meses sem pisar em terra.<br />

Pensamos até em fazer um motim contra Colombo. Mas, quando estávamos às vésperas<br />

<strong>da</strong> revolução, chegamos às Índias (se bem que há marinheiros que dizem que este é um novo continente).<br />

A beleza dessa ilha, com seus montes e suas serras, suas águas e seus vales regados por rios<br />

cau<strong>da</strong>losos, é um espetáculo tal que em nenhuma outra terra sob o sol pode haver mais magnífica.<br />

Mas o mais curioso destas paragens não é sua natureza, e sim seus naturais.<br />

Vou contar-lhe como os encontramos:<br />

Quando demos à praia não vimos ninguém, mas, olhando ao longe, percebemos uma poeira<br />

que levantava e, pé ante pé, nos dirigimos até lá.<br />

Qual não foi nosso espanto quando chegamos a um enorme terreno muito limpo, onde havia<br />

uma grama cerradinha e mais de vinte selvagens correndo nus pelo campo. Curiosamente, metade<br />

dos silvestres tinha o corpo totalmente pintado de branco e os outros, de vermelho.<br />

Estavam jogando futebol. E bem. Conseguiam passar a bola de um pé a outro de tantas<br />

e várias formas que eu só podia crer no que via porque meus olhos não mentem como minha boca.<br />

Aos poucos fomos nos enturmando com os torcedores e descobrimos que estávamos vendo o<br />

clássico <strong>da</strong> ilha, algo como o nosso Real Madrid x Barcelona.<br />

Depois <strong>da</strong> parti<strong>da</strong>, que terminou em 3 a 3, Colombo chamou os capitães <strong>da</strong>s equipes e<br />

disse que tomava possessão <strong>da</strong> dita Ilha pelo Rei e pela Rainha, seus senhores. Os selvagens em<br />

na<strong>da</strong> se opuseram, talvez por reconhecerem nossa superiori<strong>da</strong>de, talvez por não entenderem patavinas<br />

de nossa língua.<br />

Demos-lhes alguns gorros vermelhos e contas de vidro que colocaram no pescoço, e outras<br />

coisas muitas de pouco valor, com o que tiveram grande prazer e ficaram tão nossos que era maravilha.<br />

Depois na<strong>da</strong>ram até às barcas, e nos trouxeram fios de algodão em novelos e outras coisas<br />

muitas.<br />

Meus companheiros de navio levarão alguns papagaios para vender na Espanha. Já eu<br />

levarei Caycos e Lucayo. O primeiro é um ágil ponta de lança e o segundo, um respeitável centroavante<br />

trombador. Deixarei de ser cozinheiro e me tornarei empresário de futebol, Carmencita<br />

queri<strong>da</strong>, com o que penso que finalmente poderei pedir sua mão em casamento.<br />

Receba esta carta como um beijo nas palmas de sua mão, <strong>da</strong>do por aquele que a ama com<br />

desespero e esperança,<br />

12<br />

Hernán Hernandes.

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