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não a alimentava com mais sofrimentos do que tinha. Toda aquela sua casa de<br />
livro, feita em folhas de papel, linhas e frases, ali sujas e desleixadas, tornando-se<br />
lixo. E o personagem, entranhado naquele texto em meio ao fedor e resíduos<br />
molhados daquela lata, me colocava, naquele momento, como um ser humano<br />
que efetivamente podia fazer alguma coisa em prol de alguém, ali no caso, os<br />
personagens do livro e o próprio livro. Senti orgulho de mim, aquele exemplar<br />
literário me fez sentir uma pessoa de verdade. Pareceu-me que eles (os<br />
personagens), e o livro, estivessem tão desvalorizados quanto a minha pessoa,<br />
antes daquele momento, e que os personagens daquela história, não mais<br />
queriam viver, junto com aquele livro, mas eu o havia<br />
encontrado. Ele me salvaria e eu retribuiria de alguma forma. Isso não era um<br />
pensamento premeditado em mim, mas era como se eu ouvisse uma voz<br />
silenciosa dizendo nos meus ouvidos, vindo de meu coração: – Não hesite,<br />
apanhe-o, salve-o! Assim como também o personagem tinha sido encontrado e<br />
salvo por um pavão gigante, que podia misteriosamente voar como uma<br />
andorinha. Eu, como um garimpeiro, acabava de encontrar uma pepita valiosa, e<br />
tudo movido por aquele meu fascínio escondido dentro do sentido, pela avidez do<br />
meu querer conhecer, descobrir mundos e sentimentos, cheguei a concluir que<br />
talvez tudo isso nos levasse a uma vida eterna, talvez esta história nos<br />
imortalizasse... Talvez tudo estivesse no... Talvez, entre o acertar e o errar. – O<br />
talvez... É aquele ponto entre o pensamento e a decisão. O que nem sempre se<br />
consegue fazer sem antes pensar, e pensar, e pensar até errar ou acertar, este<br />
mundo é mesmo um mundo de incertezas - concluo finalmente.<br />
Sobre o dorso do pássaro gigante, o nosso personagem encantava-se<br />
com tantas belezas que jamais vira em toda sua vida ou jamais veria, se tivesse<br />
concretizado seu intento nefasto de morrer, mas sua morte estava mesmo<br />
naquele ponto do incerto, naquele talvez. Era tão jovem, havia de merecer viver<br />
ainda por muito tempo. Mas jovens também morrem, e como morrem! Mas ele<br />
estava vivo e descobria ninhos de aves sobre galhos das imensas árvores, filhotes<br />
sendo tratados carinhosamente por mamães pássaras, saguis saltitando alegres<br />
sobre galhos davam movimentos à vida. Por que todos os seres têm mães e pais?<br />
Em certo sentido, alguns animais só têm mães; os pais vêm e se acasalam e depois