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uma febril paixão, que apagava dele todas as possibilidades de qualquer<br />
amor fazer surgir o desvendar, fazer surgir o simples...<br />
De fato, eu estava aflito, lembrei-me mais uma vez de seu Minoro, o que<br />
diria o velho japonês com sua sobriedade, com sua calma e filosofia - indaguei no<br />
meu consciente, como se seu Minoro me pudesse responder por ele -, houve uma<br />
mistura de sentidos e pensamentos e acabei por ficar sem resposta alguma.<br />
Imaginei que a falta de resposta era-me a resposta que indicava o caminho que<br />
eu precisava percorrer, a minha ferrovia que tinha que trilhar, só assim é que eu<br />
desvendaria o simples proposto, e para desvendar o que se passaria adiante, na<br />
leitura. Uma coisa estava associada à outra, eu não podia fraquejar.<br />
Por fim, e contra todos que não acreditavam naquele rapagão, certo<br />
dia - e neste dia, não falou com ninguém -, decidiu, finalmente acabar com tudo –<br />
como dizia – e saiu disposto a pular de uma ponte ferroviária ou, de algum<br />
penhasco, e tudo terminaria. Estava cego, e como um cego, caminhou rua afora<br />
sem enxergar nada, sem sentir nada, estava anestesiado e extasiado, qualquer<br />
cego sentiria e veria a vida com muito mais vida que ele, neste dia. A ideia lhe<br />
deixou sem sentir coisa alguma, talvez se alguém lhe batesse na cabeça, ainda<br />
assim não sentiria nada.<br />
“Às vezes um homem morre mesmo antes de morrer, quando pensa antes<br />
do fim, que o fim já chegou. Diria seu Minoro, se pudesse vislumbrar aquele<br />
trágico final, comigo.” Eu sempre pensava em seu Minoro, sentia certa<br />
autoridade em lhe atribuir pensamentos que me completava.<br />
Lendo aquela narrativa, me ocorreu que seu Minoro me havia dito, certa<br />
vez, que há uma literalidade intrínseca em todos os acontecimentos no mundo e<br />
que isso os tornam isentos de qualquer coincidência. Coincidência – afirmava – é<br />
inexistente. Para que algo seja coincidente é necessário trilhares de<br />
acontecimentos em cadeia acontecerem, e só assim, ainda, seria possível de<br />
nenhuma interferência, e, como cada<br />
algo iria acontecer com seu próprio agir e de forma arbitrária, sem essas<br />
interferências. Seu Minoro começava a falar comigo e se esquecia que eu era<br />
apenas um menino, parecia-me, que ele não se importava com a minha<br />
ignorância, ou que tinha medo de desmerecê-la, talvez tivesse razão. Ele havia<br />
me dito, lembro-me bem, para terminar: - O senhoro deve ser um bom homem,<br />
nada é por acaso, se for um bom